Round 11

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O dia da luta chegou. Desde o último encontro versus o mago-boxeador no mês passado, muita coisa ocorreu. No ringue, percebi os sorrisos tímidos de Zeca por ver minha movimentação contra Pinóquio. Ele não me permitia respirar, mas isso não significa que eu facilitei as oportunidades para me acertar.

Os clones tinham prazo curto de vida. O balanço do meu tronco evitava alguns socos. Outros conseguia contra-atacar com velocidade. Impedindo ser acertado. Há tempos não me sentia tão vivo meu boxe. Um sorriso subiu no rosto de maneira incontrolável.

— Ai sa-sa-sabotagem! Está ma-mais rápido! — Pinóquio me elogiou.

Não que eu desgostasse do Sabotagem. Amo as músicas dele. Mas senti um leve insulto nas falas do branquelo. Direcionei a força num rápido cruzado de esquerda. Acertando o verdadeiro. Ele cambaleou até as cordas.

— Resxpeita o mano Sabota! — Fiz uma cara de raiva, mas logo a mudei para um sorriso brincalhão.

— Desce garoto — O pedido veio seguido do Soluço. — Não precisa mais se aquecer.

— O maior problema dessa luta é que não tem aviso de horário, e muito menosx com quem você vai enfrentar.

— Te-tem sim!

O Pinóquio saiu do ringue para tirar a luva e as ataduras. Acabei por imitá-lo. A ansiedade me maltratava mais que o próprio embate. Fui para o vestiário tomar um banho gelado.

Retornei. Zeca e Pinóquio analisavam um vídeo de luta. Nele havia gritos animados de um público entusiasmado. — Boxe? — Me aproximei para ver. Era realmente uma luta. Muito desbalanceada por sinal. Havia um homem velho destruindo um mago-boxeador que parecia possuir a minha idade.

— Que... surra. — Pontuei.

— Esse era o meu maior medo. — Soluçou — Pensei na possibilidade de um veterano entrar no campeonato, por ser amador. — Arrotou — Esse é o... — Se esqueceu. — Quem Pinóquio?

— El ju-ju-ju-jubilado. U-um lutador ve-ve-veterano!

— O boxe de magosx não começou recente? — Questionei.

— Aqui. — Soluçou. — Lá em Nova-Bosta. É Nova-Bosta? Bosta-Iorque! — Soluçou. — Ele lutava por lá, quando já era oficial.

Bosta-Iorque? Zeca não sabia bem o nome da cidade. Só que a informação conseguia amassar a comédia de ver um bêbado falando besteira. O boxe de magos iniciou há mais tempo que estou parado. Mas só foi oficializado nas regiões brasileiras, recente.

Isso era pior que o esperado. Não apenas um lutador mais velho que eu. Também significava muita experiência nas costas. Estava pronto para levar uma surra. Hoje!

A porta da academia foi arrastada assim que o vídeo finalizou. Yasmin e Baiano nos saudaram. Mal pude olhar para ela envergonhado, e pouco importou. Ela nem ligou para a saudação. Enquanto eu e Baiano fizemos nosso aperto de mão maluco. Sempre fazíamos — Quando nos recordávamos.

— Preparado para luta de hoje? — Ela colocou a mochila no canto, e veio para a aglomeração.

— Vou lutar contra um veterano.

— Garoto, olha isso! — Zeca apontou para o vídeo que estudava. — Aqui está nossa vitória. — Soluçou.

— Não vejo nada, Zeca. — Fiquei observando o combate.

Tudo nele parecia perfeito. O homem estava lindo na luta de boxe, e isso deveria ser um crime passível de uma punição severa. Os golpes se encaixavam numa sequência sem brechas. Os braços — pesados por conta do round — conseguiam se manter bem alinhados ao queixo. Só que algo me surpreendeu. Minha boca abriu por reflexo. Zeca expressou um sorriso animado...

— A resxpiração dele!

— Exato! — A fala de Zeca me afastou. Maldito seja o bafo de cachaça. — ele tem uma técnica de luta muito polida. Superior à tua em todos os aspectos. Mas ainda tem quarenta anos.

De fato não era fraco. Mas não controlamos nosso corpo. Pensar em estender a luta só para obter a chance de ganhar me deixava mal. Contudo era a brecha que tinha se quisesse ganhar do El Jubilado.

Se eu soubesse quando ia ser a luta...

— Matheus, você vai ter tempo para a luta até às dezessete horas. — Yasmin foi bastante conveniente. Vamos fingir que não foi uma quebra de parede na história. — Está aqui no site do campeonato amador.

Bem. Não sabia que ia existir um site para essa maluquice, mas deveria imaginar.

— Até lá... Pode me acompanhar no shopping?

Assenti. Olhei para trás. Os rapazes estavam sorrindo e fazendo sinais de "joia" com os dedos. Isso me deixava mais envergonhado que aceitar o pedido de Yasmin. Peguei as luvas e botei envolta do pescoço. — Uma mania que tinha de nunca deixa-las longe de mim.

Assim que saímos caminhamos em direção ao Shopping Botafogo. — Ou como todo carioca conhece: O monte Olimpo. — Não era por menos. Um dos prédios verticais mais demorados de chegar ao topo. Poucas vezes fui ao Shopping sem que o intuito fosse comprar lanche e comer numa sessão de cinema, como essa.

— O que viemos fazer aqui?

— Comprar calcinhas!

Passei do ponto de estar vermelho.

— Comprar o quê?

— Calcinhas.

— Calcinhasx?

— É Matheus. Vou repetir quantas vezes?

— Por que não chamou alguma amiga?

— Eu tenho cara de ter amigas, Matheus? Soquei a cara da maioria das garotas que conheço. Antes vinha com os garotos da academia, mas como você fez questão de arrumar briga contra eles, e contra o meu ex. Vai ter que me acompanhar.

Vê se pode. A garota me acusava de tudo que ela já queria fazer. Tudo bem que dei uma leve empurrada para as coisas ocorrerem, mas era sacanagem. — Talvez estivesse gostando dessa exclusividade. — Yasmin parecia irritada com as encaradas que recebia.

As pessoas encaravam-na por conta do cabelo arco-íris, e a forma de se vestir. — Ela parecia possuir mais colhões que eu. E tinha. — Sempre que meus olhos batiam no vislumbre de imagem dela, podia sentir um leve toque de baba descendo pelo canto direito da boca.

Chegamos na loja de calcinhas. Logo cacei um banco para repousar, mas outro homem havia chego antes. Nossos olhares conversavam, e compreendi que ele não sairia de lá até a mulher ir embora da loja.

Yasmin pegou em meu pulso, e me arrastou para ver as calcinhas. — De tudo que era tamanho, cor, e jeito. Espera calcinha de cactos? — Para minha surpresa. Ela pegou a calcinha com estampa de cactos e abriu um enorme sorriso.

— O que achou?

— São cactosx. — A peguei na mão. — Parecem uma másxcara dos lutadores mexicanos! — Tive a ideia genial de colocar no rosto para interpretar o que dizia.

Foi nesse ponto que o problema ocorreu. — Por sorte, havia feito ela rir. — Após o momento de felicidade fui teleportado. Como? Mal sei explicar. O que havia ocorrido com o borrachudo que apareceu no meio da favela, também aconteceu comigo.

Estava no meio da Cinelândia. — Para quem não é carioca é no centro da cidade. Um lugar bastante movimentado inclusive. — O ringue havia sido posto na praça, e algumas lonas foram estendidas para evitar o sol.

O El Jubilado estava fora do ringue. Ele gargalhava, assim como o resto do público. — Tirei a calcinha do rosto. Mal sabia se podia ser considerada uma boa decisão. — Tirei o celular do bolso e liguei de imediato para academia.

— Garoto! A Yasmin me ligou dizendo que você sumiu! — Soluçou.

— Zeca! Estou na Cinelândia! A luta deve começar daqui a pouco!

— Aguarde garoto! Primeiro. Saia do ringue! Existe um período de trinta minutos para ambos os lutadores subirem. Estamos chegando!

Bem. Agora taxado de tarado das calcinhas com estampa de cacto. Aguardava no meio da Cinelândia. Tudo que podia esperar era o nocaute.

O Nocaute do X-TudoOnde histórias criam vida. Descubra agora