Psicose (Livro I)

Od andiiep

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Melissa Parker é uma psiquiatra recém-formada que encontra seu primeiro emprego em um manicômio judiciário. E... Více

Aviso Inicial
Prólogo
Um - St. Marcus Institute
Dois - A holandesa de Cambridge
Três - Inesperado
Cinco - Insônia
Seis - Happy Hour
Sete - Progresso
Oito - Passado
Nove - Proximidade
Dez - Embriaguez Acidental
Onze - Hormônios!
Doze - Corey vs Brian
Treze - Fotografia
Quatorze - Helvete
Quinze - Perigo
Dezesseis - Triângulo
Dezessete - Sobrenatural
Dezoito - Confusão
Dezenove - Corey vs Brian (parte 2)
Vinte - O plano mirabolante de Corey Sanders
Vinte e Um - Render-se
Vinte e Dois - Bipolaridade
Vinte e Três - Mensagem Sobrenatural
Vinte e Quatro - Intimidade
Vinte e Cinco - O inferno converte-se em paraíso
Vinte e Seis - Não Há Compaixão Com a Morte
Vinte e sete - Quebra-Cabeças
Vinte e Oito - O Passado Condena
Vinte e Nove - REDRUM
Trinta - Veritas Vos Liberabit
Trinta e Um - Plano de Fuga
Trinta e Dois - Luxúria
Trinta e Três - Preparação
Trinta e Quatro - Vai Dar Tudo Certo!
Trinta e Cinco - Um Sonho de Liberdade
Trinta e Seis - Scotland Yard
Trinta e Sete - Reencontro
Trinta e Oito - Vigilância Constante
Trinta e Nove - Corpo e Alma
Quarenta - Encontros e Desencontros
Quarenta e Um - Armadilha
Quarenta e Dois - Salvação?
Quarenta e Três - Tentativa e Erro
Quarenta e Quatro - O Infeliz Retorno
Quarenta e Cinco - Do Pó Vieste...
Epílogo
AUTO MERCHAN

Quatro - Sutura

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Od andiiep

N/A: Oláá! Fico feliz em saber que chegou até aqui! Espero que esteja gostando da leitura! <3

P.s.: Se por acaso encontrar algum "Danny" ao invés de "Corey", desconsidere. É um erro que o wattpad simplesmente me impede de consertar.

Milbjs,

Ands.


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Melissa não sabia se era vítima do destino ou apenas de uma infeliz coincidência, pois Corey Sanders, novamente, estava em seu caminho. Como se já não bastasse ter de encontrá-lo nas sessões particulares, e fracassar na árdua tarefa que era conquistar sua simpatia e, principalmente, suas palavras. Como se já não bastasse passar a vergonha de falar sozinha trancada com ele em um consultório pequeno demais para os dois, teria de viver tal inconveniente na frente de outras pessoas.

Corey Sanders, na particular atitude zombeteira, abriu um largo sorriso para Melissa. Como se fosse o responsável por todos os encontros que a rotina do St. Marcus impunha, como se fosse o responsável por Melissa ter sido escolhida sua médica, como se fosse o responsável por sua escalação naquela maldita sessão de terapia em grupo. A impertinência e egocentrismo exacerbados de seus modos eram absolutamente irritantes. Eram capazes de tirar Melissa da realidade com uma facilidade que beirava o ridículo.

Somente quando ouviu o barulho da porta sendo fechada, Melissa acordou do transe em que os olhos azuis de Corey Sanders a havia compelido. Ela passou a focar os demais olhos insanos que a fitavam com extremo interesse, como se fosse um brinquedo novo que uma criança acabara de ganhar no Natal.

Brian postou uma mão de modo delicado sobre o ombro de Melissa, que se virou em sua direção. O susto passou tão rápido quanto veio. Brian sorriu amigável e indicou a única cadeira vazia na roda que se estendia de modo irregular pela sala grande de paredes brancas. Melissa assentiu e foi até lá, tentando manter a pose ereta e os passos firmes. Brian caminhou até o meio da roda, enquanto Melissa pegava a prancheta que estava sobre a cadeira e em seguida se sentava. Na folha de papel presa na prancheta continha os nomes das dez pessoas presentes e o tema a ser desenvolvido naquela sessão. Os pacientes, para seu total desconforto, ainda insistiam em analisá-la.

O nome de Corey Sanders praticamente piscou em neon.

-Boa noite a todos. – Brian cumprimentou, em uma simpatia de apresentador de programa de auditório.

Alguns responderam um "boa noite" tão empolgado quanto. Um ou dois tons rudes se destacaram, enquanto outros apenas balançaram a cabeça.

Corey Sanders não moveu um músculo na cadeira em que estava casualmente largado. Com exceção dos olhos, que fitavam Brian como se quisesse queimá-lo em brasa.

Dois guardas estavam postados ao lado da porta, Melissa pôde observar, o que explicava a ausência das algemas. Porém, não foi Corey Sanders quem mais chamou a atenção de Melissa. Não dessa vez. Havia alguém naquela sala que era tão particularmente perturbado, que era difícil evitar o dispêndio de atenção.

Era um rosto conhecido, no entanto. O rosto que ela analisava no dia anterior, antes que Brian chegasse para chamá-la para o primeiro almoço no St. Marcus. Aquele era Johnatan Reagan, um de seus pacientes. Possivelmente, pela sua extensa lista de crimes, o pior e mais perigoso deles. Principalmente por ser um pedófilo que estuprou e matou dezenove crianças, antes de ser finalmente encontrado e preso. Certamente era a pessoa mais assustadora que Melissa vira por ali. Ou talvez em toda a sua vida.

A pele do homem, extremamente branca, era macilenta e grudada em seu rosto ossudo e magro, resultado provável de uma péssima nutrição. A barba era rala e branca em alguns pontos, assim como os cabelos, esses devidamente raspados rente à cabeça. Duas olheiras arroxeadas afundavam ainda mais os olhos negros no crânio, quase como se ele não tivesse, de fato, olhos. O corpo tão magro quanto o rosto, mas que provavelmente antes era tão forte quanto um touro, era envolto pelos braços tatuados com rosas vermelhas. Ele se balançava para frente e para trás, em um ritmo único. Parecia mais um personagem perverso de filme de terror do que qualquer outra coisa.

A negritude de seu olhar chegava a dar calafrios em Melissa, que imediatamente tratou de encarar qualquer outro ponto da sala que não ele. Suas mãos começaram a suar sem seu prévio consentimento.

A voz de Brian voltou a soar, então Melissa tentou manter a distração, para mandar aquele temor covarde para o quinto dos infernos.

-Primeiramente, gostaria de informar que o doutor Alexander McDermott não será mais o responsável pelas sessões de terapia de grupo dessa turma.

Várias exclamações de lamentação foram ouvidas, enquanto Brian balançava a mão para chamar a atenção para si outra vez.

-Mas, a boa notícia, é que ele será substituído pela doutora Melissa Parker, nossa mais nova médica. – Brian sorriu, e apontou Melissa.

Ela estava séria e praticamente se encolheu em sua cadeira. Tentou forçar um sorriso ao receber atenção geral, porém pareceu mais uma careta feia do que uma demonstração de simpatia.

Duas mulheres mais próximas sorriram com uma felicidade tão grande, que parecia quase inabalável. Um senhor corpulento, de provavelmente quase dois metros de altura, a cumprimentou com um aceno simpático de cabeça. Três moças mais novas, quase empoleiradas na cadeira de Corey Sanders, a olharam com certo desprezo, antes de voltarem suas atenções ao que interessava: o bonitão ao lado.

O próprio Corey Sanders abriu seu sorriso característico, arqueando a sobrancelha naquele tom de desafio também já característico. Tinha os braços cruzados na frente do peito. Agia com serenidade, quase como se não tivesse saído correndo do consultório naquela mesma manhã. Jhonnatan Reagan, por sua vez, mantinha sua posição e olhar de maníaco. Passava a impressão de que poderia atacar a qualquer momento, como se o tempo todo se preparasse para dar um bote. A paciente sentada logo ao seu lado era a senhora Logan e mais ao lado, vinha Julia Sheffield, com toda a sua aura angelical de dar calafrios.

-Gostaria muito que todos dessem as boas vindas à Melissa e a tratassem com todo o respeito e educação que ela merece. – disse Brian – Isso vale especialmente para você, Jamie! – ele apontou uma das moças mais novas, que agora insistia em fitar Melissa com expressão de nojo.

Imediatamente a moça se desfez de tal semblante, e passou a sorrir de um jeito apaixonado para Brian. Corey Sanders tinha uma admiradora a menos.

-Melissa... – Brian se pronunciou mais uma vez, enquanto caminhava para um canto mais afastado da sala – É com você! – e piscou sorridente.

Melissa, por sua vez, acenou afirmativa com a cabeça. Pigarreou no seu metodismo exacerbado, para que a voz não saísse no tom fraco e hesitante que provavelmente faria. Limpou as mãos suadas no jaleco e deu uma olhada parcial em cada um dos rostos que esperavam ansiosos por sua manifestação, antes que finalmente fosse dominada por uma falha coragem.

-Boa noite. – cumprimentou, sem se surpreender com o leve tremor que suas cordas vocais se fizeram ouvir.

Forçou um sorriso, na intenção de disfarçar o deslize. Não soube se obteve sucesso, no entanto. Preferia ignorar o doutor Brian Peters escondido mais ao fundo. Apenas se lembrou de todas as instruções que ele passara e pôs-se a falar novamente.

-Como o doutor Peters já anunciou, sou a doutora Melissa Parker e daqui em diante vou cuidar de vocês nas terapias de grupo.

-Seja muito bem-vinda, doutora. – uma das senhoras sorridentes ao seu lado desejou, e a alegria de seu sorriso quase foi capaz de contagiar o de Melissa.

-Muito obrigada.

-Você é muito bonita. – a outra senhora observou, fitando-a com extrema admiração.

-Acho tão... Normal. – Jamie, a tal moça com quem Brian ralhara mais cedo, foi quem se manifestou, abanando a mão com displicência.

Melissa não conseguiu conter o riso. Jamie, entretanto, pareceu não ter gostado.

-Você é invejosa demais para reconhecer a beleza nas demais pessoas, senhorita Jamie. – a senhora que elogiara Melissa retrucou.

-E você além de louca, é cega, Meredith! – a moça rolou os olhos – Porque sempre vê beleza onde claramente não tem. – então cruzou os braços.

-Ei, garotas! Está tudo bem! Agradeço o elogio Meredith, e aprecio sua sincera opinião, Jamie, mas não é preciso iniciar uma discussão! Estamos todos em uma sessão para discutirmos o que pensamos e sentimos sem sermos pressionados, certo? – ponderou Melissa, de repente se sentindo um pouco mais confiante.

Infelizmente, a confiança se esvaiu com a mesma facilidade com que se formou.

-Eu acho que Jamie tem inveja da doutora porque não provoca nem a metade da reação que a doutora causa nos hormônios masculinos. – a voz que soou era fria e sem vida. Deixou o ar pesado com toda a sua perversão. – Principalmente nos meus. – Johnatan Reagan sorriu, mostrando pela primeira vez todos seus dentes amarelos e apodrecidos.

Seu corpo não parou de balançar o para frente e para trás nem um segundo sequer. A malícia que impregnava seu gesto deixou Melissa levemente enjoada, de modo que ela agradeceu quando Brian interveio em tom de alerta:

-Johnatan, acho melhor guardar seus pensamentos para si mesmo. Achei que depois de todo esse tempo já tivesse aprendido.

-Desculpa, doutor! – o homem levantou as duas mãos espalmadas na altura dos ombros, em gesto de quem se arrepende.

Seu riso dissimulado, no entanto, demonstrava exatamente o oposto do que ele queria aparentar. O enjoo continuou no estômago de Melissa, e sua mão praticamente suava em bicas nessa altura. Juntou forças não soube de onde, e continuou como se nada tivesse acontecido:

-Bem, dando início à sessão de hoje... Alguém gostaria de compartilhar algo? – perguntou, tentando olhar para qualquer lugar que não fosse Johnatan Reagan.

Julia Sheffield levantou a mão, como se pedisse permissão para falar em sala de aula.

-Pode falar, Julia.

-Eu gostaria de compartilhar o quanto fiquei feliz com o dia ensolarado de hoje. – sua voz doce e angelical soou, e aquela estranha sensação de arrepio na espinha pôde ser sentida quase que coletivamente.

A garota assustava a todos, sem exceção, até mesmo os tão loucos e insanos quanto ela.

-Ah, pelo amor de Deus! – Jamie protestou, indignada – Ninguém quer saber o quanto o dia de sol deixou seu mundo de conto de fadas mais feliz! Eu realmente espero ouvir algo de proveitoso aqui. – a moça voltou para Melissa quando proferiu a última frase.

-Você é tão ridícula, Jamie! Se visse o mundo do modo que eu vejo, talvez não fosse assim tão carrancuda. – Julia Sheffield respondeu.

Melissa, dessa vez, mais preparada, conseguiu conter o riso.

-Ei, meninas! O que foi que eu disse sobre discussões? Não estamos aqui para isso, não é mesmo? Jamie, respeite o que sua colega tem a dizer, e caso tenha algo a acrescentar que seja do proveito de todos nós, por favor, sinta-se à vontade para falar o tempo que quiser. Caso contrário, sugiro que guarde suas críticas para si. – Melissa sorriu simpática ao terminar, e ganhou um revirar mal educado de olhos em troca, que não deu importância. – Então... Mais alguém quer compartilhar algo do dia de hoje?

-Eu quero. – Jhonnatan Reagan falou novamente, e de repente o enjoo voltou e um frio na barriga esquisito dominou Melissa.

-O que quer compartilhar conosco? – ela pigarreou antes de falar, e sem querer engoliu em seco ao fim de sua frase.

Não havia como disfarçar o nervosismo ali e sabia que aquilo não era bom.

-A doutora está nervosa... Não precisa ficar nervosa... Eu não mordo. – e ele sorriu de novo. Melissa não se sentiu bem. – Só se você pedir. – e piscou.

Tudo bem, ela teria pesadelos com aquilo de noite.

-Eu não acho que esteja em condições de morder alguém com essa sua péssima qualidade dentária, meu querido. – a voz irritante e pretensiosa de Jamie foi quem proferiu a ofensa.

Melissa teria dado risada, se a situação de repente não tivesse se tornado crítica.

-Se quiser te mostro o estrago que a minha péssima qualidade dentária pode causar nessa sua carne nojenta! – Johnatan Reagan respondeu a ofensa.

Um sorriso perverso esticou seus lábios, fazendo um rasgo estranho em seu rosto marcado por cicatrizes. Ele fingiu morder o ar e arrancou um gritinho afetado de umas das garotas. Melissa de repente não soube o que fazer, paralisando. E só perdeu ainda mais o foco ao se deixar encarar Corey Sanders e perceber que ele se divertia verdadeiramente com a cena.

-Johnatan! Pense bem no que vai dizer! –Brian gritou de seu canto afastado, trazendo a ordem de volta ao recinto.

O ar em volta de Melissa pareceu começar a pesar, as paredes se aproximaram tortuosamente. Uma agonia esquisita se instalou em seu peito, quase como um ataque de ansiedade. Como se esperasse por algo que sabia que iria acontecer, mas que torcia, no fundo, para que não acontecesse.

-Desculpe, doutor, mas eu realmente não posso deixar de compartilhar as coisas que estão aqui. – disse Johnnatan Reagan, enquanto sua mão de dedos compridos e ossudos apontava sua própria cabeça. – Não me perdoaria se não dissesse tudo o que eu faria com ela se a tivesse em minha cama, sabe? Só de pensar o que minhas mãos fa...

Johnatan Reagan foi impedido de terminar sua frase suja e mal intencionada. O estômago de Melissa revirava perigosamente, mas ela ainda foi capaz de acompanhar tudo o que aconteceu a seguir. Foram como flashes de um filme, no entanto, quase como se não fosse, de fato, real.

Corey Sanders, de uma hora para outra, pareceu não achar mais graça na situação. Com uma rapidez e agilidade impressionantes, seu corpo voou como um furacão na direção de Johnatan Reagan, que se empoleirava distraído em seu bote assassino. Corey Sanders derrubou seu oponente e a cadeira ao chão, sem parecer estar preocupado com as consequências de seus atos.

Por um segundo, o segundo que todos levaram para digerir e entender a cena que passava a se desenvolver, o silêncio foi predominante. E no seguinte, o barulho dominou. Socos sendo trocados, ossos se chocando, passos rápidos dos guardas na intenção de separar os pacientes, mulheres gritando histericamente e desesperadas. Melissa, por sua vez, só era capaz de distinguir a respiração pesada e descompassada que saía em rajadas rápidas de seu pulmão. Seus olhos estavam cravados em Corey Sanders e seus movimentos violentos e habilidosos. De repente, a cena da luta pareceu algo belo. Caótico, porém muito belo.

Corey Sanders foi capaz de dar dois socos no rosto ossudo de Johnatan Reagan, arrancando dele um filete de sangue dos lábios e deixando o nariz pontudo em um ângulo esquisito. Depois, passou a tentar enforcá-lo. A expressão em seus olhos era puramente assassina, injetada, e suas íris azuis pareciam tomadas de vermelho. Suas duas mãos apertavam o pescoço do outro, tirando-lhe o ar. Johnatan Reagan, entretanto, achou forças para revidar. Com um soco na costela de Sanders, conseguiu um segundo de distração, então girou o corpo e trocou suas posições.

Corey Sanders ficou por baixo, com as costas prensadas contra o chão, e tomou três socos tão bem dados quanto os que deu, sendo salvo dos próximos pelos guardas que finalmente foram capazes de apartar a briga. Sangue jorrava do supercílio de Corey Sanders, de seus lábios e um olho vermelho perigava se tornar roxo a qualquer instante.

As mulheres ainda gritavam em desespero. Jamie, por sua vez, incentivava a briga, e quando percebeu que havia terminado, passou a reclamar a plenos pulmões. O senhor corpulento não dizia uma palavra, porém sua boca estava escancarada. Suas mãos cobriam seus olhos com desespero. Johnatan Reagan amaldiçoava em gritos histéricos todos os palavrões possíveis e imagináveis, enquanto tentava se livrar do aperto de ferro do guarda três vezes maiores do que ele. Corey Sanders, por sua vez, encarava com uma intensidade assassina seu oponente, quase como se pudesse desintegrá-lo com apenas a força do pensamento. Havia ódio ali, muito ódio.

Melissa, como em um passe de mágica, acordou do transe absurdo em que havia estado durante aqueles poucos, porém intensos, segundos. Sua consciência voltou a funcionar na normalidade que era esperada e ela percebeu o perigo que rodeou aquele local.

-Chame alguma enfermeira! – Melissa finalmente gritou por cima dos demais gritos femininos, na direção de Brian, que segurava Corey Sanders.

-Só temos duas de plantão e as duas estão no helvete agora. – Brian respondeu.

Melissa bufou indignada, rolando os olhos. Sem pensar por muito tempo, subiu na cadeira, na intenção de conseguir o máximo de atenção possível.

-EI! – gritou. Imediatamente todos cessaram o que estavam fazendo e passaram a dedicar toda a atenção a ela. – Todo mundo calmo! Agora... Você – ela apontou para o guarda que não segurava ninguém e estava boquiaberto demais para fazer qualquer outra coisa além de se surpreender. Parecia jovem demais para lidar com uma situação daquelas com a calma que o outro conseguia – Leve todos os pacientes para os seus devidos quartos.

O homem assentiu com a cabeça, chamando com um gesto os pacientes dispersos e assustados. Ele prendeu todos com suas respectivas algemas e chamou reforço pelo rádio, antes de sair da sala. Os oito pacientes que não haviam se metido na briga não se opuseram às medidas tomadas, como se estivessem ansiosos para sumir daquele ambiente que ainda abrigava a tensão da briga. Jamie foi a única que continuou reclamando, alegando que queria ver quem venceria no final.

-Você – Melissa apontou para o guarda que continha sem muito esforço o arisco Johnatan Reagan. – Leve o paciente daqui e providencie curativos nesses machucados, antes de trancá-lo novamente. Ele não parece civilizado o suficiente para ser tratado agora.

-Sua cela especial na solitária te aguarda. – o guarda sorriu maldoso, arrastando um Johnatan Reagan que voltara a amaldiçoar com todas as forças que seu pulmão fraco lhe permitia.

-E você. – ela apontou Corey Sanders, que parecia bem calmo agora, apesar de ainda ser preso pelos braços por Brian. Ela o analisou bom um instante cuidadoso, antes de deixar um lado desconhecido seu falasse: – Vai para enfermaria cuidar desses ferimentos.

-Está certo cuidar de um e deixar o outro com o nariz provavelmente quebrado apodrecendo na solitária, doutora Parker? – Brian brincou, sorrindo quase que maldoso.

-Se você estiver disposto a cuidar dele, é todo seu! Eu não chego mais do que mil metros perto desse cara!

-Justo. – Brian assentiu - Deixo o Sanders na enfermaria com você e vou dar um jeito nele. – disse, enquanto já arrastava Corey Sanders corredor afora. Melissa caminhava em seu encalço. – E que fique claro que um guarda vai estar bem ao lado da porta caso tente alguma gracinha, Sanders. – alertou, com uma frieza que Melissa jamais tinha presenciado sair de sua boca.

Corey Sanders, no entanto, mal pareceu sentir a advertência implícita nas palavras. Ele deu de ombros com displicência, rolando os olhos com um sorrisinho de escárnio nos lábios. Brian, por sua vez, franziu o cenho, para fechar a expressão em ameaça, e empurrou Sanders sem qualquer delicadeza na direção da enfermaria. Melissa caminhou receosa logo atrás dos dois. Tensão e testosterona acumulada dominavam a área ao redor dos dois. Observando de fora, Melissa percebia claramente a rixa silenciosa que havia entre eles. Quis muito saber a razão de todo aquele ódio recíproco. O que havia acontecido entre Corey Sanders e o doutor Brian Peters, afinal?

Três portas à frente e alguns metros a mais no corredor, encontrava-se a enfermaria. Um pequeno quadrado de vidro bem ao centro da porta permitia uma vista do interior da sala, que estava com as luzes apagadas e completamente deserta. Lá no fim do corredor havia um guarda, talvez o maior que Melissa já tinha visto no St. Marcus, e ele se aproximou quando Brian fez um sinal.

-Está fazendo a ronda noturna, Jordan?

-Sim, doutor Peters.

-Poderia, por favor, deixar de lado essa importante tarefa por alguns minutos? A doutora Parker precisa fazer um curativo em um paciente e não seria sensato que o fizesse sem qualquer segurança do outro lado da porta. – Brian sorriu simpático.

-Estou à disposição. – o homem assentiu, imediatamente se postando ao lado da porta da enfermaria, em uma pose de quem guarda a entrada do Palácio de Buckingham.

-Volto logo. – Brian disse a Melissa, antes de sair caminhando a passos rápidos e largos pelo corredor agora deserto.

Melissa assentiu, girou a maçaneta fria e abriu a porta. Procurou pelo interruptor na parede, iluminando o ambiente. O cheiro de álcool e éter fez seu nariz coçar. Melissa tentou sorrir amigável para Corey Sanders, chamando-o com um gesto para dentro. Sorriu para o guarda também, antes de fechar a porta atrás de si.

A enfermaria era composta por três macas, um armário lotado de remédios, uma escrivaninha e uma janela coberta por uma persiana branca. Tudo ali, na realidade, era branco até demais. Desde o vinil que cobria as macas até a madeira que formava o armário. Chegava a doer nos olhos.

Corey Sanders estava parado de frente para Melissa, encarando-a com certo interesse distinto daquele que geralmente empregava. Num lapso de inconsciência, ela quis agradecer por ter tentado partir a cara de Johnatan Reagan em duas, porque de repente notou ter desenvolvido certo asco pelo homem, contudo não era nem certo e nem lógico pensar de tal maneira. Incentivar a violência entre pacientes era uma prática reprovável. Preferiu mandá-lo sentar em uma das macas.

-Eu não vou te machucar. – forçou um sorriso, vendo que Sanders não mexeria um músculo na direção da tal maca. – Quero te ajudar, assim como você me ajudou. Bom, me ajudou, de certa forma. – completou, dando de ombros, com o cenho franzido e um tom repreensor.

Corey Sanders umedeceu os lábios, franzindo a testa, como se enfrentasse uma luta interna. Logo depois, suspirou resignado e caminhou lentamente até a maca do meio.

Melissa sorriu em agradecimento, indo até ao armário de medicamentos. Buscou álcool, algodão, gaze, esparadrapo, tesoura e a agulha e linha para sutura. Não encontrou qualquer tipo de anestésico. Seriam alguns minutos difíceis para seu paciente, mas talvez ele merecesse um pouquinho de dor, para aprender a ser menos arrogante. O supercílio dele tinha um talho aberto e jorrava mais sangue do que o saudável permitia. Melissa colocou a luva e se aproximou dele.

-Já tem um tempo que eu não faço isso. – disse, tentando a qualquer custo quebrar aquela tensão esquisita que pairava sobre ambos. – Posso estar meio enferrujada, mas juro que vou fazer o possível para não doer. Tanto. Não consegui encontrar qualquer anestésico.

Corey Sanders arregalou levemente os olhos ao enxergar o material de sutura que Melissa trazia com cuidado em mãos, e ela quis dar risada de tal reação. Mas conteve. Era sempre melhor se conter quando ele estava por perto.

-Desculpe, mas tenho que fazer isso. Seu supercílio está numa situação deplorável. – lamentou, enquanto examinava de perto o ferimento do rapaz, ainda sem tocá-lo. – Vou deixar por último, para que você vá se preparando psicologicamente, tudo bem? Pelo jeito você não gosta muito de agulhas... – comentou, enquanto embebia um chumaço de algodão em álcool.

Melissa estava nervosa, porém no controle da situação. Demorou mais tempo do que o necessário para preparar o algodão, e quando finalmente criou coragem, levantou os olhos na direção das íris azuis de Corey Sanders. Elas a encaravam de volta com um brilho distinto do usual.

De perto ele era ainda mais encantador, pensou. Era possível se perder naquele mar de variáveis tons azuis sem ao menos se dar conta. Havia uma grande confusão de sentimentos e ressentimentos por ali, Melissa observou. O que mais chamou a atenção, no entanto, foi que a vida se esvaía lentamente, quase como se torturasse o pobre rapaz, e isso era uma verdadeira pena. A beleza daquilo não poderia ser perdida de forma tão cruel. A carga de sensações que Melissa recebia através daquele contato visual era pesada, mas altamente viciante. Algo nela impedia Melissa de quebrar a conexão que, de fato, naquele momento, parecia tão sólida quanto um diamante.

Melissa balançou a cabeça de um lado a outro, limpando a mente de tais pensamentos inapropriados, tentando se livrar do momento intensamente perigoso que estava acontecendo ali.

- Vou limpar esse corte na sua boca agora, está bem? – informou, após pigarrear com força, na intenção de deixar a voz compreensível. – Tem algum problema se eu te tocar? – perguntou, em uma hesitação inevitável.

Corey Sanders não se moveu, mas também não deu sinais de quem se opunha ao que Melissa queria fazer. Tudo o que ele fazia era fitar seus olhos, de modo que começava a deixá-la extremamente encabulada. Só estava esperando o momento constrangedor em que suas bochechas começariam a corar.

Melissa desviou o olhar, mantendo-o concentrado sobre o corte pequeno que sangrava o lábio inferior de Corey Sanders. Preferiu ignorar a voz atrevida que observava o quão bonitos e bem desenhados eram os lábios que formavam sua boca. Melissa tomou a ausência de reação dele como uma autorização e anunciou, antes de finalmente passar o algodão com extremo cuidado e delicadeza, sobre o corte:

- Pode arder um pouquinho.

Corey Sanders franziu o cenho e fechou os olhos com força, mas não deixou que sua voz que, a essa altura, Melissa quase morreria para ouvir, soltasse uma exclamação da dor que estava sentindo. Dessa vez ela não conseguiu conter uma leve risadinha.

- Nem para expressar sua dor você fala? – perguntou, com um tom divertido.

Estava quase descontraída quando o algodão finalizou a limpeza do corte, que não era profundo e não demoraria a se curar. Melissa o descartou no lixo próximo e buscou a agulha de sutura lacrada em seu devido plástico.

- Acho que uma simples dor não é motivo para abrir a boca, não é mesmo? – concluiu sozinha com seus pensamentos. – Tem algum propósito esse seu voto de silêncio? – perguntou, e teve que rir mais uma vez.

Obviamente ele não iria responder.

- Você faria um monge budista orgulhoso.

Melissa preparou linha e agulha, e embebeu mais um pedaço de algodão em álcool para limpar aquele bom tanto de sangue se acumulava na testa e olhos de Corey Sanders. Ele permaneceu a encará-la daquela mesma maneira. E ela continuou a ignorar.

- Você sabe, alguns fazem voto de silêncio, passam a vida toda sem proferir uma palavra... – Melissa continuou falando sozinha, enquanto limpava com cuidado o corte profundo que partira o supercílio dele em dois. – Se bem que, me disseram que você fala com uma pessoa aqui dentro. Não fala?

Melissa terminou a limpeza do corte e descartou o algodão sujo juntamente com o outro na lixeira. Buscou em seguida a linha e agulha, encarando preocupada a expressão quase desesperada de Corey Sanders. Achou melhor continuar a falar, dessa vez para distraí-lo do aparente medo que tinha da agulha de sutura.

- O carcereiro chefe do prédio C é um sujeito de sorte. Daria de tudo para que você me respondesse agora. Falar sozinha não é uma das experiências mais agradáveis por que passei... – Melissa comentou, enquanto a linha fazia seu caminho na pele branca de Corey Sanders.

Mais uma vez ele fechou os olhos com força, mordendo os lábios sem qualquer delicadeza. Melissa observou suas mãos fecharem em punho, amassando o papel branco que cobria a maca. E ela não gostou nem um pouco de ser a responsável pela dor que causava aquele tipo de sofrimento. Uma estranha agonia veio por um instante, quase como se a dor dele fosse a sua própria. Talvez desejasse estar em seu lugar. Não gostava de vê-lo sofrer, e isso era um fato incontestável. Mas tinha um trabalho a fazer ali, e se não o finalizasse como deveria, as consequências poderiam ser bem piores do que alguns minutos de uma agulha perfurando a pele.

- O que você fez foi errado, sabe? Brigar com outro paciente daquela maneira... É claro que você já deve saber disso, e provavelmente não dá a mínima. – Melissa rolou os olhos – Mas eu preciso te contar um segredo: pessoalmente, acho que ele estava merecendo um chega para lá, para parar de falar todas aquelas besteiras. Nenhuma mulher é obrigada a ouvir aquele tipo de coisa, independente de quem seja o interlocutor da conversa. – o sorriso que surgiu nos lábios de Melissa era mínimo – Não sei o que pode ter te levado a ter uma reação dessas, mas foi absolutamente providencial. Sabe-se lá o que mais poderia ter saído daquela boca perversa. Espero que o nariz quebrado sirva como lição.

Ela manteve a mão firme, apesar de um inesperado frio que atingiu sua barriga, pois, caso contrário, a sutura teria um resultado final desastroso.

-Não sei se valeram a pena todos esses ferimentos e a dor que eu estou te causando agora. Juro que se pudesse não o faria, mas será bem pior se não fizer. Espero que me desculpe por isso. – Melissa mais uma vez sorriu, quase que naturalmente, de um modo... Carinhoso?

Corey Sanders só mantinha seu olhar atencioso e insistente em Melissa. Ela tinha a impressão que ele observava cada uma de suas expressões, cada um dos movimentos de seus músculos.

-Vou encarar esse seu silêncio como um "Obrigada, doutora Parker. Essa foi a melhor sutura da minha vida". – brincou.

Corey Sanders não demonstrou qualquer outra reação diferente da de sempre. Observar, observar e observar invasivamente de modo que a deixava envergonhada.

-Você já teve outras na sua vida, não teve? Todo mundo já fez alguma travessura e teve que levar pontos... Eu mesma já passei por essa situação quatro vezes. Duas no joelho, uma na mão e uma na testa. Uma da mão e uma do joelho foram resultado de um acidente de carro – ela franziu o cenho, a dor incômoda no fundo de seus olhos que vinha de vez em quando estava lá, para atormentá-la – Mas não me lembro muito bem disso. – deu de ombros, a fim de afastar tais pensamentos nebulosos - A da testa foi a pior, o que explica essa franja. Tive a brilhante ideia de descer de joelhos em um escorregador e o corte que eu consegui quando caí não foi nada saudável. Eu era muito agitada quando criança, não parava um segundo, e o resultado foi um bom tanto de cicatrizes. – Melissa sorriu mais uma vez, agora com um considerável tanto de saudade figurando em seus lábios repuxados. – Mas quanto mais cicatrizes, mais histórias têm para contar certo? – finalizou, fitando com rapidez os olhos estranhamente interessados de Corey Sanders, e não entediados, como imaginou.

O modo como ela falava besteiras sem parar irritaria qualquer um. Principalmente alguém trancafiado em um lugar como o St. Marcus. Melissa gostou da sensação de estar, pelo menos, sendo ouvida, ainda que não respondida.

-Você poderia contar a história da cicatriz que esses quatro pontos vão deixar. Se abrisse a boca para falar... – provocou Melissa, finalizando o trabalho de agulha e linha, cortando a última com a tesoura cuidadosamente. – Tenho certeza de que o carcereiro chefe do prédio C ficará encantado em saber, já que ele provavelmente será o único a ouvir sua voz por aqui... – lamentou, jogando a agulha no lixo.

Buscou uma gaze, cortando-a em um pedaço pequeno, e prendeu sobre o corte suturado com o esparadrapo.

-Pronto! Fim de tortura! – comemorou Melissa.

Ela não soube se foi mais um produto de sua imaginação fértil, mas teve a leve impressão que um sorriso tímido, diferente do sarcástico de sempre, quis aparecer no canto nos lábios de Corey Sanders, que tremerem por alguns instantes. Se ele teve essa ideia, foi logo descartada, porque no segundo seguinte, seus lábios se trancaram em uma linha fina, como se censurassem a rebeldia de seus pensamentos. Seus olhos, no entanto, brilhavam em um agradecimento discreto, mas que, para Melissa, foi como se o sol voltasse a brilhar depois de anos sem dar as caras. Estava relativamente satisfeita com apenas essa demonstração de educação vinda dele.

-De nada. – disse, como se respondesse ao "obrigado" silencioso que advinha dele.

E sorriu novamente, na esperança tola de que talvez ele deixasse de lado aquela carranca que adotara de maneira tão veemente. Nada aconteceu, entretanto. A não ser a chegada barulhenta do doutor Brian Peters, que abriu a porta da enfermaria com uma força além do necessário.

-Está tudo bem por aqui? - perguntou, com a voz afobada pela provável pressa com que atravessou o corredor.

-Sim, tudo em perfeita ordem. – Melissa sorriu e ele correspondeu o gesto – Acabei de terminar.

-Ótimo! – Brian colocou a cabeça para fora da sala – Jordan! Pode levar o paciente de volta. – disse, sendo seguido pela enorme presença do guarda, que buscou algemas e prendeu as mãos de Corey Sanders na frente do corpo.

Ele nem ao menos se deu ao trabalho de encarar Melissa no casual sarcasmo antes de deixar a enfermaria. E ela não soube por que, mas se sentiu vazia por um segundo, devido à ausência daquele irritante gesto, mas de repente tão necessário.

-Ele quebrou o nariz do Reagan de um jeito que... Puxa! Vai ficar torto de um modo até cômico. E o olho vai ficar tão inchado que ele provavelmente não vai enxergar bem durante uma semana! – comentou Brian, tentando esconder a admiração pelo bom trabalho de Corey Sanders em machucar Johnatan Reagan.

-Corey Sanders só teve que levar alguns pontos, mas nada como ossos quebrados e olhos inchados.

-Aquele imbecil do Reagan mereceu. E bem, eu dei um jeito de fazê-lo sofrer mais um pouco enquanto colocava seu nariz no lugar, mas poderia ter doído um pouco mais. – Brian lançou um olhar preocupado a ela. – Não se preocupe, vou falar com o doutor Thompson e você não vai ter que chegar mais perto dele.

-Obrigada. – Melissa sorriu agradecida.

-Então... – Brian começou, enquanto ambos saíam da enfermaria, deixando as luzes apagadas e a porta fechada. Seus passos faziam eco no corredor deserto. – Lembra que você disse que, quando eu precisasse, estaria à disposição? – ele sorriu, estranhamente tímido.

Melissa de repente sentiu um frio esquisito na barriga. Não soube se gostou ou não.

-Sim...

-Eu realmente preciso tomar um café fora Winchelsea. Na verdade, sinto muito falta da Starbucks. Tem uma logo em Eastbourne, a aproximadamente 27 milhas daqui. Está a fim?

-Ah... Eu... – Melissa pigarreou, pega de surpresa pelo convite.

Mal tinha tido tempo para digerir toda aquela confusão que era o St. Marcus Institute. Que dirá teve tempo de processar o tipo de sentimento que nutria pelo doutor Brian Peters. Ele foi muito prestativo, é claro, a ajudou em todas as vezes que precisou, mas... O tom que ele falava era de quem queria um encontro com intenções claramente românticas, caso contrário não teria estado tão hesitante no momento de fazer o convite. Se fosse um passeio de dois amigos a timidez não o teria dominado de modo tão desconcertante. E, bem, Melissa ainda não estava preparada para esse tipo de... Compromisso? Nem mesmo um café na Starbucks de Eastbourne, por mais que também sentisse falta daquela abençoada cafeteria.

-Eu a assustei?

-Ah, eu, ah... Não sei. – Melissa sorriu incerta – Quer dizer, talvez... Na verdade... Vamos esperar eu me acostumar com tudo, colocar as ideias no lugar, e então faremos esse passeio até Eastbourne, tudo bem?

-Tudo bem. – Brian assentiu, insondável.

Melissa não sabia o motivo, só não se sentiria confortável viajando 27 milhas para ir a uma Starbucks com seu mais adorável e atraente colega. Obviamente ela devia ter algum problema mental, porque o doutor Brian Peters era a perfeita descrição do homem com que sonhou a vida toda. Infelizmente, seus conceitos pareciam estar mudando, e lá no fundo tinha uma voz atrevida dizendo que não era exatamente ele que Melissa queria que a convidasse para um café.

Naquela noite, tomada pela obsessão que a havia dominado durante o dia, Melissa acabou sonhando com Corey Sanders. No sonho, ele falava com ela, como tanto desejava internamente, de maneira quase desesperada. O diálogo, porém, foi diferente daquele que sua mente havia imaginado quando estava acordada.

Melissa se surpreendeu quando reconheceu o campus de Cambridge ao seu redor, como se fosse familiar ao local, como se tivesse uma rotina diária ali. Como se estudasse em Cambridge. Era noite e a lua cheia brilhava imponente no céu. Não havia estrelas. Uma festa rolava animada em um dos prédios dos dormitórios. Melissa não soube como, mas tinha certeza de que era o prédio da Engenharia.

Tímida, Melissa caminhou por entre as pessoas, sem chamar muita atenção. Quando chegou ao hall principal do prédio, onde a maioria das pessoas se aglomerava, avistou Corey Sanders. Ele estava ao lado de Barber Paay, a abraçando pelos ombros. Melissa foi corroída por um tipo absurdo e doentio de ciúme. Um estranho sentimento de posse a arrebatou, e ela quis reivindicar Corey Sanders para si. Porém, tal sentimento não fez sentido. Não o conhecia. Não sabia quem ele era. Então por que sabia seu nome? Por que achava estar perdidamente apaixonada por ele? Por que odiava aquela linda ruiva sorridente ao seu lado? Melissa estava confusa.

Deu meia volta, e saiu do prédio. Foi sentar atrás dele, encostada em seus tijolos a vista. Não soube por quanto tempo esteve ali. Talvez algumas horas. Talvez poucos segundos... Tudo estava embaçado e sombrio. Porém se iluminou quando avistou Corey Sanders caminhar cambaleante em sua direção. Estava bêbado. E tropeçou bem na frente de Melissa, quase caindo. Só não atingiu o chão porque ela o ajudou.

-Obrigado. – Corey Sanders agradeceu.

Melissa sentiu o estômago revirar de excitação. Corey Sanders havia falado com ela. Quão maravilhoso poderia ser? No entanto, o nervosismo não deixou que ela respondesse à altura. Em verdade, a voz ficou presa em sua garganta, que travou.

Quando Corey Sanders sorriu, a situação só piorou. Melissa limitou-se a ajudá-lo a se sentar ao seu lado, retribuindo o sorriso.

-Você não fala? – ele perguntou, e sua voz saiu mole. Um bafo de bebida abateu as narinas de Melissa, que enjoou.

Mais uma vez, dessa porque temia vomitar, Melissa não respondeu. Apenas o fitou, em uma curiosa admiração.

-Qual seu nome? – Corey Sanders perguntou mais uma vez.

Melissa ainda estava travada. Naquele instante, porque percebeu que não era capaz de falar. Sua língua estava amarrada, não tinha voz. Foi uma situação desesperadora. Interrompida, porém, pela chegada de outra pessoa bêbada e cambaleante.

-O que faz com essa esquisita? – Barber Paay perguntou, quando fitou Melissa e Corey, sentados um ao lado do outro.

Melissa nem tinha ideia de como sabia o nome da bela ruiva que a encarava enfezada.

-Eu... Quase caí, ela me ajudou. – Corey sorriu bobo.

-Vamos, você não quer ser visto ao lado dela. – Barber ignorou a resposta de Corey, ajudando-o a se levantar.

O casal foi embora, sem olhar para trás, deixando Melissa no seu desespero mudo gritando internamente para que ele voltasse.

Dor.

Era o que a algema raspando no osso de seu pulso causava. Era o que os pontos recém-costurados infringiam. Era o que o soco bem dado de Johnatan Reagan provocava tanto em seu lábio cortado como em seu olho inchado. Dor era o que mais procurava, não era? Era o que mais queria... E tudo o que Corey conseguia pensa era... Nela.

Na maldita doutora Melissa Parker.

O que ela tinha de tão especial, afinal? Que tipo de magia exalava? Corey jamais antes havia sentido a necessidade de defender uma mulher como fizera naquela desastrosa sessão de terapia de grupo. Teve vontade de partir todos os ossos de Johnatan Reagan, sem deixar nenhum inteiro para contar história. Teve vontade de arrancar os olhos de Johnatan Reagan, para que ele nunca mais os pusesse sobre a doutora Melissa Parker daquela forma abusada e suja. Teve vontade de cortar a língua de Johnatan Reagan, para que ele jamais proferisse qualquer palavra naquele tom sórdido, repugnante, desprezível. Johnatan Reagan era um ser asqueroso que não merecia viver, isso Corey sempre achara, mas a partir daquele dia, tinha um conceito bem diferente a respeito daquele imbecil. De verme insignificante, ele passara a um mal a ser cortado pela raiz.

Entretanto, os planos de acabar com Johnatan Reagan simplesmente não iam para frente, ainda que ele pudesse fazer alguma coisa além de dar uma boa surra nele. Os pensamentos de Corey volta e meia eram distraídos pela doutora Melissa Parker e todo o seu... Encantamento? Corey nem tinha ideia do que diabos aquela maldita mulher estava causando. Não sabia se eram os olhos acinzentados que brilhavam reluzentes, ou se eram as covinhas que se formavam em sua bochecha quando sorria tímida, ou se era o curvar perfeito de seus lábios carnudos tão vermelhos... Poderia ser toda a curiosidade que ela transpassava toda vez que Corey estava por perto, como se quisesse desvendar cada um de seus mais íntimos segredos. Quem sabe a insistência teimosa em conversar com ele, até mesmo assuntos banais, mesmo sabendo que provavelmente jamais obteria uma resposta. O tom de voz... Ah, o tom de voz levemente rouco, com algumas variações doces que com frequência pareciam a Corey uma perfeita sinfonia. E que dava vontade de... Falar. Cada mínima palavra que se formava nos lábios dela era um convite para que outras saíssem de seus próprios. Era um desafio a ser superado, no entanto. Assim como a vontade de sorrir quando ela fazia o mesmo.

Enquanto a doutora Melissa Parker costurava o corte em seu supercílio, um estranho sentimento de gratidão, que há muito havia desaparecido, se apossou de Corey. Era algo bom de sentir, afinal. Seu mundo pareceu menos cinzento, o dia menos frio... Porque a doutora Melissa Parker parecia ter o incrível poder de esquentar tudo ao seu redor.

Todavia, Corey achava que toda essa positividade deveria ser evitada. Não era correto se sentir dessa forma. Ele era sujo, estava sujo, e era absolutamente inaceitável pensar na doce e atenciosa Melissa Parker com olhos distintos dos que sempre vira os demais médicos. Ela era como todos os outros. Corey estava, no fundo, irritado com todo o novo turbilhão de sentimentos que vinha apenas para confundir sua cabeça já completamente bagunçada.

Não precisava de mais motivos para se sentir perdido. Queria, ao contrário, achar um jeito de não se perder completamente, e não era obcecado pela sua mais nova médica que conseguiria tal feito. Só tinha que continuar a ignorá-la, pensou, mesmo estando eternamente grato pela sua sutura milagrosa.

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