- está entregue,madame - acordei do meu cochilo assim que Jonathan estacionou, eu havia caído no sono no caminho de volta pra casa. Me aconcheguei ainda mais no ombro de kauane, queria aproveitar mais alguns instantes assim
Kauane- luck, acorda - gostava de quando ela me chamava assim
Ela me chama de sorte, mesmo o sortudo sendo eu por a ter
Lucas- só mais 5 minutos - me esfreguei como um gato manhoso contra a curva do seu pescoço
Kauane- para de enrolar, vamos - ela desceu do carro e ficou me esperando para entrarmos
Jonathan- posso te levar até sua casa, se quiser - ele se virou para mim, fiquei pensativo por alguns instantes de modo que ele franziu a testa
Não tinha para onde ir, era irônico pensar que nunca considerei algo material como meu lar, sempre pensei que kauane fosse a coisa mais próxima que tinha desse conceito. Mesmo após anos no orfanato nunca me senti acolhido por aquelas pessoas, na verdade eles nunca me acolheram.
Olhei através do vidro e observei o pequeno ser que me esperava pacientemente do lado de fora
Jonathan- desculpa, falei algo de errado?
Sua voz me tirou dos meus pensamentos, virei meu foco para ele e lhe lancei um sorriso triste
Lucas- não, só tava pensativo
Embora Jonathan seja intrometido em grande parte do tempo dessa vez ele não foi, acho que ele notou que havia algo mais em minha resposta, pelo jeito que me olhou sabia que ele fazia um grande esforço para não soltar sua língua
Jonathan- até amanhã então - ele se virou para frente dando fim a nossa conversa, desci do carro e fui até a kauane
Lucas- sua mãe tá em casa? - notei a luz da sala ligada, tudo oque queria era um banho quente, uma cama macia para se deitar e minha dama ao meu lado
Kauane- pelo jeito tá - ela olhou para trás vendo a janela
Lucas- acho melhor eu não entrar agora
Ela me olhou confusa quase como se eu tivesse falado uma língua estrangeira
Kauane- qual o problema? Minha mãe te adora
Lucas- eu também amo ela mas seria estranho eu tomar banho na sua casa uma hora dessa
Só não quero ser um incômodo
Kauane- não vejo problema nenhum
Lucas- não quero que ela pense que sou um sem teto
Coisa que praticamente sou, eu só queria dar uma boa impressão pra ela...
Kauane- para de falar besteira, vamos. Oque há de errado em um amigo tomar banho na sua casa?
Lucas- e-eu não sou só seu amigo - era estranho falar aquilo em voz alta, senti uma onda de calor tomar meu corpo e minhas bochechas queimarem em chamas - eu volto mais tarde
Merda, porque eu tô fugindo?
Sem dar chance dela falar qualquer coisa saiu em disparada em uma direção aleatória, me sentia um idiota por isso. Deixei meus pés me guiarem sem rumo, caminhei sem pensar pelas ruas e apenas me distrai com o que acontecia em minha volta. A alguns quarteirões de distância da casa de kauane me sentei na calçada e observei a vida das pessoas
As vezes invejo as pessoas que tem vidas normais, do tipo que tem pais amorosos, um teto sobre a cabeça e uma cama confortável para dormir. Os invejo porque sei que por mais que eu tente, nunca terei uma vida normal. Esse é o sentimento que tenho, por mais que o reprima ele é persistente
Que deprimente
Riu do meu próprio pensamento, as pessoas que passam por mim me olham como se eu fosse um louco
Se elas soubessem da metade da história, teriam certeza
Um carro para na minha frente, me levanto já imaginando quem era
- o programa tá quanto? - a voz bem humorada de Jonathan quebra meu clima depressivo, me aproximo do vidro abaixado e me apoio na porta
- toda sua herança já basta - sorriu sem muita emoção
Jonathan- entra ai vai - o obedeci sem hesitar ou pensar muito, não tinha muita escolha a não ser o obedecer
Lucas- o que faz por aqui? - coloquei o cinto e me recostei no banco
Jonathan- tive que passa em um lugar pra pegar uma coisa - notei seu maxilar tenso, ele mantinha seus olhos atento a rua e a maneira que falou dizia que não falaria mais que aquilo - e você?
Não sendo um cadáver eu agradeço
Lucas- parei pra pegar um ar - sorri tentando esconder os cenários que se passavam em minha cabeça
Jonathan- pensei que ia dormir na kauane - ele ligou o carro e seguiu rumo ao desconhecido
Lucas- eu vou - um sorriso de orelha a orelha apareceu em meu rosto, era automático quando se tratava dela
Jonathan- tira esse sorriso irritante da cara - ele bufou igual a um boi raivoso
Lucas- a felicidade alheia incomoda tanto assim? - sua única resposta foi uma gargalhada - pra onde tá me levando?
Ele tirou os olhos da rua e com uma estranha felicidade sorriu para mim
Jonathan- minha casa - ele pisou fundo no acelerador me arrancando bons palavrões
Ele estacionou em frente a uma mansão de tirar o fôlego, me sentia mais pobre do que o normal
Jonathan- vai fica ai olhando ou vai entrar? - ele desceu do carro sem esperar minha resposta
Havia um caminho de pedra iluminado que nos guiava até o hall de entrada, a cada passo me sentia minúsculo em comparação com o tamanho exagerado da casa. O único contraste com o branco da casa era a grama perfeitamente verde e bem cuidada
Lucas- casa maneira - falei quando o alcancei, ele parou e digitou uma senha na porta
Esse é o Tony stark da shopee?
Jonathan- essa não é minha casa
Lucas- porfavor, não me diz que você tá invadindo uma mansão de um estranho - fechei os olhos e cruzei os dedos
Jonathan- não idiota - sua risada me tranquilizou - essa é minha casa de festas
Soltei o ar que nem havia notado que prendia
Rico tem cada frescura
Lucas- que tipo de pessoa tem uma casa só pra dá festa? - a indignação era palpável em minha voz
Jonathan- Eu? - ele abriu a porta e deu espaço para eu passar - mi casa, su casa
O chão de mármore branco estava impecável a ponto deu ficar com pena de pisar sobre ele, o lugar era uma mistura de salão de festa e uma sala de estar, havia pouca decoração oque fazia tudo parecer mais vazio e sem vida. Os poucos móveis que tinham era de um preto fosco chamativo
Até quem fim alguma cor nesse lugar
Jonathan- vem, os quartos ficam no segundo andar - ele passou por mim e foi em direção a grande escadaria, o segui calado
Jonathan- fica a vontade, tá bom? - ele parou em frente a uma das portas, presumi que ali era seu quarto. Ele abriu a porta já jogando sua mochila no chão e foi correndo se jogar na cama
Seu quarto parecia desintonizado com o resto da casa, suas paredes eram pretas e seus móveis de um tom de madeira escura, havia estantes de livros e algumas fotografias em preto e branco na parede, essas com cenas eróticas e um tanto quanto vulgares. Ao me dar conta do conteúdo por vergonha ignorei sua existência
Jonathan- bora joga uma sinuca?
Me sentei na cama ao seu lado
Lucas- sério que você tem uma sinuca só pra você?
Jonathan- Aham, mas não tem graça joga sozinho - ele se levantou e saiu andando - vem
Ele fez um pequeno resumo de onde se localizava cada cômodo da casa enquanto me guiava até a sinuca
Lucas- confesso que já esqueci tudo - ele passou seu braço por cima do meu ombro e soltou uma gargalhada
Jonathan- qualquer coisa é só me perguntar
Ele abriu uma porta de vidro que dava acesso ao quintal da casa, ali era o típico espaço de lazer mas a decoração era sofisticada e minimalista. A mesa de bilhar ficava no canto oposto da churrasqueira
Jonathan- tá preparado pra perder?
Lucas- não conheço o sabor da derrota - ele me arremessou um taco e começou a arrumar a mesa
Jonathan- primeiro as damas - ele disse após organizar as bolas e escolher um taco cuidadosamente
Lucas- não adianta escolher demais, você vai perder do mesmo jeito - dei uma tacada com toda a força, as bolas foram para todos os lados se espalhando, duas caíram no buraco - exatamente como planejei
Jonathan- sorte de principiante - ele foi até um mini frigobar perto da churrasqueira e tirou duas cervejas de lá dentro - quer?
Lucas- não, valeu - dei outra tacada mas dessa vez nenhuma bola foi encaçapada - merda....
Jonathan- falei que era sorte de principiante, não se frustre tanto - ele deu um gole na cerveja e logo em seguida fez sua jogada - devo pegar leve com você?
Lucas- jamais - no instante que essa palavra saiu da minha boca, ele encaçapou uma bola
Jonathan- de qualquer forma eu não iria mesmo - lá estava seu habitual sorriso irritante
Lucas- não sou dentista, pare de sorrir e joga logo - me recostei em uma coluna próxima e observei mais atentamente o quintal
Jonathan- que tal melhorarmos o jogo?
Lucas- não me venha com body shot - fiz cara de repulsa ao imaginar a cena em minha mente, Jonathan explodiu em gargalhada
Jonathan- sério que isso é a primeira coisa que passo na sua mente? - apenas concordei com a cabeça- cara, você é um pevertido
Lucas- vindo de você só espero o pior - fui até ele e dei um gole em sua cerveja, o líquido gelado agradou meu paladar - o que ia sugerir então?
Jonathan- um jogo de perguntas e respostas - ele deu uma tacada de qualquer maneira- Viu?, nada de lamber bebida no corpo um do outro luquinhas - ele bagunçou meu cabelo e se afastou da mesa
Lucas- você falando assim me sinto um pevertido mesmo - por pura sorte encaçapei outra bola
Jonathan- talvez porque você seja um - ele deu de ombros e riu - vai querer jogar?
Lucas- claro, mas terá um castigo né?
Talvez eu me arrependa disso mais tarde
Jonathan- se não responder vai ter que beber
Lucas- tá bom
Cerveja desce igual água, jogo fácil
Jonathan me deixou sozinho e foi até a cozinha, quando voltou segurava uma garrafa de gin empolgado
Lucas- pensei que íamos beber cerveja
Jonathan- mas aí não teria graça - ele colocou dois copos na beira da mesa e encheu cada um com um dedo de gin
Lucas- você começa - dessa vez errei todas as bolas e por pouco quase encaçapei a bola branca
Jonathan- você não é daqui né?
Lucas- sou, só não costumo sair muito - penso cuidadosamente em que palavras usar, não queria revelar muito da minha vida pessoal - porque essa casa é tão sem cor?
Jonathan- também não gosto disso, esse branco me lembra de hospital - ele dá um sorriso triste - mas meu pai insiste em deixar tudo como estava antes
Lucas- antes do que? - deixo a curiosidade falar mais alto
Jonathan- não é sua vez de perguntar, para de roubar- ele sorri e se posiciona para dar sua tacada - oque sabe de mim?
Lucas- não muito - minto - sei oque dizem por ai
Jonathan- É oque dizem? - ele encaçapa outra bola
Lucas- não é sua vez, já respondi- ver sua cara de indignação me arranca um sorriso - essas perguntas tão muito fracas
Jonathan- então faça uma melhor
Lucas- as fotografias no seu quarto - antes que eu pudesse terminar minha pergunta ele já ia em direção ao copo - nem terminei minha pergunta e já desistiu?
Jonathan- é embaraçoso falar delas - ele deu de ombros
Lucas- como as conseguiu?
Jonathan- eu estou nelas então foi quase como um presente- quase tive que recolher meu queixo no chão
Então o homem que está nelas é Jonathan, quem será a mulher?
As fotografias mostravam apenas partes dos corpos de um casal em seu ápice de amor, era vulgar mas não monstrava nudez explícita
Lucas- não sabia que era modelo
Jonathan- não sou, embora minha beleza sirva perfeitamente pra isso - revirei os olhos diante de tanta baboseira
Lucas- fico imaginando como deve ter sido estranho fingir aquelas cenas - ele riu do que falei
Jonathan- não estávamos fingindo - ele pareceu pensativo, quase como se as lembranças daquele dia viessem a mente - não gosto de pensar nela... quer dizer, nelas, nas fotografias
Ele ficou sem jeito oque foi engraçado de se ver
Lucas- claro, nas fotografias - apenas fingi acreditar que ele se referia a elas - sua vez
Jonathan- quem foi seu primeiro amor?
Lucas- achei que fosse óbvio - soltei um sorriso bobo e andei até meu copo intacto de gin - Ao meu primeiro e único amor - levantei o copo e o tomei em um único gole
Jonathan fez o mesmo - A minha musa - ele virou o copo e logo em seguida já o enchia novamente
Lucas- se refere a garota da foto? - dessa vez ele encheu seu copo bem mais do que um dedo - não exagera na bebida tá bom?
Nesse ritmo vou acaba virando babá no fim da noite
Jonathan- qual o lugar mais inusitado que você já transou? - ele me ignorou totalmente
Na sua escola....
Essa resposta veio na ponta da língua mas apenas fiquei com ela na mente, aquele momento será eternamente apenas meu e de kauane
Nosso eterno segredo
Lucas- essa eu passo - tomei mais um gole, a bebida já não descia tão bem - e você?
Jonathan- capô da bmw
Lucas- eca, me lembre de nunca encosta naquele capô - ele soltou uma gargalhada engraçada
Jonathan- se você soubesse de todos detalhes garanto que não se esqueceria - ele deu outro gole na bebida
Lucas- prefiro ficar sem saber e me prevenir de traumas
Jonathan- prefiro fica calado, não quero leva outro soco - ele se sentou na mesa de sinuca, havíamos deixado de lado completamente o jogo - nunca te vi com um celular
Lucas- não tenho um
Jonathan- você é tipo aquele povo né?
Lucas- que povo?
Jonathan- os maias - apontei o dedo do meio pra ele - não me leva a mal, mas que tipo de adolescente não tem celular?
Lucas- eu?
Jonathan- você só pode ser um idoso
Lucas- sou só estranho mesmo - ele deu um sorriso fraco
Jonathan- isso não dá pra negar - ele se deitou na mesa de sinuca, olhei ao redor e vi uma árvore com uma casa nela
Lucas- por que você tem uma casa na árvore na sua casa de festa?
Jonathan- resumindo passei minha infância aqui - ele soltou um longo suspiro - fico imaginando o tipo de criança que você era
Lucas- eu era normal - bebi o que restava em meu copo e me sentei perto dele - do tipo feliz e encrenqueiro
Bom, não menti na parte do encrenqueiro
Jonathan- difícil imaginar isso - me deitei ao seu lado e fiquei olhando o teto
Lucas- É, eu sei - soltei um suspiro aliviado dele não querer saber mais sobre minha infância - mas a pequena já deu um jeito em mim
Jonathan- percebi, só falta ela coloca uma coleira em você
Lucas- não exagera - um sorriso involuntário apareceu em meu rosto
Jonathan- por mais que negue, você não esconde - ele se sentou e deu um gole na garrafa - você a ama
Senti um frio na barriga e a palma de minha mão começou a suar. Em minha mente veio a imagem de kauane e senti vontade de a ter por perto
Lucas- e tem como não amar? - ele permaneceu quieto e pensativo, desejei poder ler sua mente e o possível caos nela
Jonathan- tem razão - ele falou em tom de provocação - ela é incrível
Ela é mais do que só incrível....
Lucas- É, ela é.
Eu acrescentaria todo tipo de elogio possível, quando se tratava da minha pequena parecia faltar palavras para a descrever
Jonathan- fica a vontade pra me dar outro soco, bem forte dessa vez - ele deu um sorriso triste
Lucas- minha raiva já passo, por que eu faria isso?
Jonathan- eu mereço
Lucas- de vez em quando admito, to começando a achar que você é sadomasoquista
Jonathan- não é nada disso - sua gargalhada me fez abrir um sorriso fraco - ver vocês me lembra de uma pessoa
Lucas- quem?
Jonathan desceu da mesa e foi em direção a porta, ele acabou me deixando sem minha resposta e aguçando minha curiosidade
Eu havia acabado de sair do banho, ele havia me emprestado algumas peças de roupa de quando ele ainda era um "frango", odiava esses termos de academia mas por sorte sua roupa ficou perfeita em mim
Jonathan- tá com fome? - neguei com a cabeça- problema seu, fiz lanche pra você
Ele segurava um prato e um copo de suco, os peguei contra minha vontade
Jonathan- come vai - ele se sentou na cama e ficou me observando, quase como se esperasse minha aprovação. Dei uma mordida no pão
Lucas- Huuum, esse é o melhor pão com... creme de amendoim que comi em toda minha vida - ele ficou feliz e saiu do meu pé, me deixando sozinho para ir tomar banho
Jonathan- toma- ele me jogou o controle- escolhe algo ai pra gente
Me joguei na cama e procurei pelas fotografias mas para minha surpresa elas não estavam lá
Ele tirou elas daqui enquanto eu tomava banho?
Deixei essa pergunta pra lá e esperei ele sair do banho, me entreti com minha tarefa
Jonathan- eai já se decidiu? - ele esfregava freneticamente a toalha em seu cabelo
Lucas- tem esses dois - ele pendurou a toalha e se deitou
Jonathan- você escolhe, aliás fica a vontade pra pega as coisas na geladeira
Dei play num filme de ação misturado com comédia, em algum momento tanto eu quanto Jonathan caímos no sono. Acordei com fome e desorientado, demorou alguns instantes para me recordar onde estava e com quem estava
Lucas- merda, eu apaguei - falei pra mim mesmo, senti o braço de Jonathan encima de mim - era só o que faltava....
Tentei não o acordar e dei um jeito de fugir de seu abraço, sai do quarto em direção a cozinha
Lucas- pelo menos não dormimos de conchinha - falei aliviado enquanto abria a geladeira
Meus olhos brilharam quando viram um prato cheio de brigadeiro, sem pensar muito os comi até matar minha vontade
Lucas- ela deve tá preocupada comigo, melhor eu ir embora
Fui até o quarto me preocupando em ser o mais furtivo possível, jonathan dormia igual uma pedra
Ele dormindo nem parece o idiota irritante que é
Antes de ir certifiquei de o cobrir, sem uma despedida adequada o dei as costas e sai pela noite
Parecia que eu caminhava a séculos, o caminho parecia ter triplicado de tamanho e me sentia lento
Sinto que passei por essa mesma árvore umas 3 vezes
Minha boca estava seca e sentia um profundo relaxamento. Passei a mão pelo cabelo o bagunçando e olhei em volta confuso
- porra, já passei por essa rua umas duas vezes - chutei a árvore nervoso, a dor substituiu minha raiva rapidamente e sai pulando num pé só - mais...q- porra
-bom, é isso que acontece quando se chuta uma árvore - uma voz feminina pareceu falar comigo
Me virei em direção da mesma, mas a única coisa que vi era um gato preto sentado na calçada a minha frente
- jurava ter ouvido algo - me aproximei do gato e sentei ao seu lado - talvez eu esteja ficando louco amiguinho
- talvez, quem sabe - assustado olhei em volta a procura da dona da voz, mas para meu azar minha única companhia era o gato
- isso não tem graça - peguei o gato no colo e me levantei - seja quem for, apareça
- mas...nem estou me escondendo - senti um calafrio percorrer meu corpo, pressionei ainda mais o gato contra meu peito
- não é oque parece - sorri de nervoso, sarcasmo não era uma boa opção para essa situação - só covardes se escondem
- só idiotas não veem oque quer - deixei escapar uma risada
- não devia falar assim com um estranho - acariciei a bola de pêlo que segurava como um filho, sentir seus pêlos macios me acalmou
- quem disse que somos estranhos? - minha cabeça dava voltas e voltas a procura de um sentido em sua resposta, embora sua voz fosse famíliar não me recordava dá onde, ou de quem pertencia
Que situação...caótica?
- não somos? - a ingenuidade em minha voz arrancou uma bela risada da mulher misteriosa
- não, garanto que mesmo que tente se lembrar não vai conseguir - meus pés formigavam para dar o fora dali, mas minha mente parecia não processar o perigo
- então me diz, quem é você? - houve uma pausa dramática entre minha pergunta e sua resposta, meu coração palpitava de ansiedade
- olha para frente - tudo oque via era a árvore em minha frente
- Você é a árvore? - parecia idiota perguntar mas as palavras saíram da minha boca sem que antes eu pudesse julgar isso
- idiota, olha mais pra baixo - o gato que estava em meu colo agora se encontrava sentado a minha frente
Mas que porra tá acontecendo?
- como... - olhei para onde a segundos atrás aquele gato estava, notei que fazia carinho no vento
- pode parar de acariciar o nada, porfavor? - me afastei assustado daquela pequena criatura - não me olhe com essa cara
- quer que eu te olhe com que cara? - me sentia um louco de carteirinha por estar conversando com uma gata, era tão difícil absorver aquela situação que cogitei a ideia de me dar um tapa
Vamos usar a lógica, isso é só um sonho né?
Dei as costas ao felino e respirei fundo tentando me acalmar e achar sentido em tudo aquilo
Ok.... falar com animais seria uma nova habilidade?
Depois de alguns minutos pensativo me virei novamente
- vou ser sincero com você - sorri amigavelmente tentando não transparecer meus surtos internos - que porra tá acontecendo?
- está acontecendo exatamente oque você vê e ouve - o animal veio em minha direção parecendo subir uma escada invisível
Isso é demais pro meu cérebro processar
- acho melhor não me seguir, ouviu?
Sai andando sem esperar sua resposta, quando vi que o animal não me seguia relaxei pensando ter dado fim a aquele episódio traumático
- pensou mesmo que seria fácil se livrar de mim? - quando olhei para frente ele flutuava a centímetros do meu rosto
O susto foi tanto que meu impulso foi tentar o acertar mas ele desapareceu antes que minha mão o acertasse
- Santa Luisa Mell, não faz mais isso - ele apareceu novamente e começou a rolar de rir no ar - melhor parar de rir antes que eu te coloque num saco e dê pro canil
Eu realmente perdi o controle da minha vida
- não fique bravo - desviei da bola de pêlo flutuante e segui meu caminho
- então não me estressa - olhei para cima sem paciência, já era tarde e sentia meu corpo cansado e lento. A lua brilhava como um lampião, por alguns instantes desejei observar as estrelas com kauane
- tá pensando nela?
- como sabe? - fiquei espantado mas não muito devido a situação que me encontrava
- você tá com aquela cara - olhei para o animal falante que rodopiava a minha volta
- que cara?
- de trouxa apaixonado - o espantei de perto de mim
- oque um animal como você entenderia sobre o amor?
- mais coisas do que imagina Lucas - parei ao ouvir meu nome
- como sabe meu nome?
- tem Alzheimer?, falei que já nós conhecemos
- talvez tenha, não me lembro de conversar com gatos falantes
- sou uma gata - ela me corrigiu impaciente
- continua sendo estranho do mesmo jeito
Realmente to começando a duvidar da minha sanidade mental
- minha forma felina ou o fato deu falar?
- bolas de pêlo igual a você não flutuam, nem falam. Vocês são só fofos e antipáticos
- os gatos se sentem terrivelmente ofendidos com oque disse
- porfavor não mande sua gangue de amigos atrás de mim - falei debochado
- fique tranquilo, não farei - ela falou de forma imparcial, não sabia se ela falava a verdade ou não
Realmente fiquei assustado com a possibilidade de acordar amanhã com a casa rodeada de gatos mercenários. Afastei essa possibilidade da mente e mudei de assunto
- por que tá me seguindo? - me veio a mente assim que notei que estava próximo a casa de kauane
- queria que chegasse em segurança em casa
- Você é meu anjo da guarda ou algo assim? - sorri para o animal
- não, sou só uma velha amiga - ela deu uma risada fraca
Ok isso é estranho, até demais pra mim
- se eu tivesse uma gata falante como amiga me recordaria disso - ela não falou nada e foi assim até chegarmos em frente a casa da kauane
- Lucas, se cuida - apenas acenei com a cabeça enquanto a via se afastar
- não vai me dizer seu nome? - ela parou e ficou alguns segundos pensativa
- se falar você vai se lembrar quem sou?
- claro - respondi sem titubear mesmo tendo dúvidas
- Você passou tanto tempo com humanos que já mente como um - ela veio em minha direção e se sentou a minha frente, me abaixei próxima a ela
- oque falou não faz sentido
- um dia fará, agora vai atrás dela - fiz carinho em sua cabeça, ela deu um ronrosnado fofo
- te verei novamente?
- talvez
- então, até a próxima bola de pêlo - me levantei e esperei a criatura a minha frente ir embora mas antes de ir ela me falou uma última coisa
- almas gêmeas foram destinadas a se encontrar, não a ficarem juntas
- oque isso significa?
- cuidado, apenas -
Sem dar mais explicações ela saiu andando pela noite, fiquei alguns segundos absorvendo aquela conversa estranha mas por não me sentir bem, achei melhor entrar
Oque diabos foi isso?