𝗙𝗲𝘁𝗶𝘀𝗵 • H.S.

By akastylessgirl

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Uma noite. Foi tudo o que precisou. Agora eles tem um acordo. • •... More

antes de ler / teaser
01 [ca•su•al]
02 [ten•são]
03 [pro•pos•ta]
04 [ex•ce•ção] (!)
05 [ca•pri•cho]
06 [a•cor•do]
07 [ris•pi•dez] (!)
08 [de•cep•ção]
09 [re•gra]
10 [em•pá•fi•a]
11 [pro•i•bi•do] (!)
12 [hos•ti•li•da•de]
13 [ge•ne•ro•si•da•de] (!)
14 [con•se•quên•ci•a] (!)
15 [hu•mil•da•de]
16 [in•si•di•o•so]
17 [do•mi•na•ção] (!)
18 [con•des•cen•den•te]
19 [a•fron•ta]
20 [ex•clu•si•vo] (!)
21 [a•lu•ci•nó•ge•no] (!)
22 [a•me•a•ça]
23 [dra•ma•ti•za•ção] (!)
24 [ir•re•ve•rên•ci•a]
25 [vul•ne•rá•vel]
26 [con•fi•an•ça] (!)
27 [con•for•tá•vel]
28 [em•bri•a•guez] (!)
29 [con•fli•to]
30 [dis•so•lu•ção]
32 [re•ca•í•da] (!)
33 [pe•ri•pé•ci•a]
34 [sau•da•de]
35 [ins•pi•ra•ção]
[in•ter•lú•di•o]
36 [va•ri•a•ção]
37 [or•gu•lho]
38 [re•pa•ra•ção]
39 [con•ci•li•a•ção]
40 [a•mi•za•de]
41 [con•jec•tu•ra]
42 [ten•ta•ção]
43 [i•ne•bri•an•te]
44 [êx•ta•se] (!)
45 [su•a•ve]
46 [sub•ter•fú•gi•o] (!)
47 [in•ti•mis•ta] (!)
48 [me•lí•flu•o]
49 [in•ver•são] (!)
50 [fe•ti•che]
bônus [texting]

31 [ci•ú•mes]

504 34 40
By akastylessgirl

[sentimento complexo e de difícil compreensão, provocado pelo medo de perder a pessoa amada.]

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HARRY

Fazem três semanas que Charlotte rompeu nosso acordo de sexo casual e com ele, suas saias foram aposentadas.

As mais tortuosas e desconfortáveis três semanas se passaram e as coisas não aparentam que irão melhorar. Eu gostaria de dizer que tudo está normal, que só porque uma pessoa saiu da minha rotina não significa que tudo mudou, mas seria uma enorme mentira.

Não consigo ficar mais de dez minutos no meu apartamento sem que uma lembrança de um momento nosso me venha a mente. Eu olho para o meu sofá e lá está ela com a boca em mim. Eu olho para a pia da cozinha e lá está ela com as pernas ao redor da minha cintura. Eu olho pra minha cama, ah, a minha cama, e lá está ela em toda a sua glória. Mal posso tomar um banho gelado em paz, memórias dos meus dedos correndo por seu longo cabelo e o som de sua risada... Eu posso ouvir claramente.

Estou perdendo a cabeça pouco a pouco. Obcecado, compulsoriamente pensando nela e só nela.

É como uma doença que não tem cura. Eu já estive apaixonado antes e eu sei como essa enfermidade age. Vai doer, doer, doer, até não doer mais.

Faz bastante tempo, no entanto, desde o meu último relacionamento sério e eu havia me desacostumado com a sensação. Está sendo mais difícil, mais sofrido, e eu tenho certeza, pois em uma das minhas tentativas desesperadas de ocupar minha mente com qualquer outra coisa que não seja aquela mulher, vasculhei as minhas caixas de mudança até encontrar meus antigos cadernos de composição. As canções nunca lançadas, as canções que me foram roubadas, as piores e as nunca terminadas, todas comprovaram que eu nunca estive tão desamparado como estou agora.

Pode parecer loucura, nós nem estávamos namorando, mas é exatamente por isso que está sendo sofrido pra mim lidar com tudo. Desde o início com ela, eu achei que estava de barriga cheia, mas sei agora que nem ao menos havia começado a comer. Nosso acordo nunca avançou para mais do que isso, eu sempre fui deixado com a vontade de mais; uma vontade que me foi frustrada na margem da linha de chegada.

E eu ainda a vejo no meu trabalho, porquê lá também é o trabalho dela. Como posso esquecê-la, se ela está sempre por perto?

Gary me disse milhares de vezes pra pedir demissão, mas eu não quero passar fome e morar nas ruas. Logo quando ela me deu um fora, pensei que seria demitido, mas isso não aconteceu e eu não vou arruinar a minha única fonte de renda por um motivo tão mesquinho.

Estilhaça o meu coração em mil pedaços vê-la tão lindamente sem esforço todas as noites, sorrindo para todo mundo menos para mim, agindo tão distante e fria comigo como se não nos conhecêssemos, usando apenas calças - exatamente como no início? Absolutamente! Mas, novamente, eu preciso do emprego.

Estou a procura de outros lugares para tocar, mas confesso que uma parte masoquista dentro de mim gosta da tortura de estar no mesmo ambiente que ela, mesmo que não estejamos mais juntos - se é que eu posso nomear assim. É melhor vê-la, mesmo sem tocá-la, do que não vê-la mais.

Ainda não estou pronto, não aceitei de fato o que aconteceu.

Eu sou um idiota, sei disso, e o pior de tudo é que não posso negar a nesga de esperança que existe dentro de mim. Quem sabe um dia, ela olhe para mim e... É nisso que fico pensando quando estou no Poison Ivy. Fico esperando que uma noite ela vá olhar para mim sobre o bar, em meio aos clientes, em meio a alegria de toda aquela gente, em meio a todo o ressentimento, e perceber como eu ainda a quero e sorrir; um simples gesto que dirá tudo que preciso saber.

Quem quer que tenha sido o boçal que disse que sonhar não custa nada, errou. Sonhar demanda muito da saúde mental e os meus sonhos ilusórios só estão me deixando mais doente. E eu nem ao menos ligo pra isso, eu não quero parar. Ainda não.

Naomi sabe o que aconteceu e me mostrou muita bondade. Ela tem sido calorosa comigo sempre que tem a oportunidade, troca palavras de reafirmação e sempre checa como eu estou. Eu me sinto culpado em fazer isso, mas as vezes nos conversamos antes da Charlotte chegar no bar. Ela nunca me diz nada que poderia comprometer a amiga, mal cita a mesma, e genuinamente demonstra interesse em mim e apenas em mim nessas conversas. É uma das coisas que tem me segurado em pé, ao mesmo tempo que me destrói quando eu me dou conta de que isso só solidifica ainda mais o fim.

Folheando meus cadernos, puxando pela memória, tentei achar uma solução para essa angústia toda, mas foi tudo em vão. Meus últimos relacionamentos acabaram por motivos mais amenos: a paixão acabou, personalidades incompatíveis, mentiras intoleráveis - coisas que eu pude superar com mais facilidade, que não senti falta quando acabou, que me orgulho de ter dado adeus.

O que fazer com paixão latente e nova, selvagem e desmedida, reprimida por orgulho e rejeição?

Eu já experienciei gostar de alguém que não gostava de mim antes. Já vivi um affair onde apenas eu queria dar o próximo passo. Entretanto, essas vivências queimaram como a chama de um palito de fósforo: brilhando forte no início, apagando rapidamente sem nem ao menos chegar ao fim. Eu era jovem, impressionável, ingênuo - principalmente considerando que esse affair em particular do meu passado foi com um cara que só queria se aproveitar da minha inexperiência com outros homens.

Encontrei um caderno em especial que contém uma canção a qual eu escrevi com 19 anos de idade, justamente para o sujeito que me usou por semanas e depois sumiu sem dar notícia. Lendo a letra da música eu me emocionei. Chorei. Me fez lembrar muito sobre o que estou passando agora, mas de um jeito menos malicioso da parte da Charlotte. Ela nunca foi traiçoeira como aquele cara, ainda assim ambos me fizeram desejar ter um pouco de seus corações.

Hoje é mais um desses dias canalhas de trabalho que me desconcertam. Me arrumando na frente do espelho do meu banheiro, meu coração se enche de ansiedade ao lembrar da mulher que vou admirar a distância e se encolhe de nojo ao perceber o quão patético eu sou por me contentar com essa situação.

Abotoo minha camisa vermelha de mangas curtas e ajeito a gola. A cor me dá uma sensação de conforto nos primeiros instantes, mas me deixa triste por fim. Eu poderia trocá-la por outra de outra cor, se meu humor fosse melhorar de alguma forma com isso. Não vai. Irei com essa mesmo.

Esperança, a droga da esperança.

Ainda está ensolarado lá fora, tenho de aparecer no Poison apenas às 19h, mas como eu havia mencionado anteriormente, minhas conversas esporádicas com a Naomi demandam certo tempo antes da agitação da noite recair sobre nossos ombros. Coloco um par de óculos escuros no rosto, passo a mão pelo cabelo uma última vez e caminho para fora do apartamento, coletando meu violão no processo e o pendurando no ombro.

Ando pelas ruas sem pressa, usando essa pequena viagem à pé para refletir - algo que eu tenho feito incansavelmente essas semanas. San Francisco é uma cidade bonita, descolada, boa de se viver. Tem boas praias, embora eu nunca tenha tido o tempo para visitar, e as pessoas aqui são divertidas, estilosas, calorosas como o clima. É como uma Los Angeles, mas bem menos pretenciosa. Me mudei para cá pois não aguentava mais morar no mesmo lugar que havia sido enganado, mas não me arrependi da experiência. Eu poderia me estabelecer aqui. Quem sabe quando todo esse turbilhão de emoções cessar, eu possa de fato pensar nisso de forma mais decisiva, pois nesse momento não digo isso pensando unicamente na arquitetura.

Já no centro, subo à 13 com a principal e de longe avisto o bar. O neon rosa está desligado, mas eu conheço muito bem aquela fachada de tijolos negros. Não estou vendo o carro da Naomi em lugar nenhum, o que pode significar duas coisas: ela ainda não chegou ou teve de parar o veículo em outro lugar. Espero de verdade que seja a segunda opção.

Faço o meu melhor para passar uma imagem serena para ela, mas a verdade é que eu preciso das nossas sessões amistosas de diálogo casual. Naomi é a única que realmente entende o que eu estou passando. O Gary pode ter boas intenções, mas seus conselhos beiram a insensibilidade na maior parte das vezes, além do fato dele ter abertamente me dito que nunca foi com a cara da Charlotte. Eles nunca trocaram mais do que um simples 'bom dia', mas isso foi o suficiente para ele formar sua opinião a cerca da mesma. E o Dylan... Ele está sempre no mundo da lua, não dá pra confiar muito.

Em honestidade, me sinto sozinho. Completamente.

Se eu me abrir com a minha mãe, ela será capaz de me mandar voltar pra casa pra me dar colo. A minha irmã provavelmente seria uma opção melhor para dividir tal assunto, mas ela também é da família e seu lado protetor poderá afetar seu julgamento. Além do mais, compartilhar esse assunto para a minha família seria como colocar um selo de oficialidade no meu problema, coisa que estou tentando evitar - por mais inútil que esteja parecendo a cada dia que passa.

Um carro azul marinho estaciona perto do bar e poucos segundos depois, avisto Charlotte em pessoa descendo do lado do passageiro. Paro minha caminhada, sentindo minhas sobrancelhas franzindo em desentendimento conforme eu agarro a alça da capa do meu violão com firmeza. Esse não é o carro da Naomi.

Do lado do motorista, um homem de cabelos pretos e levemente arrepiados se revela. Talvez seja um motorista de Uber, o carro não tem identificação de táxi. Estou à vários metros de distância deles, mas posso ver seus lábios se movimentarem enquanto conversam sobre o capô do veículo. O homem está de costas para mim, mas julgo ser jovem como eu. Ele tem os braços tatuados e se veste com simples casualidade: uma camiseta branca, calça jeans azul escura e tênis.

Charlotte está virada para mim e eu posso ver com clareza o sorriso largo que conserva no meio da conversa toda. Ela veste uma calça preta justa (que novidade), uma regata que mostra centímetros de sua barriga e suas botas de salto grosso. Linda como de costume, ela caminha até a parte de trás do carro e o homem a acompanha. Eles abrem o porta-malas juntos e começam a tirar caixas de lá.

Tudo bem, ele deve ser mesmo um motorista qualquer. Ela provavelmente precisava trazer algumas coisas para o bar e não podia fazer isso sozinha. Talvez Naomi esteja ocupada com outro assunto e não conseguiu ajudá-la. Me sinto mais leve com a teoria. Ela desceu do banco do carona, mas e daí? Podem haver caixas nos bancos traseiros também.

Devo me aproximar e oferecer ajuda?

O homem estica uma das mãos até a base da coluna dela, sua blusa curta o permitindo tocar um pouco de pele no processo e Charlotte não faz absolutamente nada para afastá-lo. Pelo contrário, ela o fita sobre o ombro e sorri de canto. Ele fala mais alguma coisa e ela ri, batendo seu quadril no dele de forma brincalhona e descontraída.

Não, ele não é a porra de um motorista de Uber.

Charlotte agarra duas caixas de papelão e o sujeito atrevido faz o mesmo, mas as segura apenas com um dos braços, usando a mão livre para fechar o porta-malas e mostrar pra ela que é forte o suficiente. Exibido de merda. Quem diabos é esse cara, afinal? Quem ele pensa que é?

Ele está tocando o quadril dela agora. Meus dedos ficam brancos com a força que eu faço na alça da capa do meu violão, tentando canalizar a onda de raiva que está subindo pelo meu corpo. Charlotte ainda não está tirando a mão dele. Por quê ela está deixando ele fazer isso? Ela quer que ele a toque? Por quê? Quem ele é pra ela?

Juntos, eles andam para a porta de entrada do bar. Ela deixa as caixas no chão e tira um molho de chaves de seu bolso traseiro, escolhendo a chave correta e abrindo a porta. Ela sinaliza para que o Sr. Mãos-bobas entre na frente, mas, claro, o merdinha insiste para ela ser a primeira. Eu torço mentalmente para ela negar, pois mesmo sem conhecer esse idiota, sei que ele só quer uma chance de olhar pra bunda dela. Charlotte ri e oferece a vez para ele uma segunda vez, o sujeito negando novamente. Por fim, ela entra na frente e eu tenho vontade de morrer quando noto o sorrisinho sujo na cara dele.

Alguém me segure, eu estou prestes a causar uma cena.

Eles desaparecem dentro do bar e a porta se fecha. Eu ainda estou parado no meio da calçada, perplexo, irritado, cheio de perguntas. Tento racionalizar esse episódio que acabo de testemunhar - algo que eu provavelmente não deveria ter testemunhado -, reunindo explicações plausíveis para o comportamento de ambos, porém me falta a paciência necessária para ser imparcial.

Aquele homem, seja lá de onde ele saiu, a tocou como se não fosse a primeira vez, sorriu com naturalidade, ele estava à vontade naquela posição.

Saio do meio da calçada onde me encontrava e me encosto na fachada de um comércio qualquer, ainda vidrado na porta do Poison. Minha vontade é de ir até lá e conferir com os meus próprios olhos o que está se passando, quem sabe atrapalhar as intenções do merdinha. Eles estão sozinhos lá dentro, até onde eu sei, e isso só está me deixando ainda mais incomodado.

De onde ela o conhece? Desde quando o conhece? Estão juntos? Ela gosta dele? Ele estava tocando ela daquele jeito, porque já a tocou de outras formas? Ela gosta quando ele faz isso? Ele é melhor do que eu? Ela se quer se lembra de mim? Porque eu certamente ainda me lembro dela.

Olho para o carro do babaca. O modelo é novo, mas não é dos mais caros. É medíocre, do tipo que você compra parcelado em mil vezes só pra dizer que tem um carro. Imbecil, poluindo o meio ambiente... Se eu tivesse uma faca de bolso, era adeusinho pneu.

Que porra eu tô pensando? Ir pra cadeia por ciúmes? Minha mãe me criou melhor.

É culpa da Charlotte, é sempre culpa dela. Esses sentimentos brutais, irremediáveis, sempre surgem quando se trata dela. Eu não sou assim. Ou sou? Não importa agora. O que importa é que ela está sozinha no bar com um sujeito de mãos bobas que não sou eu.

Sinto uma ardência esquisita no dedo e olho para a minha mão. Meu polegar está sangrando, a unha do meu indicador manejou cortar minha cutícula de forma extrema com meus movimentos estressados. Deus, eu preciso me acalmar.

Ouço a porta do bar abrir e o sujeito sai de lá sozinho, fechando a mesma atrás de si. Ótimo, espero que esteja indo embora para nunca mais voltar. Me desencosto da parede onde estava me apoiando e ajeito o violão no meu ombro. Assim que esse otário cair fora, serei eu a ficar sozinho com a Charlotte. Nem que seja apenas para ficar em um silêncio incomodo. Eu posso fingir que estou focado no trabalho, enquanto a observo em seu próprio. Eu faço isso todas as noites, não é tão difícil.

O plano era simples, assim como a execução do mesmo. Eu só não esperava ser surpreendido - horrorizado, na verdade - com a visão daquele homem usando a camiseta do Live Aid. A minha camiseta do Live Aid. A camiseta que eu já tinha aceitado que seria dela, a que ela tanto queria e no final das contas, no mesmo dia que partiu meu coração, ficou para si.

Eu coço os olhos com os dorsos das mãos com violência, numa tentativa tola de ajustar minha visão no caso de eu estar ficando louco, alucinado. Meus pés se desgrudam do chão antes que eu possa impedir e quanto mais perto eu chego daquele homem, mais clara a estampa da camiseta fica no corpo dele.

Que porra?! Mas. Que. Porra?!

Olho para o rosto dele e cerro meus punhos aos lados do meu corpo tenso. Sua pele é morena, sobrancelhas grossas e escuras, assim como sua barba e cabelo. Ele aparenta ser do oriente médio ou ao menos descendente. Tem olhos castanhos e os traços faciais bem definidos, do tipo que te faz lembrar do sujeito. Em outras palavras, o merdinha é bonito. Atraente.

Me aproximo o suficiente para ele me perceber e suas sobrancelhas escuras se franzem para mim. Ele coça a barba fechada com os dedos tatuados e eu entendo com isso que ele vai falar comigo. Merda.

"Mm... Eu acho que ainda não está aberto para clientes, cara." Sua voz é calma, melodiosa e, me fode, mas o maldito é britânico. Isso só pode ser uma piada de mal gosto. Só pode ser!

Engulo em seco a minha raiva e curvo meus lábios no sorriso mais falso que consigo. "Eu sei, cara. Eu trabalho aqui. Algo à mais que queira me informar?" Rebato em total hostilidade, não conseguindo me segurar. Ele arqueia as sobrancelhas ao notar o tom que eu uso e dá dois passos atrás, erguendo as mãos em rendição. Meus olhos são atraídos diretamente para a camiseta - a minha camiseta - em seu tronco e eu tenciono em irritação outra vez.

"Sem comentários." Diz apenas e se aproxima de seu carro, pronto para partir.

"Melhor assim." Concluo e abro a porta do bar, me colocando pra dentro e longe desse desgraçado de rostinho simétrico.

Assim que a porta bate - com certa violência, devo dizer - atrás de mim, a voz de Charlotte soa em seguida. "Esqueceu alguma coisa?" Ela pergunta e ri, "Por que eu não estou surpresa?" Meu sangue ferve com o tom que ela usa para dizer isso. Então eles se conhecem a ponto de saberem os maneirismos um do outro? A pergunta que fica é: desde quando?

"Você é inacreditável, devo dizer." Ela continua falando quando eu piso no salão, mas por estar de costas para a entrada, atrás do bar, não percebe com quem de fato está conversando. "Nunca vi alguém tão desajeitado, tão esquecido, tão avoado como você. Eu juro, é-" Ela finalmente se vira e toma um susto ao me ver, interrompendo suas impressões do sujeito sem nome.

Os olhos de Charlotte se arregalam e seu corpo congela, como se visse um fantasma. Eu sorrio sem humor frente a sua reação, amargura preenchendo meu peito. "Puxa, nunca ninguém ficou tão descontente com a minha presença. Eu estou lisonjeado." Ironizo.

"H-Harry?" Ela gagueja, algo raro (a menos que esteja a beira do orgasmo).

"Bom saber que eu posso tirar outros tipos de reação de você." O comentário sai como um tapa e ela desgosta do mesmo, pois faz uma carranca imediatamente.

"O que está fazendo aqui? É cedo." Interroga séria, mas sem olhar diretamente para mim. Noto que suas mãos estão agarradas no balcão com força e a expressão de seu corpo é diminuta, defensiva.

"Eu queria olhar na sua cara quando te fizesse a minha pergunta."

"Que pergunta?"

"Como ousa?" Disparo rudemente, deixando bem claro que não estou brincando, muito menos feliz.

Charlotte finalmente me olha nos olhos e eu posso jurar que vejo suas íris tremerem levemente. Ela abre a boca para responder, mas a fecha e engole em seco. Quando maneja me responder, sua voz sai muito mais forte do que antes. "Se você viu o meu amigo saindo daqui, fique sabendo que eu não te devo nenhuma explicação. O que eu faço ou deixo de fazer da minha vida, não diz respeito a você."

Eu rio amargo de seu argumento, mordendo meu lábio inferior com força para impedir que um xingamento atravesse meus dentes.

"Eu não te devo nada, Harry." Ela tem a audácia de ressaltar, como se eu já não soubesse disso.

"Eu não ligo pra quem seja a porra do seu amiguinho, Charlotte." Basicamente cuspo as palavras. "Mas ele provavelmente deve ser alguém muito importante, para estar usando a porra da minha camiseta como se fosse dele."

A menção do artigo de roupa a faz empalidecer e eu travo as mandíbulas. Que bela hora para ficar toda tímida comigo. Depois de tudo que ela foi capaz de gritar na minha cara. Cada palavra fincando o meu coração como adagas envenenadas.

Ela sai de trás do balcão com passos calculados, comedidos, e por um momento eu realmente considero a possibilidade de termos uma conversa direta e honesta.

"Ouça. Nosso acordo-" Ia dizendo, coisas que eu já estou cansado de ouvir, que não nos levariam a lugar nenhum.

"Oh, se poupe!" Eu a corto grosseiramente, fazendo um gesto displicente com a mão e desviando o rosto.

Quão ingênuo da minha parte.

Faz-se um silêncio estranho entre nós e quando volto minha atenção para ela, vejo seus malditos olhos de mel me analisando criticamente de uma forma que eu vi tantas vezes. Antes mesmo que ela abra a boca, já sei o que me aguarda: rispidez.

"Não me diga que você está com ciúmes, Harry." Ela zomba e se põe a rir. Eu juro, às vezes eu odeio essa mulher de uma forma... Meu silêncio só a faz ter ainda mais certeza de tal sentimento vergonhoso e ela se diverte além as minhas custas. "Que maravilha, Styles. Que maravilha." O sarcasmo é tão bruto, que me faz dar um passo para trás.

"Você não tem o direito de sentir ciúmes de mim. Enlouqueceu? Entrando aqui assim, bancando o macho man." Repreende de braços cruzados, seus olhos queimando sobre mim. "Sim, ele estava usando a sua camiseta e sim, há um motivo pra isso. Mas você nunca reclamou aquela camiseta de volta, eu achei que nem a queira mais, pensei que fosse minha. Minha pra fazer o que eu quiser. Minha para-"

"Foda-se! Eu não quero saber." A interrompo numa exclamação acalorada, as veias no meu pescoço saltando. "Fique com a merda da camiseta. Faça de pano de chão, dê para um mendigo. Eu não ligo."

Eu ligo, claro, mas vale a pena? Não. Então seja como for. Não posso dar muro em ponta de faca por muito tempo se planejo manter a mão.

Fico esperando por uma resposta dela igualmente irritadiça, mas me surpreendo quando ela escolhe ficar calada e desviar os olhos, apertando seus braços sobre seu peito com mais força.

Eu quase quero que ela me diga alguma coisa, que grite comigo, que me enlouqueça de raiva. Eu quase quero odiá-la de verdade, que ela me odeie para sempre, que me faça fugir e nunca, nunca mais voltar. Tudo isso só porquê, pelo menos, eu teria algo. Qualquer coisa. É deprimente e me choca ao finalmente me fazer entender até que ponto eu estou sendo capaz de chegar por essa mulher.

"Eu preciso dar o fora daqui." Murmuro, muito mais como uma constatação sóbria de realidade, do que para esclarecer minha partida a ela.

Marcho o mais rápido que posso para fora do bar. Quando abro a porta, vejo Naomi, que estava se preparando para entrar. Ela sorri para mim ao me reconhecer, mas minha cabeça está tão anuviada nesse momento, que eu simplesmente passo por ela lhe dando apenas desculpas por não parar e lhe dirigir a palavra.

Ando com tanta raiva, tanta pressa, tanta cegueira, que mal percebo minha chegada no meu apartamento. Gary estava saindo de seu próprio no momento que marchei em direção a minha porta e pela segunda vez no dia, ignoro um amigo.

Jogo meu violão no sofá e começo a andar sem rumo dentro do apartamento, uma forte energia negativa tomando conta do meu corpo de uma forma que me deixa impossibilitado de fazer qualquer coisa coerente.

Sou um homem, então acho que poderia gritar e socar paredes até esse sentimento ruim passar. Entretanto, não sou esse tipo de homem e quando me dou conta, há um caderno aberto na minha frente, uma caneta na minha mão.

Encaro a página em branco por muito tempo, deixando todas as minhas emoções se assentarem dentro de mim, reunindo memórias, coletando a coragem necessária para prosseguir. Se eu escrever a primeira palavra, não haverá maneira de me fazer parar. Será um caminho sem volta.

Começo a escrever.

N/A: Convido vocês a conferirem a minha nova fanfic chamada Nightingale quando puderem.

Votem e comentem, meu amores.

Espero que tenham gostado do capítulo.
xx

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