- Brenda Narrando -
Alguns dias se passaram desde que a Lara acordou e ela não passou por outras intercorrências porém não consegue se comunicar com a gente e ainda está bem confusa em relação a tudo. O Marcelo que estava com as emoções no limite pela Lara, agora estava pior e o tempo todo eu pegava ele chorando ou olhando para algum ponto de forma vaga e isso era bem explicável já que a minha sogra piorou muito nos últimos dias. O médico da Lara marcou uma reunião essa manhã e eu já estava agoniada querendo saber o que ele tinha pra falar.
- Preciso que vocês entendam o quadro da Lara e irei explicar da forma mais simples - o médico começou a falar e eu assenti, olhei de lado para o Marcelo e vi o mesmo super concentrado - Como eu suspeitei a Lara está com um quadro de afasia global que é a perda de toda a capacidade de compreender a fala, a escrita ou linguagem - deu uma pausa e arregalei os olhos - Ela até solta algumas palavras mas com dificuldade, ela não consegue formular frases e não se lembra de nomes de objetos. Ela tem a palavra em mente porém ao tentar falar não consegue. Entendem?
- Sim, entendemos - Marcelo falou e me olhou, apenas confirmei com a cabeça - E qual o plano a seguir?
- Tratamento com neuropsicólogo e fonoaudiólogo, os profissionais precisam avaliá-la e quando ela tiver condições os tratamentos serão iniciados de forma rápida - falou e eu coloquei o cabelo atrás da orelha - Quanto mais rápido começar o tratamento é melhor
- O meu filho e o meu genro falaram que ela não se lembrou do namorado, ela sabe quem é porém não se lembra dele - falei e segurei a mão do Marcelo - Ela tá com amnésia?
- Não, ela não está - negou e respirei aliviada, já li que alguns tratamentos sempre possuem eficácia maior se o paciente estiver cercado de pessoas do convívio e se ela não lembrasse seria complicado - A Lara está confusa, ela se perde em relação ao tempo, em alguns momentos não lembra quem são as pessoas ou chega lembrar mas não sabe o nome e já esperávamos isso - explicou - É muito provável que ela não se lembre do acidente e nem desses primeiros dias acordada
- Se for pra esquecer algo que seja esse evento ruim, né? - falei e o Marcelo concordou com a cabeça - São essas as sequelas ou tem mais alguma coisa?
- A Lara esqueceu funções básicas - começou a falar e o meu coração disparou - Não consegue engolir, não sabe como segurar um talher - deu uma pausa - Para efeito de comparação é como se ela tivesse voltado a ser bebê e precisasse reaprender tudo que o cérebro esqueceu, e ela precisará de muita fisioterapia pra se lembrar de como andar, subir um degrau, segurar um garfo
- Meu deus - sussurrei e senti o Marcelo apertando a minha mão - O senhor sabe mais ou menos o tempo de recuperação total?
- Olha, eu estimar com certeza seria um erro porque a recuperação depende de muitos fatores mas levando em consideração a paciente acredito que em 3 meses a afasia não será um problema - falou e eu assenti - E a parte motora de 6 meses a 1 ano
- Tudo bem - Marcelo balançou a cabeça - Eu quero os melhores profissionais cuidando da minha filha, não importa o preço e não importa de onde ele venha, eu quero que ela continue tendo o melhor tratamento
- Ela terá - garantiu e eu suspirei
- Gabriel Narrando -
Eu precisava ocupar a minha cabeça de alguém forma e a forma que eu encontrei foi aceitar uma reunião, o caso era super simples pois o MP não tinha provas e estava tentando uma confissão do meu cliente, coisa que não aconteceria. Quando saí da reunião a minha secretária avisou que o Ricardo, investigador aqui do escritório, estava me esperando na minha sala.
- O que descobriu? - perguntei e fiz um toque com ele
- Tudo - falou simples - Filho de peixe, peixinho é
- Como assim? - perguntei confuso e ele me entregou uma pasta
- O pai já se envolveu em acidente e pelo descobri ele vive bêbado por aí - contou - Playboy classe média e que vive fazendo merda, sabe? E os pais passando a mão na cabeça, confusões bêbado e acusação até de agressão a uma ex-namorada - deu uma pausa - Eles até tentaram subornar os médicos pra falarem que o garoto não estava bêbado
- A ficha que ele está cultivando é linda - ironizei e ele riu
- O pai tem uma dívida imensa com um fornecedor e deu a casa da família e o restaurante como garantia - falou e eu li por cima sobre a dívida, virei a página e li a cópia do contrato o que me fez sorrir
- Me deu uma vontade de investir em distribuição de alimentos - falei sorrindo
- Hartmann - alertou negando com a cabeça
- Executa a dívida - falei simples
- Precisa disso, Gabriel? - perguntou sério - Quem fez a merda foi ele e não os pais, você vai tirar a casa e a fonte de renda deles
- Se eles não tivessem passado a mão na cabeça dele não estaria fazendo isso - falei sério - Enquanto eles se importavam em encobrir o filho, tentar subornar os médicos a minha namorada estava lutando pra viver e tendo a porra da cabeça aberta o tempo inteiro - senti a minha mão tremer, abri e fechei pra aliviar a tensão - Tem noção que tiraram uma parte do crânio dela e o alojaram no abdômen?
- Ok - engoliu a seco - Ainda hoje te mando os papéis e você será o novo dono da distribuidora e também da dívida
- Obrigado - falei e nos despedimos, sai da minha sala um pouco depois e tomei um susto ao ver a Estela
- Gabriel - sorriu e veio na minha direção - Soube do seu acidente e fiquei tão aflita, fiquei com o coração apertado e até fui te visitar mas acredita que quando cheguei lá o seu pai disse que era pra eu ir embora? - falou e eu fiquei surpreso - Ele disse que de todas as pessoas do mundo eu seria a que menos você queria receber - contou e sorriu fraco - Tentei explicar que nós somos amigos, que tínhamos uma história só que até a sua mãe me mandou embora
- O que você está fazendo aqui? - perguntei direto
- Eu vim pra uma reunião com o Peixoto, preciso que ele olhe um caso meu e - estava falando mas resolvi interromper
- Ele não vai te ajudar e você sabe disso - falei e ela revirou os olhos
- Não custa tentar - sorriu - Lembra que a minha cara tristinha consegue qualquer coisa? Ou um sorriso um tanto sugestivo
- É mesmo? - ri em deboche - Vai fazer carinha triste pro promotor também? Abrir um botão da camisa? Ah, vai abrir as pernas? - mal terminei de falar e ela tinha os olhos arregalados
- Você está me ofendendo - falou séria - Tá achando que eu sou o quê?
- Uma péssima advogada - falei irritado - Não é capaz de resolver um caso sozinha porque resolveu manter a carteirinha na gaveta ao invés de estudar, né? E se engana quem pensa que essas ajudas que você pede aos outros é pra coisa complicada mas não, não é, Estela, qualquer um dos patetas que estagiam pra mim resolveriam os seus casos sem nem pensar direito e você simplesmente não faz ideia de como começar e prefere culpar ao mundo do que olhar pra realidade e se dar conta que você é uma pessoa profissional - os olhos dela ficavam cada vez mais arregalados e me dei conta que já tinha inúmeras pessoas observando mas eu não estava nem aí
- Você não tem o direito de falar assim comigo - falou e limpou rapidamente uma lágrima que escorreu
- E você não tem o direito de vir perturbar os outros por conta da sua incompetência - falei alto - Invés de ficar tentando se jogar pra cima de mim senta a porra da bunda em uma cadeira e vai estudar
- S-seu babaca - tentou me bater mas fui mais rápido e segurei a mão dela
- É isso que vai fazer quando um promotor te detonar na frente de várias pessoas? - ri em deboche - Meus parabéns, Estela, é mais fraca do que eu pensava
- Idiota - tentou vir pra cima de mim mas seguraram e quando olhei era um segurança
- Ei, vem comigo agora - Andrade se aproximou e me segurou pelo braço, me puxou e quando eu vi estava dentro do elevador - Se acalma, caralho! Respira com calma - travou o elevador e eu tentei fazer o que ele mandou mas estava difícil
- Não consigo - falei baixo e ele segurou meus ombros
- Consegue sim - falou firme e eu fechei os olhos mas só me vinha a Lara em mente e isso piorava a minha situação
- Caralho - coloquei a mão no meu peito e apertei ao sentir um aperto no coração
- Vem - chamou e eu nem tinha me dado conta que o elevador voltou a funcionar, ele me tirou do elevador e quando reparei já estava na sala do meu avô e fiquei surpreso ao ver o meu pai
- O que foi? - meu pai perguntou rápido e o Andrade me levou até um sofá
- Um bate boca com a filha do Sponza - contou e meu pai se ajoelhou na minha frente
- Respira devagar - soltou a minha gravata e abriu os botões do colarinho
- A Lara - funguei - Eu fui mais cedo no hospital e ela não consegue nem beber água, pai - solucei - Mandei o Ricardo investigar e acredita que os pais do cara até tentaram subornar os médicos pra não falarem que o filho da puta estava bêbado - ele limpou o meu rosto e as lágrimas desciam sem parar - A Lara vai precisar aprender como se vive, e tudo porque alguém achou que seria legal pegar um carro com a cara cheia
- Ela vai se recuperar, campeão - falou e solucei - Ela vai reaprender tudo e em breve estará pronta pra ser completamente feliz novamente
- Mesmo assim, pai - respirei fundo - Ela tá sofrendo e eu conheço a Lara, ela vai sofrer quando descobrir as limitações - neguei com a cabeça - Ela é bailarina, ela ama dançar e agora não lembra como se anda
- É uma fase muito ruim, é injusto ela pagar pelo erro dos outros - deu uma pausa - Porém agora o que nos resta é focar na realidade, campeão, e pra você ajudar a sua namorada precisa estar bem
- Eu estou bem - falei e ele negou
- Eu vou te levar pra casa, você vai tomar um banho e vai descansar - falou sério - Você não tem dormido e quando cochila acorda pouco depois e fica andando pela casa
- Como você - estava falando mas ele me interrompeu
- Ah, eu e a sua mãe não conseguimos dormir muito bem sabendo que você não está bem - falou simples - E ouvimos passos no corredor
- Entendi - falei e ele me abraçou
- Precisa conversar com o Sponza e avisar sobre essa maluca da filha dele - escutei a voz do Andrade - Ela vive vindo aqui pedir reunião e quando vai vê é ajuda em caso, no mínimo no escritório do pai ninguém quer ajudar por motivos óbvios
- Eu vou acabar com a carreira dela - meu avô falou simples
- É uma boa opção - Andrade falou simples e meu avô se sentou ao meu lado, segurou a minha mão e logo apertou