Eu abri os olhos, deparando-me com um tecto branco, frio, com detalhes dourados. Por algum motivo, o quarto parecia gelado, mas a temperatura, pelo menos para mim, estava ambiente.
Pensei, então, por breves momentos, que poderia estar no meu quarto e não entendera devido ao sono e a esperança invadiu-me, olhando em volta.
E a minha visão, rapidamente, abandonou essa ideia.
Caramba, Dipper!!, reclamei comigo mesmo, você é um idiota! Podia ter ficado de boca fechada, não?
Fiz um duplo facepalm na face, irritado comigo mesmo. Libertei um grunhido de irritação, até, finalmente, me aparecer a pergunta mais óbvia em mente, que me esquecera totalmente:
"Onde é que raios eu estava?".
Agora, mais acordado, observei mais detalhadamente o quarto em que eu dormia.
Era sofisticado, com detalhes que variavam entre o branco, preto e amarelo, com tons dourados incluídos à mistura. Tinha um mobiliário diverso e composto, incluindo até uma zona com um espelho e gavetas, talvez para alguma garota se maquilhar.
O quarto era amplo. A porta ficava do seu lado direito e era preta com detalhes amarelos. Ao seu lado, alguns cómodos para colocar roupa ou assim eram seguidos pela parede até chegar à minha cama, ao fundo do quarto.
Mas foi aí que eu entendi que existia outra cama.
Ao meu lado esquerdo tinha pouco espaço, ocupado por uma cama de solteiro, igual à minha e uma janela aberta, com os raios de sol a baterem-me na cara.
Suspirei, sentando-me.
Eu apenas me lembrava da conversa com o homem estranho de ontem.
" – Q...Quem é você?!". – Perguntei eu, assustado. – "E eu não vou trabalhar para ninguém sem saber de nada!!".
" – E você tem outra escolha?". – Desta vez, ele perguntava, em resposta à minha pergunta. – "Prefere se tornar um sem-abrigo?".
Não respondi. Lembro-me de ter murmurado algo a olhar para o lado, que não me lembrava, pegando na mão dele.
A partir daí, lembro-me de cair no meio do chão, duro e cair num sono profundo.
" – Mas...". – Murmurei, para mim mesmo. Aquilo não fazia nenhum sentindo.
Sem ter tempo de continuar a fala, a porta do meu quarto abriu-se delicadamente, surgindo uma menina, vestida de empregada.
As suas vestes eram das mesmas cores do meu quarto, em formato de empregada. Tinha o cabelo rosado e pálido, variando também em tons de laranja. Os seus olhos azuis cruzaram-se com os meus, brilhantes e desafiantes, prontos para me por à prova a qualquer momento.
" – Dipper Pines". – Chamou. – "O mestre deseja se reunir com você".
Assenti para a menina.
" – Deverá estar apresentável em cinco minutos. Retornarei aqui para vir busca-lo". – Terminou, fechando a porta devagar.
E assim aconteceu. Eu acabei por adormecer apenas com os meus calções Jeans e a Tshirt laranja, que vestira na noite anterior. Por incrível que pareça, cheiravam bem e pareciam lavados por algum motivo desconhecido.
Coloquei o meu boné, para mim mais que histórico, na cabeça e vesti o casaco. Estava pronto.
A menina veio buscar-me assim que se passaram cinco minutos.
" – Siga-me, por favor, Senhor Pines". – Pediu.
Achei estranho, mas assenti, afinal, a menina parecia ter a mesma idade que eu.
Os corredores por onde a seguia eram, praticamente, sempre das mesmas cores e com formas triangulares – Existiam muito poucas coisas redondas.
As cores também eram semelhantes, mas os corredores eram claros e amplos, devido à quantidade de janelas e luminosidade.
De vez em quando passava-mos por um grupo de empregados, que me olhavam com espanto e confusos e, alguns deles, segundos depois sorriam para mim, acenando. Eu devolvia sempre o sorriso.
" – Err...". – Murmurei. Eu queria tentar começar uma conversa. – "Poderia dizer-me onde estou?".
" – O Master dir-te-á tudo o que é necessário. Peço que aguarde". – Respondeu, quase como roboticamente para toda a gente que ali passava e perguntava o mesmo.
" – Master?". – Sussurrei, pensativo e em tom de pergunta.
" – É o nosso senhor, dono da mansão. Mais conhecido, também, por 'chefe' ou 'patrão'". – Respondeu, sem olhar para mim. Ela continuava a andar, sem me dar importância. Os seus pigtails saltitavam de um lado para o outro, por serem cacheados, notando um leve tom de amarelo nas pontas, graças à maior atenção para as costas da rosada.
" – Entendo...". – E a conversa morreu ali, por uns minutos tensos. Novamente, tentei. – "Podes, ah... Ao menos, dizer-me o teu nome?". – Pedi.
Ela parou de andar, virando o olhar para mim, um tanto espantada.
" – Nunca... Ninguém me tinha feito essa pergunta". – Admitiu, num sussurro. – "Eu não a sei responder... Me perdoe".
Libertei uma leve risada.
" – Não precisa de pensar para responder, apenas me diga o seu nome, será o suficiente!". – Respondi, com um sorriso mais doce agora.
Ela não disse mais nada. Parou à frente de uma grande porta, batendo três vezes na madeira da mesma. Depois, virou costas e saiu, fazendo apenas o som dos sapatos dela baterem contra o chão e ecoarem pelo corredor fora.
A certa altura parou, olhando para trás. Por incrível que pareça, ela sorriu levemente.
" – Charlie". – Disse. – "Charlie Brownie".
E saiu, sem dizer mais nada.
Não tive lá muito tempo para pensar na menina, porque as grandes portas pretas de madeira e com detalhes amarelos não mo permitiram, já que se abriram lentamente, com um rangido demasiado estranho para o meu gosto.
Não sei porquê, entrei; Talvez alguma coisa, uma força, sei lá, mo convida-se a fazer, mas senti necessidade de entrar – Por isso, simplesmente entrei, sem autorização.
Existia, apenas uma longa mesa pelo quarto fora. Era um quarto estreito e pequeno, nada do que esperava, devido às grandes portas que surgiam ali, atrás de mim, fechando-se lentamente atrás de mim.
A janela atrás da mesa iluminava o local, por ser de manhã. Os móveis eram escassos e a sala só tinha duas cores – Preto e amarelo.
Mas o menos importante era o conteúdo dela.
Lá estava ele, sentado na última ponta, perto da janela; Olhava para mim com um sorriso divertido.
Vestia as mesmas roupas e o seu chapéu continuava difícil de entender, mas não liguei muito a isso. A pose dele deu-me arrepios.
Estava de pernas cruzadas, com a cabeça segura no braço direito. A mão esquerda segurava a bendita bengala preta, que antes, estava atrás das costas.
" – Sente-se, Dipper Pines". – Pediu, ou melhor, ordenou. – "Temos muito que falar".
Obedeci. Sentei-me na outra ponta, sem me mexer mais, completamente petrificado e recto – Talvez com medo de acabar por fazer alguma coisa errada, que era o mais provável –.
" – Oh, onde eu estou com a cabeça!".
Sem pensar duas vezes, ele bateu com a palma da mão uma na outra, fazendo a mesa mudar de forma, rapidamente. A mesa rectangular era, agora, quadrada, e depois tornou-se redonda. A sala mudara completamente, tornando-se bem mais pequena e acolhedora. Talvez, por isso, tivesse relaxado na cadeira, naquele momento.
" – Comecemos, então". – Anunciou. Eu fui para abrir a boca, pronto par ao bombardear de milhares de perguntas, mas ele foi mais rápido. Levantou a mão esquerda da bengala, embora esta estranhamente não tivesse caído. Depois, ele apenas levantando o dedo indicador e girando-o levemente. Continuava com a cabeça apoiada na outra mão.
Uma caneta e um conjunto de papéis esvoaçaram rente aos meus ouvidos, fazendo-me assustar levemente, mas sem me continuar a mexer. As minhas unhas cravavam os bancos de madeira e decorados com amarelo claro e preto.
" – A minha ajudante Kelly". – Começou, apontando para a caneta voadora, que começava a escrever. – "Relatará tudo o que falar, por escrito...". – Ele fez uma pausa, olhando-me maliciosamente, como um novo brinquedo. – "Tenha cuidado, Pines, um passo em falso e será o fim".
Engoli em seco, tenso. Sentia a transpiração do meu corpo aumentar, enquanto os nervos se encontravam em franja.
" – Comecemos, verdadeiramente...". – Ele retirou a cabeça da mão direita, levantando-se. O seu sorriso sinistro estendeu-se pela face, causando-me um calafrio. – "Dados pessoais". – Pediu. Depois de uns segundos de ele a olhar para mim, com as suas pupilas rasgadas é que entendi que ele me estava a pedir para falar.
" – Err...". – A caneta começou a escrever, até o meu pensamento de fala. – "Dipper Pines. Dezasseis anos.". – Comecei, um pouco nervoso, mas, à medida que as palavras fluíam na minha mente e contava tudo, ficava mais descontraído. – "Estou no segundo ano do ensino médio, e... Ah... Tenho uma irmã gémea, Mabel Pines. Eu vivia com ela e com os meus pais, mas meio que acabei por ser expulso...". – Comentei a última parte com a mão atrás do pescoço, na nuca, esfregando-a, com um sorriso amarelo e olhando para o lado.
" – Motivo de expulsão?". – Continuou, com um sorriso ainda mais divertido. Fiquei muito surpreso pela pergunta direta – Admito que esperava algo mais discreto.
" – Admitir a sexualidade". – Confirmei, desviando o olhar dos seus olhos amarelos. Não sabia porquê, eu não ia responder, mas sairam-me as palavras, sem eu mesmo ter tempo de pensar. Assim que o desviei, vi que um silêncio se instalou na sala.
Sem eu mesmo notar, ele encontrava-se à minha frente, segurando-me o queixo e colocando-me o rosto perto do dele, o que me fez ficar um pouco com a face a arder.
" – Enquanto o seu Master fala com você, jamais desvie o olhar". – Disse, largando o meu rosto. Ele já não tinha qualquer sorriso. – "Pelos vistos, Lunger terá de lhe dar umas pequenas lições, creio eu".
" – Lunger...?". – Murmurei, pensativo, mas ele não respondeu; Talvez porque não ouviu ou talvez porque não quis.
" – Continuemos". – Pediu, voltando a sentar-se. Desta vez, a perna direita estava deitada e apoiada na da esquerda e ele voltou a apoiar a cabeça, desta vez em cima das costas da mão, divertido. – "Tem alguma pergunta?".
Achei estranho não perguntar mais nada, mas pelo que vi, todos os meus dados pessoais, mesmo os que não confirmei nem queria revelar, estavam escritos por Kelly, a caneta azul, na folha.
" – Muitas!!". – Comecei, prestes a dar em doido. – "Onde estou? Porque estou aqui? E o que raios se passa contigo e com esta mansão macabra?!". – Era muitas coisas sem respostas, mas, embora o meu tom de preocupação e dúvida era, na verdade, misturado com uma ponta de esperança de uma nova aventura para explorar, tal e qual como em Gravity Falls.
Ele libertou uma gargalhada calma, mas bastante assustadora.
" – Tudo a seu tempo, meu...".
" – Quem é você?!". – Interrompi-o, levantando-me da cadeira, prestes a perder a paciência. – "Vim parar aqui sem saber como. Não conheço ninguém deste local, porque raios eu trabalharia com o senhor?". – Perguntei, desafiando-o.
Ele ficou parado, por um tempo, surpreso. Depois, a gargalhada antiga dele evoluiu, então, para uma de diversão sádica, fez um estalinho com os dedos. Uma chávena de café surgiu, preta e amarela, no meio do ar, a flutuar. Ele observou-a, divertido, desviando um olhar de diversão e um sorriso de canto, apenas dizendo a frase que mais me causou arrepios até hoje:
" – Adivinha quem eu sou..."
" - ...Pinetree".
O meu corpo levantou-se bem rapidamente da cadeira, acabando por cair no chão. Encostei-me, com força, contra a parede, sentindo a respiração cortada e uma transpiração fria me invadir.
" – Não... Pode ser...".
" – Oh!". – Ele olhou para mim, com um sorriso animado, quase que parecia inocente, se não fosse dele. – "Pelos vistos os neurónios juntaram as peças, não foi?". – Ele esboçou um sorriso a mostrar os dentes. – "És tão inteligente para umas coisas e tão lerdo para outras...".
Fiquei parado. Nada do meu corpo obedecia ao meu cérebro, já que o meu instinto gritava em todos os pelos do meu corpo "CORRE!".
" – O que foi?". – Perguntou. – "O gato comeu-te a língua, Pinetree?".
" – N...Não". – Foi tudo o que consegui responder, engolindo em seco. É verdade que, desde a derrota do meu inimigo, ele atormentava-me em sonhos, tanto a mim como a Mabel.
" – Sabia que era uma questão de tempo até tu e a tua irmãzinha cederem...". – Começou, olhando-me com o olho com a pupila rasgada. Só então é que entendera que ele usava uma pala em forma de triângulo no olho direito; Talvez a magia dele fizera com que esse facto não fosse notado por mim. – "Sabia que era uma questão de tempo até ela se sentir pressionada por mim, sem que a mesma soubesse, para te levar a usar um motivo para seres expulso de casa".
" – Foste tu?!". – Gritei, irritado. Agora, os nervos evoluíram para raiva. Dirigi-me a ele e bati com o punho na mesa. – "Arruinaste-me a vida?!".
Ele deu uma risadinha.
" – Tecnicamente... Acho que a acabei de a salvar". – Ele libertou um sorriso sádico. – "Agora, tu serás o meu pequeno empregado nesta grande mansão, Pinetree".
" – Nunca, nem em um milhão de anos, eu trabalharia para ti, Cipher!". – Neguei, olhando-o nos olhos, frustrado. – "Prefiro morrer nas ruas que viver aqui!"
Depois, virei costas, dirigindo-me à porta da sala. Girei a maçaneta, mas a mesma não abria; Estava trancada.
Foi então que ouvi uma risada. A risada que me atormentava em pesadelos, desde o dia que a derrotei. A risada que me arrepiava e me fazia sentir o maior medo que já senti até então – A famosa risada divertida e sádica de Bill Cipher.
" – Infelizmente, Pinetree...".
" – Quem entra nessa mansão... Nunca mais sai".