Psicose (Livro I)

By andiiep

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Melissa Parker é uma psiquiatra recém-formada que encontra seu primeiro emprego em um manicômio judiciário. E... More

Aviso Inicial
Prólogo
Um - St. Marcus Institute
Dois - A holandesa de Cambridge
Três - Inesperado
Quatro - Sutura
Cinco - Insônia
Seis - Happy Hour
Sete - Progresso
Oito - Passado
Nove - Proximidade
Dez - Embriaguez Acidental
Onze - Hormônios!
Doze - Corey vs Brian
Treze - Fotografia
Quatorze - Helvete
Quinze - Perigo
Dezesseis - Triângulo
Dezessete - Sobrenatural
Dezoito - Confusão
Dezenove - Corey vs Brian (parte 2)
Vinte - O plano mirabolante de Corey Sanders
Vinte e Um - Render-se
Vinte e Dois - Bipolaridade
Vinte e Três - Mensagem Sobrenatural
Vinte e Quatro - Intimidade
Vinte e Cinco - O inferno converte-se em paraíso
Vinte e Seis - Não Há Compaixão Com a Morte
Vinte e sete - Quebra-Cabeças
Vinte e Oito - O Passado Condena
Vinte e Nove - REDRUM
Trinta - Veritas Vos Liberabit
Trinta e Um - Plano de Fuga
Trinta e Dois - Luxúria
Trinta e Quatro - Vai Dar Tudo Certo!
Trinta e Cinco - Um Sonho de Liberdade
Trinta e Seis - Scotland Yard
Trinta e Sete - Reencontro
Trinta e Oito - Vigilância Constante
Trinta e Nove - Corpo e Alma
Quarenta - Encontros e Desencontros
Quarenta e Um - Armadilha
Quarenta e Dois - Salvação?
Quarenta e Três - Tentativa e Erro
Quarenta e Quatro - O Infeliz Retorno
Quarenta e Cinco - Do Pó Vieste...
Epílogo
AUTO MERCHAN

Trinta e Três - Preparação

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By andiiep


Dormir não era uma opção naquela noite. Por isso, quando o dia raiou, Melissa sustentava pesadas olheiras sob os olhos acinzentados. E seu cinza, naquela fatídica manhã, não brilhava. Ao contrário, era tomado de um espesso nevoeiro que se enroscava por suas íris. Tudo porque era difícil processar toda a informação da última consulta com Corey Sanders.

Agora apenas... Corey.

Se fechasse os olhos, Melissa ainda podia sentir o toque áspero dos dedos dele por sua pele, da língua macia dele dançando com a sua, dos lábios doces dele, tão perfeitamente conectados aos seus. E o fato de não saber o que poderia acontecer no dia seguinte fazia seu instinto, por pura conservação do que restava de sua sanidade, repelisse tais lembranças. Melissa temia pelo pior. E não queria saturar as memórias de todos os momentos mágicos que Corey Sanders proporcionara em sua vida pacata. Precisaria delas, caso algo desse errado.

Durante todo o dia, Melissa tentou se concentrar em seu trabalho, comportar-se normalmente, como se não estivesse prestes a cometer a maior loucura de sua vida dali a poucas horas... Era praticamente impossível, entretanto, controlar os nervos. Principalmente quando o tempo resolveu fechar e o céu se tornar tão negro que parecia noite. Nuvens escuras baixaram sobre o St. Marcus Institute. Raios e trovões estouravam com força sobre Winchelsea, e não deixavam Melissa menos nervosa. Pelo contrário. A cada estouro grave no céu, ela dava um pulo em sua cadeira e levava a mão ao peito, para verificar a quanto dispararam as batidas do seu coração. Antes do fim do expediente, o céu já desabava sobre suas cabeças em forma de gotas grossas de chuva.

Melissa não viu Kate durante o dia todo. Nem no café da manhã nem no almoço, e ficou se perguntando se ela não teria desistido da loucura que Melissa havia proposto... No final das contas, não culparia Kate se o tivesse feito. Nem mesmo se ela tivesse contado tudo para o Dr. Thompson. Ou para a polícia. Era demais o que Melissa havia pedido, principalmente se considerado o tão pouco tempo de amizade entre as duas.

A verdade era que estava surpresa pela concordância tão rápida de Kate, mas não era momento para questionamentos. Alguém ali dentro a ajudaria a salvar Corey Sanders da perdição da insanidade, e nada mais importava.

Melissa tinha consciência do absurdo de seu plano. Tinha consciência do risco que representava. Tinha consciência do tanto de leis que estaria desafiando só por planejar uma fuga. E mais ainda se ela desse certo. E nem ao menos tinha ideia do que fazer caso o plano desse certo. Não poderia simplesmente se demitir do St. Marcus e fugir por aí com Corey procurando por Danny Langdon. Embora a fuga fosse o plano principal, ainda havia todas as consequências de sua realização a serem consideradas.

As 18:30 estavam próximas quando Melissa dispensou a senhora Logan de sua consulta. No momento em que a velha e rechonchuda senhora deixou o consultório, Melissa soltou o corpo sobre a cadeira e deixou um suspiro alto escapar. Os olhos fecharam e ela repassou pela milésima vez no dia o que deveria fazer quando Kate desse o sinal. Todos os músculos de seu corpo se tornaram trêmulos. As mãos suavam em bica e a testa era marcada por uma linha fina de suor frio.

Melissa concentou-se em sua respiração, em busca da necessária e arredia calma. Jamais teve um notável equilíbrio emocional. Não agia bem sob pressão, não falava bem em público e muito menos achava ser mentalmente capaz de ajudar um suposto assassino condenado a fugir de uma prisão. O lado racional de sua consciência gritava para que desistisse daquela insanidade. Desistir parecia, de fato, a melhor opção. Mas não era a melhor opção para o bem estar de Corey Sanders, e era o que mais importava a Melissa naquele momento. Ver Corey Sanders do lado de fora dos muros cruéis do St. Marcus Institute era uma prioridade.

Depois de um longo tempo, Melissa pareceu se sentir forte o bastante para abrir os olhos e encarar a realidade do mundo ao seu redor. Quando aconteceu, a escuridão já dominava seu consultório. Embora ainda não se sentisse pronta para sair dali, não conseguir mais encontrar motivos plausíveis para continuar protelando.

Melissa arrumou sua mesa metodicamente, como fazia todos os dias. Apenas demorou quinze minutos a mais do que o normal. Nem que quisesse ser mais rápida conseguiria, uma vez que a tremedeira em suas mãos e pernas não permitiria.

Só deixou seu consultório quando as 19:00 horas se aproximavam. O frio gelado da noite corria pelos corredores do St. Marcus. Melissa apertou o casaco de couro contra o corpo, enquanto se encaminhava ao refeitório. Seria a última chance de encontrar Kate antes de chegar à conclusão pateticamente óbvia de que ela havia desistido de tudo.

Não foi surpresa quando adentrou o refeitório e encontrou todos os possíveis médicos, enfermeiros e funcionários, menos Kate. O olhar enfezado de Brian cruzou com o dela logo em seguida. Melissa ignorou, virando o rosto. Contrariada, foi buscar algo para encher o estômago, coisa que não havia feito o dia todo. No entanto, comer não parecia assim tão simples. Não quando a planejada fuga de Corey Sanders se aproximava, sorrateira. Além de tudo, o olhar insistente de Brian estava fixo sobre Melissa, em todos os movimentos que fazia. A concentração era praticamente impossível a essa altura, com tanto na cabeça para pensar e ainda ter que lidar com os problemas que tinha com Brian.

Melissa respirou fundo, pegou seu peixe com batatas e foi se sentar na mesa mais afastada o possível, sozinha. Ao lado da janela, onde esperava ter uma visão de um Corey descontraído pelo jardim. Mas a essa hora, ele já estaria trancado no prédio B, provavelmente fazendo sua refeição. Ou estava tão nervoso quanto ela, que mal conseguia olhar para a refeição em seu prato sem sentir o estômago embrulhar.

Melissa batia os dedos na mesa, a perna subia e descia em ritmo rápido e contínuo... Sinais evidentes de seu nervosismo. Enquanto ela torcia para que Brian não se aproximasse (não sabia se era capaz de aguentar um confronto no estado de nervos em que se encontrava), revirava suas batatas com o garfo. O queixo estava apoiado na outra mão, enquanto os olhos a cada cinco segundos buscavam algo do lado de fora. Já nem sabia mais o que seu subconsciente procurava.

Depois de vinte minutos entediantes e nervosos, Melissa desistiu de engolir qualquer coisa e jogou a comida em seu prato no lixo. Em seguida, depositou a louça sobre o balcão onde as cozinheiras o apanhariam, e saiu do refeitório. Não olhou na direção de Brian. O olhar insistente que ele lançada dava-lhe a impressão de que sabia que Melissa estava aprontando alguma coisa que não devia. Brian, contudo, deveria ser a última das preocupações. Havia outros assuntos mais importantes para resolver.

Como, por exemplo, onde diabos Kate havia se metido?

Sua pergunta quase desesperada foi respondida quando virou a esquina no corredor que levava ao seu dormitório. Kate vinha andando a passos rápidos em sua direção, e jogou as mãos para o céu, como um sinal de agradecimento, quando reconheceu Melissa na baixa luz do corredor.

— Graças a Deus te encontrei! — Ela sussurrou quando se aproximou, e puxou Melissa pelo braço.

Melissa acompanhou Kate, que a arrastou sem muita paciência de volta às escadas.

— O que está acontecendo, Kate? Eu procurei por você o dia todo, mas você sumiu e... Não está desistindo, está? — Melissa fitou-a em seu melhor olhar preocupado, enquanto as duas desciam as escadas.

— Não! — Kate respondeu prontamente, quase parecendo ofendida — Prometi que ajudaria e realmente não quero ver um inocente sofrendo o que Corey Sanders vem sofrendo todos esses anos... Além do mais, meu carma me diz que eu vou garantir meu lugar no céu se toda essa loucura der certo... — Então a enfermeira sorriu.

Melissa não conseguiu corresponder.

— Passei o dia todo arranjando os... Suprimentos a serem utilizados. E ajeitando o lugar em que ele vai ficar até que achemos um lugar melhor. — explicou-se, percebendo o excesso de apreensão que dominava a Melissa rígida que a seguia.

— E deu tudo certo?

A voz preocupada de Melissa reverberou no corredor vazio do andar térreo do prédio administrativo. Ela não sabia aonde Kate a estava levando, mas também não estava interessada em saber.

— Sim. A falta do remédio só vai começar a fazer efeito na hora em que... Bem. No momento exato em que nós precisaremos. — Kate dizia calmamente, abanando as mãos em casualidade.

Melissa não entendia como ela conseguia parecer tão calma e tranquila quando o plano mais arriscado de suas vidas estava prestes a ser executado.

— Kate?

— Sim?

— Não acho que foi uma boa ideia deixa-los em remédio, é arriscado e totalmente anti-profissional... Eles podem se machucar de verdade.

Kate parou na frente de uma porta com os dizeres "ALMOXARIFADO". Melissa parou ao seu lado, buscando em seu olhar plácido a calma de que necessitava. Não veio.

Uma pequena parte do plano que ambas haviam arquitetado era Kate deixar os prisioneiros do prédio B sem seus devidos remédios. Quando o sinal fosse dado, eles fariam parte da distração necessária para que Corey conseguisse fugir.

Kate suspirou e puxou uma chave do bolso, abrindo a porta. Ambas entraram e ela a trancou. O cheiro de mofo era predominante, mas, a essa altura era um costume. O nariz de Melissa nem coçou. A luz amarelada que iluminou era fraca e dificultava a visão.

— Ninguém vai se machucar, Melissa. Teremos um bando de psicopatas do prédio C dopados demais para lembrarem do próprio nome à solta, desarmados, contra os guardas armados até os dentes. E por outro lado, os nem tão psicopatas assim em estado de abstinência alto demais para serem capazes de machucar alguém. Eles não são violentos. Só vão correr sem rumo para todos os lados e dar um pouco de trabalho aos guardas mais gordinhos, você vai ver. Vai dar tudo certo, não se preocupe.

— Não sei até que ponto é seguro deixá-los à solta dessa forma...

— Para quem estava preocupada com a minha desistência há cinco minutos, você está me soando bastante suspeita, Melissa. — Kate comentou, enquanto procurava entre os armários do almoxarifado mais uma parte necessária do plano.

— Estou errada por me preocupar com a integridade dos outros?

— Olha... – Kate tirou a cabeça de dentro do armário e se voltou para Melissa – Quando der a hora, todos os funcionários estarão no prédio administrativo e assim que as portas do helvete se abrirem, as do administrativo travam. É medida de segurança do St. Marcus. Já fizemos treinamento disso um milhão de vezes. Todos estarão seguros... Os que mais correm risco com tudo isso somos eu e você, que provavelmente, com esse frio, seremos as únicas do lado de fora, além dos guardas, quando a rebelião estourar.

Melissa assentiu com a cabeça, finalmente convencendo-se de que talvez não desse tudo errado, e foi ajudar Kate a procurar o que precisavam dali.

A primeira, e mais difícil, parte do plano, era desligar a energia do helvete e do prédio B e cortar o gerador, o que faria com que as portas destravassem e os psicopatas estivessem livres e soltos para fazerem o que bem entendessem pelos jardins do St. Marcus.

O encontro dos prisioneiros dos prédios B e C era o que preocupava Melissa, mas se Kate dizia que eles não se machucariam, então Melissa preferia acreditar.

— Eu tenho uma dúvida! — Melissa disse, abrindo outro armário.

— Qual dúvida? — ela ouviu a voz abafada de Kate perguntar lá do outro lado do almoxarifado.

— Como você vai fazer para desligar a energia do helvete e do prédio B e ainda cortar o gerador? Porque ninguém tem permissão para entrar lá após o expediente.

— Digamos que Pete deve alguns favores a Corey Sanders... — ela disse, aproximando-se com um bolo azul escuro em mãos.

— Favores?

— Sim. Favores. — ela confirmou, enquanto buscava com os olhos por algo. — Não sei direito qual é a relação entre os dois, mas quando fui falar com Pete sobre Corey Sanders, ele não pensou duas vezes em ajudar no nosso plano. Quer dizer, Pete sempre aliviou as coisas para o lado dele, não foi tão difícil deduzir que ele poderia ser mais um aliado.

— Ficou louca? E se ele fosse contar tudo para o Dr. Thompson?

— Eu precisava arriscar.

— Inclusive o nosso pescoço?

— Melissa, deu tudo certo, ele não falou nada, ao menos até agora, e, se tudo der certo, vai fazer o que eu pedi.

— Se você está dizendo... — A doutora deu de ombros, tentando parecer que, por dentro, estava surtando.

E preocupada, além de tudo, com a lealdade de Pete a Corey. Que ela fosse realmente verdadeira...

Kate soltou um gritinho de satisfação quando achou o que procurava, e voltou para Melissa com um saco preto em mãos. O bolo azul escuro estava ali dentro. Era um uniforme dos guardas do St. Marcus. Aquele que ela entregaria a Corey para que pudesse se camuflar em meio ao bando de guardas que estaria espalhado pelo St. Marcus tentando controlar a rebelião.

— Antes que eu me esqueça! — Kate deu um tapa na própria testa, e do bolso de seu vestido branco de enfermeira, tirou um papel que entregou a Melissa.

— O que é isso?

— O mapa que Corey Sanders vai precisar para chegar à cabana que eu preparei para ele.

Melissa apenas assentiu com a cabeça, dando uma olhada rápida nas instruções escritas em letras caprichosas, então dobrou o papel com cuidado e guardou no bolso de sua calça.

— Como foi que encontrou essa cabana?

— Eu gosto de caminhar pela floresta. Fazer trilha, sabe? É revigorante. Em uma dessas caminhadas, em que eu me empolguei demais e explorei mais da floresta do que seria seguro, eu a encontrei. Acho que está abandonada há muito tempo.

— Entendo...

— Sabe o que fazer, certo? — Kate perguntou, interrompendo o raciocínio de Melissa.

— Entregar o uniforme a Corey é a coisa mais fácil que eu tenho que fazer hoje, Kate... — Melissa suspirou.

— Não sei, não... Cuidado para não se distrair com outras coisas quando estiver sozinha no quarto com ele... — Kate sorriu ladina e arqueou uma sobrancelha sugestivamente.

Melissa revirou os olhos, sem intenção de responder a provocação.

— Estou falando alguma mentira? — A enfermeira insistiu.

— Claro que está!

— Tudo bem... — Kate riu, já caminhando na direção da porta do almoxarifado. — Depois de entregar o uniforme a Corey Sanders...

— Encontro você para tentar colocar meu lado sedutor em prática e roubo a chave da saída do portão aos fundos do St. Marcus com o guarda do prédio administrativo. — A doutora disse mecanicamente, como se tivesse passado o dia todo decorando a sentença.

— E então nós sairemos para o nosso passeio noturno. Vou aflorar meu lado piromaníaca e você... Bem. Sabe o que fazer. — Kate suspirou, quando as duas já caminhavam casualmente pelo corredor.

Melissa apertava com força o plástico preto entre os dedos, amassando as peças de roupa ali guardadas. Disfarçava bem, a essa altura, o nervosismo ridículo que mal a deixava respirar. Sua visão era meio turva e o coração batia tão forte, que era ritmo constante em seus ouvidos. Quando chegaram à recepção, onde a mocinha dos chicletes já se preparava para ir embora, Kate e Melissa se separaram. Kate subiu as escadas na direção de seu dormitório, preparar tudo o que precisariam quando a parte de Melissa já estivesse cumprida. Melissa, por sua vez, deixou o prédio administrativo, e caminhou a passos nervosos na direção do prédio B.

Os jardins do St. Marcus, que durante o dia eram vivos e particularmente encantadores, durante à noite eram sombrios e desertos. Não havia viva alma ali. Melissa, no entanto, podia sentir o olhar em suas costas dos guardas que firmavam posto nas grandes guaritas suspensas dos portões. Eles seriam o principal problema no plano de fuga. Ela esperava que a distração de Kate fosse o suficiente para tirá-los de seus postos.

Ao subir as escadas do prédio B, um guarda de aparência mais pacífica que o normal a recebeu.

— Pois não? — Ele perguntou. O pesado rifle apertado entre os dedos. Sorria, apesar da postura defensiva.

— Tenho uma entrega para Corey Sanders. — informou Melissa, pigarreando antes de falar, na intenção de que sua voz saísse convincente o bastante. Estava impressionada com seu desempenho.

— Entrega? Hoje não é dia de entrega, doutora...

— Parker. Eu sei, mas... Estamos falando de Corey Sanders, não é mesmo? — Melissa usou de seu melhor sorriso meigo. Sabia que, pelo menos esse, tinha efeito garantido.

— E agora designaram uma médica para fazer entregas... — O homem rolou os olhos, visivelmente contrariado.

— Bem, ele é meu paciente. E todos sabemos da relutância dele em se comunicar com as pessoas...

— Então você é a famosa médica que fez Sanders finalmente abrir o bico e parar de causar problemas? — O guarda sorriu.

— Eu mesma.

— Boa sorte. – disse ele, abrindo caminho para que Melissa passasse.

Ela sorriu em agradecimento, acenando com a cabeça, e então adentrou o prédio B. A atmosfera era pesada, mas suportável. A segurança, bem menos rígida.

Se por alguns poucos segundos ela havia estado calma, essa sensação de alívio passou no momento em que se deu conta de onde estava e por que estava. As mãos suavam. A garganta travou com a saliva, que, por um segundo, não quis descer. O coração, obviamente, disparou, e, dessa vez, num misto de nervosismo pela fuga e pela iminente proximidade de Corey. Ela pigarreou, entretanto, casualmente, antes de apertar o botão vermelho que liberaria a porta para que ela entrasse.

Um barulho automático reverberou pelo corredor vazio, então a porta lentamente revelou o interior do quarto. Curvado sobre sua escrivaninha, de costas para Melissa, estava Corey. Ela ainda conseguiu observar os músculos tatuados de suas costas, graças ao fato de que ele estava sem camisa, antes que ele se virasse em sua direção.

O encontro de seus olhares fez o tempo parar por alguns instantes. Durante esses, foi somente o mundo de Melissa e Corey, trocando aquela mistura sempre confusa de sentimentos.

Foi somente quando ele sorriu leve, descontraído, que ela foi capaz de acordar. Então adentrou seu quarto, tomando o cuidado de não deixar a porta fechar, apenas encostando-a.

— Boa noite, doutora. — ele cumprimentou, deixando que o sorriso antes descontraído se transformasse no mal-intencionado de sempre.

— Sua calma e apetite sexual me assustam, sabia? — foi o que ela disse, caminhando pelo quarto para se sentar na cama.

— Tem de haver um jeito de disfarçar todas as preocupações, certo? — Corey girou na cadeira, ficando de frente para a doutora — Por mais clichê que pareça, o mundo já não importa quando você está por perto. É como meu calmante particular...

Melissa suspirou e não conseguiu conter o pequeno sorriso que brincou no canto de seus lábios.

— Está vendo? Acabei com a sua tensão...

— Tudo bem, isso pode ser lindo, romântico, profundo, mas... Eu realmente gostaria que se preocupasse.

— Não vou dizer que não estou preocupado, porque estou, principalmente por você, mas eu prefiro ser otimista e acreditar que vai dar tudo certo. — Corey sorriu.

— Você e Kate poderiam ser melhores amigos. — Melissa rolou os olhos, deixando o pacote preto em cima da cama — O uniforme. — informou, então tirou o pedaço de papel que Kate entregara-lhe anteriormente — E o mapa para chegar na cabana onde ficará escondido até que... Bem, até que achemos um jeito de tirar você daqui.

Corey assentiu com a cabeça, levantando da cadeira e indo até Melissa. Pegou o pedaço de papel das mãos dela e o desdobrou, analisando com atenção o que ali estava escrito. Não disse nada, frustrando as expectativas de Melissa. Então pegou o saco preto de cima de sua cama e analisou o uniforme. Pegou o boné que fazia parte dele e colocou na cabeça.

— Gosta de homens de uniforme, doutora? — Corey sorriu malicioso.

Melissa demorou um mínimo de tempo apara assimilar a pergunta mal-intencionada dele. Então conseguiu se impressionar com o fato de ainda conseguir ser o bad boy de sempre, mesmo quando estava próximo de cometer uma loucura suicida.

— Francamente, Corey! — Ela ralhou e se levanou.

Ele a impediu de chegar à porta entreaberta, entretanto.

— Calma, doutora... — Corey postou-se à frente de Melissa.

O cheiro de seu perfume amadeirado chocou-se em cheio com as narinas dela. Por um instante, a proximidade não esperada a deixou perdida, até que o olhar de Melissa foi atraído para os músculos do peitoral de Corey, que subia e descia no ritmo calmo de sua respiração. Então desceu ao abdômen definido, às entradas que apareciam, rodeadas pelo elástico de sua boxer à mostra. Melissa engoliu em seco e só levantou os olhos quando Corey pigarreou, chamando sua atenção com mais um "doutora", dessa vez em um tom irritantemente divertido.

— Pare de me chamar de doutora!

— Tudo bem, então... — as mãos dele agarraram sua cintura e a puxaram com força em sua direção. O chocar de seu corpo contra o dele foi uma sensação indescritivelmente maravilhosa. — Melissa... — Corey sussurrou em seu ouvido.

Sua voz rouca, aliada à sua respiração quente que bateu na pele abaixo do ouvido de Melissa, causou-lhe arrepios e tremores. Quando ele riu no mesmo tom rouco, deliciado com os efeitos que a ela tinha causado, Melissa sentiu os joelhos se aprontarem para virar gelatina.

— Vai sair daqui sem me dar um beijo de boa sorte? — dizia Corey, enquanto passeava o nariz do pescoço à clavícula de Melissa.

— Vai dar tudo certo... — Melissa sussurrou, a voz falhando. Seus olhos fecharam para que pudesse aproveitar melhor as sensações de formigamento em sua pele — Você não precisa de mim.

— É aí que você se engana... — Corey levou os olhos azuis a se cravarem nos acinzentados dela — Estou fazendo isso por você.

— Corey... Não diga isso. — A doutora pediu quando as mãos dele foram acariciar seu rosto — Você tem uma família esperando por você lá fora, tem o assassino de Barber que precisa pagar pelo que fez...

— Eu sei, eu sei... — ele sussurrou baixinho. E seu rosto aproximou-se do dela perigosamente. Melissa lutou para manter os olhos nos dele, ignorando seus lábios vermelhos e cheios que chamavam a atenção — Mas na vida sempre temos novas prioridades. É a você que eu vou dever minha liberdade, minha sanidade, minha honra... Que mais importa a um homem do que isso?

Corey abriu um sorriso pequeno, porém sincero, nos lábios. Os lábios que, em seguida, beijaram os de Melissa. Ela respirou fundo por um instante, o mesmo que levou para que a língua quente e macia de Corey adentrasse sua boca e trouxesse junto o gosto doce dele. Ansiosa, deixou que suas mãos ganhassem vida e agarrasem a nuca dele, puxando desesperadamente seu cabelo curto. Corey apertou mais sua cintura e a puxou para mais perto. Não havia qualquer distância entre eles. E não apenas fisicamente falando.

A sensação de formigamento e êxtase que deixava todo o interior de Melissa agitado e borbulhante, ela tinha certeza que o tomava também. A carga de sentimentos fortes depositada naquele ardente beijo era igualmente recíproca. Havia medo ali. Medo de que aquele momento talvez nunca mais voltasse a acontecer. Se desse tudo errado. Mas ao mesmo tempo, a esperança tomava a chama que incendiava seus corações. Força para acreditar que no dia seguinte Corey seria um homem livre eles tinham que ter.

Quando se afastaram, Corey acariciou o rosto de Melissa com tanto apreço e ternura, que a fez sorrir.

— Vai dar tudo certo... — sussurrou, jogando seu hálito quente no rosto dela.

— Assim espero. — Melissa apertou entre seus dedos a mão dele ainda postada em seu rosto, então deu as costas, lançando um último olhar, que significou o mundo.

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