Capítulo I

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Como todos os dias, Ricardo decide que é hora de levantar da cama, afinal o fim de semana promete ser ensolarado e ele não gostaria de perder esse dia por nada. Desde que a quarentena começou, o morador do apartamento 419 passou a auxiliar seus vizinhos, Dona Laura e Seu Norberto, com atividades que necessitem a saída de casa.

Faz duas semanas desde que o governo decretou um lockdown total e o patógeno, que já deixou um rastro com muitos corpos por onde passa, parece não ter misericórdia daqueles que são infectados. Ricardo sabe que o patógeno é perigoso, mas geralmente tenta não pensar nele, sabe também que qualquer coisa ele pode contar com Fernanda, a moça do 415, a qual sempre resiste às suas cantadas. Ela é enfermeira, portanto ele sabe que ela pode auxiliar no que for preciso.

Fernanda tem um filho de oito anos, Franklin, o garoto é um prodígio, Ricardo sabe que ele provavelmente vai seguir na carreira médica como a mãe. Embora seja um pouco solitário, Franklin costuma ter uma boa relação com Jordan, o novo vizinho.

Jordan, é um aficionado por jogos eletrônicos e possui um canal de streaming de jogos de RPG, decidiu depois que atingisse determinado número de seguidores que moraria sozinho, assim ele ocupa o quarto 417.  Dona Laura suspeita que o novo vizinho seja gay e lastima muito caso ele de fato seja. Para ela já bastava o andar contar com Julia e Patrícia, duas mulheres casadas, para a senhora isso não passava de "uma pouca vergonha", como ela costumava dizer.

Enquanto ela costuma lastimar sobre a vida sexual dos vizinhos, seu marido, o Seu Norberto, lastima o fato da esposa não repor a bolsa de colostomia dele, no que ela rebate dizendo que não é médica e que nem se fosse paga mexeria na merda do marido.

Antes de sair para as compras, Ricardo passou no apartamento 410, onde mora o casal de idosos, e perguntou se eles precisam de algo do mercado ou da farmácia. Desde que Jordan ensinou Dona Laura a usar aplicativos de compra online, ela deixou de pedir para Ricardo que lhe faça as compras.

Assim que chegou no térreo, Ricardo colocou a máscara no rosto e as luvas, para se manter protegido de uma possível infecção. Ele puxou a maçaneta da porta para sair à rua e tão logo a puxou, ele se depara com Leandro, o síndico do prédio e morador do apartamento 411. Ricardo o cumprimenta acenando levemente com a cabeça e segue para rua.

As ruas encontram-se vazias, como de costume, nada de muito diferente, afinal há duas semanas o lockdown havia sido decretado, portanto as poucas pessoas na rua estão ali porque precisam estar, seja trabalhando ou em busca de itens essenciais para abastecer suas casas.

Ricardo não pode deixar de notar que a prefeitura estava fiscalizando os prédios à volta, então lembrou-se que o governo havia dito, no início do lockdown, que todas as pessoas seriam testadas, um bairro por vez, portanto não era surpresa que isso fosse acontecer. Ricardo é um homem que sabe das coisas, sempre tenta se manter informado, e obviamente ele sabia que o Solar Almeida, o prédio onde vive, teve o primeiro caso da nova infecção, portanto era de se esperar que o bairro fosse o primeiro a ter a população testada para a presença do patógeno.

Enquanto ia em direção ao mercado, um funcionário do governo o chamou e disse-lhe para voltar para casa, pois o bairro está em testagem, portanto era necessário que todos estivessem em casa. Ele tentou explicar que estava indo às compras, porém teve de voltar ao seu apartamento e aguardar a testagem.

Os sintomas do patógeno não são bem conhecidos, alguns apresentam tosse, taquicardia, enxaquecas, coriza e alguns outros sintomas que são bem menos comuns, porém cada pessoa apresenta sintomas diferentes. Alguns infectados apresentam um ou vários sintomas, portanto a infecção só pode ser confirmada com um exame de sangue específico. Geralmente os resultados saem em dois dias, às vezes mais dependendo do volume de amostras para testagem. A única coisa em comum em todos os infectados pelo patógeno é que todos estavam mortos. Uma doença mortal e que ainda não possui uma cura.

Os funcionários do governo chegam ao prédio e fazem o teste em todos os moradores, à exceção de Fernanda, que estava no hospital trabalhando para cuidar daqueles que perecem pelo novo patógeno. Um por um todos os moradores vão sendo testados: apartamento 410, 411, 413, 415, 417, 418 e 419. Os apartamentos 412, 414 e 416 encontram-se desocupados há dois meses, quando os últimos moradores se mudaram para andares abaixo.

Franklin, que estava ao cuidado de Julia e Patrícia estava brincando com Pablo, o amigo argentino de Patrícia, no momento da chegada dos funcionários do governo. Fernanda havia alertado as vizinhas que o menino tinha certo medo de agulhas, então foi necessário que Pablo o distraísse enquanto um dos funcionários lhe tirava o sangue. Pablo estava de passagem pelo Brasil, em um programa de intercâmbio, ele fazia artes e estava um ano atrás de Patrícia, que já atuava como artista freelancer para uma marca de leites local. Ele não conseguiu voltar para casa depois que o patógeno passou a ser uma ameaça em vários lugares do planeta.

Ricardo esperou ansioso a chegada dos funcionários, pois tão logo ele fizesse o teste, mais rápido ele podia ir às compras. Ele esperou até que batessem à porta do seu apartamento. Para sua surpresa, ele ficou meio tonto após a retirada do sangue, não esperava por isso. E decidiu ir às compras, porém cambaleou e decidiu ir deitar um pouco, mais tarde, quando recuperasse as forças, ele iria ao mercado.

Mas ele adormeceu.

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⏰ Last updated: May 21, 2020 ⏰

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Isolados do Quarto AndarWhere stories live. Discover now