Abraçada aos próprios braços Helena olhava pela janela da sala que lhe dava uma vista privilegiada sobre a cidade, sentia-se perdida há muito nos seus pensamentos. Presa entre o homem que amava, o homem que desejava o seu amor e o seu pai. Podia dizer com toda a certeza que eles eram os pilares da sua vida e passava pela sua cabeça como seria possível continuar a sua vida sem algum deles. Thomas tinha aparecido do nada e tinha-se tornado o seu tudo. Alfie era Alfie, não precisava de definição. E Joaquim tinha-a tornado no que ela era hoje. Forte, destemida e perseverante. Devia tudo a todos eles. Por mais que jurasse a pés juntos que tudo iria correr bem e se agarrasse a isso com todas as forças, estaria disposta a fazer o que fosse preciso para garantir que todos voltavam para casa. Essa esperança cega a que se agarrava dava-lhe forças para sair da cama todos os dias.
-"Senti a tua falta na cama."- Thomas surpreendeu-a agarrando a sua cintura quando beijou carinhosamente o seu pescoço.-"Se te deixares consumir love, acredita que não vais querer saber o que isso pode fazer contigo."
-"Sofrer por antecipação sempre foi uma característica minha."- Helena disse enquanto se aninhava um pouco mais no abraço calorento de Thomas.
-"Em breve poderás respirar de alívio e não terás de lidar mais com isto. Nenhum de nós terá."
-"Só espero não ter de lidar com outro tipo de demónios.."- Helena baixou a cabeça levemente.
-"Hey, o que acabei de te dizer hum?"- De uma só vez Thomas virou Helena para si encostando-a delicadamente à janela atrás de si. -"Confia no plano e principalmente em ti."
-"E se algo correr mal?"- Helena engoliu a seco olhando profundamente para Thomas que inspirou fundo e abanou a cabeça.
-"Se algo correr mal, sabes o que tem de ser feito."- Thomas beijou a sua testa e abraçou-a com uma intensidade que nunca antes tinha visto, transmitindo tudo o que por vezes falhava em palavras.-"Tu és o elo de ligação que mantém 3 dos homens mais perigosos do mundo lado a lado, apesar de todas as divergências. Nunca deixes de acreditar na capacidade que tens para mudar o mundo, love."
Thomas olhou pela janela ainda com Helena nos braços e viu um carro descaracterizado parar na frente do pub, o que prendeu a sua atenção. Quando o motorista saiu apressado para abrir a porta, os seus olhos arregalaram-se e este puxou Helena na direcção oposta da janela.
-"Fodasse!"
-"Que se passou?"- Helena perguntou surpresa com o movimento brusco de Thomas.
-"Mosley está lá embaixo."- Helena sentiu a garganta a apertar com as palavras que tinha acabado de ouvir.
-"Como passou pelos meus homens sem ser detectado? Merda ele não pode saber que estão aqui!"
-"Usou um carro diferente com vidros escurecidos, era impossível saber que era ele. Helena eu não posso sair daqui, procura os meus irmãos. Se Mosley os vir estamos fodidos."
-"Merda, merda, merda!"- Helena dizia enquanto corria para a entrada falsa agarrando a saia para não atrapalhar. Sentia o coração acelerar desmedidamente quando alcançou o topo das escadas fazendo os olhares precipitarem-se sobre si com tremenda agitação.
-"Arthur! Finn! Subam agora, Mosley está lá fora."- Helena agarrou no braço de Arthur que entornou o whisky com o puxão que a morena lhe deu.
-"Mas que merda? Finn corre, caralho!"- Arthur pegou o mais novo pelo pescoço e subiram a escada tão rapidamente que Helena agradeceu mentalmente por estarem em tão boa forma. O seu tio ajeitava o terno atrás do balcão tentando manter a postura. Helena pegou no copo que Arthur tinha deixado cair quando as portas do pub se abriram para deixar vislumbrar o sorriso presunçoso de Mosley. A morena engoliu a seco delicadamente enquanto Mosley se dirigia a si.
-"Espero não ter vindo em má altura. Helena."- Disse tirando o chapéu enquanto pegava na mão de Helena para a beijar como sempre fazia. O auto-controlo de Helena tinha de estar no máximo para suportar qualquer tipo de aproximação.
-"Mr. Mosley, não esperava a sua visita. Posso ajudar?"- Joaquim aproximou-se do balcão encarando directamente Mosley que abriu o sorriso novamente.
-"Não propriamente o senhor mas a sua filha. Gostaria que me desse a honra de aceitar o meu convite para jantar hoje."- Helena sentiu momentaneamente o ar sair dos seus pulmões e a sua pele ficar pálida perante a afirmação daquele homem. Se antes já se sentia entre a espada e a parede, a partir daquele momento ela teria de ser a pessoa mais forte do mundo para se permitir entrar num jogo que já se desenrolava sem possibilidade de voltar atrás.
-"Jantar? O comício está próximo, provavelmente terá muita coisa para alinhar."- Helena tentou parecer o mais neutra possível nas suas palavras, tentando lidar com a presença à sua frente.
-"Pelo contrário minha querida, a única coisa que me falta tratar é a Helena."- Mosley aproximou-se um pouco mais.
-"Aconselhava-o a ter cuidado com as palavras na minha casa, Mr. Mosley."- Joaquim endireitou a postura.
-"Perdão, expressei-me mal. O que queria dizer é que será uma boa altura para a conhecer antes do comício. Afinal de contas, será a minha companhia e irei apresentá-la como tal."
Helena hesitou responder, tempo demais do que inicialmente tinha previsto. Como poderia suportar aquela companhia por mais que uma noite? Toda a preparação que tinha tido até à data não era suficiente. 10 anos de preparação não seriam suficientes para lhe tirar o nojo constante e repúdio que ela sentia por aquele homem.
-"Acho que seria uma óptima ideia aceitares o convite do Mr. Mosley, Helena."- Joaquim interveio, vendo a visível hesitação na cara de Helena em responder, tinha-se perdido nos seus pensamentos e precisava ser chamada à realidade.
-"Com todo o gosto, Oswald."- Helena finalmente respondeu forçando o sorriso.
-"Esperarei por si no salão do hotel, se bem me recordo não valerá a pena oferecer-me para a vir buscar."- Mosley meteu o chapéu e beijou novamente a mão de Helena antes de sair. -"Mr. Marques."
Helena sentou-se no balcão directamente à frente do seu tio, respirava pesadamente. Joaquim pegou num copo que encheu de whisky e lhe passou.
-"Não há como voltar atrás a partir de agora filha, o jogo começou. E tu tens as cartas na mão, lembra-te disso."- Joaquim disse-lhe antes de passos pesados desceram as escadas, os irmãos Shelby tinham visto o carro de Mosley arrancar e juntavam-se a Helena e Joaquim no salão.
-"Que porra queria ele Helena?"- Thomas perguntou-lhe passando as mãos no cabelo enquanto tragava pesadamente o cigarro.
-"Eu, Tommy."- Helena disse antes de engolir o líquido de uma só vez
-"O que disseste?"- Thomas sentou-se na cadeira ao lado dela, enquanto Arthur e Finn se encostavam ao balcão.
-"Convidou-me para jantar."- Helena respirou fundo e olhou para Thomas antecipando a sua reacção, podia observar as veias na sua testa ficarem mais grossas.
-"Fodasse este plano, fodasse tudo. Isso não vai acontecer, caralho!"
-"Tommy, não há nada que tu ou eu possamos fazer. Os dados estão lançados, este jogo já começou e teremos de ir com tudo. E recusar o convite não seria inteligente da minha parte, sabes que tenho razão."- Helena disse-lhe esperançosa.-"Fazer o que tem de ser feito, lembraste?"- Thomas abraçou-a com força, recordando as palavras que lhe tinha dito à pouco.
-"You're playing with the fucking Devil, love."