Chicago, Illinois, tempos atuais.
- Merda, inferno. Agora não me falta acontecer mais nada. - esbravejava Gaélico, assim que finalizou a chamada telefônica.
O jovem fotógrafo de 22 anos, jogou o celular de mau jeito em cima da poltrona gasta do modesto apartamento que ele dividia junto à seu amigo, o também fotógrafo Jacob.
Jacob, um belo negro de quase 1,90 de altura, olhava seu amigo dar várias voltas impaciente pelo apartamento deles.
- Se acalma garoto, ou você vai acabar fazendo um buraco no meio da nossa sala. O que houve nesse telefonema que te deixou tão agitando? Aliás, mais agitado que o normal!
Gaélico não respondeu seu amigo, em vez disso, impaciente, ele pegou um cigarro e acendeu. Jacob suspirou. Era assim com Gaélico. O jovem irlandês era lindo, porém era a criatura mais explosiva que Jacob teve a chance de conhecer. Sua aparencia angelical podia enganar muitas pessoas. Mas Jacob conhecia o amigo. E apesar dele ser explosivo, era a melhor pessoa que Jacob tinha conhecido em sua vida. E Jacob entendia Gaélico. O garoto tinha seus motivos pra ser assim. Explosivo e atrevido.
Ao invés de entender o que houve, Jacob estudou seu amigo. Um belo loiro de 22 anos, aparecia angelical. Jacob o via fumar, de uma maneira que era única e exclusiva de Gaélico. Ele tinha uma maneira de segurar o cigarro que encantava a todos. Porém Jacob sacudiu a cabeça e falou pra si mesmo que deveria manter o foco. Gaélico era seu irmão caçula. Mesmo que não de sangue. Mais sim do coração.
Ambos se conheceram na faculdade, os dois fazia fotografia, enquanto Jacob se especializou para se um grande fotógrafo de celebridades e revistas de famosos. Gaélico fez suas especializações para fotografia de paisagens e trilhas. Embora os dois tivessem a mesma profissão, eles viviam em mundos diferentes.
Jacob vivia todo o glamour da sociedade e do mundo das celebridades, já Gaélico passava boa parte do ano vivendo nas trilhas, na companhia da sua mochila, uma barraca e sua inseparável câmera fotográfica. A distância não diminuía a amizade dos dois, nem o carinho que um sentia pelo outro. Afinal os dois eram melhores amigos. Dois amigos, irmãos. Parceiros no crime.
A amizade era baseada no amor e na sinceridade, desde o início foi assim, os dois são gays assumidos. E apesar da beleza que ambos tinham, nunca houve atração entre eles, era um sentimento de irmandade mesmo. Tanto que prometeram que morariam juntos até que algum deles encontrasse seu companheiro.
Jacob estava feliz em ter seu irmão caçula no apartamento. Fazia exato um mês que Gaélico tinha chegado da sua última viagem de trabalho. E o garoto já andava ansioso para embarcar na próxima. Ele não parava de falar na trilha de Aconcágua. Assim era Gaélico. Um jovem que gostava de aventuras e de sua liberdade.
- Cancelaram a minha viagem pro Aconcágua, você acreditar nisso? - disse Gaélico assim que terminou seu cigarro. O garoto estava parado no meio da sala, com a mão puxado o cabelo. Sua hiperatividade estava a mil.
- Porquê? - quis saber Jacob. - Você é o melhor fotógrafo de trilhas que eu conheço.
- Culpa do outono, teve um rompimento na trilha. Parece que vão levar a estação inteira pra concertarem. Merda! - praguejou Gaélico.
Jacob sabia que o amigo estava praguejado não pelo dinheiro que perderia durante esse tempo parado, e sim pela aventura. Gaélico não parava de falar dessa viagem, Jacob sabia decor. todas características dessa trilha. Parque Provincial Aconcágua, Argentina.
O parque ficava a 180 Km da cidade de Mendoza na Argentina. Lá havia várias opções de trekkings e o mais famoso o 'Teto das Américas' também conhecido como 'monte Aconcágua', que é o ponto mais alto da Cordilheira dos Andes, com mais de 6.962 metros de altitude. E Gaélico estava pronto pra passar os próximos três meses ali.
- Olha pelo lado positivo, você pelo menos passará o outono em Chicago, conhece outono mais lindo do que esse? Encare isso como umas férias. Vai Gaélico! Não fique assim. E só o outono, e você quase não para em casa. - disse Jacob dando de ombros.
Era verdade. A cidade de Chicago ficava fabulosa no outono. Se bem que Chicago era cheia de atrações em todas as épocas do ano, especialmente no Outono, a cidade ganhava um charme dourado todo especial que ia além dos coloridos das árvores.
Outono em Chicago era uma das atrações mais linda do mundo, sem dizer que vale à pena assistir os colorido das folhas pela cidade, aliás este é um programa famoso e queridinho entre os ricos e famosos, que lotavam a cidade nessa estação. Para ver as folhagens multicoloridas ou as árvores já sem folhas. Era uma visão de tirar o fôlego.
Porém Gaélico não se animou com aquilo, o garoto fez uma careta e acendeu outro cigarro. Jacob balançou a cabeça em desagrado. Seu amigo era um caso perdido.
- Já falei que esse cigarro ainda vai te matar? - disse Jacob contrariado.
- E eu já te falei que vamos morrer de um jeito ou de outro? - ele sempre tinha a mesma resposta na ponta da língua.
- Desisto! - disse Jacob erguendo as mãos para o alto.
Como afrontamento, Gaélico soltou sua fumaça lentamente. Jacob esperou pacientemente que Gaélico terminasse seu cigarro. Assim que o amigo terminou de destruir seu pulmão aos pouco. Jacob falou:
- Então? Mais tranquilo? Você sabe que o apartamento é nosso, seu quarto está intocável. Chicago está linda. Aproveita e encare isso como uma mine férias.
- Odeio esse seu otimismo, mas fazer o que? Não tem jeito. Vou ter que ficar esses meses aqui parado. - Gaélico suspirou.
- Você pode aproveitar e fazer um tour pela cidade, pegue a sua câmera e fotografe a beleza do outono. Você tem infinidades de opções. - disse Jacob sentado do lado de seu amigo.
- Você sabe que odeio esse tipo de fotografia. Sempre que vou a uma praça encontro algum rico metido. - Gaélico revirou os olhos.
O irlandês não vivia no mundo somente por opção, ele tinha uma certa implicância com pessoas ricas. Na verdade Gaélico tinha sua própria opinião formada sobre eles. E a culpa disso tinha sido um acontecimento de sua infância ainda na Irlanda.
Ele veio de uma família humilde e de classe trabalhadora. Eles viviam em uma casa alugada, na qual a renda do casal, pais de Gaélico, mal dava para cumprir com o aluguel mensal e a comida para os dois filhos gêmeos pequenos.
O pai de Gaélico, trabalhava em uma loja de automóvel, já a mãe, sem emprego fazia pequenos bicos em casa mesmo. Era uma vida simples e de dificuldades, mas o casal nunca passou fome, nem os filhos. As coisas mudaram de rumo, quando Seu Kennedy, pai de Gaélico perdeu o emprego. Desempregado, a família teve que parar no olho da rua, se não bastasse o sofrimento, o irmão gêmeo de Gaélico foi diagnosticado com leucemia. O caso do garoto a princípio não era tão grave. Mais sem dinheiro, nenhum médico quis fazer o tratamento gratuitamente, tratamento esse que se fosse feito a tempo, com certeza teria salvado a vida de Ronan.
Na infância, Gaélico teve que ver seu irmão morrer de maneira horrível, afogado no próprio sangue. Seu pai não aguentou a barra e comenteu suicídio, na ruína sua mãe morreu com problemas renais. Problemas esses que seriam resolvidos se a família de Gaélico tivesse um pouco de dinheiro. Sozinho no mundo, e sem dinheiro sequer pra enterrar sua família. Gaélico saiu da Irlanda na primeira oportunidade. Mas graça a sua infância, ele odiava os ricos, odiava dinheiro. Seu patrimônio se resumia à uma mochila, sua barraca e sua câmera fotográfica.
E claro que sua vida mudou depois que conheceu Jacob. Seu amigo era sua única família. E não importava em que lugar do mundo que Gaélico estivesse, ele sabia que sempre teria Jacob.
O garoto não suportaria mais perder ninguém em na sua vida, a dor de perder seus pais e seu irmão gêmeo, era a mesma que uma adaga afiada em seu coração. A vida o fez fica forte. E acima de tudo, o fez lutar por seus ideais. Gaélico não baixava a cabeça pra ninguém. Ele já teve que baixar muito na infância, quando era obrigado a pedir comida às pessoas, e mesmo nos dias de hoje, o jovem se lembrava de como era enxotado como um cachorro pulguento pelas pessoas que o olhavam com nojo. Ele se lembrava claramente das vezes em que catava comida nas lixeiras. Não! O Gaélico de hoje não baixava a cabeça pra ninguém.
- É, pelo visto terei que passar esse outono aqui. - finamente Gaélico se rendeu.
Bom, pelo menos seria só essa estação, o que dê mal poderia acontecer?
Uma semana depois, Gaélico estava com um cigarro na mão e com a outra mão estava com o celular ocupado falando com alguém. Assim que encerrou a ligação, foi de encontro a Jacob que estava um tanto curioso com a conversa do amigo.
- Ryan de novo? - quis saber Jacob.
- Sim, o cara é insistente. - falou Gaélico pegando uma torrada e passando manteiga de amendoim na mesma.
Jacob fez uma careta, seu amigo amava aquela iguaria.
- Culpa sua que deu o número do telefone para o rapaz, que eu saiba você quis ensinar uma lição ao pobre homem, e agora ele está aí. Correndo atrás de você.
- A culpa é dele, quem mandou aquele idiota fazer uma aposta com os amigos. O jogo virou, ele apostou que ficaria comigo. E como vingança, eu o fiz acreditar que ficaria com ele, me fiz de bom moço e no final ele se apaixonou por mim. Simples assim. - falou Gaélico com a boca cheia de torrada.
- Você não presta! Quem ouve você falando assim, pensa que está na companhia de um depravado. Mas eu sei que estou na companhia de um virgem. Como você se manteve puro até hoje? Eu realmente não faço a mínima ideia. - disse Jacob se servido de café.
Gaélico olhou pra ele e deu de ombros, sim, ele era virgem. Não que fosse santo, ele já teve namorados. Mas na opinião dele. Nenhum o conquistou o suficiente para uma relação íntima.
- Tenho 22 anos. Não é tão ridículo assim ser virgem.
- Eu sei que não, e admiro isso em você. - disse Jacob piscando o olho pra amigo. - A propósito, você poderia dar o número do seu celular pra seus "amigos ". Assim eles não me ligariam na hora em que estou trabalhado.
Gaélico sempre dava o número do celular de Jacob a todos.
- E você acha que eu tenho celular? - respondeu Gaélico.
- Pois devia, estamos em 2019, quem não tem celular nos dias de hoje?
- Eu!
- Pois deveria comprar um, aproveite esse tempo e ande pelas lojas. Vá fazer umas compras.
- Você achar que eu sou quem? A rainha da Inglaterra?
Jacob sorriu e balançou a cabeça.
- Gaélico, hoje em dia, qualquer pessoa pode ter um celular.
- Você falou bem, qualquer pessoa, eu não sou qualquer um. - Gaélico levantou o queixo.
- Oh menino teimoso. - resmungou Jacob.
Naquela mesma noite, os amigos estavam na mesa jantando. Jacob estava muito quieto, e Gaélico estranhava o comportamento do amigo. Naquela tarde, Gaélico ouviu o conselho de Jacob, e saiu por Chicago com sua câmera a fim de captura alguma imagem interessante. Para o espanto e surpresa do garoto, ele registrou várias imagens belas. Jacob estava certo, Chicago era fabulosa.
Agora ele estava ali, doido pra compartilhar sua experiência com amigo, e suas fotos. E falar para ele que já não estava mais odiado a ideia de passar o outono ali. Porém isso ficou em segundo plano. Seu amigo estava muito estranho.
Jacob não havia sequer tocado na comida, ele brincava com ela no prato. Impaciente, Gaélico largou sua comida e falou com o amigo:
- Tá bom! Comece a falar. - disse Gaélico.
- Não é nada...
- Jacob! Por favor, sou eu!
Jacob suspirou. Ele conhecia Gaélico o suficiente pra saber que o amigo não o deixaria em paz.
- Aquele cara, que estou a tempo de rolo.
- O Liam?
- Esse mesmo. Então, ele me convidou pra passar dez dias com ele em Malibu.
Gaélico ficou de boca aberta.
- E porque o impasse? - Gaélico disse assim que encontrou voz. - Você mesmo me disse que estava apaixonado por esse cara!
- E estou mesmo, o lance é que não sei até aonde essa história vai. E sem falar que fui escalado para o evento de fotografia na noite de gala de Chicago. É a festa mais importante da temporada, ela celebra o outono, vai estar cheio de ricos e famosos. E você já sabe né?
- Sei, aonde tem esses nojentinhos, você está para captura-los e suas falsas vidas de merda. - debochou Gaélico.
- Isso! Embora eu queira, não vou pode ir. - mal Jacob terminou de falar, e uma luz se acendeu em sua cabeça. - A não ser, é claro, que meu amigo fotógrafo vá cobrir o evento em meu lugar? - disse um animado Jacob.
Gaélico negou com a cabeça se levantado da mesa.
- Não, não e não. Você sabe que odeio esse tipo de evento, sem falar naqueles esnobes. Eu te amo Jacob, mas não me peça pra fazer algo assim!
Jacob já estava atrás de Gaélico.
- Por favor, por favor! Você sabe como esse cara é importante pra mim. É minha chance de saber se vale a pena investir em um namoro. Vai?
Gaélico não conseguiu resistir ao olhar de pidão de seu amigo, derrotado, ele suspirou e apontou o dedo para Jacob.
- Acho bom esse lance ser sério, ah, se algum rico daqueles me encher o saco, seu emprego vai estar em risco.
Jacob não escutou Gaélico, o homem estava eufórico e agradecido. Beijou abraçou e apertou o rosto do amigo.
- Você vai amar a noite de Chicago.
- E quando será esse evento?
- Amanhã!
Gaélico sorriu e deu de ombros, pelo menos ele teria um programa para a noite. O que de errado poderia acontecer? Seria apenas mais uma noite fria de outono.