Eu agradeço mentalmente quando consigo entrar na casa de John B de boa, sem precisar pular nenhuma janela ou quebrar a maçaneta e fingir que foi algum guaxinim de noite. Sim, isso já aconteceu.
Só quando eu entro e me jogo no sofá cama que percebo o porquê a porta estava destrancada - John B está sentado na poltrona, me encarando com a sobrancelha arqueada como os pais fazem quando os filhos adolescentes fogem para uma festa que eles o proibiram de ir.
— Fala aí, mano. Tá acordado até agora por quê?
John B parece com sono e, mesmo sem ele me responder, sei que estava me esperando chegar. Eu entendo, provavelmente estava preocupado e blá, blá, blá. Ele não costumava ser tão responsável assim antes.
Ele dá de ombros e pega o celular para digitar alguma coisa.
— Tava falando com a Sarah. E tu, cara? Se enfiou onde durante o dia.
Eu respiro fundo antes mesmo de responder, e talvez enrole um pouco enquanto tiro o sapato e me deito de qualquer jeito no sofá. É óbvio que ele está se fazendo de sonso para conseguir as informações que quer e tenho certeza que John B vai odiar minha resposta, mesmo que não tenha nada demais nela.
— Fui pra casa.
Dessa vez, ele não finge que está mais interessado no celular do que em falar comigo.
— Pensei que aqui fosse sua casa.
E é, tenho vontade de responder. Pelo menos a casa decente e minimamente segura que eu tenho para me esconder, mas aquela é a casa de verdade, onde eu constantemente tenho medo do humor do meu pai.
Não que eu deva sentir medo dele, sou bem mais forte e ele está sempre drogado, mas, ainda assim, eu sinto.
— Não começa, JB.
O garoto revira os olhos e se ajeita na poltrona o suficiente para me encarar exatamente como um adulto preocupado, o que é ridículo porque nós temos basicamente a mesma idade e, de novo, ele não é um exemplo de responsabilidade.
Eu já sei do que ele vai falar antes mesmo que fale.
— Foi por isso que não te falei, tá ligado? Não queria que surtasse.
Eu reviro os olhos e respiro fundo de forma dramática antes de responder.
— Eu não surtei, mano. Só fui pra casa porque sabia que meu pai não ia estar e queria ficar um tempo em paz.
John B arqueia a sobrancelha e eu passo a mão no cabelo e bagunço os fios. Sei que não deveria estar tenso por conversar com ele, mas não consigo impedir minha mandíbula de travar.
— Não tem nada a ver com Kie?
Só a menção do nome dela faz a boca do meu estômago pesar, principalmente porque sei que eles se divertiram juntos hoje. Aparentemente todos estão felizes com a volta dela - exceto eu.
— Não chama ela assim.
Ele é rápido na resposta.
— Você começou a chamar ela assim.
Eu sei. Eu que dei o apelido depois que ela reclamou que odiava seu nome porque não dava para chamá-la de algum jeito fofo. Ela gostou tanto que começou a assinar esse nome nos desenhos que fazia. Mas isso já tem tempo para caralho, não importa mais.
Jogo minha cabeça para trás até encostar nas costas do sofá.
— Foda-se, JB, não quero falar dela.
O garoto levanta as mãos em rendição, mas eu apostaria dois dedos que ele não tem a mínima pretensão de parar esse assunto antes de conseguir o que quer. E eu não tenho a mínima ideia do que é.
Posso sentir seu olhar sobre mim por mais alguns segundos antes de finalmente tomar coragem para o encarar com a sobrancelha arqueada. Então eu suspiro.
— Tá bom, pergunta de uma vez.
John B não perde a chance fingindo que não sabe do que eu estou falando.
— Não quer mesmo encontrar ela? Tipo, ver como ela tá e essas porras.
Eu não preciso pensar na resposta - ela é "sim". Eu quero para caralho saber como ela está e ouvir a voz dela, porque eu sinto sua falta como se ela tivesse ido embora ontem, e não há mais de um ano.
Como se não bastasse, eu queria procurar algum sinal nela de que ela se arrependeu de ir embora, e que sente minha falta também.
Mas ao invés de falar isso, eu só dou de ombros.
— Sei lá, JB. Ela deve continuar a mesma, linda pra caralho e ainda com a mesma mania de morder os lábios quando tá nervosa, apoiar a mão no rosto quando está cansada de falar e mexer no cordão o tempo todo.
O garoto na minha frente não consegue evitar o sorriso ao me ver falando e só por causa disso eu percebo que falei demais. Merda demais e agora ele nunca vai me deixar esquecer isso.
— Então sente a falta dela?
Eu reviro os olhos.
— Ainda é a garota que me deixou. Não sinto falta dela e definitivamente não quero vê-la de novo. Tá bom pra você?
Ele assente com a cabeça mas, no fundo, acho que nós dois sabemos que não é verdade.
O que é uma merda, porque eu sempre fui péssimo com essa porra de sentimentos e eu tenho tanto deles agora que mal consigo entender.