Sangue Real [✓]

By TalitaPC

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Alicia Dolohov viveu a vida toda em Cérnia, um dos dez reinos de Régnes. Sua vida era comum, como a de qualqu... More

Epigrafe
Prólogo
DreamCast - Parte Um
DreamCast - Parte Dois
DreamCast - Parte três
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Papo sério
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Uma espiadinha nas redes...
Capítulo 30

Capítulo 5

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By TalitaPC


Acordei com batidas na porta do quarto. Olhei no relógio do celular e franzi a testa ao ver que ainda era cedo. Abri a porta com o cabelo bagunçado e cara de sono, encontrando Michely sorridente, desejando 'Bom dia' e avisando que o café da manhã já estava sendo servido. Ela abriu as cortinas, deixando que a luz natural iluminasse o ambiente e aproveitei para ir tomar banho.

Quando voltei ao quarto a cama estava devidamente arrumada, então segui ao roupeiro. Escolhi uma calça jeans e blusa de manga curta, branca, depois calcei o all star.

Me despedi de Michely avisando que conseguia ir até o refeitório sozinha. Ela obviamente tentou contestar, mas falei todo o trajeto que faria e no final dei um sorriso presunçoso ao constatar que havia ganhado no argumento.

— Até que enfim! — Vaiola brincou quando sentei para tomar o café da manhã.

— Não estou atrasada. — me defendi.

— Eu sei. — deu de ombros.

Neguei com a cabeça enquanto dava uma generosa colherada na salada de fruta que peguei. Percebi que Luiza falava sobre um tour e entendi que seria feito na Escola, já que conhecemos o internato no dia anterior.

— Que emocionante! — Piter ironizou, nos fazendo dar risada.

Desde que o conheci no dia anterior percebi seu humor ácido. Estava sempre fazendo alguma piada, ou sendo sarcástico.

Tomamos café enquanto conversávamos, até magicamente o refeitório ficar em completo silêncio. Olhei na direção da porta e percebi que Kamily acabava de entrar.

— Bom dia! — nos cumprimentou — Acredito que já devem ter sido informados sobre o tour de hoje. — comentou e os alunos assentiram — Espero que seja proveitoso, já que vão passar algum tempo na Escola e será interessante que conheçam o lugar.

Kamily pediu para que devagar nós nos levantássemos e a seguíssemos até o hall.

— Bom, vamos começar do princípio... — pigarreou baixo — Aqui é o hall, que têm o quadro de avisos na parede à direita e é onde podem obter informações importantes quando não acessaram o site da Escola. — indicou o mural cheio de papéis — Já à esquerda temos o corredor que leva a sala da diretoria, orientação e a dos professores. — apontou com a cabeça para o outro lado — Vocês podem ir conversar com Analise ou Joana quando acharem necessário, ou com algum professor quando precisarem. — sorriu gentilmente e virou, andando em direção ao corredor da direita, nós prontamente a seguimos — Este corredor vocês conhecem, pois no lado direito ficam os auditórios A e B, no lado esquerdo C e D, e mais à frente, no final, o anfiteatro. — indicou as portas conforme passávamos — Aqui são feitas as aulas complementares de teatro.

Senti alguém ao meu lado e sorri para Vaiola, que engatou nossos braços parecendo uma criança com medo de se perder no shopping. Revirei os olhos, afinal, Vaiola conhecia a Escola toda por causa da irmã.

Voltamos ao hall e quando percebi estávamos novamente em frente ao quadro de Vicente, desta vez indo em direção ao outro corredor. Sabia que ali ficava a biblioteca, pois estive no dia anterior.

— Essa é a sala de informática e vocês podem utilizá-la em qualquer momento, obviamente dentro do horário de funcionamento da Escola. — explicou apontando para a primeira porta — Aqui temos outra sala de informática, mas esta é destinada apenas às aulas complementares de ciências computacionais e tecnologia de informação. — indicou a porta da frente — E por fim, a biblioteca, que a maioria de vocês conhece por causa do jogo de iniciação... — comentou e nós assentimos — Vocês também podem utilizá-la quando quiserem, respeitando o horário como já citei anteriormente.

Kamily pediu que retornássemos ao hall e então subimos por uma das escadas laterais, indo ao segundo andar.

— Aqui ficam as salas das aulas obrigatórias. — Kamily parou no espaço que unia os dois lados do andar e nos encarou — O currículo da Escola conta com quatro matérias obrigatórias do primeiro período, sendo elas: Línguas I; Introdução histórica; Perspectivas globais; e Cálculos I e II, essa matéria é dividida em duas fases durante esse primeiro período.

Kamily explicou que os corredores iniciais tanto da direita quanto da esquerda eram ocupados apenas por armários e cada um de nós receberia o seu. Estávamos agora no corredor da direita e no final havia uma curva, que levava a mais um corredor, que surpreendentemente levava a outro. Quando percebi estávamos novamente perto das escadas, mas saindo pelo lado esquerdo e honestamente não entendi como isso aconteceu. Com certeza me perderia por ali e precisaria de ajuda nos primeiros dias.

— Bom, agora vamos ao local em que ficam as salas das aulas complementares. — Kamily avisou e começou a descer a escada.

Nós voltamos ao hall e saímos da Escola, dando a volta pela lateral. Já tinha percebido que havia uma construção grande que parecia ser extensão da Escola e foi exatamente para lá que Kamily nos levou.

— É neste anexo que ficam algumas matérias complementares... — comentou enquanto subíamos os degraus da frente e entrávamos em um hall de tamanho médio — Aqui no andar térreo temos a sala de: Música; Culinária; e Dança. — apontou para as três portas — Já no segundo andar temos a de: Fotografia; Design de moda; e Etiqueta/Protocolo; — Kamily fez uma pequena pausa e sorriu — Vamos conhecer as salas?

Todos concordaram e então nós seguimos até a sala de música. Como esperado era grande e toda revestida com isoladores de som. No final dela havia vários instrumentos como, violão convencional e violoncelo, violino, flauta, saxofone, entre outros. Além de maiores como, bateria, teclado e um lindo piano de cauda branco.

Andei até perto do piano e passei a ponta dos dedos com cuidado enquanto Kamily explicava um pouco mais sobre como funcionavam as aulas.

— Você toca? — ouvi alguém.

Virei o rosto e encontrei Frederick parado a alguns passos, com as mãos no bolso da calça jeans e um discreto sorriso.

— Sim, — concordei — Mas não sou expert.

Fred assentiu enquanto andava até perto do piano e ocasionalmente de mim.

— E você... Toca? — questionei.

— Sim, — afirmou e deu de ombros — Mas não sou expert. — piscou com um olho só.

Sorri e neguei com a cabeça. Frederick sabia fazer joguinhos e me questionei se as garotas caiam mesmo na conversa dele.

— Vamos pessoal! — alguém chamou e percebi que restava apenas nós dois na sala.

Rapidamente segui em direção à porta, sorrindo timidamente para Kamily como pedido de desculpas. Vi Vaiola e Luiza conversando no corredor e andei até elas.

— Ok, vamos pedir uma segunda opinião. — Luiza sorriu assim que me viu.

— O que? — franzi a testa.

— O que você acha de Frederick e eu? Juntos! — perguntou me encarando atentamente.

— Você e Frederick? — repeti olhando dela para Vaiola, que deu de ombros como quem diz: Não sei de nada!

Mordi o lábio não sabendo muito bem o que dizer. Tinha percebido que os dois pareciam íntimos no jeito de interagir e não seria surpresa se já tivessem tido algum tipo de envolvimento, afinal vinham do mesmo reino.

— Hm... — murmurei pensativa — Acho legal. Acho que seria legal!

Isso! — sorriu abertamente.

Podia ser coisa da minha cabeça, mas notei algo estranho na atitude de Luiza. Era como se quisesse deixar claro seu interesse em Fred, principalmente para mim. Isso também explicava os olhares atentos em nossa direção ontem durante o jogo.

Antes que continuássemos o assunto a Kamily nos chamou e juntas voltamos a segui-la, indo até o salão destinado a aula de dança.

Confesso que tudo que envolvia artes chamava minha atenção, na verdade, qualquer coisa em que conseguisse me expressar de alguma forma. Com certeza minha mãe tinha participação nisso, pois desde pequena via seus vídeos caseiros cantando e ficava na sala de casa imitando-a. Acho que isso fazia com que de alguma forma me sentisse mais próxima dela.

Todas as salas que conhecemos estavam devidamente equipadas com tudo que precisaríamos. Então a de dança era toda espelhada, com algumas barras de apoio. A de culinária era uma cozinha gigante que parecia sair de um restaurante profissional.

No segundo andar passamos pelas duas salas de fotografia, a escura onde eram feitas as revelações e a que é uma espécie de estúdio. A de design de moda tinha três mesas compridas e no fundo um armário que ocupava a parede toda, com tecidos, linhas, acessórios, e outras coisas que podiam ser usadas para criações, além de várias máquinas de costura portátil. Por fim, a de etiqueta/protocolo com mesas e cadeiras postas como se fosse ser servida alguma refeição naquele momento.

— Esse lugar é incrível. — Ximena sussurrou e assenti.

Tinha consciência de que as oportunidades de aprendizagem aqui na Escola Real seriam grandes e pretendia explorá-las o máximo possível.

Agora estávamos na escadaria em frente ao anexo. Kamily indicou uma construção de vidro mais longe, explicando que ali era a área das piscinas, onde aconteciam as aulas de natação. Ao lado, há alguns metros, havia outra construção, mas toda fechada, parecendo um ginásio, onde eram realizadas as de defesa pessoal. Por fim, vários metros à frente, tinha um picadeiro coberto, usado para as aulas de equitação e ao lado o estábulo onde ficavam acomodados os animais.

Kamily disse que já era quase hora do almoço e por isso não nos levaria para conhecer aqueles lugares pessoalmente, mas que podíamos fazer isso em outro momento se quiséssemos.

— Antes de finalizarmos e poder liberá-los para irem ao refeitório, gostaria de lembrar que hoje é o último dia para que montem seus cronogramas. — Kamily sorriu gentilmente — Não sei se todos sabem, mas as matérias obrigatórias têm quatro créditos cada, formando dezesseis dos vinte e seis que precisam para este período. — fez uma pausa e nos olhou atentamente — Isso quer dizer que precisam escolher cinco matérias complementares de sua preferência e encaixá-las nos horários destinados para tais.

Kamily falou um pouco mais sobre como montarmos o cronograma no site da Escola e depois nos dispensou, combinando de nos encontrar na manhã seguinte, no hall da Escola, para que nos indicasse os armários e auxiliasse a encontrar as salas caso precisássemos.

Nós seguimos todos ao refeitório. Ximena e Luiza falavam animadas sobre as matérias complementares que mais lhes interessavam. Já Piter, eu e Vaiola andávamos logo atrás e fazíamos comentários quando concordávamos ou não com algo.

Arregalei levemente os olhos quando entramos no refeitório e o encontramos já praticamente cheio. Percebi que havia o dobro de pessoas que nos outros dias e deduzi que eram os alunos veteranos que chegaram para o início das aulas.

Engoli meio em seco ao notar vários olhares avaliativos e me senti um pouco desconfortável. Ao contrário de Piter e Vaiola que pareciam se deliciar com os minutos de atenção que recebiam. Os dois caminhavam em direção ao buffet como se estivessem em uma passarela e revirei os olhos, contendo a vontade de dar risada.

Nós nos servimos e sentamos na mesma mesa de hoje de manhã. Olhei para meus novos amigos e fiquei feliz por estar me enturmando mais rápido do que pensei. Porém, uma coisa ainda me incomoda: Como minha inscrição foi feita para a Escola Real e por quem?

Tinha conversado sobre isso ontem à noite com Ryan e Sansa e os dois concordaram de que devia ir atrás da resposta, se achava que isso era o certo. Por isso decidi que conversaria com a diretora e explicaria a situação.

A questão é que agora, depois de já ter vivenciado algumas experiências na Escola e saber as oportunidades que teria, me deixava desanimada pensar na possibilidade de perder a bolsa e ir embora ao descobrirem que não me inscrevi. Isso porque já criei expectativas, ainda mais depois do tour que fizemos.

Depois de comermos o pessoal decidiu ir à sala de convivência, mas como tinha outros planos avisei que os encontraria mais tarde.

Me despedi deles e segui em direção ao hall, indo ao corredor que Kamily havia mostrado no tour, onde ficava a sala da diretora. Foi fácil identificá-la já que havia uma placa dourada na porta, com seu nome. Então sem pensar muito, ou desistiria, respirei fundo e bati na madeira escura.

Alguns minutos depois a porta abriu e Analise sorriu levemente ao me encontrar parada ali ao lado de fora.

— Olá. — cumprimentou — Posso ajudá-la?

— Gostaria de conversar um pouco... — torci as mãos em frente ao corpo.

— Claro, entre! — deu espaço para que passasse.

Sempre seria estranho estar na sala da diretora, mesmo que fosse por vontade própria.

Ouvi a porta fechar e Analise indicou que sentasse na cadeira a frente de sua mesa enquanto se acomodava na detrás.

— Então... — incentivou, me olhando atentamente.

— Nem sei muito como começar, mas vamos lá... — respirei fundo — Recebi uma carta de admissão da Escola e como pode ver... Estou aqui! — dei uma risada nervosa — Mas não me inscrevi para receber a bolsa e sinceramente não sei como isso aconteceu. — neguei com a cabeça.

— Ok. Vamos por partes, — Analise sorriu calmamente — Qual o seu nome?

— Alicia Dolohov. — mordi o lábio inferior.

— Só um minuto. — pediu e levantou, indo até um armário de duas portas que ficava no canto da sala.

Analise procurou por algo, até encontrar e voltar à mesa com uma pasta nas mãos. Ela abriu e a primeira coisa que vi foi minha foto, a mesma da identidade e com certeza não era o meu melhor ângulo.

— Então Alicia, — Analise comentou enquanto folheava a pasta — Aqui nós temos sua inscrição devidamente preenchida... — ofereceu a folha para que a pegasse — Também temos seu currículo desde os anos iniciais da escola, — colocou duas folhas a minha frente na mesa — Além de um memorial descritivo e bem elaborado, devo acrescentar. — concluiu mostrando as várias folhas.

Franzi a testa enquanto encarava a inscrição agora em minhas mãos. Todas as informações eram verdadeiras e como foi feita pela internet não havia nenhuma letra para poder identificar o remetente.

— Isso é... — franzi a testa.

— Alicia, — Analise chamou — A menos que desista da bolsa, ela é sua. — afirmou olhando-me com seriedade — A inscrição foi feita corretamente e seu currículo foi avaliado, as médias sempre foram boas e recebemos ótimas recomendações de antigos professores. — sorriu levemente.

— Vocês conversaram com meus professores? — questionei surpresa.

— A equipe que seleciona os novos alunos é bem competente e faz uma conferência minuciosa das informações que recebemos. — deu de ombros.

— Entendi. — murmurei.

— Não está satisfeita com a Escola? — inclinou levemente a cabeça enquanto me olhava atentamente.

— Ah, não, — neguei rapidamente — Estou muito satisfeita. — afirmei assentindo — Só não queria estar aqui de alguma forma... Injusta ou errada?! — fiz uma careta tentando achar a palavra certa.

— Fique tranquila Alicia, está tudo devidamente correto. — sorriu, passando confiança — Então, vai desistir da bolsa? — arqueou uma sobrancelha.

Encarei novamente as várias folhas sobre a mesa e minha foto presa com o clips.

Já me sentia mais calma por ter esclarecido a situação, mesmo que ainda fosse um mistério quem fez a inscrição. Segundo Analise tudo estava correto, então poderia ficar com a bolsa de estudos, se quisesse.

— Quero ficar na Escola Real. — afirmei.

— Ótimo. — comemorou — Então espero que aproveite ao máximo sua estadia aqui. — recolheu os papéis e lhe entreguei a ficha, que foi devidamente guardada dentro da pasta — Posso lhe ajudar com mais alguma coisa?

— Não, era só isso. — neguei com a cabeça — Achei melhor esclarecer a situação o mais cedo possível.

— Você está certa e aprecio a sinceridade quanto a tudo isso. — sorriu — Só mostra que acertamos ao aceitá-la na Escola.

Assenti e levantei da cadeira, indo até a porta. A abri e antes de sair acenei rapidamente, despedindo-me de Analise.

Quando estava no corredor soltei a respiração que nem havia notado ter prendido. Sentia o coração um pouco acelerado e atribuí a adrenalina recente, afinal fui de uma possível expulsão a decisão de permanência definitiva na Escola.

Não foi nada impensado, na verdade, vinha elaborando essa ideia desde Cérnia, quando recebi a carta de admissão. Como Leila mesmo disse: É uma grande oportunidade.

Estava distraída. A mente cheia com as novas possibilidades que surgiam agora que tinha certeza da permanência na Escola.

— AH! — exclamei quando esbarrei em alguém no hall.

— Me desculpe. — ouvi a voz grave e percebi que se tratava de um homem.

— Tudo bem, — o tranquilizei — Eu estava distraída e não vi por onde ia. — dei de ombros.

— Está tudo bem mesmo? — me olhou com mais atenção e por algum motivo desconhecido senti o rosto esquentar — Desculpe, estou sendo intrometido...

Reparei melhor no homem desconhecido e em sua roupa, mais especificamente no conjunto social cinza escuro que, aliás, lhe caía muito bem. Os olhos eram de um castanho que poderiam ser considerados comuns, mas havia algo neles que chamava a atenção e prendiam. O cabelo curto estava bem penteado e contrastava com a barba rala, quase imperceptível.

— Digamos que as coisas estão se ajeitando. — dei de ombros.

— Que bom. — sorriu — A propósito... Sou Nicholas. — estendeu a mão.

— Alicia! — a aceitei, apertando.

Seu sorriso aumentou enquanto levava minha mão aos lábios e beijava o dorso. Foi um pouco estranho já que hoje em dia as pessoas não fazem mais esse tipo de coisa.

— Até mais Alicia. — se despediu e seguiu pelo corredor em que ficava a diretoria.

Respirei fundo e voltei a andar em direção à sala de convivência, indo encontrar meus amigos.

Assim que entrei no lugar ouvi a risada de Piter e os encontrei em um dos sofás perto da tv. Vaiola sorriu quando me viu e bateu no estofado ao seu lado, que estava vago.

— Do que estão falando? — perguntei enquanto me acomodava.

— Os veteranos prepararam uma recepção. — Vaiola explicou e percebi que havia alguns deles sentados nos sofás e puffs perto — Uma fogueira.

— Que legal! — sorri animada.

Adorava fogueiras. Já tinha ido a algumas em Cérnia, principalmente durante o ensino médio.

Todos demonstraram empolgação com a ideia. Ao que parece era uma tradição de começo de períodos, uma forma de integrar todos os alunos. Percebi que os veteranos pareciam legais e a conversa fluía tranquilamente, esperava que fosse assim com todos. Em certo momento alguém comentou sobre o cronograma de aulas e eles se prontificaram a irem até a informática para ajudar-nos a montá-lo.

Como esperado, a sala era grande. Havia uma quantidade significativa de computadores, organizados em seis fileiras. Escolhi um monitor e sentei na confortável cadeira estofada, com Vaiola ao lado. Uma garota loira chamada Judy puxou outra e sentou entre nós duas, ajudando a mexer no site.

Obviamente a águia símbolo estava estampada no topo junto com o nome da Escola Real de Régnes. Primeiro criei uma conta no site e depois de confirmar os dados, anotei as informações de acesso, ou acabaria esquecendo. Quando enfim consegui entrar na página principal, apareceu um lembrete com algumas referências básicas de como montar o cronograma, basicamente selecionando e arrastando as matérias para os horários de minha preferência. Depois de clicar em 'OK' uma nova página abriu, mostrando a tabela com as matérias obrigatórias e os horários. Durante a manhã teríamos duas matérias, depois éramos liberados para o almoço e à tarde nós fazíamos a aula complementar escolhida.

Suspirei baixo e montei o cronograma junto com Vaiola e Piter, que estava na fileira de monitores atrás da nossa. Conseguimos colocar aulas juntos, não todas, pois havia limite máximo de alunos por sala e algumas já estavam cheias. Depois foi a vez de escolhermos as matérias complementares e confesso que foi a parte mais difícil, pois várias me interessavam e só podia escolher cinco. Acabei optando por música, dança, defesa pessoal, equitação e natação, encaixando-as nos dias da semana.

Conferi tudo duas vezes antes de clicar 'Concluir' e o cronograma salvar no meu perfil de usuário. Também aproveitei e mandei uma cópia ao meu celular para ter acesso com mais facilidade.

Quando terminamos já era perto do horário da fogueira, então combinamos de nos arrumarmos e nos encontrarmos no hall do internato para irmos todos juntos.

— Olá Michely! — cumprimentei entrando no quarto.

Vi seu rosto meio assustado e dei uma risada baixa, fazendo um sinal com a mão para que se acalmasse. Fechei a porta e tirei o casaco enquanto andava em direção ao banheiro.

— Precisa de ajuda? — Michely perguntou com a voz mais alta.

— Vou tomar banho. — avisei já dentro do banheiro — Tem uma fogueira agora à noite. — entrei no box e liguei o chuveiro.

Nossa conversa foi interrompida pelo barulho da água. Tinha prendido os cabelos, então foi um banho rápido.

Assim que terminei me sequei e vesti o roupão, voltando ao quarto. Michely estava parada perto da cama e neguei com a cabeça enquanto abria a porta do roupeiro.

— Você realmente não precisa ficar o tempo todo aqui no quarto. — comentei pegando uma calça jeans preta e a colocando — Me sinto estranha pensando que estou a monopolizando... — peguei a blusa de alças com estampa florida, vestindo-a.

Virei de frente para Michely, que encarava a peça de roupa que tinha nas mãos, com o rosto um pouco vermelho.

— Não está monopolizando. — negou com a cabeça — Estou fazendo meu trabalho. — justificou.

Coloquei as mãos na cintura e a encarei, até que também me olhasse.

— Mesmo? — inclinei levemente a cabeça.

— Mesmo! — sorriu.

Suspirei alto e assenti. Michely parecia ser uma garota legal e esperava que nós conseguíssemos desenvolver alguma amizade, já que passaríamos juntas esse período de permanência na Escola.

— Combinei de encontrar com alguns colegas para irmos juntos a fogueira. — fiz aspas no meio da frase — Estou avisando porque sei que vai querer me levar até o local, mas não tem necessidade, — calcei o all star — Vou estar devidamente acompanhada, então pode ficar tranquila... Também significa que está liberada para... — fiz uma pausa e mordi o lábio inferior — Fazer qualquer coisa que queira.

Michely deu risada com o final nada elaborado do discurso e apenas ignorei, sentando em frente à penteadeira, começando uma maquiagem básica.

— Bom, já que não precisa da minha companhia, vou aproveitar o momento para buscar seus uniformes. — Michely comentou parando perto da penteadeira.

— Ah, hm... — murmurei — Precisa de ajuda com isso? — franzi a testa.

— Não, apenas vou buscar os modelos que devem estar prontos. — negou com a cabeça — Usei algumas roupas suas como referência no tamanho, espero que não se importe. — deu de ombros — Você parecia ocupada, então quis adiantar já que amanhã é o primeiro dia de aula. — justificou.

— Não, na verdade, agradeço. — suspirei baixo — Não tinha lembrado do uniforme, isso me fugiu completamente. — fiz uma careta.

— Por isso estou aqui. — Michely sorriu.

Dei uma risada e assenti. Estava começando a entender porque existiam as damas e ajudantes. São muitos detalhes iniciais que às vezes podem passar despercebidos como, por exemplo, a questão do uniforme, que em nenhum momento passou pela minha cabeça desde que cheguei à Escola.

— Então, já que vai descer, vou aproveitar e ir junto. — comentei e levantei da penteadeira.

Soltei o cabelo e passei a escova rapidamente, desembaraçando-o. Peguei o celular e conferi as horas, estava adiantada, mas melhor assim do que atrasada.

Agradeci quando passei por Michely e juntas nós seguimos pelo corredor.

— Você fica o dia todo aqui? — questionei olhando-a de canto — Isso não é tipo um daqueles trabalhos abusivos, não é?

Ouvi a risada baixa de Michely e revirei os olhos, cutucando-a com o cotovelo.

— Desculpe, mas é que o jeito com que você falou foi engraçado. — justificou e pigarreou, limpando a garganta — Não, não é um trabalho abusivo. — negou com a cabeça — Os horários foram devidamente combinados de acordo com minha preferência, além disso, tenho folga todos os finais de semana e uma semanal a cada quinze dias. — explicou sorrindo gentilmente — Ah, e o salário condiz com as tarefas, então...

— Fico mais aliviada. — confessei.

Sabia que o mundo não era justo. Havia mais desigualdade do que gostaria de admitir e a salarial era uma delas. Muitas pessoas trabalhavam só para terem o suficiente para se sustentar e passar o mês, minimamente tranquilas. Além de que, o salário de uma mulher é mais baixo que o de um homem, pois vivemos em uma sociedade machista.

Estas questões sociais sempre me interessaram e costumava debater quando tinha oportunidade. Questões de desigualdade social, racial, ou de gênero ainda eram pouco discutidas e certo tabu para várias pessoas em pleno século vinte e um, infelizmente.

Nós chegamos ao hall e vi que Ximena e Piter já estavam ali, conversando. Me despedi de Michely e a obriguei a prometer que depois de pegar os uniformes iria sair do trabalho e ir curtir o tempo livre. Ela ainda relutou, mas depois de encará-la com uma cara de brava acabei vencendo.

— Boa noite Michely. — toquei seu braço.

Ela apenas sorriu e acenou discretamente, seguindo em direção à porta embaixo da escada à esquerda, até então desconhecida.

— Hm... — Ximena murmurou quando me aproximei — Ela é bonitinha. — piscou com um olho só.

Neguei com a cabeça. Ximena era bem saidinha, já tinha percebido pelos seus comentários maliciosos sobre alguns alunos.

Nós ficamos mais alguns minutos no hall até que todos tivessem chegado. Então, juntos nós saímos do internato e seguimos pela lateral, indo à parte de trás. Percorremos o extenso gramado até chegarmos à área em que começava uma trilha que entrava por uma espécie de bosque, com árvores altas.

Piter andava ao meu lado. Já Ximena e Vaiola iam à frente, junto com Judy e Laisa, uma garota com mecha azul no cabelo.

Dei risada quando Piter se abanou e olhou para um dos garotos que passava por nós, também indo em direção ao local da fogueira. Cutuquei suas costelas quando fez um comentário sobre a bunda do garoto, que provavelmente ouviu, já que nos olhou de forma avaliativa, como se tentasse descobrir qual de nós havia falado.

— Chegamos! — Judy avisou batendo palmas.

Sorri assim que vi a fogueira. Era grande o suficiente para que conseguíssemos ficar praticamente todos ao redor, nos bancos e troncos de madeira.

Vários alunos já estavam reunidos ali e tinha impressão de que viriam mais, afinal ainda estava no horário em que disseram que começariam a recepção.

— Isso vai ser bem legal! — Vaiola comentou animada.

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