A teoria do caos

By AyzuSaki

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Alguns eventos moldam as pessoas. Acontecimentos que transformam o caminho de alguém totalmente, por terem um... More

Capítulo I - O homem que trabalha com lixo
Capítulo II - O menino que brinca com lixo
Capítulo III - Que tipo de herói você quer se tornar?
Capítulo IV - Os gatos de rua de Hosu
Capítulo V - Aqueles encontros predestinados
Capítulo VI - Desvios imprevisíveis
Capítulo VII - Convergindo
Capítulo VIII - Endeavor precisa esfriar a cabeça
Capítulo IX - Sua mãe nunca te ensinou a mentir, mas deveria
Capítulo X -Aizawa questiona as suas escolhas na vida - Parte I
Capítulo XI -Aizawa questiona as suas escolhas na vida - Parte II
Capítulo XII - O gato e o novelo de lã
Capítulo XIII - A órbita de um Midoriya
Capítulo XIV - O poder por trás de um nome
Capítulo XV - Os rolês aleatórios de Nora
Capítulo XVI - Um interlúdio antes da desgraça
Capítulo XVII - O paradoxo da força irresistível
Capítulo XVIII - Aquelas reuniões familiares com parentes que tentam te matar
Capítulo XIX - O menino e os monstros
Capítulo XX - As promessas que fazemos e que nos quebram
Capítulo XXII - O paradoxo de Epicuro
Capítulo XXIII - Uma fúria feita de gelo
Capítulo XXIV - O inverno está aqui
Capítulo XXV - Efeito bola de neve
Capítulo XXVI - O guia prático de como criar caos, por Izuku Midoriya
Capítulo XXVII - Um cego guiando um cego
Capítulo XVIII - A ponta do fio
Capítulo XXIX - Os galhos da árvore
Capítulo XXX- Izuku é uma calamidade de bolso

Capítulo XXI - O Inverno está chegando

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By AyzuSaki

"Homens rasos acreditam na sorte ou nas circunstâncias.

Homens fortes acreditam em causa e efeito."

- Ralph Waldo Emerson

Naruhata.

Um pequeno distrito em Tóquio, consistindo de prédios abandonados e ruas desertas. Anos atrás, foi palco de muitos incidentes envolvendo vigilantes como The Crawler, Pop Step e Knuckleduster, mas hoje o local recebe menos atenção.

Quando Trigger estava em seu estopim no Japão, vários indivíduos foram apreendidos após o uso da droga no distrito. Responsável por um aumento brusco da capacidade de qualquer quirk, porém com o efeito adverso de fazer quem a utiliza eventualmente perder totalmente a razão, usuários de Trigger eram reconhecidos pela cor preta de suas línguas e foram caçados por vários distritos em Tóquio, envolvendo heróis, vigilantes e policiais em sua busca.

Hoje, com pouca atividade da droga em Naruhata, o distrito foi deixado à sua própria sorte, exceto por o apoio policial local e atividades de vigilantes mais cuidadosos.

Em suas ruas escuras, todos já haviam ouvido falar do Red Room. Um pequeno bar e casa de massagem, relativamente bem conservado no centro do bairro da luz vermelha. Em suas ruas de traficantes e prostitutas, o local era uma zona neutra para se fazer negócios, mas também um porto seguro para quem buscava refúgio. Sua dona, Madame Yuu, era conhecida por seu pulso de ferro para os negócios, mas coração mole para adotar mulheres ou crianças em necessidade. Era comum deixarem alguma criança em sua porta, quando eles mesmos não chegavam até lá, na promessa de uma cama quente e ajuda para se colocar de pé. Nos últimos meses um certo vigilante em Hosu tinha tomado como tarefa lhe mandar pelo menos três novas crianças na sua direção, a pequena peste.

Foi assim que anos atrás Madame Yuu conheceu Asahi. Alguém, claramente sabendo bem o que fazia, havia cuidado dele o bastante para sobreviver aos terríveis ferimentos e o deixou na sua porta, com a certeza de que ela não o viraria as costas.

Havia muito que ela não sabia sobre ele, mesmo com o passar dos anos. Ele mostrava modos e conhecimento de alguém de boa família, mas sinais de negligência e abuso como só havia visto nos piores casos que havia recebido de suas meninas. A mente dele parecia em frangalhos boa parte do tempo e demorou muito para que conseguissem o fazer minimamente funcional e começar a ajudar no bar e hoje em dia ele até mesmo ajudava os outros a espantar os clientes mais atrevidos das meninas.

Ele não falava do seu passado, mas ninguém lá falava, então não era um grande problema. Ela nem mesmo comentava sobre as noites em que ele sumia, apenas abafando os comentários sobre ele ter se metido no negócio de vigilantes, algo que ela mais pediu para que não fizesse. O nome Dabi começava a se espalhar pelas ruas, e ela não tinha dúvidas que Asahi era o envolvido.

Madame Yuu sabia que seria em vão tentar o parar. Asahi, ou o que quer que fosse o nome dele de verdade, tinha uma agenda a cumprir. Ela reconhecia nos olhos dele que havia algo que ele precisava fazer, que nunca saia da sua cabeça, mesmo quando parecia quase relaxado carregando bebidas no bar e conversando com as garotas.

Por isso quando o viu tão fixo na televisão nos últimos dias, ela sabia que algo estava vindo. Desde a primeira notícia sobre um ataque em uma escola de heróis, ele parecia inquieto, pensativo. O pegava soltando o ar frustrado. Decidindo algo.

Madame Yuu sabia. Ela o conhecia o bastante. Por isso não se surpreendeu quando ele bateu na sua porta com uma mochila com seus pertences e uma expressão séria.

Ela sabia que esse dia estava chegando.

— Vai voltar?

Ele virou o rosto levemente e então balançou a cabeça.

Era sempre triste quando uma de suas crianças ia. Ainda mais uma como Asahi. Uma que ela tinha certeza que o fim não seria feliz.

Era como ver um desastre que não podia impedir.

Suspirou e se ergueu da mesa, colocando o cigarro no cinzeiro e pegando um maço de dinheiro da gaveta e o entregando.

— Isso é bem mais do que meu pagamento.

Madame Yuu rolou os olhos e fez sinal para que se aproximasse. Segurou o rosto dele cuidadosamente, erguendo o pescoço para isso. Ele havia crescido muito do adolescente tão pequeno que havia aparecido na sua porta. Ignorou a tensão dele com o toque e sorriu levemente, o rosto enrugado se contorcendo e mostrando os dentes amarelados pela nicotina.

O rosto remendado e eternamente destruído por cicatrizes ainda carregava certa fragilidade, quando alguém sabia onde olhar.

— Se cuide, Asahi. *

— Obrigado. Por tudo.

Quando ele saiu pela porta do bar, teve certeza que nunca mais o veria.

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Fuyumi lembrava vagamente de alguns momentos felizes em sua vida.

Do sorriso da sua mãe, dos abraços raros, mas calorosos do seu pai e da risada de Touya enquanto corriam ao redor da casa. Naquela época Touya estava sempre lá, sempre ao seu lado, como deveria ser com os dois. Com cinco minutos de diferença entre eles, era o esperado que assim fosse. Naquela época ela pensou que assim seria por toda a vida.

Era uma época simples, antes das quirks deles surgirem, antes de ela ser dita como a criança fadada a ser ignorada e seu irmão ser obrigado a ser submetido a mais violência do que alguém como ele poderia aguentar. Touya sempre havia sido tão gentil, dolorosamente pequeno, tão frágil, sempre doente, que sua mãe sempre teve certeza que a quirk dele seria como a dela, porque ele representava a neve como nenhum deles havia representado: suave, frágil e silencioso. Efêmero.

Em dias ruins, enquanto andava por uma casa vazia e vivendo com apenas as memórias do passado, ela se pegava pensando em como seu irmão era uma daquelas criaturas destinadas à serem quebradas. Uma quirk poderosa em um corpo que não podia suportá-la, um emocional frágil em uma família que começou a se destruir tão cedo.

E um dia ele se foi e Fuyumi perdeu uma parte dela que nunca teria de volta. Fuyumi ficou para trás, como sempre. Apenas uma testemunha daquela história toda. Sua mãe, Touya e até Natsuo, que foi para a universidade. E ainda assim ela continuava lá. Em boa parte por Shoto, que era mais parecido com o irmão mais velho do que ele sequer tinha ideia, mas também por uma ilusão em sua cabeça de que um dia as coisas dariam certo. Que talvez ela conseguisse fazer deles uma família. Pegar o pouco que ainda lhe restava e remendar os pedaços e, talvez, voltar àquela época. Por Touya.

Fuyumi desejava isso mais que tudo.

Fuyumi se perguntava o quanto idiota era desejar algo assim, vendo a expressão exausta, mas sempre estóica do seu irmão mais novo. Notando como ele mancava até a mesa, ignorando os próprio machucados de uma sessão de treino que havia durado até quase duas da manhã. Ela sabia. Ela havia esperado e remendado ele.

— Nee-san?

— Hum?

Shoto virou o rosto em curiosidade, a testa franzida. Algo que ele sempre fazia quando estava preocupado. Fuyumi sorriu nervosamente, guardando o bule que ia colocar no fogo antes de ele entrar. Desde que havia visto Shoto em pânico quando se levantou para fazer chá no meio da noite e ele entrou na cozinha procurando água, ela sempre evitava fazer isso com ele em casa.

Ela nunca queria passar por aquilo de novo. Ver Shoto assim lhe partia o coração.

— Está tudo bem?

— Claro. Fiz seu bentô. Sente para comer, ainda tem tempo.

Percebeu uma breve hesitação. De uns tempos para cá ele sempre saia mais cedo e sem comer, mas nunca parecia faminto ao retornar. Ele comia em algum lugar no caminho da escola. Com certeza violando a dieta que o pai deles havia criado para ele. E quem seria Fuyumi para julgar?

Ela temia essas confrontações, cada vez mais frequentes entre o pai e o irmão, mas entendia Shoto.

Se ao menos ela pudesse fazer mais por ele.

— Indo a algum lugar? Vai se encontrar com alguém?

Ela era a irmã mais velha, tinha o direito de saber.

Shoto hesitou novamente, mas negou, sentando na mesa.

Fuyumi agora estava ainda mais curiosa. Shoto era sempre dolorosamente controlado para uma criança da idade dele, e ainda assim viu pelo menos 4 emoções diferentes no rosto dele no último minuto.

— Quer me contar algo?

Fuyumi se controlou para não apertar as bochechas dele, era sempre adorável quando ele fazia essa careta confusa.

— Nee-san?

— Você parece com cara de alguém que precisa conversar. Pode falar comigo, Shoto.

— Hum.

Ele desviou os olhos de forma desconfortável, mas pegou um dos bolinho de arroz. Fuyumi pegou outro com um pequeno sorriso.

— Eu acho que Bakugou está traindo ele.

Fuyumi se engasgou com o bolinho.

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Hitoshi não sabia ao certo o que estava acontecendo em U.A no momento, mas havia uma óbvia tensão no ar entre os funcionários durante toda a manhã. Não ajudava muito que sua sala estava sendo alvo de tantos olhares desde que as aulas retornaram, a maioria com curiosidade, mas conseguia distinguir os hostis de longe.

Mesmo se não houvessem recebido o pequeno anúncio de guerra no dia anterior, não havia dúvidas de que eles seriam alvos durante o festival.

Ainda havia as perguntas sobre o ocorrido, a insistência, mesmo quando foi feito anúncio sobre o ataque nas salas.

Toda a situação fazia seu estômago embrulhar. O que se passava na cabeça daquela gente?

— Isso não é uma atitude de alguém estudando para ser um herói.

Iida comentou, lançando um olhar de reprovação para um grupo de alunos que pareciam ponderar em vir até eles, mudando de ideia com a expressão hostil que receberam.

Hitoshi tinha que admitir que estava um pouco impressionado. Iida estava tomando o papel de líder bem a sério, tomando a frente do grupo como um lobo guiando uma alcateia. Yaoyorozu, como uma boa segunda líder, estava no meio do grupo, observando os colegas de forma atenta mesmo enquanto conversava com Jirou.

Olhou para o lado, se perguntando quando eles haviam se tornado uma alcateia. A sala inteira estava junta, caminhando pelos corredores. Mesmo os alunos mais introvertidos estavam mesclados no grupo. Até mesmo Bakugou seguia atrás, Kirishima e Uraraka conversando com ele. Protegendo a retaguarda, podia notar.

Todoroki, que sempre sentava sozinho, havia surpreendentemente se postado ao lado de Hitoshi logo que saíram do refeitório. Desconfiava por ele ser o mais silencioso do grupo e o mais possível de não tentar desenrolar uma conversa com ele. Hitoshi não se importava, realmente.

Depois de passar tanto tempo com Hatsume e Midoriya ele apreciava alguém silencioso.

Aizawa-Sensei havia dito que ficassem juntos, parece que o pensamento comum de todos foi seguir o conselho ao pé da letra.

Parece que a situação de vida ou morte havia trazido alguns benefícios, apesar de tudo.

Quando entraram na classe, esperando encontrar Aizawa-Sensei os esperando como em toda classe após o almoço, se surpreenderam ao ver outra pessoa. Um homem alto e com dentes pontudos, que lhe parecia vagamente familiar no uniforme vermelho de herói.

Olhou para Todoroki, notando a postura tensa dele. Hitoshi o entendia. Odiava surpresas também.

O homem sorriu com simpatia, a expressão amigável o tornando menos intimidador, ainda assim podia notar a tensão nos seus colegas, alguns parando na porta.

— Ah, Classe 1-A, finalmente! Sou Sekijiro Kan, mas alguns podem me conhecer como o herói Vlad King.

Ah, por isso havia o achado familiar. Então esse era o professor da classe 1-B, se lembrava bem.

— Aizawa não vai poder ficar com vocês essa tarde, então estou aqui para o substituir e juntar as duas classes para um pequeno treinamento. Peguem os uniformes de Educação Física, já que soube que a maioria dos uniformes de vocês está em conserto, certo? Perguntas?

Iida ergueu a mão, parecendo menos tenso.

— Aizawa-Sensei está bem?

— Ah, sim. Ele está ótimo. O diretor precisou da ajuda dele em algo depois do almoço, mas logo ele estará de volta. Algo mais? Não? Aguardo vocês do campo de treinamento do primeiro ano.

Hitoshi não se sentia assegurado.

Pela expressão de seus colegas, nenhum deles se sentia.

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Fuyumi retornou das classes da manhã com uma pilha de provas para corrigir. Já fazia um tempo que a responsável por ajudar nos afazeres havia ficado adoentada, por isso tinha que ajudar no almoço quando chegava. Quando era dia de seu pai passar o dia inteiro na agência ela não se importava e preparava apenas um bentô para levar, mas quando ele vinha para casa se esforçava para preparar algo.

Nas terças ele sempre vinha e fazia o plantão à noite inteira.

"Quanto menos estressado ele ficar, melhor para o Shoto."

O pensamento a fez pausar por alguns segundos, seu estômago embrulhando.

O som do interfone a assustou e enxugou as mãos rapidamente, caminhando pela casa fria até a porta da frente, olhando o monitor do portão e vendo uma cena inusitada. O homem alto ela não reconhecia de imediato, mas o pequeno animal ao seu lado era uma figura bem reconhecida.

O que o diretor da escola do Shoto estava fazendo ali?

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Kirishima sabia que a paciência de Bakugou estava por um fio. Normalmente ele já não era muito paciente, mas o outro estudante da classe B estava cruzando a linha. E ele não era o único que se sentia atingido. As tiradas dele durante o treino atingia toda a classe como um todo.

Ele tinha que dar crédito aos outros alunos da classe B, que não só não tomavam parte na incitação clara, mas viu mais de uma vez um deles tentar arrastar o colega para longe deles com um pedido de desculpas. Conseguia notar olhares de simpatia na direção deles e alguns solenes e exceto por uma ou outra tentativa de pergunta hesitante, eles não haviam tocado no assunto sobre USJ.

Exceto por Neito Monoma.

Kirishima não entendia qual era o problema daquele cara, ele claramente tinha um grande, mas ele precisava se controlar, porque estava cada vez menos motivado em parar Bakugou. E pelo frio repentino no ar, Bakugou não seria o único problema dele se não se controlasse.

— ...Eu esperava mais da classe que sobreviveu à USJ! Para quem está inflando tanto o ego com a situação, não vi nada demais durante os treinos!

— Monoma, se não calar a boca eu vou te desacordar.

— Kendo! Você tem que ficar do meu lado!

— Desculpe, ele bateu com a cabeça quando criança.

— Se ele não se calar, vai bater agora também.

Kirishima olhou surpreso para baixo, porque a ameaça não veio de Bakugou, que segurava pela camisa, aguentando as explosões dele para escapar, mas de Uraraka, que ajudava Iida a recolher o equipamento.

Bakugou até mesmo pausou com isso, olhando para ela levemente impressionado.

— Ou quem sabe vá dar uma volta na estratosfera e fique por lá.

— Uraraka!

Iida repreendeu, mas quem o conhecia via que não havia tanta força na bronca. Kirishima não sabia nem o que falar.

— A garota do infinito é selvagem.

Shinsou comentou, o único da classe A que, por algum motivo, Monoma não havia sido completamente hostil.

— haha, nada mal, cara redonda.

— Bakugou! Não incentive essa selvageria.

— Foda-se.

Click!

— Bakugou! Não pode desligar o aparelho auditivo sempre que quiser ignorar alguém!

— Muito bem! O treino acabou, terminem de guardar as coisas. Quando saírem do vestiário voltem para a sala. Power Loader me informou que esse horário foi reservado para que se encontrem com os estudantes que estão trabalhando no equipamento de vocês no laboratório. Vocês irão por ordem da lista que irei falar na sala. Classe A, Kayama-sensei estará na sala quando retornarem com a lista de vocês.

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A conversa com Endeavor estava indo tão bem quanto Aizawa esperava que fosse.

— O que está querendo insinuar com 'situação preocupante'?!

Ele começava a se arrepender de não ter insistido em trazerem Naomasa com eles. Nedzu havia sido firme, acreditando que a presença de um policial dificultaria mais a conversa por parecer um ataque direto.

—Primeiro falham em proteger os alunos e querem que ainda assim confie em deixar Shoto na mão de vocês em dormitórios e agora me acusam de-

—Todoroki, ninguém o acusou de nada.

"Ainda." Aizawa admirava a tranquilidade de Nedzu com a situação, porque ele estava perto de perder a dele. Apenas com aquela breve conversa, pela atitude do herói em relação ao filho, a forma como ele se referia a ele mais como uma possessão do que como seu filho, isso havia ligado todos os alarmes em sua cabeça.

—Como eu dizia, antes de me interromper de forma tão rude-

O herói surpreendentemente pareceu aceitar a bronca. Parece que uma vez aluno da U.A, sempre aluno da U.A.

—Durante as conversas mandatórias com os alunos de USJ, alguns questionamentos foram levantados sobre a situação do seu filho em casa que nos deixou preocupados.

—Eu não autorizei nenhuma conversa.

—No momento em que assinou a matrícula dele, você autorizou.

Nedzu juntou as patas e olhou o herói de forma calculista.

—Eu vou ser sincero, Enji.

"Nome informal, as coisas estão ficando mais pesadas aqui."

—Eu não estou gostando muito do cenário se desenhando na minha mente com essa conversa. Não pense que sua autoridade como herói número dois vai me intimidar. Eu sou o responsável por colocar heróis na indústria todos os anos, inclusive você.

Endeavor cerrou os dentes, a barba se acendendo em chamas. Aizawa encerrou a quirk dele rapidamente, recebendo o olhar furioso por isso sem titubear.

—Aizawa, por favor.

Piscou os olhos ao comando de Nedzu, mas não desviou o olhar do outro.

—Isso foi algum tipo de ameaça?

Nedzu deu uma pequena risada.

—Oh, não. Só um aviso, um conselho entre antigo diretor e aluno. Sobre os dormitórios, você sempre tem a opção de retirar jovem Todoroki da U.A e esperar um ano para as novas aplicações em outras escolas.

Algo que ele nunca faria, disso Aizawa tinha certeza. Ele conhecia homens como Endeavor, que buscavam prestígio acima de tudo. Nedzu sabia disso como ninguém também. Ele havia o dado uma opção que ele nunca tomaria.

— Caso resolva ficar, ao fim do festival os dormitórios estarão prontos. Posso garantir que a segurança dentro do campus está impenetrável e nenhum aluno sairá de lá sem escolta de um herói enquanto a situação com a liga não for resolvida. Ele estará seguro.

"Inclusive de você."

Um breve olhar com Nedzu e sabia que a conversa ficaria por ali, por enquanto. A expressão do diretor estava fechada e os dois se levantaram apenas com uma breve despedida do herói, que ainda parecia furioso sentado no lugar oposto da mesa.

Aizawa sentiu seu estômago embrulhar por a situação não estar totalmente resolvida. Ele queria tirar seu aluno dali o mais rápido possível, mas precisavam de provas. E boas provas, sendo Endeavor quem era. Ele entendia agora que Nedzu havia ido ali com o propósito de conseguir primeiro a autorização para tirar Todoroki dali, o que eventualmente conseguiria, ele havia deixado Endeavor sem escolha.

Aizawa queria mais do que isso.

—Eu levo vocês até a porta.

A voz o fez olhar para a garota, a mesma que havia aberto a porta e servido o chá para eles.

Fuyumi Todoroki, a irmã mais velha de Shoto.

Estava um pouco impressionado. Ela era silenciosa, o bastante para não ter percebido que ela estava ali ou ter ideia do quanto havia ouvido da conversa.

Assentiu, a observando enquanto conversava de forma amigável com o diretor. Conseguia observar a postura tensa e ansiosa da garota. Junto a forma como Endeavor havia praticamente a ignorado o tempo todo, o cenário parecia ainda pior em sua mente.

Por isso tomou aquela decisão.

No momento em que alcançaram o portão, ele se virou antes de entrar no carro.

—Todoroki-san, um momento.

Olhos azuis se arregalaram, confusos.

—Sim?

Aizawa olhou Nedzu já no carro, e se voltou para a garota, puxando um pequeno cartão do bolso e a entregando.

—Caso precise e queira falar qualquer coisa sobre a situação.

Ela pareceu ainda mais alarmada.

—Situação? Não tem situação, eu-

Aizawa balançou a cabeça, fechando o cartão na mão dela.

—Caso precise de qualquer coisa então. Eu sou Aizawa, Shoto é meu aluno.

Ela aceitou o cartão, hesitante.

—Aizawa-san. Cuide do Shoto, sim?

Quase sorriu com a expressão honesta da garota e assentiu em concordância. Ela não precisava lhe pedir isso.

Quando entrou no carro, Nedzu não comentou sobre a pequena troca.

O pequeno animal parecia pensativo. Calculista.

Já perto de U.A ele finalmente falou.

—Ligue para Naomasa. Peça para começar as investigações.

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Fuyumi sentia o cartão pesado em seu bolso ao entrar em casa.

Ela esperava que nunca fosse precisar dele.

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Shoto estava com os conselhos de Fuyumi em mente. Sua irmã era inteligente, principalmente em relação a como lidar com pessoas, então deveria ouvi-la sobre a situação.

"Se tiver dúvida em algo, Shoto, deve perguntar. É melhor do que tirar conclusões precipitadas."

Fazia sentido, embora ele soubesse que estava certo. Havia ligado todos os pontos. Ele havia ouvido Ashido comentar com a garota invisível sobre Kirishima, Bakugou e Uraraka, em como os três estavam se encaminhando à algo, claramente.

Ele tratava os dois de forma bem melhor do que tratava a pessoa com quem estava junto.

Era revoltante.

—Shoto Todoroki? Por aqui.

Um garoto com vários braços o apontou até a estação onde seu uniforme era trabalhado e sentiu seus ombros relaxarem ao ver quem era a pessoa responsável. Justo quem precisava no momento.

—Você está com Deku.

Ao ouvir o nome o garoto ergueu o cabeça de onde estava trabalhando em algo na mesa, na estação do fundo do laboratório. Havia um gato alaranjado deitado em uma cadeira ao lado dele, o rabo se mexendo ocasionalmente enquanto cochilava.

Os cabelos do outro garoto estavam bem presos e ele tinha um visor erguido na cabeça. Os olhos fundos encontraram os seus com um leve sorriso e Shoto pausou.

Ele parecia...cansado. Mais do que o normal, e isso era alguma coisa.

— É, ele está um pouco estranho hoje.

O garoto comentou ao seu lado.

—Mas é um dos melhores. Pode ir.

Recebeu um leve empurrão em incentivo e começou a caminhar.

—Ei, Shouchan.

Ele sorriu pequeno, esticando mais a coluna e estalando os braçaos e fazendo um sinal de mão para que se aproximasse.

—Olá...hum.

—Já disse que pode me chamar de Deku.

Shoto franziu o nariz com o nome, que sempre lhe parecia estranho. O outro pegou seu braço e usou uma fita métrica nele, anotando algo em um tablet.

—Eu prefiro não.

—Então me chame de Izuku.

Ele pediu de forma quase ausente, abrindo uma caixa e tirando um tecido dali.

—Isso não é muito informal?

— É? Eu não sei. Nunca fui bom com isso. Eu te chamo de Shouchan, parece justo.

Deu de ombros com a lógica estranha. Ele também não era bom socialmente.

Que fosse.

Izuku esticou o tecido na mesa e puxou um lança chamas.

— Esse tecido é algo especial. Ele é resistente à altas temperaturas.

Ele demonstrou isso com o lança-chamas, o tecido permanecendo intacto.

— A parte interna dele também tem Kevlar, ajuda no impacto.. Ele tem microporosidades, para que mesmo resistente não abafe as chamas, já que elas vem de dentro para fora.

—Eu não uso o fogo.

O outro o olhou com isso, de onde desenrolava o uniforme com cuidado.

—Você tem o fogo na sua quirk, não tem?

Tentou não se mover em desconforto, abafando a raiva comum que sentia sempre ao falar do assunto.

—Sim, mas não uso.

Sua voz saiu mais dura do que queria. Izuku desviou os olhos de volta para o equipamento. O uniforme era simples, como queria, mas as cores haviam mudado para um tom mais escuro e azul. Notou um cinto de utilidades e bolsos que não havia pedido e havia uma peça que não reconhecia.

— Algum motivo em específico? Pelo o que entendi da sua quirk seu lado esquerdo regula o direito e vice-versa. Usar um e não usar o outro pode causar sérios danos para seu corpo.

—Nada que precise saber.

Os ombros do outro garoto ficaram tensos e notou o gato o fitando quase de forma julgadora no momento. Sentiu vontade de se desculpar pelo tom, mas engoliu isso. Não havia feito nada de errado.

—Experimente no provador aqui atrás, vamos fazer os ajustes e ver o que precisa.

Shoto abriu a boca para falar algo, mas a fechou rapidamente e obedeceu.

Enquanto se vestia sentiu uma sensação ruim com a situação.

"A culpa é dele por se meter onde não lhe cabe."

Não sabia quem tentava se convencer.

Soltou um som frustrado, fechando o zíper com mais força do que o necessário.

"Eu não vim aqui para fazer amigos, não tem porquê me sentir mal por isso."

Abriu a cortina do provador com força e o gato continuava o olhando. Era bem parecido como Duas Caras o fitava quando era rude com alguém no café.

Shoto suspirou. Parece que não tinha jeito.

A expressão de Izuku estava menos amigável quando se virou, já testando as medidas no uniforme.

— Está apertado quando se move?

Negou com a cabeça.

— Você cresceu um pouco desde que tirou as medidas, mas fiz alguns números a mais esperando ter que ajustar depois, então acho que estamos bem. Provavelmente até o fim do ano teremos que ajustar novamente. A sola das botas ajuda no atrito, soube que gosta de deslizar quando usa o gelo.

Assentiu, mordendo a bochecha.

"Eu não fiz nada de errado."

O gato continuava o fitando.

—Isso é um bastão. Não precisa usar se não quiser, foi só algo que pensei junto com Aya. Ele é retrátil, cabe na palma da mão, mas se apertar aqui duas vezes ele vai se expandir.

Ele demonstrou, o objeto crescendo para o tamanho dele. Shoto ergueu a mão hesitante e Izuku o entregou. Era frio em sua mão.

—Metal?

—Um tipo de metal. Ótimo condutor, de frio e calor. Pode utilizar para estender o uso da sua quirk. Se aprender a lutar com ele vai ser de serventia em uma situação que não possa usá-la também. Eu analisei o seu estilo de luta, eles enviam para o departamento, e acredito que ele combine com seu estilo de kata.

Shoto sentiu o peso em sua mão, admirado.

—Alguma dúvida? Não? Então pode se trocar.

Shoto soltou o ar e tocou no ombro do outro quando ele virou as costas. O sentiu tensionar de imediato e tirou a mão.

—Desculpe. Pelo o que disse.

—Está desculpado. Não é da minha conta.

Franziu o cenho em desagrado por isso. Ele nem mesmo se virou para falar.

— Izuku.

O nome saiu estranho na sua boca. Muito informal. Mas melhor do que Deku.

Ouviu um suspiro e ele tirou o visor, o rosto ainda mais cansado à mostra.

—Shouchan, eu tive uma noite muito ruim, por isso estou um tanto rabugento também. Está tudo bem.

Shoto ainda assim não se sentia satisfeito. Ele sentia uma vontade imensa de contar seus motivos. Havia algo no outro garoto que lhe inspirava esse tipo de confiança. Algo que o deixava estressado se ele ficasse chateado com ele.

Ao mesmo tempo ele não queria misturar o café, Duas Caras e Izuku com nada da sua vida. Eles eram uma parte separada daquilo.

—Está parecendo constipado.

—Bakugou está traindo você.

A frase saiu de supetão. Sentiu alívio imediato por ser honesto ao menos com alguma coisa. Izuku piscou uma, duas vezes. Olhos verdes arregalados.

—Hum?

—Eu não acho que eles dois sabem que ele tem alguém, então a culpa é só dele.

Completou, porque tinha que ser justo.

Com isso virou as costas e foi se trocar.

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—O que foi isso?

Satou girou a cadeira para fora da sua estação, erguendo o visor com a expressão curiosa.

Aya deu de ombros, fingindo que também não estava atenta à conversa. A tensão na estação do Deku estava alta segundos atrás. Levando em conta em como ele estava estranho o dia inteiro, ela tinha razões de ficar de olho.

Voltou ao tecido nas suas mãos. A garota invisível estava sendo um desafio e tanto, mas estava chegando a algum lugar. Apenas mais alguns testes e a pobre coitada podia deixar de andar pelada.

Depois era a vez de Creati. Nisso ia precisar de Deku.

Hiro surgiu do nada ao seu lado, abandonando seu projeto com uma expressão animada.

—O que é isso? Drama? Vocês ouviram?

—Hiro, deixa de ser fofoqueiro.

—Mas quem é esse Bakugou? Como assim ele traiu Deku?

—Hiro-

—É o amigo de infância dele.

—Hatsume! Quando veio parar aqui? Já tem gente te esperando.

—Oh? Melhores amigos que se tornam namorados. Quão clichê.

—Zuko está focado no uniforme dele, mais do que qualquer um.

—Que sacanagem! E ele o trai?

Aya suspirou. Hatsume sorria como o gato que pegou o canário. Ela sabia que a garota estava instigando a revolta. Hatsume sempre era a criadora do caos.

—Que coisa anti-heróica. Izuku merece mais.

—Eu tive a sensação-

E agora Nara estava ali também. Todo mundo abandonando seus projetos por uma fofoca, pelo jeito.

— -que o sujeito contou porque quer uma chance.

—Vão para a estação de vocês! Agora!

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Hitoshi piscou confuso ao se deparar com a cena.

Izuku havia tomado seu projeto de um dos colegas, porque, citando ele "Hichan, eu sou seu mecânico agora", então não era surpresa que ele estava em sua lista.

A surpresa é que Todoroki, que havia sido chamado antes dele, ainda estava ali. E parecia que não ia sair.

Ele estava bem à vontade em uma cadeira do lado de Izuku, com o gato mal-humorado nos braços e vendo tudo o que Izuku fazia de forma atenta. De vez em quando Izuku lhe entregava algo e ele se distraia com isso, a expressão concentrada no rosto estoico.

"É como ver dois gatos interagindo."

O pensamento o fez se engasgar em uma risada.

—Shinsou! Meu homem!

Hiro o parou, a cadeira rodando para sua frente. Na estação dele, Jirou revirou os olhos onde estava experimentando seu equipamento.

—Shinsou! Bom te ver!

Satou o acostou do outro lado, abandonando um dos alunos da Classe B.

Ele realmente estava bem famoso no departamento.

Hiro segurou seu braço e o puxou para baixo, ainda sentado. Os olhos dele gigantes na lupa contrastava com a expressão séria.

—Shinsou, você conhece um tal de Bakugou?

—Ele é da minha sala. Vocês também o conhecem, foi quem tentou explodir a cara do Deku naquele dia.

—Ahhh, aquele é o Bakugou? Você sabia que ele estava namorando com Izuku?

"Hein?"

—Pior ainda!

Satou interrompeu o curto-circuito em sua cabeça sacudindo seu braço.

—Ele traiu nosso bombom de café maníaco. O quão cruel é isso? Tem que ter retaliação.

Agora, Hitoshi tinha certeza, absoluta, que Izuku não namorava Bakugou.

Mas ele não dispensaria a possibilidade de sacanear com seu colega mais explosivo, por isso sorriu.

—Podem contar comigo para desfazer essa injustiça.

...................................................................

Shoto estava errado, ao que parecia.

Isso era inesperado.

—Você tem certeza?

Talvez tenha perguntado isso várias vezes, mas tinha que saber.

Izuku suspirou e ouviu algo suspeito como uma risada vindo de Shinsou, que estava plantado em um banco enquanto Izuku ajustava um equipamento no rosto dele.

—É, Shouchan, tenho. Não sei de onde tirou essa ideia.

—Para ser justo, vocês brigam como dois velhos casados.

Shinsou o entendia, pelo menos.

—Ai, Izuku. Fez de propósito.

—Calado, Hichan.

Izuku se aproximou mais do outro, mexendo no que parecia uma focinheira, olhando assim. O material era escuro e notava alguns botões nela. O uniforme de Shinsou parecia simples e prático, algo que notava podia ser um padrão no trabalho do outro garoto. As cores eram escuras, fáceis de se mesclar durante a noite.

—Está irritando sua pele?

—Não.

—Estranho, está vermelho.

—Talvez seja porque está respirando na cara dele, Zuko.

A outra garota, que Izuku havia chamado de Mei, se aproximou e jogou algo na estação. O sorriso dela era largo e o deixou desconfortável quando o fitou, como se ela o analisasse rapidamente e soubesse de coisas que não deveria.

—Aqui o que me pediu para nosso Hitoshi. A carta de permissão do professor da Classe A está aí, mas ele quer conversar com os dois sobre o assunto depois.

Ouviu Hitoshi fazer um som de surpresa.

—Isso é-

—Um protótipo da ferramenta de captura baseada na de Eraserhead.

—Puta merda.

—Não vamos mexer nela agora, Hichan. Primeiro, esse equipamento aqui vai ajudar com sua quirk. É um modulador de voz, ele capta o padrão de voz das pessoas e o copia e modula a sua no mesmo padrão. Como um copiador. Pode entender os benefícios, certo. Hichan?

—Eu acho que ele entrou em pane de tão surpreso no quanto somos maravilhosos com ele.

—Mei, menos.

Shoto ia admitir, era impressionante.

Assim como assistir a interação dos três. Eles pareciam se conhecer bem. Imaginava quando isso aconteceu.

Shoto coçou entre as orelhas do gato nos seus braços, silencioso enquanto os observava de fora, como sempre, tentando decifrar a sensação estranha que sentia com isso.

Ele não chegou a conclusão alguma.

.............................................................

Parecia ser algum tipo de ironia do destino que de todas as pessoas que ela pudesse cair no horário, Ochaco tinha que estar no mesmo horário de inspeção do uniforme de Monoma. Ela se considerava uma pessoa amigável, mas os comentários do outro estudante em conjunto com os nervos à flor da pele dos últimos tempos estavam pintando uma situação que poderia acabar com alguém sendo jogado em direção ao sol.

—Uraraka, calma.

Pelo menos Kirishima estava ali. Bakugou também, mas ele parecia mais inclinado à ajudar do que impedir que fizesse uma besteira.

Uma garota bonita de cabelos verdes estava mostrando à eles o laboratório, indicando para onde deveriam ir. O lugar parecia mais um enorme galpão, com estações espalhadas onde via os estudantes do departamento trabalhando nos uniformes, alguns estudantes da Classe A e B entrando e saindo de provadores, experimentando e testando as melhorias, planejando trocas e reparos. Com esse monte de gente fazia sentido que alguns fossem ficar para o dia seguinte.

A garota bonita, que se apresentou como Kenranzaki, lhe indicou uma das estações em que duas meninas altas, morenas e de cabelos azuis trabalhavam lado a lado.

Para seu azar era do lado da de onde Monoma estava indo, onde um garoto com vários braços terminava os ajustes em um uniforme de alguém da classe B.

—Uraraka e Kirishima?

Os dois assentiram. A garota tinha a voz amigável e parecia ser a mais falante das duas.

—Eu sou Koto Ikeda e essa é minha irmã Harumi, somos as responsáveis pelo uniforme de vocês dois. Na verdade, Deku fez boa parte do seu uniforme, Uraraka, tanto que o símbolo dele está nele, mas como ele pegou muitos projetos, porque não sabe quando parar, assumimos o restante. Se tiver alguma dúvida que não possa responder, pode ir até ele.

Uraraka assentiu, tentando entender a enxurrada de palavras.

Que logo se tornou pior quando ela começou a explicar seu uniforme, mas se concentrou para pegar tudo. Os dois foram empurrados para os provadores e logo notou que seu uniforme estava bem mais confortável do que antes. Seu pedido para que ele ficasse um pouco menos apertado havia funcionado.

Olhou para o final da sala ao ouvir uma explosão e viu Bakugou na última estação com o garoto-fofo-que-bebe-café-demais. Shinsou-kun e Todoroki-kun estavam lá também, fazendo o quê, ela não sabia, já que a vez deles já tinha passado.

— Ele parece quase relaxado.

Uma das garotos olhou Kirishima de forma incrédula e Uraraka teve que rir. Porque era verdade, Bakugou parecia menos explosivo do que naquela manhã. Ele devia estar muito feliz com o upgrade que estava recebendo.

—A classe A, sempre arrumando problemas.

Seu sorriso morreu ao ouvir a voz irritante de Monoma. Com o silêncio na sala, todo mundo havia ouvido isso. Ele não havia tentado baixar o tom de voz também.

—Primeiro obrigam todo mundo a mudar para os dormitórios, se banham na fama do ataque em USJ e agora querem aparecer até nisso. Que coisa mais feia.

—Uraraka.

Kirishima agarrou seu braço quando fez menção de ir até lá. A expressão dele estava em aviso.

—Não caia na dele.

Era difícil. Aquele idiota tinha pelo menos ideia do que eles passaram para dizer isso?

—Eu esperava mais de alguém da classe de heróis.

A voz cortou o outro de forma abrupta e notou que todos haviam se calado. Ouviu o som de metal contra a mesa e olhou na direção da última estação. O garoto de cabelo verde havia largado as ferramentas e se aproximado da mesa deles. Um das meninas da classe tocou no ombro dele quando ele passou, mas ele a sacudiu.

Uraraka abriu a boca, mas a fechou sem falar nada. A expressão dele, pela primeira vez na vida, parecia tão fechada quanto a de Todoroki.

Monoma continuava sorrindo, mas ele parecia tenso ao ver o outro se aproximando.

—E você, quem é?

—Alguém que estava no meio do ataque, 'se banhando na fama' de quase ser morto, de ver um herói quase ser morto, de ver o corpo de um aluno morto sendo carregado. Nesse tipo de fama. A fama que todo mundo quer.

Ele parou na frente do outro e seria ridícula a diferença de tamanho, se ela não estivesse ocupada demais se sentindo intimidada.

E muito admirada.

E ela não estava nem mesmo vendo a expressão dele no momento. Era um privilégio apenas de Monoma, que havia empalidecido abruptamente.

—Se quer abrir a boca e falar esse tipo de absurdo, que não seja dentro do nosso laboratório, já que não pode ser um ser humano decente. Quer saber o que aconteceu de verdade em USJ? Uma dose do que vocês, ou quem conseguir se formar, vai ter que passar na vida. A morte de alguém nas costas. Está dizendo que estou me banhando na fama da morte de alguém?

Monoma não estava sorrindo mais. O viu dar um passa para trás e negar devagar.

Ele estava intimidado.

"Bom."

—E qual o seu nome?

—Neito Monoma.

Ela não conseguia ver a expressão do garoto no momento, mas ele deu uma pausa no que iria falar ao ouvir o nome. Para a surpresa de todos ele puxou o garoto mais alto pela gola da camisa e avaliou algo em seu rosto, antes de o soltar abruptamente.

—Monoma.

Ele repetiu o sobrenome em voz baixa.

Monoma deu um sorriso trêmulo, tentando se recompor.

—Conhece meu sobrenome?

O outro garoto franziu o cenho, mas negou com a cabeça.

Uraraka tinha a sensação que ele estava mentindo.

—Cuidado com as palavras, Monoma.

—Me desculpe por ele!

Kendo correu de onde havia saído do provador, puxando o colega pela gola da camisa, que ainda parecia muito chocado para se mover.

— Ele tem problemas.

A expressão do outro garoto mudou e ele sorriu, balançando a mão:

—Não é sua culpa. Taka, desculpe por te atrapalhado.

—Não tem problema, Deku.

E com isso ele voltou a estação dele como se nada tivesse acontecido. Uraraka notou o sorriso maníaco na cara de Bakugou de longe. Quando o outro retornou, pegando a ferramenta, ele cruzou os braços de forma satisfeita.

—Porra-louca pirada, pensei que ele fosse se mijar.

—Calado, Kacchan.

—Vai se foder.

—Rude. Hichan, Mei, arranquem esse sorriso da cara. Por que vocês não são mais como Shouchan? Kacchan, seus peitos estão crescendo? Vou ter que ajustar de novo.

— Hãm? O que disse, nerd??

—Uau.

Tinha que concordar com Kirishima nisso.

Talvez existisse uma razão para aqueles dois se conhecerem tão bem.

....................................................

Maijima observou seus alunos 'arrumarem' as estações com orgulho. Ele dizia arrumar porque enquanto alguns trabalhavam bem na organização, a estação de outros parecia um completo caos que só tinha sentido para eles.

Dez alunos haviam ficado para o dia seguinte, mas ainda assim sua classe tinha se adiantado bastante. Era um mérito já que todos os uniformes do primeiro ano haviam ficado com eles nesse ano, mesmo com apenas 10 alunos na sala. Ajustes mais extensos eram enviados para as companhias, mas o projeto em si era unicamente deles.

Sua classe era incrível. Até mesmo um tecido 'invisível' estava sendo fabricado por eles.

Maijima não tinha do que reclamar esse ano.

Foi quando notou a ausência de alguém.

— Onde está Shimizu?

—Ele teve que sair um pouco mais cedo, não estava se sentindo muito bem.

Kenranzaki avisou, a expressão preocupada.

—Hatsume cuidou de dois projetos finais dele, os outros ficaram para amanhã.

—Hatsume? Sabe o que aconteceu.

A outra garota jogou uma última ferramenta no baú e fechou com barulho. O sorriso dela estava sempre presente, mas parecia mais restrito no momento.

—Ele teve uma noite difícil.

—Desculpe, Maijima-Sensei, o senhor ainda não havia retornado e dei permissão para ele ir. Assumo a responsabilidade.

—Tudo bem, Kenranzaki, fez o certo. Me informem qualquer coisa.

Maijima esperava que Nedzu resolvesse a situação de Shimizu o quanto antes.

Ou ele também iria se meter.

...........................................................

Izuku não se achava bom em guardar segredos, mas ele se esforçava quando era uma necessidade. Com o tempo, Takashi havia lhe ensinado a lidar melhor com isso, mas ele sempre estava deixando coisas escapar.

E por isso a situação com All Might era preocupante. Esse era exatamente o tipo de segredo que não podia soltar nunca, que só de saber dele já estava em perigo.

Por vezes ele odiava sua curiosidade.

Juntava à isso tudo o que havia descoberto sobre os Shimura noite passada, estava uma pilha de nervos o dia inteiro. Ele apenas agradecia de não ter se esbarrado com Yagi, com sua sorte teria soltado tudo o que sabia naquele momento.

Izuku odiava a ideia que estava se formando na cabeça sobre seu pai mais que tudo.

Trancou a porta e sentiu Catchan pular da sua cabeça para o chão. Catgum se enroscou em suas pernas e Ragdoll pulou em suas costas da estante. Pelo menos não estava sozinho.

Removeu os sapatos e seguiu até a porta lateral e sentou no sofá, seus olhos indo até o último quadro de evidências na parede. Ao redor da mesa diversos artigos estavam espalhados, sobre quirks e ativação forçada, sobre a genética por trás delas.

O acidente que havia levado os Shimura havia sido causada por um incêndio, então não seria surpreendente que o motivo poderia ser uma quirk ativada tardiamente e sem controle. Quanto mais tarde uma quirk se ativasse, menos controle o usuário tinha e quirks de fogo eram especialmente problemáticas.

"Eu não uso o fogo."

Balançou a cabeça e fechou os olhos.

Se seu pai, aos dez anos, tivesse ativado uma quirk tardiamente faria sentido o acidente ter levado sua casa no meio da noite. Izuku sabia que os exames, mesmo hoje em dia, para averiguar a presença de uma quirk eram falhos. O raio x em si não provava nada naquela época, e só um teste genético poderia dizer com 100% de certeza se a criança poderia ou não desenvolver uma quirk. Quirks invisíveis também são mais comuns do que se imagina.

O problema, o que estava lhe tirando o sono, era justo isso: genética.

Izuku sempre havia se perguntado a razão de não ter uma quirk, mesmo seus pais sendo da quarta geração. 

As quirks são passadas por herança mendeliana. Em algum momento a humanidade desenvolveu esse gene por meio de uma mutação, muitos acreditam que por um vírus espalhado por ratos. Inicialmente, os alelos eram 'Q', para o gene da quirk e 'q' para sem quirk. Como dominante, você poderia desenvolver uma quirk com a combinação de QQ ou Qq, mas uma pessoa só seria quirkless se carregasse a combinação qq, como era o caso de Izuku.

Ao longo do tempo surgiram mais mutações e mesmo novos alelos representando diferentes tipos de quirk. Hoje já existia estudos para comprovar a presença de dominância incompleta, codominância e polialelia, principalmente em novas mutações.  Esses aspectos diferem nos tipos diferentes de quirk: emissores, transformação e mutações.  Porém, para uma pessoa nascer sem quirk, obrigatoriamente tem que haver a combinação qq, isso era um fato que não havia mudado. 

Hoje em dia, 80% da população carregava quirks. Isso acontecia em razão de depois da terceira geração o gene 'q' surgir cada vez menos na população.  Transformações só se manifestavam em quem carregavam os alelos QQ, assim como quirks de emissão a partir da quarta geração, especialmente quirks de emissão elementais, consideradas as mais poderosas. 

Na quarta geração, as quirks de emissão eram a grande maioria. Praticamente todos os indivíduos eram QQ, o que tornava difícil ter uma criança sem quirk, especialmente na situação de seu pai e da sua mãe: dois indivíduos com quirk de emissão. Era praticamente impossível. O seu caso era uma daquelas raridades consideradas absurdas.

Izuku ainda não entendia 100% o que isso significava sobre a quirk da sua mãe, porque um dos alelos teve que vir dela, porém ele tinha uma certeza sobre seu pai: Ele não podia ter desenvolvido uma quirk elemental, mesmo tardiamente, e lhe passado ainda um alelo 'q'.

Tudo apontava que ele havia ganhado uma.

E só havia uma pessoa, que ele tinha conhecimento,  que poderia ter dado uma quirk para ele. O que se explicaria ele ter sumido por anos depois do incêndio até surgir do nada.

Seu pai, provavelmente, conhecia o 'monstro'. O mesmo monstro que havia sido o motivo de ter vivido o inferno que viveu, que causou a morte de Yana, Haru, Tsubasa e todos os outros. Que causou a situação de Takashi.

Izuku abriu os olhos e seguiu o outro quadro. A foto dos outros, dos 37 estava lá. Como um lembrete de como havia falhado com eles. De como foi o único que sobreviveu.

Seu pai, a pessoa que havia mudado sua vida, talvez conhecesse o causador de tudo aquilo.

Passou a mão no rosto e deu uma pequena risada com isso.

Seu pai, que tinha os mesmos olhos que Shigakari tinha. Shigakari, que também vivia com o monstro. Shigakari, de quem não conseguia encontrar nada sobre, mesmo depois de ter pesquisado tanto.

Mas ele havia encontrado sobre Kotarou Shimura. Certidões de óbito dele, da mulher, filha, sogros. Uma casa destruída de forma que ninguém conseguia explicar. Corpos desintegrados. 

Um filho que nunca foi encontrado.

Era coincidência demais. 

E se ele havia descoberto isso, havia chances que o monstro  já soubesse sobre Izuku também. Sobre quem era seu pai. O seu DNA havia sido colhido por Min Han Su, ele havia sido 'amigo' de Shigakari.

Será que ele havia feito a mesma coisa com os dois? Dado uma quirk para eles? A mesma quirk que destruiu a família deles? Ele teria dado a quirk a seu pai antes ou depois do incêndio?

Por que ele estava fazendo isso justo com Shimuras?

Ele teria feito isso com Izuku também, se houvesse tido a chance? O dado uma quirk e o feito causar a morte da sua mãe, para depois o receber de braços abertos?

Seria a diferença entre Izuku e Shigakari apenas a sorte de alguém ter aparecido antes por ele? Se Takashi não tivesse aparecido naquele abrigo, o monstro teria?

As perguntas estavam o corroendo, porque não havia ninguém a quem pudesse perguntar.

E se não bastasse, hoje mais uma peça havia caído no jogo.

Se aquele Monoma fosse quem ele estava pensando, as coisas haviam se complicado um pouco mais. Ele havia prometido que nunca mais iria atrás desse sobrenome, foi a única vez em que Takashi ficou furioso com ele, quando sua curiosidade o colocou em problemas mais uma vez.

Mais um segredo que teria que guardar.

"Desculpe, tio Taka. Acho que não vou poder cumprir minha promessa e deixar para lá dessa vez."

Suspirou e olhou o quadro.

Não havia o que ser feito agora, sobre nada disso.

O telefone vibrou em seu bolso e o puxou.

Hichan: Tudo certo para hoje?

Sorriu, se erguendo do sofá e indo até sua estação. Logo Mei chegaria também, ela sempre se adiantava quando estava ansiosa em terminar algo.

Olhou o uniforme na mesa, acariciando Cathead que dormia em cima dele.

A cor era um violeta quase preto, o visor era de material escuro, com um capacete com pequenas orelhas de cada lado. O modulador de voz era interno, evitaria que alguém pudesse fazer alguma associação. Ele havia preenchido mais o uniforme, dando a aparência de mais idade e altura do que era o real, mas sem o deixar pesado demais. Ideia da Mei.

Se Hichan conseguisse um estágio de nenhuma forma poderiam associar o herói ao vigilante.

Zuko: Sim. Não se atrase para o teste.

Noraneko ia voltar a saltar nessa noite.

E dessa vez não estaria sozinho.

..............................

Notas finais

Edit: Modifiquei a parte sobre a genética depois de um toque que recebi de um dos leitores (Obrigada!), como essa mudança acabou jogando uma pista GRANDE sobre algo que ia escrever adiante, vou colocar ele nas notas iniciais do próximo capítulo.

*Asahi - Morning fire, ou fogo da manhã. Porque a quirk dele é de fogo e ela o encontrou pela manhã na porta.

E nesse capítulo todos amamos Fuyumi. E amaremos mais, porque terá um capítulo bem mais para frente beeem especial sobre os irmão Todoroki. A sequência de nomes já diz tudo do caos e bagaceira que será.

-O inverno está chegando.

-O inverno está aqui.

Sim, Fuyumi (E Natsuo) serão muito importantes no que está por vir. A morte de Mineta vai girar as estruturas da família Todoroki, de certo modo.

Efeito bola de neve! Pun intended!

No próximo: A vingança do departamento de suporte, o segredo de Kaminari, o salto de um novo vigilante (go Hichan!), Naomasa tem uma conversa com um certo gato e o comecinho do festival.

Como o último capítulo do ano, ele será GI GAN TE e bem recheado. Com participação de nossa galinha voadora e foguinho azul, porque amo esses dois.

Até dezembro!

Feliz porque qualifiquei meu mestrado e só vou defender em Fevereiro. Agora é só estudar para minha residência (só), então só esperem a atualização láaaa para o finzinho do ano. Presente de natal procês.

Beijos e não me deixem no vácuo, o comentário de vocês é vida e incentivo :').

De fantasmas já bastam os erros do meu passado :').

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