Jardim de Papel (taekook ABO)

By Nyx-in07

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Kim Taehyung, um garoto simples e único criado numa fazenda no interior de Daegu, Coreia do Sul, tem o sonho... More

Margaridas na Janela
O Almoxarifado N° 1
Um Chefinho Muito Estranho
Azul Hortênsia
Luz na Escuridão
Florzinhas de Papel
Cabelos de Fogo
Dia de Cão
Especial - O quê era Antes para se tornar Depois
O Vencedor
A Mui Nobre Família Ling
Se Queima em mim, Queima em você?
A Família Que Escolhemos
Amor Entorpecido e Instigado
Onde Deve Estar
Não Pode Ser Escondido
Profundezas do Desespero
Estou Aqui Agora
Incêndio
O Pardal Perdido Que Não Podia Planar
A Mais Terrível e Perigosa e Completamente Assustadora Coisa de Todas

Garrinhas Afiadas... Ou Nem Tanto

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By Nyx-in07


Taehyung despertou devagar e silenciosamente. Estava deitado numa superfície macia com um cobertor quentinho sobre ele. Seu corpo pesava e sua cabeça latejava tanto que a dor acompanhava seus movimentos. Ele fez uma careta e esfregou a têmpora, mas a dor pareceu apenas aumentar. As lembranças do último dia surgindo rapidamente como se a cortina de fumaça que as cobria evaporasse.

Ele estava no sofá de Jeongguk, percebeu. E eles haviam bebido juntos, lembrou-se, flashes de memória ascendendo em sua mente como fogos de artifício que explodem no céu e depois desaparecem.

Tae olhou pelas extensas janelas da sala, vendo que já era noite e a lua e as estrelas despontavam resplandescentes na escuridão infinita.

Minha nossa, nossa... nossa. Argh, a dor realmente estava derrubando-o. Que horas eram...?

Taehyung ouviu um som de metal colidindo com metal e segui-o com o olhar. Vinha da cozinha. Ele se levantou como se um urso estivesse abraçando-o pelas costas e se arrastou para olhar pela abertura na parede que mostrava a cozinha.

Porém, o quê viu lhe fez arregalar os olhos e abaixar rapidamente para se esconder, cobrindo a boca com as mãos.

Ele espiou pelo murinho, suas bochechas ardendo de tão vermelhas.

Jeongguk estava lá, preparando algo numa frigideira. De calça de moletom. Nu da cintura para cima.

Taehyung engoliu em seco e mordeu os lábios, seus olhos não conseguiam desviar da pele nívea do corpo dele, os músculos das costas se contraindo conforme ele se mexia. Altivo e detalhadamente perfeito, como uma escultura modelada por mãos firmes. Os bíceps ferrenhos eram duas vezes maiores que os de Tae, com veias saltando até chegar nas mãos.

Ele estava de lado. Entretanto, quando se virou para colocar uma mistura no micro-ondas, Taehyung pôde ver, com uma clareza que deixou-o corado até o pescoço, o abdômen de Jeongguk. O peito largo e protuberante, marcado por pintinhas marrons e avermelhadas, descendo até os músculos da barriga tão bem cinzelados que ele podia ver onde as linhas começavam e onde terminavam.

Mas algo chamou a sua atenção escandalosamente. Na lateral do corpo, sobre as costelas, um pouco acima da cintura, linhas pretas desenhadas que formavam palavras que ele não conseguia ler nessa distância.

Ó céus! Jeongguk tinha uma tatuagem?!

Taehyung se abaixou novamente, as costas contra a parede, de queixo caído e tentando digerir o que vira. Ele nunca havia visto um alfa que não fosse seu pai sem camisa. Porém, ele sentia que o impacto de ver Jeongguk sem camisa tinha a força de um tsunami no seu coração, que não parava de martelar com força nas suas costelas. Ele acreditava profundamente que nenhum outro alfa deixaria-o tão fora de si quanto Jeongguk.

Eu estou tão perdido...

– O quê está fazendo aí?

E lá estava ele. Carregando duas tigelas de porcelana branca. O cabelo cor de meia-noite escorria úmido pela testa. Algumas gotas deslizavam pela nuca e se perdiam atrás do ombro dele.

Taehyung sentiu seu olho direito tremer. Se era pela vergonha de ser pego ou pela visão daquele alfa, ele não sabia.

– Eu estava... hm... – Jeongguk arqueou uma sobrancelha. – Na verdade, estou me sentindo péssimo... e tonto... minha cabeça está explodindo tanto... ahhh... o quê será de miiiin...

Ele colocou a mão na testa e fechou os olhos. Não era totalmente mentira, afinal. Ouviu um som oco de algo sendo posto no balcão e logo em seguida mãos seguravam-o pelos cotovelos.

– Vem, eu ajudo você... Deve ser a ressaca. – disse Jeongguk, tão perto que Tae estremeceu.

O ômega abriu os olhos e viu o rosto exuberantemente belo de Jeongguk. A pele vistosa, o leve rubor nas bochechas - provavelmente por causa do banho - a pintinha que habitava logo abaixo do lábio inferior dele. Taehyung traçou-os como um pintor admira uma obra.

Jeongguk levantou-o com facilidade, como se ele não pesasse nada.

Seus olhares se encontraram. Eles estavam há centímetros de distância. Jeongguk ainda com as mãos nos braços de Tae, que quase conseguia sentir o calor que a pele dele emanava. Taehyung olhou para a boca dele, tão perto e tão macia...

Jeongguk afastou-se, pigarreando. Taehyung conteve uma careta de decepção.

– Eu não sabia que você tinha uma tatuagem. – balbuciou qualquer coisa para fugir da situação. Depois, se sentiu ridículo. Como poderia saber?

– Ah... É... – Jeongguk virou o corpo para que ele visse com clareza. Era uma frase escrita com letras pequenas e sóbrias, sem floreios ou curvas perfeitas. "Minha sombra caminha na luz".

Taehyung mordeu o lábio, ponderando-a por um instante antes de dizer:

– Essa é uma frase triste.

Jeongguk olhou-o com atenção.

– Por que acha isso?

– Quer dizer que você tem um lado escondido que ninguém conhece, não é? Sombra que caminha na luz... Tudo de você está tão obviamente claro para todos ao seu redor, todos tem sua própria ideia sobre você, mas aquela sua parte que ninguém conhece permanece desconhecida de qualquer forma.

Jeongguk estava boquiaberto, os olhos tão arregalados que pareciam prontos para saltar a qualquer momento. Taehyung se encolheu. Será que havia dito algo errado?

– Você... – murmurou ele. – Foi o único que entendeu o significado sem eu precisar dizer.

O pequeno ômega sentiu-se corar sob o olhar tão profundo que vinha do alfa. Ele deu um sorriso frouxo, abaixando o queixo.

– Sua cabeça ainda dói? Eu tenho um analgésico. – esquivou Jeongguk, pegando as tigelas em cima do balcão e colocando na mesa de jantar.

Sim, a dor ainda estava lá. Taehyung acabou de se lembrar dela. Parecia que a presença do alfa captava sua atenção e o fazia se esquecer de qualquer coisa para se concentrar somente nele.

– Que horas são? – quis saber Tae.

– Dez e pouco. Eu acordei com Jimin me ligando feito um louco perguntando o quê aconteceu.

– Preciso ir para casa... – murmurou Taehyung. Ele queria seu adorável quarto, sua cama quentinha, uma boa xícara de chá fumegante e uma silenciosa noite de sono. Esquecer aquele dia tão longamente cansativo.

– Coma um pouco antes. Eu te levo. – falou Jeongguk. Tae arqueou uma sobrancelha.

– Achei que seu carro estivesse na oficina.

Jeongguk deu um torto e preguiçoso sorriso de lado.

✿✿✿

Taehyung sentia o vento cortante em sua nuca, arrepiando-o até os dedos dos pés como pequenas lâminas geladas. Seus braços rodeavam a cintura vestida em couro do alfa que pilotava a moto, um modelo muito bonito e muito caro de lataria preta e dourada, banco confortável e rodas enormes que deslizavam pela pista como patins no gelo. O barulho do motor reverberava por Taehyung como um tambor num templo oblongo.

O ômega não ligava para o frio que estremecia-o e congelava suas mãos entrelaçadas sobre o abdômen de Jeongguk. A sensação de liberdade que fazia seu coração retumbar, o mundo passando como um borrão de tinta, a lua acima que parecia correr com eles, nada mais importava a não ser aquilo. Aquela adrenalina que viajava pelo seu corpo lançando choques bons até a ponta de seus dedos.

Taehyung apertou mais forte a jaqueta que Jeongguk usava, descansando o queixo no ombro dele com um pouco de dificuldade por causa do capacete.

Eles chegaram no prédio do ômega mais cedo do que ele gostaria. E foi só retirar o capacete que Tae desatou a falar.

– Minha nossa, nossa, nossa chefinho! Eu nunca me senti tão animado antes! Sinto que posso gritar e gritar e ainda assim não conseguiria descrever a sensação! Uau...Foi incrível... Foi exatamente como eu imagino que seria voar! O vento, o mundo ficando em segundo plano, a emoção no fundinho do meu coração...

Jeongguk riu, retirando também o seu capacete.

– Eu quase não ando de moto, mas realmente adoro. Eu me sinto... não sei...

– Livre. – completou Taehyung. Jeongguk olhou para ele enfaticamente, depois assentiu, sorrindo.

– Sinto muito pelas suas roupas. – ele apontou com o queixo para a sacola que Tae carregava.

– Ah, fazer o quê. – ele deu de ombros. – Mas vou sentir falta dos meus queridos tênis. Eu realmente gostava deles...

Fizeram silêncio, admirando-se sem conseguirem desviar os olhos, qualquer palavra parecendo trivial para o momento.

– É melhor você entrar. – disse Jeongguk, enfim. – Está bem frio aqui.

Taehyung assentiu e se virou para entrar no prédio, mas parou no primeiro degrau que levava ao hall. Então, voltou correndo até o alfa e rodeou seu pescoço com os braços. Jeongguk tensionou, arregalando os olhos, sentindo a cosquinha em seu pescoço do cabelo do ômega roçando-lhe e o arrepiando.

– Obrigado, chefinho, por tudo... – sussurrou. Depois, saiu apressadamente para dentro do prédio, as bochechas ardendo vermelhas, porém sorrindo.

– De nada... – murmurou Jeongguk, dando um meio sorriso torto. Balançou a cabeça e deu tapinhas nas próprias bochechas, colocando o capacete e disparando dali.

✿✿✿

Dois dias depois...

– Tae! Chegou uma encomenda pra você! – gritou Jimin, entrando em casa carregando a caixa que o porteiro lhe entregou assim que chegou no prédio. Ele soltou-a no meio da sala enquanto ouvia os passinhos rápidos do ômega correndo até ali.

– Onde? Onde? Quero ver! – disse afobadamente, segurando uma escova de dentes. Jimin riu e apontou para a caixa retangular média pousada no tapete da sala.

Taehyung abriu-a com pressa, arrancando as fitas adesivas e retirando a tampa. Ele arregalou os olhos e ficou um instante parado encarando o interior. Jimin, curioso como um gato, se aproximou para ver o quê era.

– Um tênis?! – exclamou.

Um modelo all-star de cano alto amarelo mostarda. O mesmo que Taehyung havia visto aquele dia no shopping com Jeongguk.

Um bilhete fora posto entre os cadarços de um dos tênis. Taehyung pegou-o.

Até que essa cor não é tão ruim. Espero que goste.

Jeongguk.

Taehyung sorriu até chegar nos olhos, seu coração disparando como um cavalo de corrida, olhando para os tênis como quem olha para um diamante lapidado sendo envolvido por luz dourada efervescente. Já fazia dois dias que o incidente com a tinta aconteceu. Jeongguk não precisava fazer aquilo, mas fez. Ele lembrou.

Taehyung suspirou, as borboletas no seu estômago despertando e dando piruetas.

– É do chefinho... – murmurou, sorrindo como um tolo alegre.

Jimin arqueou uma sobrancelha.

– Por que Jeongguk te daria um tênis? – estranhou.

Tae deu de ombros.

– Meu tênis estragou aquele dia. Ele pode ter pensado que eu estava triste e por isso me presenteou com um novinho! Ah, ele é tão generoso...

– Generoso... Claro... – sopesou Jimin, com um quê de desconfiança.

– Jimin-ssi... Eu tenho uma coisa pra você. – desviou Tae, deixando os tênis na caixa. Ele correu para o seu quarto, voltando com um punhado de folhas sulfite presas por um clipe cor-de-rosa. Ele estendeu-as para Jimin, mordendo o lábio em aflição.

Jimin pegou-as, hesitante.

Eram... roupas. Desenhadas de uma forma meio infantil e não muito profissional. Folheando, ele percebeu que eram as suas roupas. As que ele desenhou para a nova coleção de primavera. As mesmas que estavam no caderno que havia sido destruído pelas tintas.

– Refiz todos que me lembrava. – explicou Tae, mexendo as mãos uma na outra. – Não estão tão bonitos quanto os seus, mas espero que goste. Eu me dediquei bastante... Olha, eu fiz até os pelinhos do Casaco Komondor...

– Tae... – disse Jimin em meio a uma risadinha. – Eu agradeço muito por você ter se importado o bastante para refazer todos os desenhos, mas não precisava.

– Não?

Jimin balançou a cabeça.

– Todos os meus croquis são digitalizados e guardados no computador justamente por precaução.

Taehyung piscou, seus lábios repuxando para cima lentamente.

– Ah! Você não sabe como eu me sinto aliviado, Jimin-ssi! Achei que havia estragado seus desenhos com mais uma das minhas "desastrices"... Ufa, todo esse trabalho me deu fome. Podemos comer o Donny hoje, Jimin-ssi? Eu pago!

Ele saiu saltitando, pegando seus tênis e abraçando-os contra o peito, indo até o quarto. Jimin ficou olhando, sorrindo e balançando a cabeça. Ele guardou os desenhos adoráveis de Taehyung na gaveta de seu ateliê. Mas um deles, o casaco Komondor, ele grudou com um pin no quadro de avisos onde costumava deixar seus próprios desenhos.

Jimin-ssi olhou para ele com carinho.

✿✿✿

– Eu e o chefinho... – murmurava Taehyung, sentado à mesa de sua sala, enquanto desenhava numa folha de papel de caderno na horizontal. – Numa linda casinha no campo, amarela com portas e janelas azuis, e três... Não... Quatro filhotes... Será que o chefinho gostaria de ter quatro filhotes?

Taehyung pintava com lápis de cor azul as mechas de seu cabelo no desenho. Era ele e Jeongguk de mãos dadas, em frente a um cenário campestre cheio de pinheiros pontiagudos e flores delicadas, com uma adorável casa amarela e azul pastel. Ao lado deles, quatro pingos de gente um menor que o outro. Dois de cada lado.

– Podemos ter uma menina primeiro... – continuava o ômega, a bochecha apoiada na mão esquerda enquanto a direita trabalhava. – E então gêmeos! Sim! Mas não idênticos porque seria difícil diferenciá-los e eu ficaria doidinho... Talvez um casal... E, por último, um garotinho de cabelos pretos e dentinhos de coelho igual o chefinho... Que nomes nós daríamos pra eles?

Taehyung pegou o lápis preto e terminou de colorir o cabelo do garotinho caçula. Então, desenhou um coração e dentro dele escreveu "KTH + JJK". Com sua obra terminada, ele permaneceu admirando e sonhando com uma vida ao lado de Jeongguk. Tanto que não notou quando outra presença adentrou a sala.

Jimin estranhou o fato de seu amigo não responder aos seus muitos chamados. Taehyung olhava com atenção algo em cima de sua mesa, sorrindo perdidamente e quase babando. Ele se aproximou para ver o que era.

Levou exatamente dez segundos para Jimin entender aquele desenho e o quê ele significava.

– EU NÃO ACREDITO!

Taehyung deu um pulo tão forte na cadeira que as rodinhas se afastaram para trás e ele caiu de bunda no chão. Paralisado, seu rosto estava mortalmente pálido enquanto encarava Jimin, que não tirava os olhos do desenho.

– JIMIN-SSI!

– Então... Então... – Jimin se afastou do desenho como se ele fosse amaldiçoado, apontando com um dedo trêmulo. – Você... gosta... do Jeongguk? Todo esse tempo era ele?! Minha mãezinha... Eu preciso me sentar antes que minhas pernas esqueçam pra quê elas servem...

Ao invés disso, ele se apoiou na parede como uma lagartixa, os braços esticados ao lado do corpo.

– Jimin-ssi... Eu posso explicar... – pestanejou Taehyung, lívido de medo.

– Ah, você vai. Pode ter certeza. Vai me explicar que porcaria é essa, Kim Taehyung?! – ele estreitou os olhos como um felino desconfiado. – Por que diabos você gosta do Jeongguk?! Do Jeongguk, justo ele?!

Taehyung piscou, sua expressão passando de assustada para confusa.

– Ora, como assim porquê? O chefinho Jeongguk é a pessoa mais apaixonável que eu conheço! Ele é tão, tão bonito, e adorável mesmo sem perceber, e eu acho que ele até que gosta da minha presença, ainda que faça de tudo para não demonstrar isso. Além disso, eu sinto que o compreendo melhor que a maioria das pessoas. Sabe, ele é mais do que deixa transparecer. Muito mais.

Jimin sentiu que precisaria segurar seu queixo ou ele estatelaria no chão.

– Mas Tae, ele te trata mal desde que você chegou...

Taehyung sacudiu o indicador para o lados em negação.

– Tsc, tsc... Isso não é verdade, Jimin-ssi. O chefinho foi muito legal quando me contratou para a vaga de almoxarife, me defendeu bravamente aquele dia na churrascaria, elogiou meu trabalho no almoxarifado, me tratou muito bem quando eu fui na casa dele e até salvou minha vida! Me ajudou quando fomos às compras... E ele sempre entra nos meus planos maluquinhos. Sabe aquele dia em que a Taeyeon passou mal? O chefinho me consolou lá no hospital com sorvete! Ah... ele é perfeito... E também no dia da tinta... Ele tem seus dias ruins, sim, mas sempre se desculpa depois.

Ele fez uma pausa para respirar e para sorrir.

– O chefinho é uma das melhores pessoas que eu conheço. Não usual e um pouquinho difícil de entender, mas é isso que me faz gostar dele. Ele é um enigma, uma incógnita, que esconde um tesouro muito bem escondido dentro do coração. Mas, sabe, Jimin-ssi, eu não me importo de cavar até encontrar.

E Jimin, bem, se encontrava com uma estranha vontade de chorar até transbordar pelos poros. Aquele ômega era... extraordinário. Em tão pouco tempo ele conheceu mais de Jeongguk do que muitas pessoas que conviviam com ele há anos. Como ele fazia para ver tudo isso? Como ele fazia parecer tão fácil?

– Tae... – murmurou Jimin hesitante. – Há coisas que você não entende... Coisas sobre Jeongguk que fazem ele... Bem...

O pequeno ômega tombou a cabeça para o lado.

– Que coisas? Não estou entendendo...

– Não cabe a mim contar. Mas, Tae, você e Jeongguk, eu não acho que será possível...

– Por que não? – ele juntou as sobrancelhas, um tanto magoado.

Jimin suspirou.

– É complicado, mas o Jeongguk não está aberto a relacionamentos, entende?

– Mas por que? – insistiu.

– É um assunto delicado e o Jeongguk odeia que falem sobre isso. – foi tudo que Jimin conseguiu dizer. – O quê eu estou dizendo é que... Tae, sinto muito, mas você não tem chance.

O ômega fez um biquinho, brincando com um lápis de cor sobre a mesa.

– Talvez não, mas não vou desistir. – afirmou com perseverança. – O chefinho está sempre rodeado de pessoas, mas é solitário. E eu vou fazer de tudo para que ele não se sinta mais assim! Qualquer coisa!

Jimin engoliu em seco, olhando de Tae para os garranchos infantis sobre o papel. Taehyung e Jeongguk e quatro crianças, desenhados como bonecos de palito com um tufo rabiscado sobre a cabeça. Jimin não deixou de notar que todas as crianças tinham cabelo preto como Jeongguk.

Fez-se um silêncio reflexivo. Jimin pensava em tudo que Taehyung dissera, até que...

– Tae, que história é essa do Jeongguk te defender na churrascaria?!

✿✿✿

Jimin saiu do A1 com uma nuvem cinzenta de raios e trovões barulhentos sobre sua cabeça. Parecia que, subitamente, o mundo havia ficado dez graus mais frio. Ou era apenas suas mãos tremendo de nervoso.

Ele encarava uma folha de papel em branco, batucando uma caneta na mesa, em qualquer outro mundo paralelo onde sua mente o levava. Este que era encoberto por sombras feitas de nanquim e lembranças turbulentas que, por mais que tentasse esquecer, nunca seria possível.

Nem mesmo duas batidas singelas na porta, acompanhados por um cheiro inebriante de sabonete de sândalo e produtos de limpeza de álcool e lavanda, conseguiram lhe arrancar daquele outro mundo coberto por cinzas de incêndios que já queimaram e neblina opaca.

– Você está com uma cara péssima, meu coração. – anunciou Yoongi, com o tom de voz macio que ele usava para falar quando Jimin estava daquele jeito.

Jimin soltou um gemido de aflição e ergueu os braços para Yoongi, que levantou-o e sentou-se na cadeira, puxando Jimin para seu colo.

– Me conte o quê houve. – pediu, acariciando os cabelos cor de chiclete macios como chá de camomila na garganta. Tinham a mesma sensação calmante para quem os tocava, na opinião de Yoongi.

– Descobri uma coisa que me abalou mais do quê deveria. – ele deitou a cabeça no ombro de Yoongi, falando baixinho no ouvido dele.

– O quê?

Jimin hesitou.

– Taehyung gosta do Jeongguk. – disparou.

Yoongi permaneceu em silêncio por um longo instante.

– Bem, isso é uma surpresa. – foi o quê disse. – Mas não entendo porque você ficou tão chateado.

Jimin olhou de súbito para o alfa, seus olhos na mesma altura. Não entendia como Yoongi conseguia ser tão calmo mesmo em situações desesperadoras como aquela.

– Como assim?! Yoongi, você sabe como Taehyung é. Ele sente as coisas intensamente. Ele próprio é intenso demais para seu próprio bem. Sabe como eu descobri? Ele estava desenhando ele e Jeongguk junto com quatro filhotes!

Yoongi deu uma risadinha de nervoso que mal apareceu e já havia sumido.

– Isso é preocupante. Muito preocupante.

– Entende o quê eu quero dizer? Não quero que Tae sofra. E é isso que vai acontecer se ele continuar com essa paixão pelo Jeongguk.

– Ou não. – ponderou. Jimin arqueou uma sobrancelha numa pergunta silenciosa. – Jimin, não é possível que você não veja a mudança no nosso amigo desde que Tae chegou. Ele está mais leve e até menos mórbido. Até aceitou sair com a gente aquele dia, e deixou Taehyung ir dormir na casa dele. Coisa que nós sabemos que seria impossível com qualquer outro. E foi fazer compras com vocês...

– Tecnicamente ele foi coagido pelo Jin, mas você tem razão. O Jeongguk de antes teria virado as costas e ido embora.

– Viu? Ele está mudando. Aos poucos. – acrescentou, não deixando de acariciar a cintura de seu ômega. – Se tem alguém que pode derreter o gelo daquele coração, é Taehyung.

Jimin mordeu os lábios.

– Será que seria possível Jeongguk retribuir os sentimentos de Tae? – ponderou. Nem ele e nem Yoongi sabiam a resposta, entretanto.

– Taehyung é uma pessoa ótima. E obstinada. – sorriu. – Ele consegue.

– Eu achei que depois do que aconteceu, Jeongguk nunca mais iria... – ele não foi capaz de continuar. Os dois ficaram em silêncio, perdidos em suas próprias memórias.

– A vida pode ser muito surpreendente, meu coração. – disse Yoongi, enfim. – Não se preocupe com isso agora. Apenas apoie o Tae. Tenho certeza que, com a sua ajuda, vai ser mais fácil.

Jimin deu um pequeno sorriso, mas que chegou aos olhos.

– Você está certo. Certíssimo. – então seu rosto se contraiu numa inflexível expressão de confiança. – E, quem sabe, seja a minha vez de bancar o Cúpido.

Yoongi iria dizer algo, mas Jimin se inclinou para capturar o lábio dele sob o seu. Eles se perderam no gosto e na textura da boca um do outro até o celular do alfa tocar. Era Hyeon. Uma chamada de vídeo.

– Papai! Tio Jimin! Eu tirei um dez na prova de coreano e a professora deixou eu ligar para contar! Não é incrível?

Jimin ficou entre orgulhoso pela boa nota de Hyeon e triste por ele ainda chamá-lo de "Tio Jimin". Ele sabia que era um sentimento estúpido já que ele e Yoongi estavam juntos há pouquíssimo tempo. Mas algo dentro dele ansiava por isso. Ele sabia que era seu lado lupino que desejava considerar aquele filhote como o seu. O filhote que ajudou a criar e que amava.

– Dorme lá em casa amanhã? Vou comprar aqueles mexilhões que você adora. – disse Yoongi, um quê de súplica em sua voz.

Jimin riu e assentiu, deixando seus pensamentos bobos de lado.

✿✿✿

– E agora eu não sei o quê fazer! – dizia Taeyeon desesperadamente, andando de um lado para o outro com tanta força que seus pés poderiam causar sulcos no chão. – Não quero magoá-lo, mas também não posso perder essa oportunidade! O Sr. Park me indicou para esse intercâmbio pessoalmente!

– Taeyeon-ssi, você precisa contar para o Hoseok-hyung. – aconselhou Taehyung. – Ele é apaixonadíssimo por você. Vai entender.

– Mas e se ele ficar muito triste? E se nosso namoro enfraquecer com a distância? E se ele se apaixonar por outra pessoa?

– Se acalme, Taeyeon-ssi! – pediu Taehyung, realmente preocupado com a integridade de seu piso. – Um amor como o de vocês não se encontra de um dia para o outro. E mesmo com a distância, tenho certeza que vocês vão superar.

Taeyeon finalmente se sentou sobre a mesa, para o alívio de Tae.

– Essas semanas que passamos juntos foram as melhores da minha vida. – contou, sorrindo. – Hoseok me faz rir e sempre se preocupa comigo. Eu até já conheci a mãe dele. Foi por acaso. Ela chegou de repente na casa dele quando eu estava lá. E ele me apresentou com o maior orgulho! Eu... Acho que vou desistir do intercâmbio. Nenhuma vaga de emprego no exterior vale o que nós temos. E eu sou feliz aqui.

Taehyung segurou a mão de Taeyeon.

– Primeiro fale com ele. E vocês decidem juntos. É o melhor do melhor!

Taeyeon sorriu.

– Você sabe tanto sobre amor, Tae. Não entendo porquê não namora.

– A-ah... Bem... – gaguejou, suas bochechas ganhando cor.

– Ainda não encontrou as palavras certas? – brincou ela. Taehyung riu de nervoso e assentiu.

– Preciso levar o lixo reciclável. – anunciou Tae com rapidez. – Vai dar tudo certo, Taeyeon-ssi. Você vai ver. Apenas fale com o Hoseok-hyung.

Taehyung colocou a caixa com todo o lixo reciclável que não poderia ser utilizado por si para criar coisas miraculosas e exóticas no chão, mas a visão que teve do local onde o lixo era separado não lhe agradou nem um pouco.

– Ora, quem é que está jogando plástico no lixo de papel e latinhas de cerveja no lixo orgânico? – resmungou para si mesmo, trocando os objetos e colocando-os em seus devidos lugares.

Porém, enquanto trabalhava, Taehyung começou a ouvir um estranho e incomum barulho. Ele levantou a cabeça e apurou os ouvidos. Era baixinho e agudo e incessante e vinha detrás da lixeira de orgânicos.

Incerto, Tae se aproximou devagar e afastou a lixeira para o lado.

Ele quase pôde ouvir o estampido de seu queixo caindo no chão.

– Mas... é um gatinho! – exclamou.

Aquele pequeno ser peludo e tão magro que era possível ver suas costelas, arranhava a lata de lixo com suas garrinhas e miava desesperadamente. Provavelmente sentiu o cheiro de algo apetitoso vindo dali e estava com fome.

– Oh... Olá, pequeno gatinho. – disse Tae, seu coração amolecendo como uma nuvem fofinha que é desmanchada pelo vento. O gato olhou para ele com curiosidade. – O quê está fazendo aí? Procurando comida?

O gato pareceu ponderar e decidiu que Taehyung não oferecia ameaça, então se aproximou e começou a se esfregar nas pernas do ômega e miar mais alto.

Ele era realmente miúdo, ainda um filhote de orelhinhas peludas e olhos azuis. Seu pelo era tão preto quanto a noite antes do sol raiar, mas estava ralo e um pouco embolado no rabinho.

– Se perdeu da sua mamãe, gatinho? – perguntou Tae, se abaixando para acariciar a cabeça do bichano. – Deve estar na rua há um tempo.

Ele miou mais forte.

– Não tenho comida para você aqui, sinto muito. – ele ronronava agora, tentando morder os dedos de Tae. – Deve ser muito solitário. Vagar por aí... Sozinho... Sem ninguém para te fazer companhia...

Ele miou baixinho, como se concordasse com Tae.

Às vezes, eu me sinto solitário.

Então... O chefinho precisa... preencher essa parte.

Foi como uma epifania. De repente, tudo pareceu se encaixar como as peças perfeitas de um quebra-cabeça mental. Jeongguk, sozinho e solitário, precisava de algo que o fizesse feliz. Um amigo presente. Uma companhia carinhosa. O gatinho, de alguém que lhe desse comida e um lar repleto de amor.

Taehyung sabia exatamente o quê fazer.

✿✿✿

– Certo, gatinho, você entendeu o plano, não é? – murmurou Taehyung para o gato escondido no seu colo por dentro da blusa de moletom. Tae fingia estar com os braços cruzados para disfarçar. Felizmente, ninguém que passava por ali lhe dava atenção. – O chefinho não é alguém muito fácil, então você vai precisar de muita paciência. Mas você vai gostar dele... Ele é adorável...

O gatinho apenas o olhava atentamente com aqueles olhos azuis fúlgidos e parecia entender tudo que o ômega falava. Ou estava apenas ponderando se havia feito um bom negócio aceitando ir com aquele rapaz tão peculiar.

– Estamos quase chegando, gatinho. – informou Tae, já no elevador. – Mas não posso ficar te chamando de gatinho... Que tal... hm... Tata? Você gosta de Tata? É um bom nome.

O gato nada respondeu, apenas continuou encarando-o. Taehyung interpretou o silêncio como afirmação.

Era hora do almoço. O Covil estava vazio e nem a gárgula mau-humorada que guardava a entrada do recinto - isto é, Seomin - estava ali naquele momento. A mesa do secretário residia vazia.

A porta da sala do alfa estava destrancada. Taehyung a abriu cautelosamente, espiando por entre uma fresta. Nem sinal de Jeongguk. Ele já devia ter ido almoçar, supôs.

O pequeno ômega estava na ponta dos pés, fechando a porta com leveza e silenciosamente. O gatinho se remexia em seu colo.

– Shh... – pediu Tae para ele. – Já estamos na segunda fase do plano. Agora, ouça bem. – ele fez contato visual com aquelas duas bolinhas de gude cerúleas. – Quando o chefinho chegar ele vai te ver, se perguntar o quê você está fazendo aqui, então você precisa seduzi-lo com esses olhinhos adoráveis, essas orelhinhas peludas, os bigodinhos tão... tão fofinhos... – ele fez um bico, morrendo de vontade de apertar aquela criatura cheia de pelos arrepiados. Balançou a cabeça, voltando a si. – Foco, Kim Taehyung... Acha que consegue fazer isso?

Taehyung se escondeu atrás do sofá de modo que Jeongguk não pudesse vê-lo a menos que resolvesse caminhar para abrir as cortinas do outro lado da sala. O quê era bastante improvável, já que elas permaneciam fechadas desde que o ômega se lembrava. Então, era só esperar.

Quando ouviu o barulho da campainha do elevador, Taehyung correu até o meio da sala e posicionou Tata ali, bem em cima do tapete retangular, disparando para seu esconderijo em seguida.

A porta se abriu e ele ouviu a voz de Jeongguk, mas ele falava numa língua que Tae não entendia. O modo como ficava em silêncio por alguns segundos antes de falar novamente indicava que ele estava ao celular.

3...2...1...

Mas o quê é isso?!

Taehyung tapou a boca para conter um gritinho de animação. Jeongguk tinha visto Tata e nesse momento devia estar se apaixonando perdidamente pelas patinhas de almofadinha macias....

– O quê esse gato horroroso 'tá fazendo na minha sala?! – o tom de Jeongguk não era nada amigável, muito menos de alguém que estava apaixonado. A expressão animada de Taehyung diluiu em uma preocupada.

Ele ouviu um miado de Tata.

– Shiu, shiu! Saia do meu tapete... Ei! Pare de se esfregar em mim! – outro miado, desta vez um ofendido. As coisas não estavam saindo como Tae esperava. – Alô? Pelo amor de Deus, tem um gato de rua na minha sala! Não, eu não sei como ele entrou! Exijo que alguém venha tirar esse bicho daqui... Sei lá, coloque de volta na rua...

– Não! – gritou Taehyung, aparecendo de trás do sofá e causando um berro de susto de Jeongguk.

O olho esquerdo do alfa tremeu ao constatar a presença do ômega.

– Eu devia saber! – acusou Jeongguk, apontando o dedo indicador para ele. – Tudo de estranho que acontece nessa empresa é coisa sua!

– Senhor Jeon? – chamava a moça do telefone.

– Deixa pra lá, eu já resolvi. – ele desligou e cruzou os braços, encarando Taehyung com os olhos cerrados. – Explique-se.

Taehyung deu um gemido de dor, juntando as palmas como uma prece.

– Por favor, chefinho, não fique bravo! Eu achei essa pobre criatura no lixo, com fome e frio, e é só um filhotinho! Um bebê que se perdeu da mãe e agora está sozinho no mundo... Olha só como ele é fofinho... Não dá vontade de guardar para sempre numa caixinha e garantir que nada de mal lhe aconteça?

Jeongguk olhou para aquele gato esquelético, com o pelo quase cinza de sujeira e embolado, os olhos enormes e azuis e garrinhas que com certeza fariam um estrago em qualquer sofá ou tapete importado dolorosamente caro.

– Tenha a santa paciência... – murmurou, apertando a ponte entre os olhos. – De todas as suas loucuras, essa foi a pior... No que é que você estava pensando?! Trazer um gato do lixo até a minha sala?!

Taehyung cutucou os indicadores, mordendo o lábio inferior.

– Eu achei que... como o chefinho se sente solitário, poderia ficar com ele...

– Eu?! Ficar com esse gato feio?!

Taehyung escancarou a boca.

– Ele não é feio! Você que é! – e se arrependeu no segundo seguinte. – Não! É mentira, chefinho! Você não é feio, eu só disse isso porque fiquei com raiva...

Jeongguk revirou os olhos.

Tata, completamente alheio à discussão, brincava com os cadarços do tênis mostarda de Tae.

– Não vou ficar com esse gato. Procure outra pessoa. – sentenciou.

Taehyung suspirou. Jeongguk estava irredutível, mas ele não iria desistir. Felizmente, um ômega preparado é um ômega que sempre tem um plano B.

Ele deu um sorriso dissimulado.

– E se fizermos uma aposta?

Isso atraiu a atenção de Jeongguk certeiramente, como um flecha que acerta o centro de um alvo multicolorido.

Uma coisa que havia aprendido sobre o alfa era que ele tinha um espírito competitivo tão, tão grande que poderia ser controlado por este. E odiava perder. Então, Tae usaria isso a seu favor.

– Que aposta? – perguntou, rondando o ômega como um felino rodeia uma presa saborosa.

Taehyung não se deixou abater por aqueles olhos de corça vigorosos e carregados de presunção. Mesmo que suas pernas estivessem moles e os joelhos, trêmulos.

– Você fica com ele por uma semana e, se nesse meio tempo não se apaixonar perdidamente e perceber que não pode mais viver sem essa criaturinha peluda e adorável, então você vence. – explicou, procurando olhar para qualquer coisa que não aqueles olhos.

– E o quê eu ganho se vencer? – quis saber, a voz arrastada de interesse. Ele já estava seduzido como uma serpente que ouve uma música agradável e perfeitamente fascinante aos seus ouvidos.

Taehyung respirou fundo.

– Eu faço o quê você quiser. Qualquer coisa.

Ele ergueu uma sobrancelha ociosa e afetada.

– Qualquer coisa, hm? – ele deu um sorriso sagaz. – Só uma semana?

– U-hum, apenas sete "diazinhos". Mas você tem que agir como um dono.

Jeongguk fez uma careta.

– Como assim "agir como um dono"?

– Dar banho, alimentar, limpar a caixinha de areia, brincar com ele, fazer carinho na barriguinha e atrás das orelhinhas, e acho que você vai ter dar leite na mamadeira já que ele é tão pequeno... – enumerou Taehyung, contando nos dedos.

– Já vi que minha conta bancária vai pro saco. – resmungou.

– Para de reclamar, você é rico!

– Pode parar de ficar falando isso toda hora?! Dinheiro não resolve tudo!

– Claro que resolve! – retrucou enfaticamente. – O mundo é uma selva capitalista onde o dinheiro é a banana que você dá pros macacos que querem te atacar.

Jeongguk fez uma notável expressão de "Você está completamente maluco".

– De onde você tirou isso?!

Ele deu de ombros.

– Namjoon-hyung estava me ensinando sobre capitalismo.

Jeongguk fechou a cara, arqueando uma sobrancelha.

– Claro, tinha que ser. Agora, será que dá pra tirar esse bichano fedorento da minha sala? Eu preciso trabalhar.

– O.K.! Vou deixá-lo no A1 comigo e, assim que terminar o expediente, a sua missão se iniciará...

A cara que Taehyung fez deixou Jeongguk levemente preocupado.

✿✿✿

– Imagino que a primeira coisa a se fazer seria dar um bom banho nele. – disse Jeongguk, torcendo o nariz para o gatinho que dormia profundamente nos braços de Taehyung, enrolado em sua blusa de moletom.

Já era final de tarde e, como prometido, Jeongguk havia iniciado a sua missão. A aposta estava, enfim, iniciada. Eles estavam no carro do alfa decidindo o quê fazer primeiro.

– Pode ser. – concordou Taehyung, raspando as unhas na cabeça do bichinho que ronronava alto. – Mas antes temos que comprar shampoo, uma cama para ele dormir quentinho, e eu pesquisei que precisamos dar um leite especial para filhotes... E uma mamadeira.

– Agora vou ter que dar mamadeira pra gato?! – indagou Jeongguk em tom ofendido.

– Você tem que agir como um dono. – ressaltou.

– Que frescura...

– Quer perder a aposta antes mesmo de começar?

Jeongguk colocou a chave na ignição e olhou para Taehyung.

– O quê acontece se eu perder?

O ômega se aproximou com um olhar tão afiado que poderia cortá-lo ao meio. Jeongguk inclinou-se para trás, assustado. Quando seus rostos estavam a 10 centímetros de distância, ele sussurrou:

– Você sofrerá as consequências.

Jeongguk engoliu em seco, pigarreando e dando a partida. Mentalmente, ele se perguntava que tipo de "consequências" Taehyung imporia e estremecia com cada alternativa.

O alfa dirigiu para um petshop gigantesco que ficava a mais ou menos 2 km da JE-ON. O edifício era pintado de rosa claro e púrpura, com uma fachada divertida salpicada por desenhos de patinhas. Nas vitrines, manequins de cachorros e gatos usando roupinhas estilosas, vestidinhos de babados e até óculos escuros; caminhas que pareciam tão confortáveis quanto almofadas de penas e o último e mais moderno modelo de coleira-guia.

Jeongguk estacionou perto da entrada.

– Não sei se podemos entrar com ele. – disse.

– Mas não podemos deixar ele aqui sozinho. – continuou Tae, olhando para o gatinho que ainda dormia.

– Vamos até lá. Qualquer coisa eu fico com ele enquanto você compra o quê precisa. – decidiu Jeongguk. Taehyung lhe lançou um olhar animado.

– Ah, chefinho! Já está agindo como um dono!

Jeongguk bufou e saiu do veículo, rodeando-o e abrindo a porta para Taehyung.

Em frente à loja, um atendente disse que eles não poderiam entrar com o gatinho sem que ele estivesse numa caixa de transporte. Taehyung, com toda a sua doçura e olhinhos brilhantes, contou que tinha achado-o na rua e não poderia deixá-lo sozinho. O atendente, corado e de coração derretido, perguntou se eles não queriam consultar o veterinário para saber se estava tudo bem com ele.

– Nossa veterinária recebe muitos casos assim. – explicou. – Podem deixá-lo com ela enquanto vocês fazem compras.

Taehyung olhou com indagação para Jeongguk, que observava o diálogo sério e um pouco incomodado. Ele assentiu para o ômega e o atendente lhes mostrou onde ficava a ala veterinária.

– Pobrezinho. – disse a veterinária quando examinou o gatinho, que havia acordado e estava perdido e zangado por estarem mexendo nele. – Não vejo pulgas nem carrapatos, mas ele está muito desnutrido. Podem dar leite e um pouquinho de ração para filhotes. Ele precisa engordar com urgência.

Jeongguk e Taehyung deixaram o felino com a veterinária, levando uma lista de produtos e remédios recomendados por ela. O alfa levava o carrinho enquanto o ômega olhava e tocava em tudo, testando as texturas e até cheirando.

– Chefinho, você prefere a mamadeira azul ou verde? – perguntou Taehyung, mostrando os dois modelos.

– Eu sei lá, tanto f... – ele interrompeu-se ao ver a sobrancelha arqueada do ômega. – Rum... Azul.

– Ótima escolha! – ele colocou a pequena mamadeira no carrinho, junto com todos os remédios que o gatinho precisava tomar. – Vamos pegar uma caminha!

Ele arrastou Jeongguk até a sessão de camas. Prateleiras altas e largas guardavam camas pequenas e grandes, redondas ou quadrangulares, de todas as cores, enfileiradas para o deleite de Taehyung e o horror de Jeongguk.

– Meu Deus, essas coisinhas custam mais que uma cama para humanos. – reclamou Jeongguk. – O quê é que tem aqui dentro? Espuma de seda tecida com fios de diamante? Vão querer o meu rim também de garantia?

– Não seja exagerado. – repreendeu Tae. – Mas acho que tem razão. É um dinheiro que podemos usar para comprar muitas outras coisas.

– Graças a Deus... – suspirou Jeongguk, arregalando os olhos ao ouvir o estalar da língua do ômega. – Quer dizer... Poxa, onde é que o pobre do gato vai dormir agora? Ó não...

– Pode deixar que eu resolvo isso! Tata vai ter a melhor cama de todas!

– Tata?

– É o nome dele.

– Como assim "o nome dele"? – quis saber, fazendo aspas com os dedos.

– O nome que eu dei, oras. – cruzou os braços.

– Ah, não mesmo. Esse nome é péssimo.

A boca de Tae se escancarou.

– O quê disse?!

– Ele vai se chamar Garrinhas. – decidiu, ignorando a cara ofendida do outro.

– Mas...

– O gato é meu, eu decido o nome. – ele ergueu uma sobrancelha elegante, como num desafio.

Taehyung estreitou os olhos. Jeongguk era ardiloso.

– Tudo bem. – falou, as palavras arranhando na garganta de tão duras.

– Já chega de brinquedos. – disse Jeongguk, quando eles foram - correção, Taehyung o arrastou - até a sessão de brinquedos e petiscos educativos.

– A educação infantil é importante para o crescimento saudável do bichinho. – recitou Tae, colocando um mini arranhador no carrinho.

– Quem disse?

– O Sr. Google.

Jeongguk bufou uma risada.

– Vamos logo pagar e buscar o gato. Eu 'tô morrendo de fome.

– Eu também. – concordou Taehyung com uma careta, pousando a mão sobre o estômago.

– Eu te convidaria para comer, mas lá em casa só tem lámen instantâneo. – falou Jeongguk, começando a empurrar o carrinho.

– Ah, eu não vou acompanhá-lo, chefinho. Vou pegar um táxi e ir para casa daqui. – informou.

Jeongguk freou o carrinho abruptamente e Taehyung trombou com as costas largas dele.

– Como assim?! E o gato?! – exclamou.

Taehyung lhe lançou um olhar pretensioso e levemente insolente.

– Você é o dono. Cuide dele. E me mantenha informado sobre cada coisa que ele fizer. Quero fotos e vídeos também, por favor. Relatório completo.

– Tudo que ele... fizer?

– Cada coisinha. – ele fingiu olhar as horas num relógio invisível no pulso. – Olha só como está tarde! Eu vou indo. Chefinho, busque o... hm... Garrinhas e coloque-o na caixa de transporte. Eu li que gatos tem medo de viajar. Au revoir!

Jeongguk ficou observando, de queixo caído, aquele ômega sair saltitando sem olhar para trás e deixando-o ali com um monte de compras que ele escolheu. E ainda teria que pegar o gato sozinho...

– Quando é que ele ficou tão abusado? – perguntou para si mesmo, bufando, mas rindo em seguida.

✿✿✿

– O.K., gato, vamos deixar algumas coisas bem claras. – falou Jeongguk, abrindo a portinha da caixa de transporte e tirando o bichano de lá. Ele se esticou na mão do alfa, acordando de um sono gostoso e bocejando. Jeongguk notou que ele tinha pequenos dentinhos despontando da gengiva rosada, mas suas garras já eram bem afiadas e com certeza fariam um estrago. – Eu não sou seu dono, mas preciso fingir que sim. Então, você tem que fazer tudo que eu mandar.

O gato olhava em volta, mal se importando com aquele humano rabugento que falava sem parar.

– Primeiro, nada de fazer caquinha no meu tapete. Segundo, mantenha essas garras longe do meu sofá. Terceiro, você só está aqui de favor por uma semana, então comporte-se. – ditou, soltando-o para que esticasse as pernas.

Jeongguk olhou para a bagunça que estava sua sala. Ele havia descarregado as compras e deixado tudo jogado - incluindo o gato em sua caixa - para ir tomar banho e jantar. Agora, vestido numa calça moletom velha e uma camisa branca, se perguntava o quê fazer primeiro.

– Sua caixa de areia vai ficar lá fora, ouviu? – disse Jeongguk, carregando o saco de areia e a caixa até a extensa varanda. O gato lhe ignorou, entretido demais com um brinquedo em formato de rato que fazia um barulhinho irritante.

Depois de arrumar a bagunça, Jeongguk pôs as mãos na cintura e olhou para Garrinhas, que mordia e chutava o rato de brinquedo.

– Acho que está na hora de te dar um banho. – decidiu, vendo aquele monte de sujeira peluda poluindo seu tapete.

O gato finalmente lhe deu atenção quando o viu com o vidro de shampoo e uma toalha velha. E Jeongguk podia jurar que viu terror naquelas imensidões azuis.

O banho foi um inferno.

Jeongguk sequer imaginava que uma coisa tão pequena podia berrar tão alto. Foi só colocá-lo debaixo da água da torneira da pia do banheiro que era como se estivesse matando-o à tortura. Ele checou várias vezes a temperatura da água, mas esta estava morna como o toque carinhoso de uma mãe.

– Você é um fresco, isso sim. – constatou Jeongguk, ensaboando a barriga do bicho, que lhe olhava como se imaginasse diversas e sangrentas formas de matá-lo com aquelas garrinhas.

E mais berros. Miados altos, dolorosos e ensurdecedores que ecoavam nas paredes de lajota do banheiro como os gritos de um fantasma acorrentado à dor.

Quando Jeongguk colocou-o debaixo da torrente de água, Garrinhas deu um sobressalto e fincou as unhas na pele da mão do alfa, rasgando e escoriando até que um corte limpo e fino se formasse.

– Au! – ele quase deixou a praguinha cair com o susto doído. – Merda! Isso dói...

Mais tarde, Jeongguk mandou uma foto do gato tão limpo que parecia outro e do belo arranhado que levou para Taehyung.

Mas já levando arranhados, chefinho? Você mal começou... E um emoji de carinha metida.

Maldito ômega.

Jeongguk bloqueou o celular antes que digitasse alguma ofensa severa e olhou para o gato, que agora miava fraquinho e se esfregava nas suas pernas.

– 'Tá com fome, bicho? – perguntou, sem se dar ao trabalho de ser delicado. – Vou fazer sua mamadeira.

Não acredito que eu disse isso, pensou.

Jeongguk lia as instruções da embalagem de leite atentamente quando sentiu a primeira pontada de dor. Depois, outra. E outra. Seguidamente. Até perceber que uma criaturinha escalava suas pernas se agarrando pela calça.

– O quê pensa que está fazendo? – quis saber, franzindo o cenho.

– Miau! – respondeu o gato, as garrinhas quase fincadas na pele de Jeongguk, protegida apenas pelos tecido da calça.

– Não seja impaciente. – disse, arrancando-o de sua perna e colocando-o em cima do balcão. – Espere a comida como um bom gato. Não estou aqui para cuidar de bichinhos insolentes.

Quando Jeongguk ofereceu a mamadeira a Garrinhas, ele mamou com tanto afinco que quase segurava o objeto com as próprias patinhas.

– Você está magro mesmo... – percebeu Jeongguk, observando-o. – Deve ter sido difícil... Ficar sozinho... Sendo tão novinho... No escuro da noite...

Jeongguk foi interrompido por um odor azedo e pungente emanando do gato. Ele viu, horrorizado, um líquido amarelado se espalhar pelo seu balcão.

– NÃO ACREDITO. – gritou.

Ele proferiu uma enxurrada de palavrões enquanto tirava o gato dali e corria para limpar aquela nojeira antes que se espalhasse.

Cara de quem faz xixi no balcão dos outros. Mandou Jeongguk para Taehyung junto à uma foto de Garrinhas lambendo a patinha frontal.

Não demorou para ele responder com emojis de riso.

Parece que sua próxima missão como dono é ensiná-lo a usar a caixinha.

Meia hora depois...

Garrinhas fez cocô na caixinha pela primeira vez. E vários emojis de comemoração. Irônicos.

Taehyung respondeu com um emoji de palmas.

E você limpou?

Não tem que ficar limpando toda hora. Retrucou Jeongguk.

Eca, chefinho. Não sabia que você era um dono preguiçoso e relaxado que não se propõe nem a limpar a caquinha do seu gatinho.

Dez segundos em que Jeongguk apertou o celular como se quisesse quebrá-lo ao meio.

Vou limpar a droga da caixa.

Somente quando a areia já estava perfeitamente limpa e o saco de lixo cheio das obras de Garrinhas, Jeongguk notou que Taehyung estava zombando dele. Usando a aposta para tirar uma com a sua cara.

Rubor subiu sua nuca e inundou seu rosto. Seu olho tremeu de uma forma assustadora.

Se aquele ômega queria guerra, pois bem. Guerra ele teria.

Jeongguk tinha saído do banho já de pijama. Seus ombros e costas doloridos pelo estresse diário do trabalho pediam por uma longa e tranquila noite de sono num colchão macio e cálido. Seus pés latejavam como se implorassem por uma folga.

Ele gemeu prazerosamente assim que se deitou em sua grande e confortável cama, sua cabeça acomodada num travesseiro que afundava como um marshmallow fofinho.

Seus olhos já estavam fechados quando ouviu o primeiro miado.

Um longo e esganiçado miado de um gato muito, muito irritante.

Jeongguk abriu um dos olhos, pedindo paciência à divindade superior para não cometer nenhum ato do qual se arrependeria depois.

Silêncio. Ele voltou a fechar os olhos.

Miaaaaaaaaauu.

Jeongguk chutou as cobertas para o lado e levantou, seu pés reclamando duramente. Ele abriu a porta com violência, fazendo-a bater na parede e desceu as escadas.

O pestinha estava lá, no meio da sala, ignorando completamente a coberta que Jeongguk arrumara para ele em cima do tapete como uma cama. Ingrato.

Ele miou novamente quando viu o alfa, correndo até ele.

– Qual o seu problema?! – disparou Jeongguk. – Seu objetivo ao nascer era me torturar até que eu tenha um ataque de nervos?! Porque está funcionando!

Ele pegou o bicho, segurando-o de frente para si por baixo das patas dianteiras. Garrinhas deu outro miado, dessa vez baixinho e sofrido, esfregando a bochecha nos dedos de Jeongguk.

Um pouco da postura dura do alfa derreteu. Não! Eu não posso me deixar levar...

Ele tinha levado Garrinhas para sua cama.

– Só hoje. – disse mais para si mesmo do que para o gato, que já se acomodara pomposamente no travesseiro ao lado de Jeongguk. – Só porque você ainda não tem sua própria cama. O Taehyung vai fazer uma para você. Sabe quem ele é, né? A peste que te trouxe até mim e tem a audácia de me desafiar e zombar da minha cara... Ele é inacreditável.

O gato observava seu monólogo, os olhinhos piscando preguiçosamente.

– Eu não sei o que ele pretende com isso. – continuava Jeongguk, olhando para o teto. – Mas ele sempre tem um plano mirabolante cozinhando naquela cabeça azul. Ele é a pessoa mais estranha que eu já conheci.

Jeongguk olhou para o gato, que já dormia encolhido com a cabeça entre as patas da frente.

Só hoje, repetiu Jeongguk mentalmente.

– Boa noite, Garrinhas.

Seria uma semana muito, muito longa.


No próximo capítulo...

Quem será o vencedor da guerra, quer dizer... aposta entre Jeongguk e Taehyung?

Há um conflito entre Taeyeon e Hoseok. Os avós de Jeongguk tem sua conclusão sobre o quê há entre o alfa e o pequeno ômega. 

✿✿✿

Se gostou, aperte na estrelinha!! Apertou? Obrigada!!

A partir do próximo capítulo, vamos entender melhor como funciona o mundo ABO de Jardim de Papel. 

Beijinhos da Nyx e até o próximo!! 

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