Eu e Katara nos entreolhamos com incerteza.
-Vou ver o que aconteceu - digo me levantando e a ajudo a fazer o mesmo - pode ficar por aqui e continuar a treinar se quiser, aposto que não é nada de mais.
-Certo - ela toma mais um gole do chá e me devolve o copo - obrigada.
Com um aceno de cabeça me afasto, seguindo em direção do casebre que Aang acabou de entrar. Ao chegar perto, deixo os dois copos no chão da esquina e me aproximo da parede de madeira na intenção de ouvir a conversa.
-Quero parar de desperdiçar o meu tempo - a voz do garoto soa em um tom perplexo - já sei me agachar, respirar e sentir o sol! Quero saber atirar fogo com os meus dedos.
-Tive um aluno que não queria aprender disciplina. Apenas se preocupava com o poder do fogo, como usar para destruir os oponentes e eliminar os obstáculos no seu caminho. Mas o fogo é um fardo terrível de suportar. A sua natureza é consumir, e destrói tudo o que o rodeia se não tiver controle.
Paro de ouvir, encostando as costas na parede, entretanto não demora para que Aang saia da cabana sem perceber minha presença.
-Você não está pronto - chamo sua atenção.
-O que?
-Você não está pronto - forço minha voz a seriedade com um tom de certeza e dou um passo à frente - para a dominação. Devia escutar o mestre.
-Também vai dizer que tenho que ter cuidado?
-Quase - os cantos de meus lábios se erguem em um sorriso - sabe… dizem que o ar é o elemento da liberdade, a água é da mudança e a terra é a de substância, já o fogo… o fogo é poder, por isso ele tem como dobrador original os dragões, que são símbolos de proteção, sabedoria e poder.
-Aonde você quer chegar? - o garoto suspira, sua expressão mostrando curiosidade e impaciência. Eu aponto para a floresta o fazendo olhar e deixo de sorrir.
-Se você jogasse uma lufada de ar na floresta as folhas se mexeriam, se Katara jogasse água a terra absorveria, se algum dominador de terra arremessasse uma rocha uma árvore poderia cair e o solo se rachar mas não se moveria mais. Agora, se eu fizer uma chama, mesmo que pequena, e não a controlar, ela vai aumentar, se expandir e destruir - ele volta a me olhar - o fogo tem vida própria. Você parece ansioso para isso, só que não está pronto. Claro, ainda deve aprender as outras dominações, mas acredito que deveria escutar Jeong Jeong e aprender a conter - me aproximo dele e agora tento soar mais amigável - apenas uma dica, de dominador de fogo para outro, é sempre bom estar um passo à frente - vejo o garoto refletir.
-Você disse isso antes - ele muda de assunto de repente.
-O quê?
-”É sempre bom estar um passo à frente”, você disse a mesma coisa antes de entrarmos na cidade, é algum tipo de frase de efeito? - não consigo evitar a risada que solto, ainda confusa com a mudança repentina.
-Tipo isso, é algo que Jeong Jeong sempre me diz, acho que acabei tomando para mim.
-São próximos?
-Nos conhecemos a sete anos, ele me salvou, me treinou e cuidou de mim… só entre nós, ele é tipo o meu pai - pisco um olho para o garoto e me viro para sair - vou deixar você pensar no que eu disse - pego os copos que tinha deixado no chão e sigo adiante.
Após limpar e guardar os utensílios decido voltar a conversar com Katara. Vejo Jeong Jeong sair com um guarda, a garota está no mesmo lugar, agora conversando com Aang. Ele dobra os joelhos, respira fundo e a folha que ele estava segurando se transforma em fogo.
-Assim ele só vai aprender quando for tarde… - digo a mim mesma e acelero passo.
Katara se aproxima dizendo algo que não posso ouvir, o fogo cresce, mas o menino não parece se importar, o jogando como um malabari.
-Aang - o chamo, mas ele me ignora e tenta fazer um movimentos que dá errado. O fogo se expande para os lados, sem controle.
Sou rápida o bastante para entrar na frente de Katara, mas não o suficiente para intervir e parar as chamas, ela ergue os braços em defesa. Como consequência parte de minhas roupas queimam e a garota se curva, suas mãos estão feridas.
Com um movimento de mãos, ordeno para que o fogo se apague e ele me obedece.
-Katara - tanto eu quanto Aang nos abaixamos para tentar ajudar a garota ferida.
-Katara, sinto muito! - o menino se desespera. Não demora para que Sokka apareça preocupado com a irmã.
-Katara, o que houve? - sua preocupação se mistura à raiva e ele olha para o outro - o que você fez?
-Foi um acidente! Eu estava… Katara eu sinto…
-Disse para você não brincar com isso! Olha o que fez!
-Se acalmem - interfiro - vai ficar tudo bem. Venha Katara, a água gelada deve ajudar a parar de queimar - a ajudo a sair, apesar de estarmos do lado do rio, acredito ser melhor não estar perto de alguém até que se acalme.
A garota chora e se curva sobre o rio enquanto acaricio suas costas, tentando amenizar a situação demonstrando que estava a apoiando. Ao entrar em contato com a água vejo seus ombros relaxarem em alívio, a água brilha chamando nossa atenção, e quando ela volta suas mãos estão completamente curadas.
-Haan… que bom - não sei como reagir. Como um click ela vira para mim.
-E você? - começa a analisar onde fui supostamente queimada - não se machucou…?
-Não se preocupe comigo - seguro em seus ombros, finalmente deixando transparecer minha preocupação - você está bem? Melhor? Como fez isso?
-Habilidade de cura - o mestre aparece se juntando a nós, percebo que ele carrega duas bolsas - os grandes dobradores da Tribo da Água às vezes tem isso - ele iria continuar falando sobre, mas se levanta rapidamente olhando para o horizonte. Navios da Nação do Fogo estão se aproximando - vão, juntem seus amigos e fujam! - olho para Katara e me junto ao mais velho pronta para o ajudar na luta - você não ouviu? Eu disse para ir!
-Como assim? Não vou te deixar!
-Sabe que deve ir, você mesma disse, você pode ajudar o Avatar e ele pode te ajudar - ele me entrega as bolsas - já arrumei suas coisas e aí tem algo que eu deveria ter te dado a muito tempo. Agora vá! Realize seus sonhos e tome o que é seu por direito - ele instrui com urgência.
Novamente olho para a garota procurando o que fazer, ela estende sua mão em resposta. Lágrimas saem de meus olhos e em um impulso abraço Jeong Jeong, ele não hesita em retribuir.
-Obrigada - é tudo que consigo dizer em meio ao choro.
-Vamos nos ver de novo, algum dia - sinto ele me apertar, beijar minha testa em despedida e então me afastar.
Seguro a mão estendida de Katara a deixando me guiar para dentro da mata. A última coisa que vejo Jeong Jeong fazer é erguer uma muralha de fogo em frente a tropa que se aproxima até que saia de meu campo de visão.
À medida que adentramos cada vez mais na densidade da floresta o som de nossos passos ecoam mais alto, até que encontramos Sokka junto a Appa.
-Katara, tudo bem?
-Tudo. Temos que sair daqui, Kami vai com a gente. Onde está o Aang? - o garoto aponta em direção ao acampamento - certo, já volto - ela sai.
-Então… haan… bem vinda ao grupo… oficialmente - ele se embola nas palavras e sorrio em agradecimento, ainda triste com a despedida.
-Vamos - não muito depois a garota ressurge - pegamos Aang no caminho - e assim subimos no bisão voltando de onde viemos.
Quando chegamos o garoto já terminou o serviço. Os navios pegavam fogo e consigo enxergar Zhao em meio a isso.
-Tenha uma boa caminhada para casa! - o menino grita mergulhado na água. Ele volta para nós e com dois pulos chega a cabeça do animal, para então o guiar pelo ar.
-Espera, onde está Jeong Jeong? - pergunto.
-Ele desapareceu, todos eles desapareceram.
Voando pelos céus nos reunimos, formando um círculo.
-Aang, você está queimando - a garota é a primeira a perceber - deixa eu ajudar - ela se aproxima e pega um cantil, dominando a água para que cure.
-Puxa, isso é água boa.
-Quando aprendeu isso? - o irmão pergunta.
-Acho que eu sempre soube.
-Ah! Então obrigado por me curar esses anos todos - ele começou a fazer seu drama.
Peguei uma das bolsas que o mestre havia me entregado, ele disse que é algo que deveria ter me dado a muito tempo. Quando abro meus olhos arregalaram pela surpresa.
-O que é isso? - Aang pergunta ao se aproximar para ver, ignorando o drama do outro.
-Ovos - olho para o grupo que me olha de volta, confusos - são ovos de dragão.