Causa debet praecedere effectum.

35 4 0
                                    

Um novo dia levanta-se. Acho que é a minha parte favorita em cada dia. Sempre adorei os nascer do sol, nem que para os assistir às vezes tivesse de me levantar por volta das 5 da manhã só para ver o sol tocar a Terra e toda a luminosidade que isso trazia ao nosso mundo tão cheio de solidão e tristeza. O sol e a lua tocam o céu partilhando o espaço e mostrando que apesar de contrários se podem juntar num momento a cada dia. O dia não é como a noite, durante o dia vemos tudo em nosso redor, o verdadeiro e o fingido sem medos. Mas quando cai a noite e a solidão e as sombras abraçam o teu corpo deixaste de ser o que queres ser e passas à tua fragilidade humana sem máscara, sem mentira. A noite sempre me assustou. O dia sempre me confortou.
Levanto-me e abro o meu computador. Muitas mensagens caíram durante aquela manhã no meu blog. Não é que as histórias sejam boas ou que as pessoas gostem do que eu escrevo. É mesmo porque aquele blog já foi um blog de mexericos devido a circunstâncias da vida e muitos da faculdade seguiam-no com afinco. Muitos perguntam-me quem é aquele rapaz e como posso escrever sobre ele, se ele é um novo especial em mim. A todos respondo que terão de ler para saber mais sobre ele. No fundo não é mentira, eu também não conheço aquele rapaz do centro, eu só o vi e escrevo sobre aquilo que ele poderá ser, não sei quem ele é mesmo. Ele é um estranho e mesmo assim parece que o conheço há anos sem que o tenha visto mais do que uma vez.
Mas há um comentário que desperta a minha atenção.

Anónimo
Como podes falar de alguém e conhecer tanto sobre ele vendo-o uma vez na vida?

Não compreendo se fala de si próprio ou se fala dele, se ele é o rapaz. Mas não acredito nisso, as coincidências são demasiado improváveis mas nunca sabemos. Acredito mais que seja um colega da faculdade daqueles que sempre vai ler os comentários e manda bitatites sobre o que escrevo.
Quando dou por mim e pelas horas noto que já estou atrasada para a primeira aula. Terei de correr para a faculdade e o caminho é longo. Tenho 10 minutos para lá chegar e assinar o livro de presenças.
Calço os tênis e visto a minha sweat dos Nirvana. Corro pelas ruas não ligando ao que me rodeia e a toda a agitação que existe. Só quero chegar a horas.
Passo pela entrada das faculdades e corro pelos corredores da minha faculdade. Estudo o que sempre quis e apesar de ter tudo em mim sinto nada ter.
Entro na sala antes do professor e ainda consigo assinar o livro de presenças.
"Maria"
Ouço-o a chamar-me e vejo o seu rosto de sorriso falso. Marco olha-me e sinto um calafrio por tudo o que acontece e já aconteceu entre nós. Mas as pernas movem-se sozinhas e caminho na sua direção. Ele dá-me a mão e sinto repulsa por mim mesma por ser tão fraca e ceder outra vez.
"Então tudo bem?"
"Sim Marco, sempre"
Um sorriso falso invade a minha cara e sinto-me mal por estar ali. Ele não é quem quero. Sei que lhe devo muito. É graças a ele que não sou só uma nerd com boas notas sozinha. Graças a ele sou popular e graças a ele tenho a pior vida que podia ter escolhido. Mas não o consigo deixar porque pode acontecer coisas piores do que já existem agora. Ele é boa pessoa, por de atrás daquela faceta. Ele nem sempre é mau...
"Aquele post de ontem, era sobre mim não era?"
"Claro que era"
Minto com todas as letras e com todas as forças. Que ele acredite penso. Ele sorri-me e sinto que a mensagem pegou. Depois disso ouço a aula e consigo tirar a cabeça dele.
"Queres ir ver este concurso comigo?"
Ele passa-me um poster dum concurso de bandas que vai acontecer na cidade. Olho para o programa e sinto vontade de ir. E com música estar com o Marco torna-se mais simples.
"Se quiseres ir comigo. Mas é hoje à noite"
"Para comemorarmos os 3 meses juntos"
Quais três meses juntos. No primeiro mês tudo corria bem e depois tudo caiu em ruínas. Que vida é essa?
"Certeza?"
"Porquê não queres ir comigo?"
"Quero claro"
"Então em tua casa às 21 horas?"
"Como quiseres"
As horas passam e tenho de estar todo o resto do dia com ele. Volto a casa sozinha e visto uma t-shirt dos Ramones. À hora em ponta o Marco surge na minha porta.
Caminhamos juntos até ao teatro e sentamo-nos na primeira fila. A conversa entre mim e ele é vaga e fria como toda a nossa relação.
As luzes baixam e sinto aquela velha adrenalina que sentia quando estava na minha banda. Imaginar que até com esse pedacinho de vida em mim acabei para estar aqui. Não que a faculdade me tenha tirado isso. Eu tirei isso de mim própria sem ter atenção à minha felicidade. Apesar de adorar a banda e de ter tocado guitarra durante anos desisti disso. A guitarra era uma paixão era um ser de mim e uma parte de mim. Mas não podia tocar segundo o Marco. Ele sempre me disse que eu não sabia tocar e que não tocava nada. Lembro-me de ele ter visto 2 concertos e depois de muitas críticas me ter feito pensar em desisitir. Então fechei aquela porta e segui em frente. Só não deixei de falar com as pessoas porque a amizade era mais forte que a nossa banda.
Sinto uma lágrima a escorrer pelo meu rosto e tapo-a para que não veja o que sinto.
As luzes apagam-se totalmente e a apresentadora fala-nos das bandas que vamos ouvir. A que abrirá o concerto é uma chamada ÁTOA.
Ouve-se uma bateria de fundo e as luzes acendem. É nesse momento que vejo aqueles olhos a observar os meus outra vez e um sorriso no seu rosto outra vez.

Omnia fert aetasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora