𝗙𝗲𝘁𝗶𝘀𝗵 • H.S.

By akastylessgirl

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Uma noite. Foi tudo o que precisou. Agora eles tem um acordo. • •... More

antes de ler / teaser
01 [ca•su•al]
02 [ten•são]
03 [pro•pos•ta]
04 [ex•ce•ção] (!)
05 [ca•pri•cho]
06 [a•cor•do]
07 [ris•pi•dez] (!)
08 [de•cep•ção]
09 [re•gra]
10 [em•pá•fi•a]
11 [pro•i•bi•do] (!)
12 [hos•ti•li•da•de]
13 [ge•ne•ro•si•da•de] (!)
14 [con•se•quên•ci•a] (!)
15 [hu•mil•da•de]
16 [in•si•di•o•so]
17 [do•mi•na•ção] (!)
18 [con•des•cen•den•te]
19 [a•fron•ta]
20 [ex•clu•si•vo] (!)
21 [a•lu•ci•nó•ge•no] (!)
22 [a•me•a•ça]
23 [dra•ma•ti•za•ção] (!)
24 [ir•re•ve•rên•ci•a]
25 [vul•ne•rá•vel]
26 [con•fi•an•ça] (!)
27 [con•for•tá•vel]
28 [em•bri•a•guez] (!)
30 [dis•so•lu•ção]
31 [ci•ú•mes]
32 [re•ca•í•da] (!)
33 [pe•ri•pé•ci•a]
34 [sau•da•de]
35 [ins•pi•ra•ção]
[in•ter•lú•di•o]
36 [va•ri•a•ção]
37 [or•gu•lho]
38 [re•pa•ra•ção]
39 [con•ci•li•a•ção]
40 [a•mi•za•de]
41 [con•jec•tu•ra]
42 [ten•ta•ção]
43 [i•ne•bri•an•te]
44 [êx•ta•se] (!)
45 [su•a•ve]
46 [sub•ter•fú•gi•o] (!)
47 [in•ti•mis•ta] (!)
48 [me•lí•flu•o]
49 [in•ver•são] (!)
50 [fe•ti•che]
bônus [texting]

29 [con•fli•to]

573 36 63
By akastylessgirl

[profunda falta de entendimento entre duas ou mais partes; choque, enfrentamento; discussão intensa; altercação.]

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HARRY

Assim que a sonolência proporcionada pela ingestão de álcool passou, eu não consegui mais pregar os olhos. Minha cabeça doía, meu estômago estava embrulhado, um sensação de enjoo incomodando a minha garganta.

Ressaca, uma vadia mesquinha que vai arruinar o seu dia por inteiro se você deixar. E eu basicamente chamei por ela quando ignorei duas coisas muito importantes na noite passada: água e comida.

Já era de manhã, o quarto estava bem mais claro do que quando me deitei, e o calor havia aumentado. Acho que já estamos no verão, porque as paredes pareciam em chamas.

Contudo, apesar de todo o desconforto interno e externo, o corpo dela ainda estava sobre o meu, me abraçando serenamente, e meus lábios não tiveram outra alternativa, a não ser sorrir.

Usando apenas uma das minhas cuecas boxer, sua pele exposta brilhava com a fina película de suor que a cobria. Seus seios esmagados no meu peitoral bem mais acalorados, a raiz de seu cabelo agora molhada, mas não dá água do chuveiro. Independentemente desses detalhes, eu a apertei ainda mais contra mim e deslizei minhas mãos por suas costas e braços, sua silhueta sonolenta me dando a distração necessária para que eu pudesse continuar na cama e aguentar firme todo o meu mal-estar.

Minha garganta seca implora por água, eu não faço ideia de à quanto tempo estamos nessa posição, à quanto tempo minha mente divaga em pensamentos sobre a mesma mulher em cima mim, mas por sorte eu havia deixado um copo cheio na mesa de cabeceira e pude beber do mesmo (com cautela para não acordá-la).

Minha leve movimentação resulta numa leve movimentação dela e Charlotte me abraça mais forte, suspirando, até que decide descer do meu corpo, deitar-se de lado e me abraçar naquela posição, enfiando seu rosto no meu pescoço suado, não se importando nem um pouco com esse detalhe também. Ela passa uma de suas pernas sobre as minhas e encaixa sua pélvis na lateral do meu quadril, voltando ao estado de sono completo.

Novamente me vejo surpreso e feliz com sua atitude afetiva. Pela madrugada, quando fomos dormir, ela mesma se atrelou a mim, mas estava bêbada e por mais que eu tenha amado aquilo, havia um explicação plausível para sua intenção de contato físico. Entretanto, e agora? Qual é a desculpa?

Olhando para o teto, busco as memórias da noite passada e alívio me faz respirar com mais calma ao perceber que não tive um apagão por conta da bebida. Às vezes isso acontece e é horrível não saber o que houve com o meu ser intoxicado.

Eu me lembro de tudo o que fizemos no Poison Ivy, inclusive de como contei piadas ridículas e fiz péssimas imitações de artistas famosos - e mortos - na frente da minha plateia querida. Lembro da Naomi dançando em cima das mesas quando o bar fechou e da Charlotte ter chamado um táxi para levarmos a amiga para casa. Lembro que ela colocou a mesma pra dormir e me convidou para sair para dançar; continuar comemorando sua reconexão com a Celeste.

Lembro do club levar um nome de referência à Alice no País das Maravilhas, o neon roxo e da música alta. Lembro da Char dançando - para mim e comigo. Lembro de me sentir genuinamente alegre, livre, do meu estômago se encher de borboletas e de como ela estava bonita sorrindo tão largamente - para mim e comigo.

Lembro dos nossos corpos perto, sempre mais perto, e de como os movimentos de Dirty Dancing terem sido replicados na pista, nossos quadris circulando e roçando sensualmente juntos.

Lembro de Sex on Fire e... Merda.

Eu disse. Alto e claro, eu confessei.

Viro o rosto para encarar Charlotte e seus olhos ainda estão fechados, seus longos cílios ainda repousados contra suas bochechas, seus lábios fracamente separados e sua respiração entrando e saindo devagar daquela forma linda de coração.

Me pergunto se ela se lembra de tudo aquilo também, se a bebida foi cruel - ou nesse caso bondosa, eu não sei bem - o suficiente para ter roubado suas memórias do momento incrível que tivemos. Me pergunto se ela realmente ouviu o que disse e se interpretou aquilo da maneira correta, se vai me odiar ou me adorar quando acordar.

Aquela música, aquela bendita música, a nossa música, começou a tocar porque ela mesma pediu pra que tocasse e eu perdi tudo. Foi como se toda aquela multidão tivesse sumido e só existisse nós dois na pista de dança. Antes que eu pudesse perceber, minha boca estava agindo sozinha.

Eu gosto de você, Charlotte. Eu realmente gosto de você.

Levo a mão que não está a abraçando para a minha testa e fecho meus olhos, me martirizando. Por que diabos eu fiz isso? Por que caralhos eu tive de beber tanto? Onde eu estava com a cabeça?

Eu devia saber que toda aquela sensação calorosa que eu vinha sentindo pelo corpo nas últimas semanas não eram apenas causadas pelo calor californiano e sim, pela droga dos meus sentimentos. Meus sentimentos à respeito dela, a doce e ríspida Charlotte; a mulher que vem fodendo a minha mente nos momentos em que não está fodendo o meu corpo.

Puxo meu cabelo de raiva ao perceber que o idiota do Gary estava certo esse tempo todo, eu realmente estou-

Não, espera, isso já é demais. Eu preciso me acalmar.

Pego meu celular para conferir as horas, mas a bateria havia acabado e me resta apenas o silêncio inquietante da espera. Eu não quero acordá-la, não só porque ela merece descansar, mas também por medo do que vai acontecer quando ver aqueles olhos de mel abertos e me encarando.

Tento pensar em outra coisa, mas a minha mente está poluída com imagens da noite passada. Como nós dançamos, como sorrimos, como nos beijamos e todo o resto. O maravilhoso resto.

Charlotte se mexe de novo e praticamente ronrona contra mim, sua mão subindo pelo meio peito nu até encontrar a minha corrente com o pingente de crucifixo e enganchar seus dedos na mesma.

"Harry?" Sussurra conforme me aperta com sua perna dobrada sobre as minhas esticadas na cama.

Eu engulo em seco antes de responder, "Sim."

"Mmm..." Ela murmura preguiçosamente, seus olhos ainda pregados, "Por que me deixou beber tanto?"

Demora para que eu tenha uma reação, mas rio fracamente por fim e agradeço aos céus mentalmente por não estar ouvindo gritos.

"Até onde eu sei, eu não tenho que deixar você fazer nada, Miss Independente." Brinco, decidindo não deixar transparecer o meu nervosismo. Só vai piorar tudo.

"É verdade." Ela sorri desleixadamente e arranha suavemente o meu peitoral, gostando da nossa posição - ou só sonolenta demais para se mover. Provavelmente a segunda opção. "Que horas são?" Pergunta, sua voz ainda carregando a rouquidão da manhã.

"Meu celular morreu." Respondo simplesmente, minhas mãos se encontrando na base das costas nuas dela, logo acima da barra da minha boxer em seus quadris.

Bem que todas as manhãs poderiam ser assim. Nós dois agarradinhos, sussurrando para não perturbar a serenidade, eventualmente nos amando nos lençóis. Mas não com essa palavra. É cedo demais. Talvez sempre seja cedo demais pra isso com ela. Infelizmente.

Charlotte franze o cenho, "Tá tudo doendo. Eu mal acordei e já posso sentir." Confessa e eu automaticamente subo uma das mãos para afagar seu rosto suado, numa tentativa de fazê-la se sentir o melhor possível.

"Eu sinto muito, Char. Você quer água? Você provavelmente deveria beber um pouco de água."

"Uhum, eu quero. Um montão. Minha garganta tá seca." Aceita, mas logo acrescenta, "Diferentemente do meu corpo todinho. Que droga de calor é esse?"

Eu acabo rindo de sua reclamação. Ela tem razão, está bem quente aqui. "Eu sei, tá demais."

Devagar, ela pisca até seus olhos abrirem e... Sardinhas naquele nariz pequeno, lábios de coração rosados e aqueles malditos, enviados pelos anjos, olhos de mel. Ela é de tirar o fôlego até mesmo quando está desarrumada, me hipnotizando sem ao menos tentar.

Eu estou muito, muito, muito fodido.

"Me dá banho de novo? Eu tô com dor e cansada demais pra fazer isso sozinha." Pede dengosa, fazendo um beicinho que quase me faz derreter em fofura.

"Tudo pra você, Cherry."

Ela pede licença para usar o banheiro antes e eu aproveito para procurar algum remédio de dor de cabeça e pegar água, muita água pra nós dois. Eu me sinto um caco e minha cabeça ainda está cheia de dúvidas e insegurança sobre a minha confissão ontem, mas tenho que cuidar dela agora e isso pode esperar.

Por sorte encontro Aspirina nas minhas caixas de mudança ainda não desfeitas. Dissolvo um comprimido efervescente para mim e levo outro para Charlotte. Ela bebe tudo e agradece, dizendo esperar que faça efeito o mais rápido possível. Eu também conto com isso, minha cabeça está latejando agora que me levantei da cama.

"Olha só essa merda." Ela exclama ao se olhar no espelho do meu banheiro, "Meu cabelo- Por que me deixou molhar esse cabelo logo antes de dormir, Harry?" Me dá a bronca, aborrecida.

"De novo isso..." Resmungo revirando os olhos,  "Eu não consegui te impedir. Quando vi, sua cabeça já estava embaixo d'água."

"Você é um mentiroso." Acusa, cruzando os braços.

"E você é uma maluca que achou que lavar o cabelo às quatro da manhã era prudente." Rebato desgostoso, minhas mãos nos meus quadris.

Ela só ergue o queixo e desvia o rosto, num movimento de 'dane-se' cheio de empáfia, que me faz rir. Por que sempre tão teimosa?

"Vamos, sujinha." A puxo pela cintura, seu tronco nu tocando o meu. "Vamos tirar esse cheiro de suor."

"Seu cheiro de suor!" Se defende com uma carranca enfezada e adorável, "Passou a noite toda se esfregando em mim, é claro que passou o fedor pra mim."

"Eu estava me esfregando em você?" Jogo a cabeça pra trás e rio forçadamente alto, para caçoar dela. "Vai sonhando, querida. Você é quem não conseguia tirar as mãos de mim. Estava toda..." Faço um biquinho e solto beijos no ar, "...'Harry, me abraça', 'Harry, me faz carinho', 'Harry- Ai!" Sou atingido por um soco no ombro.

"Tem sorte de eu não te acertar nas bolas." Diz, estreitando os olhos.

"Você não ousari-" Antes mesmo que eu possa terminar a frase, um tapa nos meus países baixos me faz dobrar ao meio, com a mão no prejuízo. "Maldita." Sussurro pra mim mesmo.

Ela só sorri satisfeita e se põe a prender o cabelo num coque bagunçado no alto de sua cabeça, tirando minha cueca de seu corpo e ficando completamente nua logo depois, enquanto eu ainda sofro.

"Nunca me subestime, bonitão." Passando por mim, ela me dá um tapa na bunda e pisa na área do chuveiro.

Ríspida por um motivo. Eu aprendi a minha lição.

Me recupero e me junto a ela no chuveiro, cumprindo minha palavra e dando-lhe o banho que ela pediu. Nossa brincadeira me distraiu tanto, que eu havia esquecido completamente do fantasma da minha confissão, ocupado demais admirando a dupla que fazemos.

Será que todas as manhãs seriam seguidas de banhos assim, caóticos e maravilhosos? Eu me divirto tanto com ela, mesmo quando está acertando o meu saco em cheio.

Eu posso até ouvir a voz do Gary dizendo 'Eu te avisei'. Aquele otário estava mesmo certo sobre os meus sentimentos e eu não poderia me sentir mais amedrontado. Quer dizer, eu claramente sinto algo forte por ela, mas eu deveria mesmo concluir que estou... apaixonado?

"Harry!" Ela ri, segurando os meus pulsos, e eu pisco rapidamente para sair dos meus devaneios. Minhas mãos estão ensaboadas e eu estava quase esfregando o rosto dela. Apesar do inconveniente, ela tem o maior sorriso de todos nos lábios, seus olhos brilhando com algo bom. "Não precisa enfiar sabonete no meu nariz."

"Tem certeza? E as melecas?" Digo a primeira bobagem que me vem a mente, fazendo ela rir mais - aquela risada gostosa de se ouvir. Meu peito fica ainda mais aquecido por dentro.

"Eu já cuidei delas." Garante, suas mãos ainda nos meus pulsos, conforme as minhas ainda residem em suas bochechas.

Esse sorriso...

Eu gosto de você, eu realmente gosto de você.

Eu... Eu também gosto de você, Harry.

A memória me acerta com tanta força, que eu fico tonto por alguns segundos, minha visão borrando. Meu coração martela a minha caixa torácica tão desesperadamente, que meus tímpanos se abafam.

Ela disse de volta? Porra, ela disse de volta!

Deus, espera, ela disse de volta. O quê isso significa? Não, eu sei o quê significa, mas o quê significa?

"Harry." Sua voz de algodão doce me desperta. Foco em seu rosto, o chuveiro ainda correndo atrás de nós, e vejo a preocupação estampando a feição dela. "Harry, você tá bem?"

"O-O que?" Eu gaguejo pateticamente, pigarreando logo em seguida. 

"Suas bochechas estão vermelhas de repente, sua cara ficou toda estranha." Informa, me analisando cautelosamente, "Tá passando mal? Quer vomitar?" Investiga, seus dedos molhados colocando meu cabelo pra longe do meu rosto com delicadeza.

"Talvez..." Balanço a cabeça, sem saber o que dizer. Contudo, ela se preocupa mais e eu me apresso em corrigir, "Não!" Basicamente grito, "Quer dizer, não." Repito bem mais baixo, talvez baixo até demais. "Eu tô bem." Isso é uma mentira descarada, eu estou em pânico.

"Ainda tá bêbado?" Ela brinca, agora afagando o meu rosto. "Porque eu sei o que pode te deixar sóbrio de vez." Sorri de canto e eu noto a malicia.

"Ah é? E o que seria?"

Charlotte ri travessa e morde os lábios...

•     •     •

Café da manhã. Ela estava falando de comida. Meu lado obsceno ficou decepcionado, mas a minha barriga roncando não via a hora de ser nutrida outra vez. 

Ela insistiu em pedir o nosso café por um aplicativo e insistiu também para que eu escolhesse o que quisesse comer. Eu, claro, fiz algumas piadas sobre ela ser de uma família rica e quase levei outro golpe entre as pernas, mas tudo se acalmou depois.

Apesar de toda a graça, eu não conseguia parar de pensar na nova lembrança da noite passada; a confissão dela.

Terá Charlotte se esquecido de tudo? Por isso ela ainda não surtou ou tentou se explicar? Ela tentaria fazer isso, não é? Ela sempre arruma um jeito de deixar claro nossa casualidade, repudiando o meu uso da palavra 'minha' e tudo mais. Entretanto, devo dizer que ultimamente, ela não tem me policiado tanto quanto antes. Será esse um bom sinal?

No ínterim da espera da nossa comida, dei-lhe a desculpa de que arrumaria um pouco o apartamento só para que pudesse usar minha cachola à vontade, sem parecer estranho. Comecei também a observá-la melhor.

Levando o comportamento dela de ontem em consideração, eu poderia dizer que Charlotte faz o tipo bêbada afetiva e justificar assim sua busca pelo meu carinho. Ela também fica bem safadinha, mas isso não é novidade.

Entretanto, qual seria a desculpa para hoje? Sua ressaca? Ela ainda está sorrindo para mim sem razão aparente, me deixando beijá-la quando eu quero, brincando comigo, flertando, sendo mais ativa com seus toques. É uma mudança expressiva.

Como eu havia dito antes, ultimamente nós temos nos aproximado bastante em termos não-sexuais. Desde o dia que abrimos nossos corações e compartilhamos parte das nossas vidas, me sinto mais leve perto dela e sinto a mesma energia vindo dela. Porém, essa manhã está sendo mais intensa nesse quesito. Nada que me faça reclamar, jamais, mas algo para ser levado em consideração.

Eu sei que ambos estávamos bêbados ontem, não só pelo álcool, mas pelo clima do ambiente ao nosso redor. Ainda assim, quando eu disse o que eu disse, eu estava sendo honesto do fundo do meu coração.

Não posso mais negar para mim mesmo. Meu peito arde em necessidade por aquela mulher. Vem gritando por ela à tempos, confesso. Sim, eu acho que estou mesmo... aquilo.

Se eu disse a verdade ontem, bêbado ou não, ela também disse?

Termino de arrumar a cama e volto para a sala, encontrando Charlotte ainda deitada no meu sofá, usando uma camiseta minha - a mesma do Live Aid que ela tanto queria pra si - e uma bermuda de moletom, que ela teve de dobrar várias vezes na cintura para evitar que caísse.

Linda.

Me aproximo e toco seu cabelo, sua cabeça repousando no braço do sofá, seus olhos fechados. Ela sorri quando eu começo a lhe fazer cafuné e meu coração vibra quente.

Seria assim tão impossível acreditar que essa mulher gosta tanto de mim, como eu gosto dela? Seria assim tão improvável crer que esse sentimento, embora tão evitado, tenha florecido em nossos peitos de uma forma ou de outra?

Char deita-se sobre suas costas e olha para mim, abrindo um sorriso de dentes e me pedindo um beijo logo depois, formando um beicinho fofo, seus olhos ainda sonolentos ao piscar graciosamente.

Não, não é impossível ou improvável.

Me inclino e pressiono meus lábios contra os dela.

Sim, ela pode ser minha. Talvez já seja. Eu tenho certeza que já sou seu. De corpo e alma.

"Me diga que se lembra da noite passada." Peço num sussurro contra seus lábios, me agachando para que meu rosto fique perto do dela sem muito esforço. "Me diga que se lembra de tudo que fizemos."

Ela ri travessa, "Eu me lembro do sexo no banheiro, sim. Minha cabeça ficava batendo no azulejo, talvez seja por isso que dói tanto agora. Seu pau estava no meu estômago." Zomba e eu acabo rindo de seu exagero.

"Por que não disse nada?" Questiono ao apertar sua cintura, meu lábio inferior sendo puxado pelos meus dentes com a antecipação do assunto que vou adentrar. "Doeu muito?"

"Não, eu estava bêbada demais pra me importar." Admite, brincando com a gola da minha camiseta.

"Me lembro de você me mandando arruinar a sua boceta." Comento e ela ri, mas esconde o rosto nas mãos. "Ah não. Não fica tímida agora, senhorita Coloque-meu-sexo-em-chamas."

"Para." Sua ordem sai arrastada, "Aquilo foi péssimo. Eu estava com tesão e a cabeça girando."

"Cheia de soluços também." Recordo e sorrio, voltando a acariciar o cabelo dela. "Mas não é só do sexo que eu estou falando."

"Ah, sim. Eu me lembro da sua dancinha ridícula." Zomba e meu queixo cai em ofensa, minha mão indo ao encontro do meu peito em descrença ao que acabo de ouvir.

"Como é que é? Não ouse insultar as minhas habilidades na pista de dança." Me defendo, conforme ela ri deliciosamente, suas bochechas coradas. "Você é que é uma péssima dançarina. Acha que é só rebolar essa bunda e pronto? Nada disso, mocinha."

Charlotte ri mais alto, inclinando sua cabeça no braço do sofá, seus olhos brilhando de alegria - algo que eu causei. Que honra.

"Você é péssimo e fim de história." Volta a alfinetar e eu só balanço a cabeça em desaprovação, estreitando meus olhos.

Se ela recorda da dança e do sexo, então se recorda do que aconteceu entre esses dois eventos. Meu peito se enche com a mesma sensação quente, que já estou ficando acostumado a esse ponto, e minhas bochecha pregam a felicidade no meu rosto. Pelo jeito seremos sorrisos hoje e se depender de mim, que sejamos sorrisos sempre.

Me ergo da minha posição no chão e me sento na beirada do sofá, ao lado do corpo dela, minhas mãos acariciando seu rosto e cabelo, "Ah, Char. Você não faz ideia do quanto eu esperei por isso. Quer dizer, eu nem sabia que estava esperando, mas agora que aconteceu, eu entendo o quanto eu queria isso."

Me inclino sobre ela e encho seu rosto de beijos, "Você é a coisa mais linda, a minha garota linda. Eu vou cuidar bem de você, eu prometo. Não sei bem o que vai acontecer agora, mas eu garanto que serei fiel aos meus sentimentos e farei valer a pena."

"Woah." Charlotte faz e me afasta de si o suficiente para ver o meu rosto novamente, me permitindo enxergar sua feição confusa. "Do que você está falando, maluquinho?"

"Você sabe." Finjo timidez só para mexer com ela. Contudo, percebo que ela continua sem ideia de onde quero chegar. Será que eu não fui claro? Talvez não, eu só comecei a me declarar sem dizer o motivo. Imaginei que ela pegaria a dica.

Charlotte passa a me olhar com certo estranhamento e se senta no sofá, seus movimentos cautelosos. Droga, será que eu estou assustando ela com esse papo de sentimentos? Provavelmente. Afinal, assim como eu, nunca foi a intenção dela se deixar levar dessa forma.

"Escuta, meu bem." Suspiro, "Eu sei que pode ser assustador, eu estava com medo também. Ainda estou, confesso. Mas se nós formos pacientes, vai funcionar. Eu sei que..." Pego a mão dela nas minhas duas, "...juntos nós vamos fazer isso dar certo."

De repente, ela puxa a mão para longe das minhas e me encara com uma expressão nada boa, completamente oposta à cinco minutos atrás.

"Que porra?!" Basicamente exclama, seu corpo se afastando do meu o máximo que pode.

"Char-"

"Isso é algum tipo de piada? Porque não tem a menor graça, Harry." Repreende aborrecida e eu fico ainda mais intrigado. Ela está tão assustada assim? E eu pensando que eu estava em negação...

"Baby, relaxa. Olha, vai ficar tudo bem." Reafirmo, soando o mais calmo possível para tranquilizá-la. "Eu entendo, é tudo tão novo, mas nós vamos ficar bem. Agora que sabemos o que ambos sentem-"

"De que porra você tá falando, Harry?!" Dessa vez ela realmente exclama e eu vacilo, não tendo esperado essa hostilidade.

Abro a boca para responder, mas nada sai. O rosto dela dispõe repúdio e não era isso que eu estava imaginando que iria acontecer, tendo em vista o que ambos confessamos ontem. Ela não se lembra? É esse o único problema?

Quando eu demoro demais para falar alguma coisa de volta, os olhos dela se arregalam em horror e Charlotte pula pra fora do sofá, "Você deve estar brincando com a minha cara. Você tem que estar brincando com a minha cara, Harry. Porra!" Começa a gritar, andando pra lá e pra cá na sala, seu corpo todo tenso, seus punhos cerrados.

"Charlotte-"

"Não! Eu sabia!" Ela me corta, já que seu acesso de raiva ainda não havia passado. "Eu sabia, porra. Eu sempre soube que essa droga de acordo não ia dar certo, por isso que eu nunca aceitei fazer isso com ninguém, mas nãaaao... Você tinha que aparecer e insistir. Insistir e jurar que tinha tudo sob controle."

"Me diga." Ela para na minha frente, seus olhos perfurando buracos no meu peito com a intensidade que me fita. "Era esse o seu plano esse tempo todo? Só deu a ideia do acordo para tentar me enfiar num relacionamento? Foi essa a sua tática suja esse tempo todo?"

Agora sou eu quem se horroriza com algo que sai da boca dela e me apresso em me defender, "Não, jamais. Eu não sabia que isso ia acontecer, eu juro. Eu realmente só queria sexo, mas..."

"Mas o que?" Exige que eu continue.

"Mas aconteceu, Charlotte." Ergo meu tom assim como ela, apesar de detestar estar fazendo isso. "Aconteceu. Eu..." Fraquejo frente a rigidez do olhar dela e me acanho.

Ouço uma risada maliciosa vindo dela e meu peito se aperta em dor, "O que eu te disse? Hm? Que porra eu te disse naquela noite, Harry? Na noite que você me propôs essa merda."

Meu corpo todo pode estar em ressaca, minha mente em angústia, mas eu sei exatamente do que ela está falando e nem preciso cavar muito para recuperar as palavras que ela me proferiu quase três meses atrás.

Acho bom que saiba mesmo o que está fazendo, porque se esse tiro sair pela culatra, a culpa será toda sua. Nunca se esqueça disso, Harry. Eu falo sério.

Como eu pude não ver essa chegando? Estava tão óbvio, ela mesma me alarmou pra isso.

"Eu não devia ter feito um acordo com tesão. É claro que você não estava pensando e pelo visto, nem eu." Ela se martiriza, balançando a cabeça em desaprovação a sua decisão passada. "E você ainda teve a audácia de me zoar, dizendo que eu era medrosa e romântica demais para ter uma amizade colorida, quando na verdade você é quem nunca teve estômago pra isso. Eu. Sabia." Diz pausadamente, me ferindo um pouco mais.

"Isso não faz sentido." Murmuro pra mim mesmo, meus olhos se enchendo de lágrimas, minha garganta arranhando com a força que eu faço para não deixar minhas emoções se derramarem na frente dela.

"Como é? O que não faz sentido? Você ter quebrado a porra da sua parte do acordo, depois de ter me garantido que não faria isso?" Provoca.

"Você disse de volta!" Perco as estribeiras e acabo gritando na cara dela, a fazendo vacilar exatamente como fez a mim no sofá. "Ontem à noite naquela merda de balada. Você disse que gostava de mim também. Você disse, Charlotte! Eu ouvi, porra."

Ela me fita de cenho franzido, confusa, muito provavelmente tentando achar essa memória em sua cabeça.

"Você pode não se lembrar agora, mas essa é a droga da verdade." Eu aponto o dedo no peito dela e acrescento, "Então, aceita isso."

A confiança dela cai e eu sorrio de canto, porém ainda muito desgostoso. Não é uma vitória de jeito algum. Não há vencedores no jogo da negação.

Por mais que eu ame cada centímetro daquele rosto, eu me viro de costas para ela, incapaz de fitá-la por mais tempo.

Durante esses meses, aprendi um pouco sobre sua personalidade. Minha garota doce e ríspida, eu costumo dizer. Uma hora doce e em outra é como um soco nas minhas bolas. Ela pode ser bem malvada quando quer e me magoou agora.

Entendo que eu tenha quebrado o nosso acordo e isso não é legal, mas eu não escolhi me apaixonar por ela. Tá aí, eu disse. Paixão. Não dá pra escolher por quem seu coração vai bater mais forte, só acontece. Você pode até escolher ignorar, mas ainda vai continuar pulsando até passar de vez. E a droga do meu coração bate mais forte por essa mulher incorrigível. 

Maldito coração, seu trabalho é apenas bombear sangue e acumular gordura. Fica fora da minha vida amorosa.

"É nisso que você está se apoiando?" Ela volta a falar e eu me viro para encará-la de novo, vendo seu sorriso convencido e braços cruzados. "Na palavra de uma bêbada?" Questiona, me desafiando a achar argumentos melhores para continuar essa discussão toda.

"Eu estava tão bêbado quanto você e, acredite em mim, eu quis dizer cada uma daquelas palavras. Eu fui honesto, Charlotte. Aliás, eu sempre fui honesto com você. Sempre." Declaro sem hesitar, meu rosto sério como cada uma das minhas frases.

"Esse é o problema, Harry. Eu não estava sendo honesta." Rebate, mudando o peso de seu corpo de perna. "Eu não quis mesmo dizer aquilo."

A fortaleza que eu havia erguido para me proteger, desmorona. Uma coisa é ela estar com medo da verdade e agir com hostilidade por impulso, outra total e completamente diferente é nem ao menos estar na mesma sintonia que eu.

Eu estou sozinho com os meus sentimentos. Sempre estive.

No instante que me toco disso, sinto vontade de vomitar. Minhas entranhas se irritam e um mal-estar súbito me deixa tonto.

"Você- O que? Não, Charlotte." A negação me faz desacreditar, minha necessidade de estar certo me fazendo procurar um lugar para que eu me segure antes de cair e me espatifar. "Você pediu a nossa música favorita para o DJ, olhou nos meus olhos e disse que gostava de mim. Você me beijou..." Minha voz falha e eu sinto as lágrimas me ameaçarem de novo, "Você me beijou, me abraçou-"

"Tesão, Harry. Já ouviu falar?" Esbraveja, "E se eu falei que gostava de você, eu não menti totalmente. Eu gosto de você, gosto. Mas não desse jeito. Se eu disse que gostava, foi em outro sentido."

Raiva me sobe pela garganta, "Então por que não explicou? Por que me deixou pensar que sentia o mesmo?"

"Eu estava bêbada, inferno!" Grita, seus punhos se fechando em seu cabelo. "Como esperava que eu fosse te explicar qualquer coisa plausível, enquanto eu via tudo duplicado? É injusto e irracional esperar que eu tenha feito qualquer coisa prudente."

Como eu fui burro. Não só isso, mas ingênuo. Eu realmente esperei que isso ia dar no fim do arco-íris? Que idiota.

"Eu vou embora." Ela anuncia e começa a andar até o meu quarto.

"O que?!" Eu estou bravo, desapontado e passando mal, mas por alguma razão, ouvir que ela vai partir me faz sentir pior, por mais que tenha sido ela a causadora da minha dor. Paixão, a droga da razão. Uma eca.

Quando Charlotte volta para a sala, está calçada de seus tênis brancos, sua bolsa está pendurada no seu ombro e ela carrega seu vestido azul claro embolado na mão.

"Olha, cara, eu sei lá que droga foi essa que acabou de acontecer aqui, mas não foi pra isso que eu me inscrevi, então... Eu só vou embora e... deixar você pensar ou algo assim." Ela pronuncia as palavras com desconforto e simplesmente passa por mim, indo o mais rápido que pode em direção a saída.

Eu entro em pânico e faço a última coisa que deveria: imploro por ela.

"Não, Char, por favor. Não vai, não vai. Por favor, Char." Corro atrás dela e consigo alcançá-la, agarrando seu braço e depois sua cintura, trazendo seu corpo para o meu. "Por favor, baby, fica comigo. Eu posso explicar tudo, você vai entender melhor."

"Me solta, Harry." Ordena firmemente e eu obedeço com pesar, meus olhos mais úmidos que nunca.

Ela nem ao menos se vira para olhar no meu rosto e sai, batendo a porta atrás de si.

Minutos depois e alguém bate na minha porta. Eu me encho de esperanças e só estico a mão para abrir a mesma, já que não me movi do lugar. Meu sorriso cai quando entendo que é apenas o cara da entrega com o nosso café da manhã.

"Desculpa a demora. Agora é o horário do almoço e tem vários pedidos-" Eu só fecho a porta sem deixar ele terminar de falar, já que tudo foi pago anteriormente, nem uma única gota de educação ou paciência nas minhas veias.

Ando cegamente até a cozinha e deixo a comida na bancada da pia. O cheiro da mesma invade o meu nariz devagar e aquela ânsia de mais cedo volta com força.

Os próximos passos que dou são urgentes em direção ao banheiro, onde eu despejo todas as borboletas no vaso sanitário.

Não, não era impossível ou improvável. Mas nunca foi real.

N/A: Não me matem, eu tenho um plano.

Espero que tenham gostado pelo menos do início do capítulo lol
xx

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