O Portador de memórias - Para...

By umprosador

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Esta é a história de Bernardo Bertrand, um escritor que durante o decorrer da própria história, passou por mu... More

Delírio
Cecília
Hospício
Carta para Cecília, diga que estou vivo!
Anotação
Olhos castanhos como os de Cecília...
Nota de delírio
Sonho de morte
Os destroços
A morte
Nota
Primum non nocere
O arder
Não precisa ler esta nota
Jogo do contente à la Elisa
Questões da Princesa Miranda
Princesa Miranda
Nota de sonho - Benjamin
Baiadère
Aqueles olhos
Pequena nota de uma nota
Cecília? Onde?
Dá-me.
Sem título
Tetracromo. Um portador de memórias.
Nota de borboleta
Presença de memórias?
Solis
,Aphrodítē
A morte
Nota ao Rato
Vida
Elfa
Artemis
Teu veleiro em flor
Vou te contar
Ajuda
Nossa Cecília
Seja meu ar
Paschein
Spirit
E o amanhã, quem dirá?
Nota de adolescência
Chronos
Carta para Bernardo
Atena
Investida
Nemesis
Página no facebook
O lobo versus a cobra
Rir até gritar, disse ele
Kindle

O sentir

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By umprosador

    Celina acorda assim que pego um copo d'água e jogo no rosto dela. Eu já tinha checado seu pulso e tinha batimento, eu falei com Miranda, mas ela não escutou, continuou segurando a mão dela e as lágrimas caindo como se tivesse velando a pobre.

- O que aconteceu!? – Disse Celina desnorteada

- A senhora desmaiou! – Gritou Miranda indo de encontro com os braços dela

    Eu fiquei olhando as duas, elas realmente devem se amar. Eu entendo que Celina adotou Miranda num momento muito específico e no qual ela precisava de alguém, mas ainda tem coisas que me deixam pensativo. Coisas do tipo: Como ela tem um oráculo? Como ela pode ter tanta informação? E o pior, quem essa mulher é pra poder consultar um oráculo? É certo que nós Portadores temos essa sensibilidade com o que está ao nosso redor, mas como pode isso? Um oráculo é algo que foi usado em mitologias por grandes magos pra entrar em contato com seres além da compreensão. Pode ser ele um livro ou até uma grande pedra, assim como um receptáculo de espíritos antigos. Embora tudo o que eu achava que sabia foi totalmente destruído com essa história de tetracromos, ainda sou cético quanto a Celina...

- A senhora tem problemas como hipertensão ou coisa assim? – Perguntei meio de banda

- Tenho pressão baixa, acho que fiquei emocionada ao ver a minha filha assim feliz e com alguém que a mereça. Eu não sei o que o senhor está fazendo, mas está fazendo certo. - Disse ela sorrindo

- A senhora poderia fazer alguma coisa também. – Disse sério, todos congelaram

Houve uma parada dramática de alguns segundos, então retomei.

- Se levantar desse chão e parar de me chamar de senhor! – Agora rindo

- Você quase me matou, Bernardo! Ele está certo, levante-se, mamãe. Deixe-me limpar a senhora. – Miranda sempre atenciosa

    Ela finalmente se levantou e se secou, fomos até a sala e conversamos um tanto sobre coisas do cotidiano, chegamos nos autores de livros. Engraçado que entre leitores esse ponto é inevitável, Celina me falou que gostava bastante de literatura Russa, mas amava a Brasileira. Disse que tínhamos talentos incríveis aqui, mas que eram maltratados pela vida (Não que os outros de outros países não fossem). "Talvez por isso sejam tão incríveis" Disse ela.

- Olhe o pobre Barreto, morreu novo!

    Miranda estava arrumando a cama para Celina dormir. Engraçado ela falar de Lima Barreto, por pouco não foi meu amigo. Assim que O Triste Fim entrou em ascendêcia, leve ascendêcia, eu o encontrei na rua. Me parecia até bem, mas se vestia mal e o olhe que ironia da vida, gostava de reparar em roupas. Algum tempo depois soube da sua morte, como estava conturbado com algumas situações, não busquei a fundo o que tinha acontecido. Já passou várias vezes pela minha cabeça o medo de morrer, e o mais comum entre os artistas, a morte nua, loucura.

- Foi mesmo... Dizem que foi culpa da família, dizem também que o pai era louco. Mas a loucura era controlada, ele de alguma forma herdou isso.

- Não aceito isso... Onde já se viu loucura controlada? A loucura é leve, voa pelo céu da boca. Não se pode controlar. A bebida acelerou, claro, mas era batuta sim.

Disse a mulher que tem um oráculo... Pensei comigo.

- Não o conheci bem pra poder comprovar... Era um homem com palavras muito bem polidas, bons pensamentos, gostava de cultura estrangeira, até comprava revistas.

- Nada disso voga. Era doido. – Disse ela firme

    É complicado tentar discutir com alguém e esse alguém não saber o que é uma discussão. Discussão é colocar em pauta um assunto de interesse em comum e questionável em que as duas partes trocam argumentos. Mas é difícil fazer isso quando você quer discutir e a outra pessoa quer explicar porque ela está certa... Nesse ponto Celina me lembra a minha irmã... Ela era assim, mas dela eu gostava. Gostava por que ela me fazia querer matá-la mesmo sabendo que meus pais me matariam depois e ninguém quer ver uma chacina dentro de casa, nem fora... Ninguém...

- Pode ser verdade... – Disse cabisbaixo, não era pra eu ter lembrado disso agora...

    Alguma coisa dentro de mim se consome e se suicida. Essas lembranças não poderiam vir a tona agora... A tristeza me arrebata de uma forma que não me deixa disfarçar. Não existe forma de disfarçar...

Elas me olham e antes de falarem alguma coisa, eu deixo as palavras vazarem:

- Me sinto um tanto cansado... Vou me deitar agra. Tenham uma ótima noite.

    Celina e Miranda ficaram me olhando enquanto eu andava até o quarto onde eu dormi no primeiro dia que cheguei aqui, hoje vou dormir com meu pior inimigo novamente, eu. Cecília fica parada me esperando no corredor. Enquanto eu ando a envolvo com o meu braço e ela anda comigo do meu lado.

- Vou dormir mais cedo hoje, tudo bem? - Olhei pra ela e ela olhava pra o chão - Eu estou bem, só vou dormir mais cedo. – Disse em pé na porta do quarto depois de beijar a testa dela.

    O rosto de Cecília é de um quase desolamento, ela não é besta, qualquer um pode perceber como estou. Mesmo assim ela não insiste, ela me deixa entrar e então eu fecho a porta. Me encosto no canto do quarto e escorrego as minhas costas até me sentar no chão. Nada disso estaria acontecendo se eu conseguisse chorar. Essas lembranças... Tenho isso as vezes, vem até mim como um soco de boxeador, quando menos se percebe já está na lona há muito tempo.

    Quando eu lembro dos meus pais, da minha mãe, do que aconteceu, isso me quebra. Eu não sei chorar, só sangrar. O tempo passa e eu continuo ali até não se sabe que horas... Quando resolvo deitar, faço um grande esforço pra limpar a minha mente e consigo.

    Quando estou na cama, ouço a porta abrir, alguém aparece na luz da lua que vaza pelo meu quarto. Miranda aparece de camisola, ela já está agachada na beirada da casa. Eu a olho embaixo da luz da lua cheia, através da janela. Eu poderia tentar descrever, mas nem eu nem o autor dessa história conseguiríamos descrever o quão maravilhosa Miranda é.

    Ela veio de camisola, talvez porque ela a use normalmente as vezes, ou talvez ela tenha vindo assim achando que se me atraísse eu iria me sentir melhor, mas isso não é a cara dela... Com certeza isso teria funcionado, o corpo de Miranda não é volumoso como o de Elisa, mas é sublime, é doce e com doses certas nos lugares certos, o rosto dela me lembra uma calma que eu nunca tinha encontrado em uma forma física antes. Quando ela ia na casa de tia Izabelli eu não estava com sanidade o suficiene pra perceber nada disso. Ela parece uma elfa, um ser lindo e longânimo que aproveita a energia da terra, linda por dentro e por fora. Mas isso não vai funcionar, não hoje.

- Posso me deitar? – Pergunta com uma voz doce, como se estivesse conversando com uma criança.

- Pode... – Respondo meio receoso

    Não sei se serei uma boa companhia esta noite, quando me sinto assim, prefiro não falar muito, minto, não tenho vontade de falar. Não sou bom em desabafar ou coisa assim... Faço isso com a caneta através dos textos, cada um deles é parte de mim, embora as vezes as pessoas não percebam... Quase ninguém percebe.

    Normalmente quando as pessoas lêem algo extremamente triste, acham aquilo lindo, mas isso é desumano! Elas deveriam se perguntar se o autor está bem, o que ele está sentindo. As pessoas acham as palavras tristes uma coisa linda. Por isso alguns escritores se matam ou enlouquecem. Escritores gritam de dor enquanto os leitores aplaudem.

    Miranda se deita colocando o braço sobre o meu peito e debaixo dos lençóis ela cruza uma perna na minha. Posso sentir o tecido de seda da camisola azul escura balançar sobre a cintura dela; posso sentir a pele dela deslizar sobre a minha e o os dedos do seu pé procurarem a melhor vaga do lençol pra se encaixar, sinto maciez das suas pernas atravessar a minha pele. Ela faz uma pergunta enquanto ela alisa o meu peito cuidadosamente:

- Por favor, meu amor, me diz o que está acontecendo. Foi a primeira vez que eu te vi assim e isso me doeu. – Disse devagar, calmamente me amaciando

Eu não gosto de desabafar, mas tinha que admitir que se eu queria continuar com Miranda na minha vida, eu terei que ser verdadeiro. Ela merece saber.

- Por favor, me prometa que não vai me olhar diferente depois do que eu disser. – Disse enquanto passava a mão no rosto dela.

Ela não responde, só confirma com o rosto.

- A minha família, meus pais, minha irmã... Por causa do que aconteceu eu também quase... – Pensei, respirei – Todos morreram na minha frente quando eu tinha 17 anos, desde esse dia minhas tias me criaram e então fui pra universidade em Portugal e foi por lá que...

    Nesse momento Miranda coloca os dedos nos meus lábios.

- Não precisa dizer se não quiser... Vou entender.

- Eu vou falar. – Disse decidido

Ela concordou e continuou a ouvir.

- Foi lá que eu consegui a dependência química, perdi tudo, comecei a beber e me viciei no sexo e nas drogas que me ofereciam nas ruas.


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