O nome da sombra - Crônicas d...

By FlaviaEduarda10

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Sombra já estava acostumada a ser apenas isso: uma sombra aos olhos da sociedade que a marginalizava há 9 ano... More

Reinado das sombras
Prisioneira de luxo
Cuidada e cheirando a rosas e lavanda
Mania do oráculo
Na escuridão
Mentiras
Calia
Entre uma coisa e outra
O castelo pela manhã
Cobras e outros animais
O treinamento
O belo mundo de porcelana
É necessário conhecer o oponente
Assassino
Limites
O último Galene
Apenas reparação
Pessoas e deuses
Espere o esperado
Confronto
Loucura da realeza
Ladra
Sombra
A entrada não é pela porta
Os dias 14
Curiosidade
Os nuances sobre a verdade
Presente
Tudo que viera antes
O primeiro furto
O buraco
Contradição
O que faz uma resistência
Últimos preparativos
É apenas lógico
Propriedade (de ninguém) do reino
O que uma ladra faz? Ela rouba
Encontro inesperado
Decisões entre cartas e camarões
Hayes Bechen
Roubando um pouco de volta
O sacolejo do barco
A linha tênue entre bom e mau
Fogo e gelo
Bayard
Incapaz de ter um segundo de paz
O que há depois do rio?
A ladra nem precisou roubar
A realeza de Drítan
Drítan não gosta de estrangeiros
Deveria?
Diplomacia e chá
A biblioteca
Confusão e incerteza são certezas
A área particular
Uma flor do deus Ignis
A reação para a ação é justiça
A calmaria antes da tempestade
Todo o ar do salão
De respirar a se afogar em um segundo
Teria que ser tudo
Automático
Deusa da (justiça) vingança
Um é a ruína do outro
O fardo do saber
A compreensão de como uma fênix funciona
Reinando das Sombras

Sobre um belo vestido vermelho

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By FlaviaEduarda10

–Obrigada por pular o treinamento de hoje por mim. Eu não fui construída como vocês, ainda sou humana. –Confessei em tom de bom humor à Kai, o braço dado ao meu enquanto caminhávamos pelo jardim em busca de tomar sol, cansada de passar a maior parte das minhas manhãs entre paredes e fadigada pelo treinamento pesado ao qual era exposta.

Cada músculo do meu corpo gritava até pelo menor movimento que fosse, roxos aparecendo em pontos específicos do meu corpo, presentes dos meus oponentes impiedosos em combate, logo, tudo que eu precisava hoje era um momento de descanso antes da minha rotina se apertar em experimentar modelos para o vestido que viria a usar no baile diplomático.

–Não se preocupe, eu sabia que um dia seu corpo não ia aguentar treinar, era apenas questão de tempo. –Kai respondera com as palavras acompanhadas por uma risada leve, soando como melodia junto ao canto dos pássaros. Em reação, coloquei uma mão no peito como que indicasse que eu ficara falsamente ofendida.

–Está me chamando de fraca, guarda Kai? –Sabendo meu jogo, rira mais, juntando-se a mim.

–Se você permanecesse no treinamento como o restante, aí sim eu me preocuparia. Um dia de descanso é mais do que merecido, tendo em vista que não estamos pegando leve com você.

Mas o objetivo principal da minha sugestão de caminharmos pelo jardim não era a fadiga ou o sol, era para que eu conseguisse informações sobre o palácio abandonado.

Levei-o "despretensiosamente" até perto de algumas árvores onde as torres do palácio ficavam visíveis e soltei como quem não esperasse nada:

–O que é aquilo? –Notei a percepção de Kai lançar seu escrutínio sobre as torres de pedra e agir com pouco caso enquanto balançou os ombros e apertou os olhos para enxergar direito, não vendo motivo para ficar alarmado com minha pergunta inocente.

–Ah, aquele é o palácio onde a família Galene costumava ficar.

–E quem fica nele agora? –Continuei com olhos desinteressados à mesma medida que curiosos, controlando-me para que ele não viesse a perceber o quanto estava investida em descobri a verdade que aquelas grossas paredes mantinham.

–Ninguém. É uma construção abandonada por conta de uma lenda que fala que o espírito de quem morreu na casa a clama e quem quer que tentasse viver nela seria atormentado pelas almas. A Rainha, em si, não é uma pessoa muito religiosa, mas não lhe custa quase nada apenas deixar o pequeno palácio no esquecimento, por isso ela é lacrada e ninguém tem realmente contato com ela, deixando apenas que a natureza a consuma junto aos pertences dos falecidos.

Minha cabeça foi logo fazendo conexões e cheguei a somente um questionamento por fim: ninguém tem contato com a casa e, ainda, seus quadros estavam descobertos pelo lençol branco, diferente do restante dos móveis.

Alguém estaria não só desobedecendo ordens da Rainha como também indo atrás de informações sobre os Galenes.

Aparentemente, eu não sou a única atrás disso.

–Você acha que deveríamos voltar ao castelo? Creio que já esteja quase no horário da prova do vestido.

–Quer dar sua opinião sobre ele também? Não é todo dia que se pode presenciar a criação de um, segundo Bram, "vestido de cair o queixo".

Um sorriso despreocupado surgiu em seu lábios e já foi direcionando-nos de volta ao castelo.

–Será um prazer... Cordélia é uma das costureiras, certo? –Com uma risada em resposta, apenas fui caminhando de forma leve ao lado de Kai.

____________

–Qual o objetivo do vestido mesmo? –Ophelia, encostada ao batente da minha porta aberta, perguntou encarando-me enquanto eu era obrigada a ficar parada sobre um caixote de madeira ao receber alfinetes dos três pares de mãos habilidosas de Cordélia, Eira e uma mulher entre seus trinta e poucos anos com cabelos loiros presos rígidos em um coque que descobri se chamar Wren, uma pilha de nervos por estar à frente de Sombra, o que quase me provocava um sorriso.

–Em suma, acredito que distração.

–Pois acredite em mim quando digo que funcionará perfeitamente, estou completamente distraída. –Kai olhou-a em uma reprovação mais divertido que sério, Wren, por sua vez, arregalou seus olhos castanhos claros pela fata de sutileza do flerte, Cordélia se conteve eu dar uma risadinha discreta, já Eira levantara uma sobrancelha e, com um sorriso rígido em sua face, parecendo mais séria que divertida, olhou Ophelia de esguelha.

Controlei a respiração para não rir dentro tecido a fim de não me espetar com as diversas agulhas perigosamente perto da minha pele.

Estaria Eira com ciúmes?

Era uma ideia tão boba e me deixou curiosa sobre quanta história Eira e Ophelia já teriam.

–No entanto, ainda não entendi direito. Você vai ser a própria distração que tem como objetivo te acobertar? Como isso funcionaria?

Era uma ideia um tanto complicada, admito, mas também precisaria confessar que a sugestão de Bram havia sido genial –o melhor esconderijo é encontrado sob milhares de olhos.

–Eu oferecerei meu álibi no baile com uma impressão tão forte que minha presença estará registrada na memória de quem estiver lá, então, se sequer for percebida a falta dos registros, eu serei logo descartada como suspeita.

Um tanto aérea, assimilando minhas palavras, Ophelia balançava a cabeça positivamente, seu foco perdido em direção à minha janela.

–Não vire muito seu tronco, senhorita Sombra, pode acabar sendo espetada. –Wren informou-me educadamente ao ajeitar o tecido que ficara frouxo em minha cintura quando escutamos passos aproximando-se pelo corredor até Vega surgir com Zoram ao seu lado.

–Sombra, está bonita com esse vestido. –Vega declarou bem humorado e com seu tom polido, sorrindo enquanto sua cicatriz que cobria-lhe a metade do rosto encurvava junto.

–Está mesmo. –Zoram acompanhou-o com uma feição descontraída até se perceber e balançar a cabeça negativamente olhando para seus pés, mais uma vez tendo que segurar meu riso.

Ele odiava me enxergar como humana porque, assim, seria mais difícil julgar a ladra má.

–O que estão fazendo aqui? Não tem outro lugar que deveriam estar? Já temos espectadores demais. –Eira comentara com um tom impaciente diante da possibilidade de ter mais duas pessoas à porta.

–Não se preocupe, senhorita Eira, não vamos ficar, viemos apenas chamar Kai e Ophelia para uma conferência com a Mestre Jasira. –Zoram apressou em justificar-se, não querendo aborrecer a moça que ajudava a fazer meu vestido.

–Não se preocupe, Sombra, estaremos de volta assim que a conversa acabar. –Kai, nada surpreso com a convocação, tentou explicar-se antes mesmo de realmente precisar de algum motivo, eu sou bem ciente de que eles tem mais coisas a fazer do que apenas serem babás da ladra do reino, conversando frivolidades.

–Fale por você. Você é o guarda dela, eu ainda tenho meus deveres. –Ophelia respondeu-o já de costas para mim, saindo da entrada do meu quarto enquanto lembrava seu irmão que a rotina dos dois era separada e eu exalava pelo nariz, sorrindo e controlando-me ainda.

–Talvez, afinal, assim a gente consiga trabalhar com mais agilidade. –Cordélia disse, por fim, no entanto, não se passaram muitos minutos até novos passos ecoarem pelo corredor aproximando-se do meu quarto.

Perto de entrar em meu campo de visão, já sabia quem era, a forma espaçada e controlada vindo do andar calculado de Nikolai finalmente passando pela porta, relutante, a cabeça levemente abaixada lançando-me seu escrutínio de cima a baixo para depois olhar para cada uma das costureiras.

–Se me permitem, preciso discutir assuntos privados de extrema importância com Sombra. Incomodam-se se eu pedir para retirarem-se? –Nikolai terminou em um tom não muito explorado por mim, não sabendo que ele poderia ser tão simpático e educado. Cada uma, de sua própria maneira, olhou-me uma última vez antes de obedecê-lo, seja encarando a costura que tinham em processo, direcionando-me olhares furtivos ou compadecidos.

Já sozinhos, deixei-me analisa-lo e respirei fundo.

–Se fosse em uma situação normal, isso seria um escândalo, no mínimo. –Deixar uma jovem desacompanhada em um ambiente fechado com um homem igualmente solteiro poderia vir a ser algum problema se eu não fosse uma ladra e ele não fosse o auxiliar da Rainha/assassino. Nikolai sorriu e exalou leve e rapidamente, aproximando-se com o foco ainda em seus pés antes de pousá-lo em meu ser.

–Algo que eu já aprendi é que nada vindo de você é normal. Encare como um elogio, nada sobre mim é normal também.

–Decida-se se é um elogio ou se isso se encaixa a você, os dois não combinam. –Ele comprimira os lábios, franzindo-os na tentativa de segurar um sorriso em resposta à minha provocação.

Sem se importar em me dar uma resposta, ele começara a estudar como o vestido era feito, como as meninas estavam planejando em criá-lo e notei quando suas sobrancelhas franziram.

O principal objetivo do belo vestido vermelho em construção em meu corpo é que ele seja chamativo, prático e elegante em mesma medida e, definitivamente, dois desses três requisitos já poderiam ser considerados feitos, porém, com agulhas e alfinetes aos montes prendendo os tecidos, tornava-me incapaz de testar sua eficiência quanto a praticidade.

–Ele é confortável? –Nikolai encontrava-se parado à minha frente, sua atenção presa ao meu rosto.

–Incrivelmente confortável e creio que será ainda mais quando estiver completamente costurado.

–Você se sente confortável usando-o? –Que pergunta estúpida, quis responder, se eu pudesse escolher, nem para Drítan estaria indo, quanto mais colaborando com um de seus planos.

–Sinto-me bem segura com ele, nada que me incomode. –Acabei dizendo. O vestido, de fato, mostrava um pouco de pele, talvez um pouco mais do que minhas roupas cotidianas (talvez por esse motivo Nikolai tenha questionado-me sobre isso), mas não era por não sentir-me confortável em minha própria pele e, sim, porquê a finalidade do que vestia normalmente era passar despercebida. Sou confiante o suficiente para não ter vergonha de exibir minha pele, nada sobre o vestido me incomodava com exceção ao fato de que ele era literalmente confeccionado para chamar atenção.

–Consegue se movimentar bem nele? –Revirei o olhar e dei uma leve bufada com sua falta de percepção.

–Não sei se notou, mas estou literalmente imóvel por conta de vários mini objetos pontudos que podem penetrar minha pele se eu me mexer sem outra pessoa para orientar-me, então, te respondendo, não faço a menor ideia.

–Então por que eu não te testo e oriento? –Nikolai retornara-me sem alterações em seu tom, entretanto, sei melhor do que cogitar que seria por algo além do que apenas ele sendo muito bom em controlar suas reações. Levantei meus braços levemente dobrados na altura dos ombros, tirando meu olhar de Nikolai e deixando-o recair sobre à parede a qual o menino assassino estava de costas.

–Vá em frente, não precisa intimidar-se. –Sou propriedade do reino, afinal.

Eu sabia o que viria, eu sabia o que ele faria, previa tudo e dera permissão, mas ao momento que suas mãos começaram a dançar pela minha cintura enquanto ele me contornava, testando se tinha a possibilidade de movimentação sob o tecido macio e vermelho de uma forma que apenas alguém experiente, o melhor de sua turma no treinamento para guarda da coroa, poderia fazer, não consegui impedir-me de ser um pouco surpreendida, uma respiração baixa escapando de meus pulmões.

Suas mãos subiram pela minha espinha por cima do vestido, pressionando-me levemente, em seguida foram em busca das limitações e acessibilidades nas mangas, checando se minhas ações com os braços estariam livres, dando a volta até parar mais uma vez à minha frente.

–Dei uma olhada nos pontos e nos alfinetes que podem vir a te espetar, então confie em mim quando lhe digo que nenhum chegará a machucar sua pele. –Ele, então, depositou hesitante suas mãos calejadas de treinamento em meus quadris, olhos presos aos meus novamente. –Posso?

Supus que ele iria girar-me de alguns modos a fim de ver se todas minhas movimentações, na medida do possível, eram viáveis, contudo, minha mente, de repente, não estava mais pensando no quanto o vestido viria a ser prático. Tudo que passava-se em minha mente eram maneiras de afastar a sensação do calor de suas mãos que irradiavam até a minha pele mesmo sob o tecido, então só balancei a cabeça positivamente a Nikolai.

Como esperado, ele mobilizou meu corpo de algumas maneira sem que suas mãos saíssem do lugar e notei como tinha mais liberdade dentro do vestido do que pensei que poderia.

Ao terminar de testar as vestes, Nikolai encarou a janela aberta com o cenho franzido.

–Está com frio? –Confusa pela pergunta um tanto aleatória, arqueei minhas sobrancelhas.

–Não, por que pensaria isso? –Surpreendentemente, ele colocara as mãos em seus bolsos e estudou-me um pouco mais.

–Seus braços estão arrepiados. –Olhando para baixo, na tentativa de prová-lo errado, vi como minha pele estava, assim como ele dissera e comecei a esfregá-los na tentativa de normalizá-los como se, realmente, tivessem sido os ventos que provocaram essa reação em mim, o que poderia ser real e eu apenas não teria notado. –Acredito que eu já tenha feito o suficiente para... checar o vestido, vou deixar que as senhoritas retornem para que continuem a prova de vestimenta. –Um tanto desajeitado, curvou-se levemente a mim com os olhos presos ao chão e virou-se à porta, ultrapassando-a rapidamente e saindo dos meus aposentos quase como se não tivesse sequer estado aqui, deixando-me parada e confusa sobre o bloco de madeira em que me encontrava enquanto as meninas retornavam.

Wren escondia seu rosto e suas expressões em suas algumas e seus pontos, Cordélia entrava curiosa para saber o que Nikolai fazia ali no quarto quando ela não podia presenciar e Eira encarava-me sob seus cílios com meio sorriso surgindo sugestivo pelo canto dos lábios. Retribuindo seus olhar, levantei uma sobrancelha e balancei a cabeça negativamente. Nem considere isso, pensei, um é a ruína do outro.

O assassino com a ordem de matar-me se eu fosse desleal, o que eu sou, e a ladra que pode vir a matá-lo para proteger sua vida.

Mas o clima ainda estava quente, eu não sentia frio algum.

E os ventos estavam parados.

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