Ao retornar à sala, direcionei um sorriso gentil para minha mãe, que parecia horrorizada com o que sua filha mais nova havia causado. Enquanto isso, Isadora permanecia de cabeça baixa, aparentemente arrependida pelo que fez à sua família. Ambas estavam sentadas no sofá, uma ao lado da outra, cercadas por velas.
Não seria surpresa se algum vizinho começasse a espalhar rumores sobre algum ritual de bruxaria em andamento.
— O amigo da Gabi vem ligar a luz daqui a pouco — informei, respirando profundamente.
— Por isso é bom termos amizade com todo mundo — minha mãe disse ao mesmo tempo que levantou-se e caminhou em direção à cozinha.
Se a senhora soubesse para quem o Dinho trabalha, talvez mudasse de ideia.
— Podemos conversar, Isa? — questionei, me aproximando da minha irmã caçula e me ajoelhei na sua frente. — Desculpa ter te batido, mana. Eu não deveria ter perdido a cabeça contigo.
— Eu acho que merecia bem mais, Lia. — A garota me encarou envergonhada.
— Não, não merecia. — Fiz carinho no seu rosto. — Você é praticamente uma criança e a minha obrigação é cuidar do seu bem-estar.
— Você desistiu do seu sonho de abrir um salão de beleza para trabalhar naquele bar sujo, apenas para que eu não precisasse trabalhar e pudesse fazer as aulas de teatro.
— Sou sua irmã mais velha e é a minha função cuidar de você, mas ainda quero entender o seu motivo pra roubar o dinheiro das nossas contas, porque eu teria dado um jeito de comprar qualquer coisa que você pedisse.
Isadora olhou em direção à cozinha e ao constatar que a nossa mãe estava longe o bastante para não ouvir a sua resposta, ela voltou a sua atenção para mim.
— Eu usei o dinheiro pra fazer um aborto.
— Em alguma das suas amigas? — Franzi o cenho sem entender.
— Não, Lia. Eu fiz o aborto em mim.
Arregalei os olhos quando a Isadora fungou e começou a chorar.
— De quem você engravidou, Isadora?
— Do Fausto.
— Seu professor de teatro?
— Sim, ele.
Levantei-me completamente atordoada, mal conseguindo respirar.
— Ele não tinha como conseguir o dinheiro, porque a esposa controla todos os gastos.
— Meu Deus, ele é casado? Isso só piora a situação.
Caminhei de um lado para o outro, tentando processar os eventos alarmantes envolvendo Isadora, quando Gabriela me chamou abruptamente na frente de casa. Por alguns minutos, tive que deixar de lado o choque de descobrir que Isadora engravidou de um homem comprometido e abortou o bebê sem comunicar nossa família.
Não conseguia imaginar a intensidade da dor que ela enfrentou ao passar por algo tão sério e delicado completamente sozinha.
Ao abrir a porta, meu coração disparou ao me deparar com Gabriela e o Chorão. Meus olhos se arregalaram e a minha respiração falhou.
Não acredito que esse vagabundo saiu da cadeia e nem me mandou um "oi". Eu te chupei até você gozar na minha garganta, seu desgraçado! Sinceramente, homem não vale um real!
— Esse é o Dinho, irmão gêmeo do Chorão, amiga — Gabriela apresentou o homem ao seu lado e soltou uma risada ao ver a minha cara de assustada.
Demorei um pouco para assimilar que eram pessoas diferentes, porque a única diferença que conseguia notar naquele momento era que o cabelo do Chorão era preto e o do Dinho era loiro platinado, parecendo uma paquita da Xuxa.
— Ah, eu sou a Emília. — Trocamos um aperto de mão rápido e ele lançou um sorriso amigável para mim.
— A garota que o Chorão quer contratar pra fazer as visitas íntimas pra ele! — Ele deu um sorrisinho malicioso.
— Vocês precisam de alguma coisa pra poder ligar a luz? — indaguei, mudando de assunto.
— Só uma escada, Emília — ele respondeu, mantendo a expressão maliciosa na face.
— Vou emprestar da minha vizinha. — Fiz menção de atravessar a rua, mas parei ao ver o GV vindo na nossa direção.
Não acredito que esse homem veio junto!
— E aí, Emília? Quanto tempo! Já tem dezoito anos?
— Esquece essa história, por favor.
— Ué, que história? — Dinho se interessou em saber.
— Essa bonitinha foi pra um baile funk há alguns anos e mentiu que era maior de idade só pra ficar comigo — GV expôs e me olhou como se quisesse me matar. — A mãe dela quase me matou quando descobriu.
— Em defesa da minha mãe, ela não sabia que você era traficante.
— E eu não sabia que a filhinha dela só tinha catorze anos.
— Enfim, águas do passado, não é mesmo? — Me desviei dos três e andei rápido até a casa da minha vizinha para emprestar a sua escada.
— Dona Ana?! — gritei ao chegar no portão e bati palmas. — Tem como a senhora emprestar a sua escada, por favor?
— Ô Emília, tá lá no quintal. — A mulher sorridente e baixinha apareceu. — Você pode ir lá pegar, minha querida.
Ana abriu o portão e ao ver os homens que estavam na frente da minha casa fez uma careta.
— Cortaram a energia lá de casa e eles vieram pra ligar — expliquei sem graça.
— Não sabia que vocês eram amigos, mas os dois devem gostar mesmo de você pra saírem da toca, porque quase não vemos nenhum deles pelas ruas.
— Eles são amigos da Gabi e acho que só o Chorão que evita ficar circulando por aí. — Entrei na casa e caminhei em direção ao quintal pelo corredor na lateral.
— É verdade. — Ana veio atrás de mim. — A primeira vez que eu vi o Chorão foi quando ele invadiu a sua casa pra fugir da polícia.
— Nem me lembra disso, dona Ana. — Dei uma risada nervosa.
— A sua família deveria processar o estado, Emília. Sua mãe não sai mais para lugar algum, nem mesmo para a igreja, e sua irmã vive triste pelos cantos. Um dia desses, a vi chorando no ponto de ônibus.
Engoli em seco ao perceber que a nossa vizinha tinha notado que a Isadora estava diferente enquanto eu e a minha mãe nem desconfiamos que tinha algo errado acontecendo.
— Vou pensar nisso, dona Ana.
Agradeci a ela, peguei a escada e voltei para a frente da minha casa com a culpa de ter sido uma irmã relapsa me corroendo por dentro. Como eu pude ser tão egoísta ao ponto de não notar que a Isadora estava precisando de ajuda?
— Essa serve, Dinho? — perguntei, mostrando a escada.
Ele confirmou com a cabeça, parecendo distraído com o celular em mãos.
— Tá trocando mensagens sacanas com a sua filhinha? — GV implicou.
— Ela não é minha filha! — Ele guardou o celular no bolso.
— Bom, ela diz que é!
— Ela é doida!
— Doida, mas você tava quase macetando a coitada quando fui te buscar.
Dinho fechou a cara e negou com a cabeça.
— Não fala dela, GV. Pode zoar comigo, mas não mexe com a Inaê.
— Tá bom, brother. Não tá mais aqui quem falou.
O Dinho subiu na escada e começou a mexer nos fios do poste.
— E aí, vai aceitar a proposta do Chorão? — GV puxou assunto.
— Óbvio que não — menti, descaradamente. — Não vou me prestar ao papel de me envolver com bandido.
— Mas não foi tu que chupou o Chorão pra ele se acalmar quando ele te manteve refém? — GV me explanou e a vontade de morrer veio junto com as suas palavras.
Senti meu rosto ficar quente pela vergonha do que fiz em um momento de loucura.
— Não acredito que ele te contou isso.
— É verdade? — Gabriela abriu um sorriso orgulhoso. — Não acredito que você me escondeu essa informação, Emília.
— Eu tava sob pressão e não me orgulho nenhum pouco do que fiz.
— Pelo menos, ele vai te pagar dessa vez — Dinho completou, arrancando risadinhas dos outros dois.
Mesmo eu não querendo aceitar a proposta do Chorão, sei que essa é a única solução rápida que pode me ajudar a resolver a minha situação financeira de uma vez por todas, porque o que eu vou ganhar em duas visitas íntimas é mais do que o suficiente para quitar todas as minhas dívidas.
Além disso, não posso deixar a minha família passar por necessidades e o jeito vai ser dar o braço a torcer e dormir com um bandido.
Que Deus me ajude a suportar essa barra que vai ser virar prostituta de um chefe de uma facção.
A história do Diego (Dinho) e da Inaê é Atração Ilícita.
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