Psicose (Livro I)

Par andiiep

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Melissa Parker é uma psiquiatra recém-formada que encontra seu primeiro emprego em um manicômio judiciário. E... Plus

Aviso Inicial
Prólogo
Um - St. Marcus Institute
Dois - A holandesa de Cambridge
Três - Inesperado
Quatro - Sutura
Cinco - Insônia
Seis - Happy Hour
Sete - Progresso
Oito - Passado
Nove - Proximidade
Dez - Embriaguez Acidental
Onze - Hormônios!
Doze - Corey vs Brian
Treze - Fotografia
Quatorze - Helvete
Dezesseis - Triângulo
Dezessete - Sobrenatural
Dezoito - Confusão
Dezenove - Corey vs Brian (parte 2)
Vinte - O plano mirabolante de Corey Sanders
Vinte e Um - Render-se
Vinte e Dois - Bipolaridade
Vinte e Três - Mensagem Sobrenatural
Vinte e Quatro - Intimidade
Vinte e Cinco - O inferno converte-se em paraíso
Vinte e Seis - Não Há Compaixão Com a Morte
Vinte e sete - Quebra-Cabeças
Vinte e Oito - O Passado Condena
Vinte e Nove - REDRUM
Trinta - Veritas Vos Liberabit
Trinta e Um - Plano de Fuga
Trinta e Dois - Luxúria
Trinta e Três - Preparação
Trinta e Quatro - Vai Dar Tudo Certo!
Trinta e Cinco - Um Sonho de Liberdade
Trinta e Seis - Scotland Yard
Trinta e Sete - Reencontro
Trinta e Oito - Vigilância Constante
Trinta e Nove - Corpo e Alma
Quarenta - Encontros e Desencontros
Quarenta e Um - Armadilha
Quarenta e Dois - Salvação?
Quarenta e Três - Tentativa e Erro
Quarenta e Quatro - O Infeliz Retorno
Quarenta e Cinco - Do Pó Vieste...
Epílogo
AUTO MERCHAN

Quinze - Perigo

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Par andiiep


Foi no banho, embaixo das gotas ferventes de água, que Melissa decidiu que voltaria a atender Corey Sanders. Enquanto massageava os cabelos com o shampoo de aroma doce, sua cabeça pensava a todo vapor, sem parar, maquinando, maquinando, maquinando...

Ele a desafiara a um perigoso jogo.

Um jogo proibido.

A doutora era competitiva o suficiente para saber que daquela história toda, nada de bom sairia. Ela não se deixaria vencer, não deixaria que Sanders saísse por cima, dono da razão. Por algum motivo, ele todo era um desafio para ela, uma provação do destino posta em seu caminho, apenas para ver o quão forte ela era... Melissa tinha problemas com relacionamento. Tinha vários problemas, na verdade, alguns que nem mesmo sua formação em psiquiatria a ajudara a resolver até ali, mas algo em Sanders causava amnésia seletiva nela, porque queria mesmo era poder estar em seus braços... Pensamento ridículo, concluiu, enquanto enxaguava os longos cabelos castanhos, o tipo de pensamento que colocaria tudo a perder.

Mas ela simplesmente não podia deixá-lo provar que tinha razão, era questão de honra. Quando fechou o registro e saiu no quarto gelado, já estava completamente decidida. Vestiu suas roupas lentamente, a todo minuto fitando de esguelha o bilhete já gasto de Sanders cuidadosamente postado sobre sua mesa de cabeceira.

"Se continuar fugindo de mim, apenas terei certeza de que está interessada em muito mais do que no meu tratamento. Será que não consegue ficar sozinha comigo em uma sala sem me desejar?

Corey."

Desejo. Desejo. Desejo.

Quando foi que deu a entender que estava interessada nele como homem, não como paciente? Quando foi que deu a ele a liberdade de falar esse tipo de coisa? Talvez quando se aproximou dele daquela maneira no corredor dos consultórios no outro dia... Falaram como se fossem dois jovens flertando em um bar. Abriu esse tipo de brecha, deu esse tipo de liberdade, sim. Culpa de sua incapacidade de controlar hormônios na presença dele. Um absurdo. Inaceitável. Conduta inapropriada.

Todavia, não poderia deixar aquela pergunta no ar sem uma resposta. Será que não consegue ficar sozinha comigo em uma sala sem me desejar? Ah, conseguia, sim, e iria provar. Faria o que, no fundo, ele tencionava com aquela mensagem, cairia na armadilha, mas seria forte o suficiente para mostrar quem estava no comando. Quem não daria o braço a torcer, quem seria capaz de superar aquela queda antes que fosse tarde demais.

Foi ao escritório do doutor Thompson antes que o expediente tivesse início. Não sabia se o encontraria ali naquele horário, mas teve sorte. O homem estava sentado atrás de sua enorme mesa, os óculos pendurados na ponta do nariz enquanto ele tentava ler um documento antigo. Não questionou a decisão de Melissa de voltar a atender Corey Sanders. Até mesmo a agradeceu, confessando que estava preocupado com os tipos de problema que ele poderia arranjar se estivesse sozinho no mesmo cômodo com Brian. Talvez as coisas saíssem de vez do eixo dessa vez, e ele seria obrigado a mandar um para a solitária e o outro embora. Não poderia se dar ao luxo de perder um profissional do calibre de Brian, dissera.

Quando um problema estava resolvido, vinha outro surgindo lá no horizonte. Nem queria pensar no que Brian diria quando descobrisse pelo doutor Thompson que ela mesma fora pessoalmente requisitar as análises psiquiátricas de Corey Sanders. Sabia que não devia satisfações a ele, mas também sabia que ele nem tinha ideia de que não poderia se meter nas escolhas dela. Como não estava com paciência para discutir com ele mais esse assunto, fugiu o máximo que pôde de Brian. Fugiu no almoço, fugiu no horário de intervalo, passou correndo por sua sala quando teve que fazer seu plantão no prédio A. Foi a última a chegar ao refeitório para o chá da tarde, roubando algumas bolachas, trancando-se em seu quarto para comê-las.

Um pouco antes do jantar, entretanto, já não havia mais como fugir. Não havia como fingir que não estava em seu quarto quando ele bateu à sua porta. Melissa até tentou se fingir de morta, porém quando Brian bateu pela terceira vez e chamou nervoso pelo seu nome, não teve escolha. Caminhou até a porta e a abriu até a metade, colocando a cabeça para fora, no seu melhor sorriso meigo.

- Oi, Brian. – disse, mordendo hesitante o lábio inferior.

- Seria muito pedir para parar de fugir de mim? A gente poder conversar? – ele colocou a mão no batente da porta, encarando Melissa de um modo que a deixou extremamente incomodada.

- Não estou fugindo.

- Então abre a porta e me deixa entrar.

Melissa cerrou os olhos, e considerou manda-lo pastar no jardim lá fora, porque não havia gostado do tom dele, mas deu passagem mesmo assim. Desentendimentos com outros funcionários não seriam bem vistos.

Melissa fechou a porta depois que ele entrou, encostando-se nela logo depois. Juntou as mãos atrás do corpo e pôs-se a analisar Brian, na maior inocência possível. Ele, por outro lado, tinha os braços fortes cruzados na frente do peito e uma expressão de desgosto dominando cada um dos traços.

- O que você pensa que está fazendo?- foi ele quem começou.

E seu tom era muito diferente do cativante de sempre.

- Sobre?

- Você sabe sobre o que, Melissa! O que tinha na cabeça quando foi pedir para voltar a atender o Sanders?

Ela evitou revirar os olhos. Não conseguia acreditar que estavam tendo aquela conversa pela milésima vez. Onde foi que errou? Quando foi que deixou que um cara que conhecia há tão pouco tempo falasse com ela daquela maneira?

- Ele precisa de ajuda tanto quanto os outros pacientes desse lugar. – seu tom saiu monótono.

- Você, por acaso, aceitaria atender Jhonnatan Reagan de novo? – Brian avançou um passo.

- Não.

- O que ele fez foi bem menos grave do que o que Corey Sanders fez.

- Corey Sanders não fez porcaria nenhuma e eu realmente não gostaria de ter que repetir isso! É sério, já estou ficando cansada, Brian! Entenda de uma vez por todas: não preciso da sua proteção, não sou uma donzela em perigo, posso me cuidar sozinha.

Ele bufou e começou a andar de um lado para outro. Então parou, olhou para ela e disse:

- Desculpe. Mas eu simplesmente não concordo com isso, não me entra na cabeça que seja razoável, mas já que você insiste...

-Sim, eu insisto. – Melissa cortou, fazendo Brian arregalar os olhos com o tom forte e decidido de sua voz. – Você não é meu dono, Brian. Muito pelo contrário! E eu realmente gostaria que você se colocasse no seu lugar e parasse de se meter na minha vida.

Brian a encarou, dessa vez, com uma intensidade muito mais irritada do que indignada. Abriu a boca algumas vezes, sem conseguir nada dizer. Derrotado, bufou em resignação e começou a caminhar para fora do quarto.

- Eu só estava pensando no seu melhor. Entenda como quiser. – ele deu de ombros, e então saiu batendo a porta em uma força um pouco além do necessário.

Melissa fez uma careta para a porta, bufando irritada. Preferia se jogar em sua cama, porém o estômago roncou e se lembrou de que precisava de comida. Então suspirou contrariada, juntou o casaco pendurado em um cabide, e saiu pelo corredor na direção do refeitório. Fez questão de ignorar Brian quando passou por ele, arrancando um olhar confuso de Kate, que foi apenas respondido com um dar de ombros indiferente, e um sorriso pouco convincente.

Corey acordou estranhamente ansioso naquela manhã de sexta-feira. Razão, com certeza, da obsessiva necessidade de doutora Melissa Parker. Após viver uma espécie de abstinência, parecia aos poucos, finalmente, se libertar. Tudo o que precisava a partir de então era estar junto dela novamente. Nem que fosse separado por uma escrivaninha de consultório médico e estivesse impedido de tocá-la pelas algemas que prendiam suas mãos.

O horário das 14:00, no entanto, demorou a chegar. Durante o tempo em que não se anunciava no relógio e Pete não vinha bater à sua porta, Corey se pegou diversas vezes roendo unhas. Tentava controlar a tremedeira impaciente de sua perna direita que subia e descia, enquanto se sentava na ponta de seu colchão. Tentava manter as mãos, que mexiam em tudo que viam, paradas em seu devido lugar. Pensou em dormir, para manter a mente longe, porém a distração que veio, não foi a pretendida.

Mais uma vez, como vinha acontecendo com frequência nos últimos dias, tudo o que Corey conseguia pensar, era nas lembranças de seus tempos com Barber. Mais precisamente os tempos conturbados de Cambridge. Corey não entendia o que estava, de fato, acontecendo. Por três anos, foi capaz de bloquear quase que completamente todo aquele emaranhado de lembranças perturbadoras. Após a chegada da doutora Melissa Parker, como se houvessem apertado um botão, tudo estava voltando à tona. Como se ela fosse a responsável por trazer aquele ar familiar de Cambridge de volta à sua vida, então não conseguia evitar voltar à época em que lá havia sido feliz. E triste.


**

Corey ajeitou a gola da camisa, precariamente fora do lugar, antes de sair da cabine do banheiro masculino do quarto andar. Ninguém usava aquele banheiro. A não ser para fazer o tipo de coisa que ele estava fazendo com Holly Jackson, a ruiva do Direito que todos sonhavam em ter, porém poucos conseguiam. Corey a havia conquistado, finalmente, há alguns dias. Não perderia a chance quando um corpo tão suculento lhe era oferecido de bom grado. E a garota sabia o que fazer e quando fazer, e Corey simplesmente apreciava isso.

Dando um último sorriso na direção dela, Corey olhou para ambos os lados do corredor, constatando que não havia ninguém por ali. Então jogou a mochila nas costas e saiu caminhando tranquilamente, como se não tivesse feito nada de errado. Pelo menos em sua cabeça distorcida.

Corey já chegava ao seu destino, a biblioteca, quando encontrou quem menos gostaria. Com um livro grosso, provavelmente de História da Arte, apertado entre os braços finos e delicados, Barber vinha caminhando decidida em sua direção. Passos fortes, lábios trancados em uma linha fina. O olhar felino de esmeralda reluziu quando ela fitou seu pescoço, provavelmente marcado pela brutalidade de Holly. Corey a xingou mentalmente de todos os palavrões conhecidos, até que Barber finalmente se aproximou.

- Com quem você estava se atracando dessa vez? Quem é a vagabunda? – ela perguntou, em tom autoritário e irritado, porém baixo. Não gostava de chamar atenção.

- Não estava com ninguém.

- Não minta pra mim, Corey! Te conheço melhor do que você mesmo.

- Acha que vai me intimidar? – Corey sorriu debochado, brincando com as alças de sua mochila.

Barber respirou fundo, e quando voltou a falar, seu tom era resignado e acima de tudo, magoado. Corey sentiu uma pontada cortar seu coração ao ouvi-la:

- Por que está fazendo isso comigo? Sabe que está me matando aos poucos, não sabe?

- Não exagere. – ele rolou olhos, disfarçando a estranha preocupação que o tomou.

Corey não estava entendido com sua cabeça nos últimos tempos. Não queria Barber, mas ao mesmo tempo queria. Queria Barber longe, mas queria Barber perto. E não gostava de pensar que ela estava com outros homens, embora soubesse que esse era o tipo de pensamento mais cafajeste e repulsivo que poderia cultivar. Sabia que estava errado, por isso tentava afastá-la, ela precisava de alguém melhor do que ele, ele não era homem suficiente para ela. Maltratá-la talvez funcionasse, por isso era o que vinha fazendo, apesar de partir seu coração.

A verdade era que, acima de tudo, Corey sabia que Barber andava envolvida com coisas ilícitas, e que deveria estar cuidando dela por conta disso. Deveria ser responsável por ela e evitar que esse tipo de coisa acontecesse com sua garota. O sentimento de culpa, talvez, era responsável pelo alto teor de sua infidelidade. Corey, afinal de contas, estava bastante confuso. Metido em uma estranha obsessão que lutava para entender.

- Se qualquer dia eu aparecer morta, pode ter certeza que a culpa vai ser toda sua! – Barber bradou baixinho, chamando sua atenção de volta à realidade.

Apontava o dedo fino de unhas feitas em sua direção. Então lhe deu costas. Corey correu dois passos para alcançá-la.

- Nunca mais repita isso! – ralhou entre dentes, ao se dar conta do absurdo que ela havia dito.

Não foi capaz de entender o desespero que corroeu seu coração ao imaginar uma realidade desesperadora em que Barber já não mais estivesse viva.

- Me deixa em paz! – ela gritou, puxando seu braço de volta.

De seu livro, deixou algo cair ao chão. Corey a deixou ir, enquanto seu olhar se fixava na flor cor de rosa já morta pelo tempo que jazia ao chão. A flor que ele havia dado a ela no seu aniversário de sete anos, há muito, muito tempo atrás. Corey apertou os olhos, respirou fundo e resgatou a flor do chão, guardando-a em seu bolso. Devolveria na oportunidade certa.


**

Corey sabia que apenas alguns dias após aquela cena, Barber apareceria morta, pendurada naquela maldita árvore, desfigurada pela lâmina cruel de uma faca. Nunca tivera a chance de devolver a ela a flor perdida.

A excitação que sentia no peito pela proximidade da nova consulta com Melissa foi abalada. Corey não ficava bem quando os últimos dias de Barber vinham atormentá-lo, geralmente em pesadelos macabros, cruéis. A lembrança, quando acordado, era muito pior. Porque estava consciente para se lembrar de que o culpado pelos últimos dias de Barber terem sido um inferno era ele. Corey era quem brigava com ela a cada cinco minutos, quem a perturbava e não a deixava ser feliz.

Ele apertou os olhos, respirando fundo. Precisava se acalmar. Precisava recuperar o pouco de sanidade que ainda cultivava. Não poderia se deixar levar pelos fantasmas do passado. Agradeceu quando uma batida na porta interrompeu sua sessão de auto piedade. Corey levantou antes que Pete a destrancasse. Tinha as mãos nos bolsos, para esconder o quão inquietas estavam. Balançava o corpo para frente e para trás sobre os pés.

- Eu não sei como você conseguiu fazer isso, mas ela está à sua espera... – foi o que Pete disse, seu sorriso era incrédulo.

Corey deu de ombros, retorceu a boca em uma expressão convencida, e com um sorriso de canto estendeu as mãos para que carcereiro as prendesse entre as algemas.

Foi com o mesmo sorriso torto que Corey fez todo o caminho do helvete até o prédio administrativo. Tinha a impressão de que parecia levemente maníaco para quem o observava, mas não dava a mínima. Satisfação resumiria seu estado de espírito. Voltar a ter a companhia de Melissa para acalmar seus ânimos confusos pela hora que durava a sessão de análise psiquiátrica era um alento.

Ao chegar à porta do consultório da doutora, Corey percebeu que ela estava entreaberta e algumas vozes discutindo baixinho podiam ser ouvidas. Ele franziu o cenho, forçando a audição, contudo não distinguiu nada que fizesse muito sentido. Então esperou, ao lado de Pete, que a cada cinco segundos olhava o relógio em seu pulso, batendo um pé impaciente no chão.

- Precisa estar em algum lugar? – Corey perguntou.

Pete voltou a olhar no relógio antes de responder:

- O helvete não pode ficar desfalcado de um guarda por muito tempo. – ele rolou os olhos.

- Eu fico aqui, pode ir.

Pete lançou um olhar desconfiado em sua direção, e olhou o relógio de novo, então a saída do corredor. E depois voltou para Corey.

- Há quanto tempo você me conhece? Acha mesmo que eu faria alguma coisa para te prejudicar? Eu não vou sair daqui. – garantiu Corey.

- Tudo bem. – Pete suspirou em derrota – Mas, por favor, não saia daqui sob qualquer hipótese! Nem que o prédio comece a desabar sobre a sua cabeça!

- Não farei.

Pete assentiu, hesitando por alguns instantes, antes de sair a passos apressados batendo as botas no chão. Corey suspirou, e pôs-se a encarar o teto, escorando o corpo na parede ao lado da porta. Lá dentro do consultório, as vozes que discutiam ainda se mantinham na mesma. Por alguns segundos, Corey tentou conter a curiosidade que praticamente levava sozinha seu corpo na direção do pequeno vão aberto da porta.

Obviamente ela foi mais forte, então ele deu dois passos lentos e silenciosos, espiando para dentro do consultório. De costas para ele, estava Melissa, com os longos cabelos castanhos soltos nas costas; de frente, mantendo uma expressão de cachorro arrependido, o patético doutor Brian Peters.

Era ele quem cochichava, e mesmo que não pudesse ouvir, Corey deduziu que sua voz soava melosa e, certamente, arrependida. Por uma vez, ele tentou pegar a mão de Melissa, que se afastou discretamente. E então começou a falar e a gesticular. Brian franziu o cenho, escutando calado tudo o que Melissa dizia, assentindo vez ou outra. Quando ela terminou de falar, ele resmungou qualquer outra coisa, e avançou na direção dela, tentando tomar sua cintura entre seus braços. Corey não conseguiu conter a risada nasalada que escapou quando Melissa afastou seus braços também.

E foi o maior erro que poderia ter cometido.

Melissa não escutou, mas Brian imediatamente levantou os olhos e os guiou até a porta. Eles se arregalaram levemente quando reconheceu Corey parado ali. Corey, por sua vez, sentiu o corpo gelar. Apenas esperou o momento em que Peters faria alguma coisa, qualquer coisa. Porém, ele não o fez, para a surpresa de Corey. Pelo menos não o que ele esperava que Brian fizesse.

O doutor Brian Peters apenas abriu um discreto sorrisinho no canto dos lábios, se aproximou de Melissa outra vez, dizendo um conjunto de palavras que pareciam, até para Corey, o mais sincero pedido de desculpas. Quando terminou de falar, abriu um tipo de sorriso, que Corey reconhecia ser aquele tipo que deixava as garotas derretidas e com o coração mole. Aquele que nenhuma garota, por mais resistente que estivesse, conseguia resistir. O tipo de sorriso de que ele mesmo se utilizava quando queria convencer uma garota. E bem, foi o que aconteceu, eventualmente.

Melissa permitiu que Brian se aproximasse e que tomasse sua cintura. Um pouco relutante, na opinião de Corey, deixou que o outro a abraçasse. Corey acompanhava a cena com os punhos cerrados e a mandíbula trancada. Estado que piorou quando Brian terminou a aproximação dos dois corpos e, lançando um sorriso malvado na direção de Corey, beijou os lábios de Melissa com os seus.

Corey se obrigou a assistir toda a cena deplorável até o fim. Não durou muito, para seu completo alívio. Foi Melissa quem afastou Brian. Com raiva. Ah, sim, ela estava muito brava e ele em péssimos lençóis. A doutora não conteve a voz dessa vez, e a bronca foi bastante audível, até para quem estava a alguns consultórios de distância:

- Acho que não te dei permissão para me beijar dessa maneira! – foi o que ela disse.

Outra vez, Corey riu. Os olhos descontentes de Brian foram de Melissa a Corey numa fração de segundo. Ele engoliu a seco e, novamente, perdeu-se em um mar desculpas.

- Você está passando de todos os limites, Brian! – ela continuou a falar bem alto – Por favor, me dê licença. – pediu.

Brian ainda falou qualquer porcaria, mas eventualmente deixou o consultório e Melissa para trás, já que ela não lhe deu ouvidos. Quando atravessou a porta, a fechou, de modo que Corey que não pôde continuar a assistir à maravilhosa reação de Melissa. O médico então passou ao seu lado, com o ar de quem é o dono do mundo:

- Pena que você só pode olhar, não é mesmo? – disse, por cima do ombro – Cuidado para não escorrer a baba. – completou, e então saiu rindo pelo corredor.

Corey sentiu o sangue subir à cabeça, algo que sempre acontecia quando Brian Peters e sua natural inconveniência estavam por perto. Aquela vontade já característica de quebrar todos os ossos de seu oponente em pedacinhos pequenininhos voltou com força total. Ainda chegou a dar dois passos na direção de Brian Peters e planejar o modo mais propício de abrir a cabeça dele em duas, mesmo com as mãos presas em algemas, mas teve o plano interrompido pela sanidade e pela voz doce que veio da porta ao seu lado.

Afinal de contas, Brian acabara de levar um belíssimo de um fora, não tinha motivos para comemorar o que quer que estivesse tentando comemorar.

- Sanders? – Melissa, parada com a mão na porta, o encarava de modo curioso. - O que faz aqui sozinho?

- Eu, ah... Pete precisou ir. Fiquei esperando você terminar... Qualquer coisa que estivesse fazendo com Peters.

Melissa o encarou por um instante, com a testa franzida, como se estivesse calculando a probabilidade de um carcereiro deixar um prisioneiro do helvete sozinho sem supervisão no corredor dos consultórios. Eventualmente pareceu concluir que, em se tratando dele, talvez fizesse algum sentido, então disse:

-Tudo bem, venha, entre. – Melissa entrou no consultório. Corey a seguiu. – Pode fechar a porta? – pediu, sorrindo amigável em seguida, apoiando-se em pé contra a escrivaninha e cruzando os braços.

Corey assentiu e fez o que lhe foi pedido, postando-se à frente dela.

Foi questão de milésimos de segundos para toda aquela porcaria de reação nervosa em seu organismo começar. O coração bateu tão forte dentro do peito, que Melissa receou que Corey talvez pudesse ouvi-lo. Em sua própria audição pulsava uma batida rítmica e acelerada, como uma banda marchante. As mãos, obviamente, não tardaram a suar e sua garganta a secar.

Era o efeito do estar sozinha com Corey Sanders em seu consultório. O desafio que ele havia lançado, que ele disse que ela não poderia superar... Ou apenas culpa do poder que aquele homem tinha sobre seus hormônios... Era quase sobrenatural, inexplicável pelas leis da natureza. Tinha alguma coisa nele, alguma coisa que tornava Melissa... Insana.

Por um momento, considerou voltar atrás, desistir, ele que ficasse com a impressão de que tinha vencido seu desafio velado. Ela não era forte o bastante para manter aquela coisa toda longe do físico, porque seu corpo praticamente gritava pelo dele.

Era, porém, tarde demais para desistir de Corey Sanders.

Como poderia, quando se tinha o mais belo par de diamantes azuis reluzindo numa perfeita combinação de loucura e sanidade para ela, somente para ela? Era difícil não se sentir tentada a desvendar todos os mistérios por trás da pessoa perturbada que era Corey Sanders.

Ela precisava, necessitava de uma alta dose diária dele, como uma droga. E tinha medo disso. Não era saudável, nem seguro, nem profissional, como ela mesma já havia concluído milhares de vezes. Ainda assim, era incapaz de escolher o caminho certo, quando o errado era tão ridiculamente sexy.

Mantendo a pose, a doutora apenas cruzou os braços, apoiada em sua escrivaninha, e passou a encará-lo numa insistente curiosidade.

- Não vai... Começar a sessão? –Sanders perguntou, apontando a cadeira que pertencia a Melissa.

Os minutos de silencio criaram uma estranha tensão, que se espalhava sorrateira pelo consultório.

- Ainda não. – ela negou com a cabeça – Vamos esclarecer alguns pontos antes de começarmos com isso.

- Tudo bem, doutora. – ele assentiu, parecendo tentado a abrir o sorriso maroto de canto de lábio.

Melissa pôde sentir que ele se conteve. Não tinha ideia do que poderia estar divertindo Corey Sanders naquela situação, mas acabaria com o motivo rapidinho.

- Eu quero impor algumas condições antes de recomeçar as nossas sessões.

- E se eu não concordar com elas?

- Pode começar a pensar em outro médico.

O sorriso veio. Não era convencido, mas desafiador, como toda a pose e atitude dele. O semblante duro dela não se desfez, precisava se impor. Precisava mostrar para ele quem mandava ali, que era a médica, ele o paciente, havia um código de conduta sob o comando do qual deveriam agir.

- Só você está autorizada a impor condições?

- Com certeza.

- Tenho alguma escolha?

- É claro que tem. – Melissa deu de ombros – Só que suas escolhas podem ter diferentes consequências... Você escolhe acatar às minhas condições e me tem como médica. Você escolhe ignorá-las e, bem, acredito que não gostaria de voltar a se consultar com o doutor Peters, gostaria?

O sorriso dele aumentou. Sanders parecia amar toda aquela situação, especialmente o fato de que a conversa deles, de profissional, não tinha muita coisa. Qualquer outro psiquiatra com um pouco mais de juízo trataria as coisas de forma diferente.

- Pois bem, doutora, vamos ouvir suas condições...

- Primeiro, por favor, poderíamos deixar de lado essa irritante mania de me chamar de doutora?

- Você é ou não é a doutora Melissa Parker?

- Sou, mas não aprecio a ironia.

- Só você está enxergando ironia nas minhas ações, doutora.

Melissa se conteve para não grunhir irritada como uma menininha contrariada. Não via motivos para continuar aquela discussão, tinha outros assuntos mais importantes para tratar. Essa batalha, ele ganhara. Apenas rolou os olhos e respirou fundo antes de continuar:

- Em segundo lugar, o que estava pensando quando achou que era interessante espalhar por aí que poderia... – ela abriu aspas com os dedos – "ter relações sexuais comigo quando bem entendesse"?

Sanders não perdeu sua pose, como ela esperava. Nada de constrangimento, apenas uma serenidade invejável. Então respondeu:

- A médica que disse isso não foi punida?

Melissa assentiu:

- Quebra de sigilo entre psiquiatra e paciente. E fofoca maldosa sobre os coleguinhas de trabalho.

- Quais as chances de ser verdade, quando até o doutor Thompson fez alguma coisa sobre isso?

A doutora torceu os lábios, vendo-se tão rapidamente sem argumentos.

- Muito baixas. Mas ainda assim, gostaria de colocar as coisas na mesa com você.

- Eu jamais falaria esse tipo de coisa. Posso ter sido um belo idiota antes, posso ter sido um cara relativamente abusivo com Barber, mas minha mãe me ensinou a respeitar as mulheres, e esses anos trancado aqui me ensinaram ainda mais, especialmente porque coloquei os pés no chão. Perder Barber me fez ver o mundo de outro modo. E a realidade é bem dura. – Sanders sorriu triste.

Por algum motivo, Melissa acreditou nas palavras dele sem muito pestanejar. Tinha outra coisa nele, outra que a tornava... Esperançosa.

- Que bom que temos isso esclarecido. O que me leva ao terceiro ponto: por que mandou um bilhete com aquele conteúdo... polêmico por Kate? Não tem noção de que alguém poderia ver aquilo? Você é completamente inconsequente.

- Ah, precisava chamar a sua atenção, doutora... – ele deu de ombros, um sorrisinho maroto nos lábios.

Ela cerrou os olhos.

- Se soubesse como me comporto quando me desafiam, não faria isso. – mais uma vez, falava com ele como se estivessem flertando em um bar.

Perdeu a linha mais rápido ainda dessa vez... E tudo piorou quando ele respondeu:

- Doutora... Será um prazer descobrir.

- Estou curiosa: o que pretende com isso?

Ele deu de ombros, casualmente, então disse:

- A verdade é que eu, por algum motivo ainda desconhecido, estou bastante curioso sobre você. E gostei de saber que gosta de ser desafiada, então vi nesse fato uma oportunidade de poder passar uma hora por dia, duas vezes por semana, trancado em uma sala com você.

- Você sabe que a hora por dia, duas vezes por semana, serão voltadas para o seu tratamento...

- Em tese...

Melissa riu.

- Eu estou no comando, eu conduzo este barco.

- Já disse que adoro mulheres dominadoras? – o sorriso que ele abriu foi um tanto maldoso.

Melissa não baixou a guarda.

- Ótimo, significa que gosta de ser dominado, e se eu digo que...

- Acabo de ficar ainda mais curioso sobre você, doutora... – ele meneou a cabeça, os olhos azuis brilhando – Cada palavra que sai da sua boca é um combustível para minha imaginação.

Outra vez, ela riu, porque cada palavra que saía da boca dele era um combustível para seus hormônios. Perigosa demais aquela conversa, o fato de que Melissa deixava que Sanders a levasse para tais campos cheios de segundas intenções. Ele poderia não estar falando nada, mas, ao mesmo tempo, poderia estar falando tudo. E o tudo era fora dos limites razoáveis.

- Minha próxima exigência: pare com essas conversas aparentemente inapropriadas.

- Já reparou que foi você quem começou? "Se soubesse como me comporto quando me desafiam...". Sabe o que esse tipo de frase, dito por uma mulher como você, pode causar na cabeça de um homem?

Melissa cruzou os braços e apertou os lábios em uma linha fina.

- Não quero saber, por isso estou pedindo para que não fale sobre.

Corey Sanders soltou um riso nasalado.

- Posso tentar, mas será que você consegue?

A doutora rolou os olhos.

- Pare de tentar flertar comigo também.

- Não estou tentando...

Mais uma vez, sua reação foi rir. De nervoso.

- Última questão: coopere comigo, por favor. Preciso que converse comigo, para que possa ajuda-lo... Se eu fizer perguntas, responda...

- Só se você me deixar perguntar também.

O frio que subiu por sua espinha naquele momento era bem distante daquele que o medo geralmente representava.

- A sessão de análise é a do paciente Corey Sanders. – foi o que Melissa respondeu.

- Eu sei, mas não é justo eu contar todos os meus segredinhos sujos, se você não me contar nenhum seu.

- Nós não estamos em situação de igualdade aqui, Sanders. Eu sou a médica, você o paciente, e tendencialmente você faz o que eu mando.

- Ah, aquele papo dominador de novo...

- Você vai ficar brincando?

- De jeito nenhum, doutora.

- Então vai responder a todas as perguntas que eu fizer?

- Eu prometo! – Corey Sanders cruzou os dedos e deu um beijo em sua ponta.

Melissa, por um instante, desejou ser aquela sortuda ponta de dedo indicador. E no segundo seguinte quis se jogar de um penhasco por tal pensamento.

- Ótimo! Então podemos começar a sessão. – disse Melissa, enquanto já começava a se encaminhar para sua cadeira.

No entanto, não conseguiu dar os passos que queria, uma vez que foi impedida pela repentina aproximação de Corey Sanders. Daquela distância, podia sentir o perfume doce dele. Seu corpo ficou estático quando percebeu. Corey Sanders e o estranho poder arrebatador de sua presença. Quanto mais próximo, mais desregulados se tornavam os nervos de Melissa. Medo e excitação formavam uma interessante, porém explosiva, combinação.

- Antes de começarmos... – disse ele, dando mais um passo à frente – Posso fazer uma pequena observação?

- Vá em frente. – Melissa deu de ombros, disfarçando o quanto estava nervosa.

- Foi um belo fora, aquele que você deu no Peters.

Por um instante, Melissa quis checar a audição, questionando se tinha ouvido a pergunta direito. E ao se dar conta de que não havia qualquer erro de julgamento, seu cérebro não foi capaz de ordenar sua boca e língua para que se mexessem no movimento da fala. Sanders riu, divertindo-se.

- Não vou negar, adoro ver as coisas dando errado para ele.

- Por que estava bisbilhotando? – foi tudo o que Melissa conseguiu dizer, depois de se recuperar do choque.

- Foi mais forte do que eu, desculpe.

- Não, não desculpo.

- Juro que não vou contar para ninguém, não quero que perca seu emprego. Embora Peters perdendo o dele seja uma perspectiva muito interessante... De qualquer modo, prefiro conviver com ele, a nunca mais ver você.

O furacão do século se instalou na barriga de Melissa, que engoliu a seco e lutou com todas as forças para não demonstrar que estava abalada.

- Não vai mais se repetir, aquela cena.

- Melhor notícia do ano. – Sanders piscou - Foi bom enquanto durou, doutora? Peters soube te satisfazer?

Melissa não conseguiu acreditar no que tinha ouvido. Cerrou os olhos, levou as mãos à cintura e preparou-se para explodir, dizer que ele não tinha nada a ver com aquilo. Não o fez, contudo, porque sabia que era exatamente o que ele queria. No entanto, também sabia que o que estava prestes a fazer não era a melhor saída. O tiro poderia sair pela culatra, ele poderia não se sentir acuado, e aí tudo estaria perdido de vez. Não custava a tentativa, contudo, porque, ali, àquela altura, já havia entendido que profissionalismo e Corey Sanders, na mesma frase, não combinavam. Ele precisava de outro tipo de abordagem. Então ela respirou fundo e disse:

- Não posso reclamar. – um pequeno sorrisinho estava no canto de seus lábios.

Ele arqueou as duas sobrancelhas, a boca entreaberta. Enquanto foi coçar a cabeça, as algemas em seus pulsos brilharam contra a luz.

- Não acredito nisso – disse, por fim – Ele não parece o tipo de cara que sabe o que faz com as mãos, a boca...

- E como é que você saberia disso? – o sorriso cresceu.

- Porque eu sei o que fazer, e quando se é um cara experiente no assunto, tem o direito moral de dizer quem sabe e quem não sabe.

Melissa sabia que não deveria continuar com aquilo, mas continuou mesmo assim. Rindo na cara do perigo.

- Você parece mais um cara que fala demais, faz de menos.

- Posso provar que não – ele deu outro passo à frente.

Melissa deu um para trás, e descobriu-se encurralada por sua escrivaninha.

- Tenho certeza de que pode, mas não estou interessada. – foi o que respondeu, dando a volta nele para ir até a porta.

- Aonde está indo? – ele perguntou confuso.

- Abrir a porta. – Melissa respondeu, dando de ombros – A sessão acabou.

Antes que eu perca de vez o controle, pensou, mas não disse.

- Por quê?

Corey Sanders soou tão inocente, que Melissa não conseguiu conter sua pergunta:

- Por que está falando essas coisas, agindo dessa maneira? Pedi para não ir por esse caminho.

- Porque eu acho que você deveria ter uma segunda opção antes de se envolver com o imbecil do Peters. –Sanders deu de ombros, sorrindo serenamente com o canto dos lábios.

Ela caiu na armadilha de novo, fez a pergunta errada na hora errada.

- Ah, é? E quem seria a segunda opção?

Corey Sanders deu três, dos cinco passos que os separavam, e a encarou profundamente dentro dos olhos. Melissa sentiu cada um de seus músculos enrijeceram. A insinuação implícita no arquear de sobrancelhas dele a deixou consternada. Até que conseguiu colocar as ideias no lugar e entendeu o que ele queria dizer com aquela atitude muda. Ele talvez fosse a primeira opção, num mundo ideal em que não fossem médica e paciente, em que ele não estivesse preso por ter, supostamente, assassinado a ex-namorada...

Ali, naquela realidade, era loucura. E uma loucura que, fora da cabeça dela, sendo demonstrada por outra pessoa, como se fosse possível, parecia ainda pior. Tentadora, mas absurda. Seria aquele o momento de colocar os pés no chão e se impor. Impor o que restava de sua lucidez.

- Acho que já tenho um diagnóstico para você: enlouqueceu de vez, sim.

Ele riu.

- Está enganada. – apesar da rejeição de Melissa, Corey Sanders manteve a pose convencida.

Sem deixar morrer o sorriso sereno, deu mais um passo à frente.

Estava próximo.

Próximo demais.

Era difícil para Melissa raciocinar com clareza.

- E o que o faz pensar que eu tenho algum tipo de interesse em você? – a doutora, imprudente, o desafiou.

Mais uma estratégia para afastá-lo. Estratégia burra, sabia que não seria eficiente. E não foi.

- O simples fato de que toda vez que eu me aproximo – Sanders deu mais um passo à frente. O último. Colou seu corpo no de Melissa, que ficou estrategicamente encurralada pela porta. Podia sentir toda a rigidez dos músculos perfeitos dele contra sua pele frágil. Seu coração começou a retumbar violentamente e ansiedade correu por suas veias. Estava estática. Incapaz de reagir de qualquer forma. - Você fica hiperventilando – Sanders aproximou a boca do ouvido de Melissa, prendendo um dos lados de sua cintura com uma mão, enquanto a outra acariciava sua barriga. E a respiração dela, no mesmo instante, descompassou. – Seu coração bate forte como se fosse pular do peito. – ele passou os dedos com leveza pelo pescoço descoberto dela.

Em seguida, seu nariz percorreu da clavícula à mandíbula dela, inspirando com força seu perfume, como se necessário para mantê-lo vivo. A doutora conteve um suspiro.

- Sua pele ficou arrepiada... – Sanders riu contra a bochecha de Melissa.

Ela queria fechar os olhos e aproveitar as ondas de prazer. Depois queria tocar o rosto de Sanders, os traços fortes que formavam sua beleza, só para ter certeza de que eram reais. Queria acariciar os lábios dele, só para ver se eram tão macios quando aparentavam. Depois beijaria cada mínimo centímetro de pele que fosse possível, para conferir se seu gosto era tão delicioso quanto seu cheiro.

Porém, ao mesmo tempo em que desejava desesperadamente tudo isso, a luz vermelha do alerta de perigo se acendeu. E Melissa acordou daquele transe absurdamente sobrenatural para o qual a intensidade de Corey Sanders a havia induzido. Colocando as mãos sobre seu peito forte, a doutora tentou empurrá-lo. No entanto, ele não foi tão longe quanto ela queria.

- Está passando dos limites, Sanders... – Melissa forçou a voz a sair, denunciando seu estado de leve êxtase. – Como pode ter tanta certeza de que eu me sinto assim? – desafiou, tentando, sem sucesso, desdenhar dos poderes de Corey Sanders.

Já deveria saber, à essa altura, que ele tinha autoestima o suficiente para não se deixar abalar por aquele tipo de abordagem. Não quando o corpo dela gritava que, sim, queria muito que aquela coisa toda acontecesse de uma vez.

- Porque é exatamente assim que eu me sinto quando você está por perto. – respondeu ele, e a profundidade e intensidade de sua voz reverberaram de uma forma tal nos ouvidos de Melissa, que por um instante ela ficou sem reação, apenas assimilando o sentido de cada uma das palavras. – E um sentimento tão intenso como esse, não pode existir sem ser compartilhado por duas pessoas. Seria um desperdício.

Ela apoiou a cabeça na porta e fechou os olhos com força, na esperança de que, se não tivesse os olhos azuis dele a convencendo, finalmente recobraria a consciência.

- Isso é tão errado.

- Errado é você se envolver com um idiota como o Peters.

Ela riu, perdendo-se no momento.

- Isso é ciúme?

- Diga você, doutora. – desafiou – Me analise.

Ela abriu os olhos, naquele instante, decididamente esquecendo-se de onde estava, com quem estava, e que o que estava prestes a autorizar, ali, não teria volta. Prosseguiu mesmo assim.

- Não é preciso ser psiquiatra para detectar o ciúme. Uma mulher com um pouco de autoestima e instinto feminino em alerta percebe isso de longe. – Melissa sorriu.

- Bem, se você prefere interpretar dessa maneira... – ele deu de ombros, tentando fingir indiferença.

Não conseguiu enganar Melissa.

- Ou... – a doutora insinuou, arqueando uma sobrancelha e abrindo um sorriso maroto.

- Ah, tem um "ou"... – Sanders sorriu maroto também.

- Ou você não está querendo perder para o Peters, já que os dois vivem nessa intriga inexplicável...

- Você nunca vai saber – Sanders entortou a boca, naquele sorriso enviesado que tencionava a malícia.

Em seguida, aproximou os dois passos que Melissa o afastara.

A doutora espalmou as mãos na porta de madeira, pois não tinha intenção de afastá-lo novamente. Sabia que não teria forças para tanto. Sua respiração descompassou de novo, o coração voltou àquele ritmo tão rápido, que chegava a ser ridículo. O perfume de Corey Sanders tomou suas narinas para si, assim como a sua sanidade, obrigando Melissa a se entregar completamente ao poder afrodisíaco daquela fragrância que a deixava vulnerável. Quanto mais lutava para buscar o ar que faltava, mais daquele mal infestado de desejo a infectava, e ela se perdia sem volta em um labirinto, um beco sem saída.

Melissa escutou o barulho das correntes das algemas de Corey Sanders se movimentando, enquanto suas duas mãos iam se postar uma de cada lado de sua cabeça. Além de presa pela deliciosa pressão que o corpo dele fazia sobre o seu, ela também se encontrava cativa das correntes que envolviam frouxamente pescoço.

Uma onda de ansiedade a envolveu, e seu corpo esquentou. Era cativa de Corey Sanders. Era intenso, era pesado, era uma prisão sem grades. Uma prisão em uma bolha em que só estavam ela e ele. O restante do mundo foi sumindo aos poucos, transformando-se em borrões de preto e branco. Já não importava mais.

- Já que você se recusa a acreditar em mim, vou lhe dar algo que vai colocar uma dúvida na sua cabeça. – foi o que Sanders disse.

Em seguida, deixou de encarar Melissa, para levar os lábios quentes e macios ao pescoço dela. O deslizar daquele pedaço de pele pela sua, deixou-lhe na tortuosa posição de imaginar como seria beijá-los verdadeiramente.

Só um pouquinho, por um momento...

Logo soube, entretanto, que um momento não seria suficiente para matar a fome que cresceu dentro dela.

- Você é louco. – resmungou, apertando os dedos contra a madeira dura da porta.

Sentia sua resistência escapar por entre os mesmos dedos. Já não era mais capaz de encontrar sua força de vontade. Era difícil quando se estava naquela situação. E foi quando ele proferiu a frase seguinte, que Melissa desistiu de lutar. Não havia mais razões para resistir, afinal.

- Não é à toa que eu estou preso aqui, é?

Quando Sanders aproximou seu rosto, Melissa, por instinto, fechou os olhos. Esperou ansiosamente pelo momento em que finalmente os lábios, que tanto se desejavam, se tocariam. Sua cabeça recostou contra a porta, como se a falta de um apoio pusesse seu equilíbrio a perder.

Foi aí que o coração bateu mais forte do que nunca. Foi aí que Melissa se esqueceu de como se respirava. Foi aí que o frio na barriga tornou-se um furacão incontrolável e devastador. O momento antes do tão desejado beijo. E então, quase como se não pudesse ser real, os lábios macios, quentes e precisos de Corey Sanders, chegaram aos seus.

Primeiro apenas roçaram, enquanto Melissa o sentia inspirando o perfume de sua pele. Sanders sorriu por um instante. O instante que levou para tirar uma de suas mãos espalmadas na porta e levá-la até o rosto de Melissa, segurando-o como se fosse feito de porcelana. Ao acariciar sua bochecha com o dedo polegar, depositou um selinho demorado na boca dela. O encaixe entre seus lábios foi ridiculamente perfeito. E a demora daquele gesto singelo deixou Melissa borbulhando por dentro. O que logo tornou-se fervente. A língua quente de Corey Sanders deslizou pelos lábios fechados de Melissa.

Primeiro, no lábio inferior, depois no superior, e tal gesto seguiu-se por uma mordidinha quase imperceptível de volta no lábio inferior. Melissa entendeu como um pedido para que os entreabrisse, e o fez lentamente, como se ainda assimilasse o toque dele. Então a língua de Corey Sanders percorreu outra vez o desenho de seus lábios, pedindo a passagem para o interior de sua boca, que foi devotamente conferida.

Por um instante, Melissa não acreditou no turbilhão de sensações que dominou seu corpo. Após o primeiro movimentar de línguas em sincronia absolutamente perfeita, ela levou suas duas mãos a agarrarem os fios curtos de cabelo de Corey Sanders. Naqueles dois míseros segundos que tomou para assimilar o que estava acontecendo, foi como se o tempo tivesse parado.

O mundo parou.

Nenhum som podia ser ouvido. Nem mesmo seu coração. Foi como se ele tivesse parado de bater. Então voltou com força total, bombeando o sangue tomado de serotonina por todo seu corpo. Melissa não soube como foi capaz de se manter em pé naquele significativo instante. Os lábios de Corey Sanders deslizaram contra os seus em uma facilidade invejável, quase programada. Era quente, molhado, e o gosto de menta de sua língua se espalhava pela boca de Melissa à medida que o beijo permitia.

Era viciante.

Doce e rude ao mesmo tempo.

Como se a própria necessidade vital estivesse sendo defendida ali, naquele simples trocar de carinho entre lábios desesperados um pelo outro. O corpo de Corey Sanders a pressionava contra a porta e tudo o que Melissa conseguia fazer era pressionar o seu próprio contra o dele, puxando-o para cada vez mais perto. Queria a maior proximidade possível, enquanto seus lábios se tocavam naquele gesto lento e ao mesmo tempo urgente.

Ambos precisavam um do outro, e ambos, mesmo que resistentes quanto a tal constatação, no fundo, sabiam disso. Melissa sentia-se completa ali, como se estivesse no lugar certo, na hora certa e com a pessoa certa, por mais errado que fosse, mais arriscado, mais perigoso. Eram os lábios de Corey Sanders que os seus foram moldados para beijar, disso, naquele mágico momento, teve plena certeza.

Foi somente quando o ar faltou precariamente que Melissa e Corey se separaram. Sanders foi o primeiro a abrir os olhos, cerrando-os em um desejo tão evidente, que quase poderia ser tocado. Melissa libertou-se da escuridão no segundo seguinte, perdendo-se em uma análise minuciosa de cada um dos detalhes que formavam a beleza inexplicável do rosto de Corey Sanders. Do queixo que ela sentiu vontade de morder, das bochechas coradas pela falta de ar, do nariz reto de formato perfeito, dos lábios avermelhados por terem tocado os seus daquela maneira tão necessitada, das covinhas naturais que se formavam quando ele sorria. E por fim, chegou aos olhos, os olhos azuis que pareciam negros. Uma erótica e sedutora ânsia brilhava em cada um deles.

Então, no segundo seguinte, como se jamais tivesse se deixado levar pelo poder de Corey Sanders, Melissa arregalou os olhos, incapaz de crer que, de fato, deixara que as coisas chegassem àquele ponto.

E, após puxar grande quantidade de ar para dentro dos pulmões, de uma forma quase desesperada, a doutora nem se deu ao trabalho de olhar nos olhos dele uma vez mais. Apenas o empurrou longe o suficiente para que pudesse abrir a porta e saiu. Precisava pensar.

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