Prólogo

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DEDICO ESSA HISTÓRIA PARA PRINCESA
(A QUEM EU MAIS AMO E ADMIRO)

Havia um aroma sutil no quarto. Uma doce fragrância que apenas um perfume de ótimo gosto poderia exalar. Um aroma encorpado e envolvente, uma composição com algo que o deixava feminino. Talvez algo relacionado a morangos. Talvez algo relacionado a beleza.

Ela estava ali em frente ao espelho, com um delineador firme na mão, dando retoques finais com traços perspicazes em seus olhos bem trabalhados e cheios de certeza, mas sua cabeça estava fora dali, em algum lugar no qual, diferentemente do seu quarto, não havia cheiro algum. Nem beleza, nem vida, nem luz. Apenas solidão. Mas teria que mudar de alguma maneira. São apenas besteiras, estupidez generalizada por todos aqueles que nunca entenderão uma única gota de qualquer coisa além de suas próprias mentes patéticas. Mentes e todo o resto.

Mas, esqueça... O importante era sair dali, por isso sua maquiagem estava perfeita. Sua pele e cabelo completavam a obra. E não podemos esquecer do vestido azul, que o próprio Arthur Caliman estaria embasbacado do quão esplêndida a sua peça estava sendo naquele momento. Seu tecido suave e incontáveis brilhos espalhados de maneira incrível faziam com que mostrasse que ela estava acima de qualquer um. Mas isso nunca foi uma novidade.

Agora ela estava lá. O ambiente era tão charmoso e sofisticado que com certeza era o lugar ao qual pertencia. Ou pelo menos queria que fosse. Então, como o dia e a noite, alguém veio conversar. Um, dois, três... Naturalmente todos eles não eram a escolha ideal, mas foram dispensados de maneira educada, bem diferente do seu costume. Depois percebeu que havia um homem na outra ponta do balcão, que, incrivelmente, parecia triste. Como poderia, sendo de um lugar como aquele? Mas isso chamou sua atenção. Foi quando ele reparou também, ou pelo menos percebeu que o olhava. Um sorriso de meia boca foi projetado, ao que ela retribuiu de maneira automática.

– Não quero atrapalhar o seu espaço, então... – disse o homem, que agora estava ao seu lado. Pausou, engoliu e continuou. – Se quiser que eu vá embora...

– Você pode ficar à vontade, este lugar está vago – ela disse, torcendo para que não tivesse soado arrogante, como sempre soava.

Haviam passado vários minutos até ele perguntar o seu nome. Ela, hesitando um momento, respondeu mentindo. Então toda aquela sensação que a vinha consumindo durante tanto tempo estava esvaindo-se pedaço por pedacinho. A timidez dele trazia algo sincero no que dizia, portanto a conversa continuou por mais tempo.

O sereno da madrugada fez os braços e ombros dela encolherem, quando ele, após falar com o manobrista, desvestiu seu blazer e, de maneira cuidadosa e um pouco desajeitada, colocou-o em suas costas. Depois estavam ouvindo uma música muito agradável no carro, que ela de imediato percebeu quem tocava. Tentava ao mesmo tempo reprimir sentimentos infantis durante a viagem, enquanto continuavam conversando.

A decoração do apartamento completava a sofisticação de cada um dos cômodos. Eram tão bonitos e ele mostrava-lhe pacientemente cada um. Estava tão nervoso estando ali com ela e ambos sabiam disso. Ela se sentia entretida de tal maneira que talvez não houvesse mais nenhum pedacinho naquele momento. Talvez não houvesse também nos momentos seguintes.

Agora o rosto dele se aproximava. Gentilmente, encostou a mão em seu rosto e ela sentia o perfume dele misturado ao seu. Seus olhos expressavam uma ternura que foi arrebatada de maneira tão profunda quando encostou seus lábios nos seus. Delicadamente, gentilmente, harmoniosamente, movendo-os hipnoticamente. Tudo estava maravilhoso. Até que uma hora não estava mais. Esse não era o homem que a beijava naquele apartamento, era uma memória completamente inoportuna que se materializou no pior momento a ser lembrada. O mais engraçado era que o beijo do homem não se parecia em nada. Ela se afastou.

– Desculpa, fiz alguma coisa de errado? – O homem parecia completamente sem jeito, com os olhos repletos de culpa. Ela disse...

– Não. Eu... – Não foi possível continuar. Os pedaços voltaram e estavam terrivelmente maiores. Gigantes e congestionados, agora em todo o seu esôfago e garganta.

Com isso a sua vista embaçou, sentindo as bochechas pinicarem. Lágrimas enormes haviam brotado, as quais foram reparadas antes de qualquer tentativa de impedi-las.

– Eu menti para você – disse ela entre soluços, gagueiras e muitas palavras enroladas.

O que aconteceu a seguir desencadeou uma série de momentos terríveis na vida daquela garota. Sim, garota. Não importava o quão diferente, superior e madura ela achava que fosse, não passava de uma menina.

– Não estou entendendo... – o homem disse um nome.

– Meu nome é Malena – a garota continuou, e as trevas começaram.

MalenaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora