Despertei com um estrondo vindo do quarto dos meus pais e ao olhar assustada para o lado, notei que a minha irmã caçula ainda dormia na cama ao lado.
Pisquei algumas vezes, tentando habituar a minha visão com a escuridão do lugar.
Sentei no colchão e olhei ao redor do pequeno quarto rosa, onde havia duas camas de solteiro, um guarda-roupa branco e uma cômoda da mesma cor de seis gavetas com espelho em cima que servia como penteadeira, procurando o motivo do barulho, mas tudo parecia continuar em ordem.
Isadora dormia profundamente com o fone de ouvido que deveria ser o que a impediu de escutar o barulho que veio lá de fora.
Através da janela de vidro que ficava ao lado da minha cama, vi que o céu ainda estava escuro e o relógio na tela do celular marcava exatamente quatro da manhã.
Mesmo apavorada, sentindo meu coração acelerado, decidi levantar da cama para ver o que estava acontecendo e caminhei nas pontas dos pés em direção à porta do quarto.
Morávamos próximo a uma favela, o que tornava a área extremamente perigosa, e o medo era um sentimento presente quase todos os dias das nossas vidas, porque a paz tornou-se algo raro nos últimos meses desde que a Facção dos Magos, mais conhecida como FDM, tomou a posse do Complexo Cascavel.
Passei pelo pequeno corredor e ao chegar próximo ao quarto dos meus pais, percebi que a porta estava aberta e o meu pai arrumava a sua mala com pressa.
— Você vai deixar sua família por uma puta? — minha mãe sussurrou, segurando seu braço.
— Ela tá esperando um bebê, Maria Lúcia! Você quer que eu faça o quê? Abandone uma grávida?
— A Emília e a Isadora precisam do pai, Oswaldo!
— A Emília tem dezoito anos e a Isadora está prestes a completar dezesseis. Elas sabem se virar muito bem sem mim…
Meu pai trabalhava como caminhoneiro, por isso vivia se envolvendo com prostitutas mais novas que ele e muitas vezes preferia gastar dinheiro com elas do que ajudar nas despesas da nossa casa.
Sinceramente, é um alívio saber que vamos nos livrar completamente da sua presença, porque o homem quase não aparecia em casa e quando ficava mais de uma semana sempre arrumava brigas com a minha mãe, o que fez com que eu e a Isadora tivéssemos uma criação em um ambiente tóxico.
Não foi uma, nem duas vezes, que o flagramos batendo na nossa mãe e qualquer amor que sentíamos por ele foi morrendo aos poucos.
Pode parecer ruindade da nossa parte, porém não tem como um amor resistir a tantas decepções.
— Mãe? — Adentrei o quarto dos dois e o meu pai arregalou os olhos ao me ver, pois sabia que eu era a única que o enfrentava dentro daquela casa. — Vem aqui comigo. — Segurei seu braço e a puxei para a cozinha.
Coloquei água em um copo e acrescentei duas colheres de açúcar para ver se ela se acalmava.
— Toma, mãe. — Entreguei o copo na sua mão.
A mulher tremia da cabeça aos pés quando sentei ao seu lado.
— Por que vocês estão brigando de novo? — Isadora perguntou ao entrar na cozinha e ver nós duas sentadas à mesa na cozinha.
— Ele engravidou outra — respondi, suspirando.
— Coitada da criança. — Minha irmã bocejou e sentou-se ao nosso lado. — Vai sofrer igual a uma condenada.
— Mas acho que ele vai embora de uma vez por todas e espero que a próxima notícia seja o enterro — disse, esperançosa.
— Não fale desse jeito do pai de vocês, Emília. Ele pode ter todos os defeitos do mundo, mas ainda é o homem que escolhi casar e vocês ainda são filhas deles.
— A senhora tem todo direito de ficar triste, mas não peça que a gente sofra junto, porque só nós duas sabemos o que passamos todos esses anos vendo ele ficar agressivo por qualquer motivo — Isadora rebateu.
— É, mãe! Antes sozinha do que mal acompanhada — completei, suspirando aliviada ao ouvir a porta da frente ser batida.
— Nós vamos ficar bem. — Isadora levantou-se e abraçou a nossa mãe.
— Prometo que vou cuidar de você e da mamãe.
— Você só é dois anos mais velha que eu, Emília — minha irmã lembrou, revirando os olhos.
— Mas eu tenho dezoito anos e já posso beber cerveja, segundo as leis brasileiras, enquanto você só pode tomar suco de laranja.
— Você só pensa em álcool, garota! — Ela se solta da nossa mãe e vem na minha direção para me dar um um tapa de leve na orelha.
— Pior é você que fica escrevendo livros de putaria na internet.
— Eu escrevo sim, mas não fico pensando em dar para o próprio patrão igual a você.
— Óbvio, Isadora! Você nem trabalha!
— Eu tô é feita com duas filhas safadas! — A nossa mãe deu uma risadinha forçada, segurou o copo quando ergueu seu corpo trêmulo da cadeira e caminhou com dificuldade até a pia.
— Ué, eu não posso fazer nada se nasci assim, mamãe — brinquei, tentando distraí-la.
— Agora, somos só nós três, meninas. — Minha mãe cobriu o rosto com as suas mãos e começou a chorar.
Eu e Isadora olhamos uma para a outra por alguns segundos e fomos em direção a nossa mãe para abraçá-la.
Éramos bastante parecidas fisicamente, porém as nossas personalidades eram completamente distintas.
[...]
Esperamos a nossa mãe se acalmar para colocarmos ela de volta na cama e eu decidi que iria dormir no seu quarto para lhe fazer companhia, porque não achei que pudesse ser uma boa ideia deixá-la sozinha.
Fiquei fazendo cafuné até vê-la cair em um sono profundo e saí do seu quarto para limpar a casa e preparar o café da manhã.
Morávamos de aluguel em uma casa com apenas quatro cômodos e um banheiro, o que deixava as tarefas domésticas do cotidiano bem fáceis de serem realizadas.
A minha mãe era costureira e eu trabalho em um bar na entrada da favela Cascavel enquanto a Isadora apenas estuda, afinal, ela só tem quinze anos.
Enquanto limpava e organizava o sofá e a estante da sala de estar, encontrei um vaso quebrado ao lado da mesinha de centro e descobri o motivo do barulho de madrugada.
Na cozinha, havia apenas uma mesa de granito com quatro lugares, uma geladeira, um fogão e duas caixas organizadoras que usávamos para guardar os talheres, pratos e outros utensílios de cozinha, porque o armário havia quebrado há meses e ainda não tivemos dinheiro para comprar outro.
Depois que fiz o café da manhã, deixei tudo brilhando para a minha mãe não ter o que se preocupar e fui acordar a Isadora.
Enquanto a minha irmã tomava banho, dei uma olhadinha no quarto da nossa mãe e ela ainda estava adormecida e pude tomar o meu café da manhã sem preocupações.
[...]
— Me leva até o ponto de ônibus, mana? — Isadora perguntou ao me ver sentada no sofá mexendo no celular.
— Levo sim, só espera eu escovar os dentes e ajeitar o meu cabelo.
Meu coração estava apertado como se algo ruim fosse acontecer e a ideia da minha mãe tentar se matar por causa do meu pai não saia da minha cabeça.
Liguei para o Arthur, o meu chefe, para explicar o que aconteceu e ele liberou que eu trocasse meu turno com a minha amiga para que a Isadora fizesse companhia para a nossa mãe enquanto eu estivesse fora.
[...]
Estávamos chegando no ponto de ônibus quando conseguimos ouvir tiros sendo disparados próximo ao local onde estávamos e corremos em direção pelo caminho que viemos.
Não era a primeira vez que um tiroteio acontecia à luz do dia e infelizmente, não seria a última vez que estaríamos no fogo cruzado.
Para a minha surpresa, ao chegarmos em frente a nossa casa, a porta estava aberta e eu arregalei os olhos ao perceber que alguém poderia ter invadido.
Pelo nervosismo da situação, a Isadora não se atentou a esse detalhe e entrou na nossa casa tão rápido que eu não consegui alertá-la do perigo.
A minha única reação foi correr atrás dela.
Meu coração acelerou e a minha respiração falhou ao ver um homem com uma arma apontada para a cabeça da minha mãe enquanto ela chorava.
— Fecha a porta e não gritem ou vocês vão dar adeus a ela — ele ameaçou.
— Por favor, não faça nada com as minhas filhas — nossa mãe implorou, chorando ainda mais. — Elas não têm culpa de nada.
— É só vocês calarem a porra da boca que todo mundo sai com vida daqui ainda hoje.
Definitivamente, esse é um dia complicado para a nossa família.
Eu não mudei nada no primeiro capítulo, mas vou detalhar a parte do sequestro e mudarei alguns acontecimentos. Não esperem nada saudável como uma salada, mas também não esperem nada tão tóxico como uma Coca-Cola.
Se quiserem, me sigam nas redes sociais e interajam nem que seja curtindo os stories. Se não quiserem, tudo bem, talvez eu não queira continuar o livro... Brincadeira, brincadeira KKKKKK