Capítulo 1

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   Se era real ou não, aquilo não importava. Eu não podia perdoá-lo, eu não podia simplesmente passar um pano em cima de tudo que ele já provocara na minha vida. Ele havia torturado meus amigos. Assassinado todas aquelas pessoas em Novokribirsk, pessoas... inocentes. Eu tentei protegê-los, e falhei miseravelmente. Conseguia ouvir a voz de Ana Kuya, xingando o fato de eu ter falhado, como se eu fosse aquela garotinha magricela de 8 anos, que não sabia fazer nada, além de desenhar algo ao menos decifrável.

  Mas eu não era mais aquela garotinha. Ela morreu no dia em que aquele chamado, aquela luz ecoou dentro de mim, como um rugido de uma fera enjaulada que almejava a liberdade. Mesmo que inconscientemente, eu quis aquilo, naquela hora, naquele lugar, como se os santos tivessem feito suas apostas em mim e ganhado.

  Mas o que eu era? Uma Santa? Uma Etherealki? Uma bruxa? Um monstro?

  Eu não sabia. Só tinha a certeza de que desde que aquela luz ecoou em mim, tudo mudou. Mudou tão radicalmente que eu a rejeitei, mas tive que aprender a conviver com aquilo como se fosse uma dor, um peso. Eu a tornei um peso no início. E quando aprendi a conviver com aquilo de forma mais amena, mesmo com o maldito colar, Maly o tornara um peso. Porque ele queria uma Alina que havia morrido há muito, muito tempo.

  Acho que eu queria voltar a ser aquela Alina também, porque Maly fora a única pessoa em Ravka; no mundo que representara para mim o que chamavam de família.

  Genya; até mesmo Zoya que me odiara quando pisei no Pequeno Palácio pela primeira vez, nunca me diminuíram, nunca quiseram que eu abandonasse meu poder se existisse uma maneira para tal, elas me... aceitaram, aceitaram quem eu era agora.

  Senti o roçar daquela esmeralda do anel pesado na palma da minha mão mesmo não conseguindo vê-lo. Nikolai poderia me amar, eu não sabia. Mas sua prioridade em tornar-me sua rainha, era pelo que eu representava, não pelo que eu era. Pensar naquilo era como uma flecha perfurando meu peito.

  E Maly... Ele me amava, e eu o amava também. Mas, por qual razão eu o amava? Por ser a única família que eu tive, por ser a minha espada? Por que eu precisava de uma espada para derrotar o Darkling quando tudo ficaria escuro à minha vontade? Por que eu precisava que meus amigos arriscassem cada lufada de ar restante em seus peitos, numa batalha em que nunca triunfariam? Por que eu simplesmente não tentava ao menos compreender aquele chamado que me fazia sentir cada vez mais viva?

  Agora, agora eu estava em ruínas. Eu mal podia sentir o calor do sol, mal conseguia sorrir... Era como se eu estivesse morrendo aos poucos, e minha luz não permitisse que eu definhasse de vez.

  Minha luz.

  Ele nunca me abandonou. Quando eu me sentia sozinha, ele estava lá, escondido nas sombras, mas estava lá. Acho que teme essa coisa que nos conecta, ele disse uma vez. Mas ele nunca desistiu de mim, ele nunca me temeu, sempre esteve lá. Semelhante atrai semelhante. Maly nunca iria me entender, porque ele simplesmente não queria, e quem quer que tentasse, iria temer aquilo alguma hora.

  O problema em querer algo é que isso nos deixa fracos, aquilo ressoou na minha mente. O que eu queria? Eu queria salvar Ravka, acabar com as mortes, eu queria paz. Eu queria tanto salvar meu país, e até agora, só tínhamos destruído a nós mesmos.

  Ele queria um mundo melhor para os Grishas, e fez atrocidades para tentar alcançar seu objetivo. Ele fez mais ainda quando eu escolhi não entender, não atender àquele chamado.

  Se, nas menores das possibilidades, vencêssemos a guerra que eu alimentei, que diferença faria? Nikolai decretaria quando se tornasse rei que grishas deviam ser respeitados e tratados como cidadãos em Ravka. Palavras. Eram apenas palavras bonitas. Ele nunca mudaria a mente das pessoas, e aquele povo, o meu povo, seria massacrado aos poucos até que grishas fossem apenas personagens dentro de livros distribuídos para as crianças, como o livro vermelho do Apparat.

Light and Dusk- an alternative ending for the grisha trilogyΌπου ζουν οι ιστορίες. Ανακάλυψε τώρα