30/Junho
CHARLIE DEAN
– Imagina só a minha surpresa... – Levantei os olhos das folhas de contratos que estavam em minhas mãos e assisti James adentrar por minha sala.
– Não enche o saco, estou ocupada. – Disse dura, voltando a dar atenção aos documentos.
– ... vovô Bernard me chama para passar alguns dias em Nova Iorque para ver o andamento da Route de lá... – Continuou.
– Eu estou ocupada. James.
– ... E no início da viagem eu descubro que minha irmãzinha fez exatamente o oposto que eu pedi... – Ele se sentou folgadamente na poltrona em minha frente.
– Sai da minha sala.
– Se autossabotou não é?
Bufei e revirei os olhos – Não estou com mínimo humor para lidar com você.
– Terminou com o Chris, com toda certeza deveria estar de mal humor. Sei o que tem... isso se chama PCP, sabe o que é?
– Eu vou chamar a segurança. – Ameacei.
– Você está com Puta Consciência Pesada. – Larguei o contrato com força e o encarei com raiva – Para de fazer essa merda com você mesma! – Apontou o dedo em minha direção – É sempre assim Charlie, para com isso!
– Sai. Da. Minha. Sala. – Falei pausadamente.
– Ele não é igual nossa família fodida, seus ex-namorados idiotas ou o maldito Tom.
– James... o prazo pro Shelby está acabando e eu estou atolada de serviço.
– É, o Frank me falou que você pegou uns trabalhos burocráticos para fazer. Estranho.. logo você que odiava isso... está tentando ocupar seu tempo, Chary? Está sendo difícil deixar a cabeça desocupada? – Peguei o telefone na mesa e disquei o ramal da minha secretária.
– Sim, senhorita Pearson? – Ouvi a voz de Jenni soar.
– Preciso de seguranças na minha sala urgentemente. – James riu sarcástico e se levantou, tomando o telefone da minha mão.
– Calma Jennifer, sou eu. Minha irmã está tendo um daqueles pitizinhos. – Bufei e voltei a olhar os documentos em minha mesa. – Ele colocou o telefone no gancho e se afastou – É, deve estar se sentindo uma merda por ter afastado o que provavelmente foi melhor coisa que aconteceu com você. – Fechou a porta com força ao passar por ela.
Larguei as folhas e abri a gaveta na mesa. Peguei uma aspirina e a engoli secamente.
Voltei a pegar o telefone e disquei diretamente para o meu pai.
– Dominic. – Atendeu.
– Tem alguma entrega importante? – Meu pai riu do outro lado da linha.
– Pede pro seu avô me mandar te tirar disso e depois quer voltar?
– Eu não pedi. Tem alguma entrega?
– Sempre tem.
– Qual a mais próxima?
– Amanhã, para Nova Iorque.
– Eu vou, me encaminhe todos os detalhes. – Ele desligou e rapidamente fiz o mesmo.
James não ia me dar paz, tinha que ficar o mais longe possível dele sem correr o risco de arriscar o meu réu primário.
Me levantei e separei os arquivos que Frank havia me dado e os documentos do Shelby. Peguei a pilha de papéis, coloquei minha bolsa no ombro e saí da sala.
– Não volto mais hoje. – Parei em frente a Jennifer – Isso você devolve pro Frank, diz para ele que vou ter que resolver uma entrega em NY, e isso – Entreguei os arquivos do Shelby – Fala pro James cuidar disso até eu voltar.
– Ah, senhorita Pearson... – Me chamou – Tem alguém querendo vê-la... – Meu coração saltou e a encarei boquiaberta.
Ele estava aqui?
– ...Tom Xavier. – Revirei os olhos e bufei.
– A partir de hoje a subida dele para o meu andar está proibida e se ele aparecer aqui, diga que eu morri. – Ela riu – Não estou brincando. Mesmo se eu estiver parada bem do seu lado, você vai dizer que não pode liberá-lo porque eu morri. – Ela relutantemente assentiu e eu fui para o elevador.
Cliquei no botão que levava ao andar da garagem e esperei. Fui direto para casa e por sorte não peguei trânsito.
Fechei a porta atrás de mim e Dodger surgiu feito um foguete, tropeçando nas suas pequenas patinhas gordinhas ao correr desengonçadamente em minha direção.
– Hey, Dodgy!
Deixei minha bolsa para o lado e me sentei no chão. Brinquei com ele por alguns severos minutos antes que eu decidisse me levantar.
Ele se sentou no chão e me encarou com a cabeça tombada paro lado. Peguei meu celular e tirei uma foto dele.
Me: Preciso que fique com seu sobrinho por no máximo 24 horas.
Diana: Helloooou Charlize! E aí, conversou com o Chris?
Me: Vai insistir nessa merda?
Diana: Conversou ou não?
Me: NÃO PORRA!
Diana: Diga para o meu sobrinho lindinho que não poderei ficar com ele
Diana: Porque a mamãe dele é uma vaca teimosa! Mas se quiser conversar sobre o que aconteceu...
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Me: Preciso que fique com o Dodger, vou viajar.
Me: No máximo 1 dia.
Candy: VIAJAR?
Candy: Conversou com o Chris?
Me: Está de sacanagem comigo fazendo essa pergunta né?
Candy: Se tiver conversado eu fico.
Me: Conversei.
Candy: Então porque o Dodger – cachorro dele – está fazendo na sua casa?
Me: Vai tomar no cu, Candice.
Candy: Se precisar de companhia, me fala...
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Tom Xavier: Por que bloqueou minha entrada na Route, Charlie Dean?
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Me: Preciso de um favor...
James: NÃO!
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Me: Eu te pago 300 dólares para ficar com o Dodger até eu voltar de viagem. Não vai ser por mais de um dia...
Alec: Fechado, mas eu fico na sua casa.
Me: Fechado!
Alec: Na verdade, não posso
Me: O quê? Por quê?
Alec: Acabaram de me falar para negar qualquer coisa que você me pedir, mas se quiser alguém para conversar, chama qualquer um dos nossos irmãos
Me: É pau mandado do James por acaso?
Me: Alec?
Me: Inferno, me responde! Você tá online!
Alec: Não foi James que me pediu isso.
Alec: Por que você terminou com o Chris?
Alec: Ficou tendo aquelas viagens doidas na sua cabeça?
Alec: Tem que parar de fazer essas coisas consigo mesma...
Me: Vai à merda, Alec.
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James: Nem adianta mandar mensagem pro Frank ou pro Carl
James: Pedi pro pai cancelar sua viagem também.
James: Frank não vai mais te dar nenhum trabalho por fora.
James: Já peguei todos os documentos do Shelby e vou manter eles comigo.
James: Então aproveita o resto dessa sexta e o final de semana inteiro pra pensar.
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Tom Xavier: Charlie, me responda por favor.
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Respirei fundo e guardei meu celular no bolso da calça, tentando ao máximo dissipar todo o estresse e raiva que estava sentindo dos meus irmãos. Dodger latiu e lambeu meu pé. Me sentei no chão novamente e sorri quando ele subiu no meu colo e começou a dar mordidinhas na minha mão.
Dodger me acalmava, e muito. Ele não tinha raça, mas era um dos filhotinhos mais lindos e fofos que eu já vi na vida. No dia que o adotei tinha acabado de ter uma discussão feia com meu pai – o que não era nenhuma novidade –. Fui ao canil e andei cegamente pelas jaulas, estava com tanta raiva na hora que andava automaticamente dando fortes passos no chão. Isso consequentemente fez com que todos os filhotes corressem para longe de mim e alguns até chegaram a chorar.
De menos ele.
Dodger literalmente balançou os rabinhos e até se divertiu com os meus passos raivosos. Eu me agachei em frente à sua jaula e senti todo o peso do dia merda sair de mim.
Era como o Chris, uma brisa calma e serena entre as minhas intensas tempestades.
O nomeei assim pensando em um dos times favoritos dele.
Chris teria amado...
Abracei o filhote e ele lambeu meu queixo, se aconchegando aos meus carinhos. Fiquei assim por um tempo até sentir duras e dolorosas memórias que fizeram meus olhos começarem a arder. Soltei Dodger no chão e levantei rapidamente, tentando pensar em me ocupar com algo.
Entretanto, não havia nada a se fazer e nada que exigia minha atenção. Sem serviço, sem atividades extras... eu estava pela primeira vez sem nada para ocupar minha mente depois de todos esses dias.
Peguei novamente Dodger e subi as escadas até meu quarto. Fechei a porta do cômodo e o coloquei no chão antes de ir para o banheiro e tomar um banho. Tornei o processo ainda mais demorado ao esfregar o shampoo no meu couro cabeludo vagarosamente, tentando fazer com que o movimento me acalmasse.
Obviamente não surtiu efeito.
Ao terminar, hidratei a pele, penteei o cabelo e apenas vesti meu roupão de seda, amarrando a faixa contra minha cintura.
Voltei ao quarto, coloquei meu filhote na cama e deitei do seu lado. Liguei a TV e preguiçosamente comecei a trocar de canais.
Apertei forte o controle em minha mão ao ver o rosto de Chris na televisão.
O universo sempre conspirava contra mim, deveria me odiar.
O nome do filme era Qual seu número e era uma comédia romântica. Já havia o assistido alguns anos atrás, foi antes de toda a grande comoção de Capitão América já que o primeiro filme ainda era bem recente. Evans não estava tão musculoso nesse filme quanto da última vez que o vi, mas tampouco estava menos bonito.
Dodger latiu contra TV e o olhei nada orgulhosa – Garoto mal! – Ele latiu mais uma vez quando começou a passar a cena que Chris cantava e tocava seu violão.
Nem tinha me dado conta que ele poderia fazer isso até agora.
Dodger andou até mim e se aconchegou na minha barriga. Ele simplesmente deu as costas à televisão e ficou me encarando estático.
– Você é o cachorro mais esquisito que eu já vi em toda minha vida. – Olhei novamente para a TV e soltei um longo suspiro.
Meus olhos voltaram a arder e meu coração contorceu em meu peito. A verdade era que agora não tendo nada para ocupar o meu tempo, minha mente começava a se tornar confusa e meus pensamentos sempre pairariam nele. Eu suspeitava que algo do tipo fosse acontecer, mas também esperava que todo esses dias que passaram pudesse tornar as coisas mais fáceis.
Mas não tornaram.
Peguei Dodger no meu colo e me levantei da cama. Desliguei a TV, calcei um par de chinelos e ainda com meu filhote nos braços, saí de casa. Coloquei o pequeno cãozinho cuidadosamente no chão do banco do passageiro e dirigi para o lugar que imaginei nunca ir antes.
Dirigi até a casa de Chris.