dois

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Outer Banks


   A epífise proximal do osso metacarpiano do meu tio se chocou contra o meu osso zigomático fazendo um corte se abrir na minha pele e o sangue espirrar na parede atrás de mim, minha cabeça tombou para o lado oposto de sua mão e a mão esquerda dele em um gancho se chocou contra a minha barriga, fazendo a náusea se tomar presente no meu corpo. Minha cabeça bateu na parede e agradeci por isso, por conta do choque não senti os outros golpes desferidos contra o meu corpo.

Mas quando entrei dentro do meu quarto mesmo zonza, tranquei a porta sentindo choques de arrepio dos meus pés subindo por todos os meus membros até sentir aquele arrepio no meu rosto enquanto caía sentada na minha cama, piscando varias vezes para a tontura passageira acabar.

Vejo meu reflexo no espelho, o sangue escorrendo da minha bochecha estava já no meu maxilar, a mancha avermelhada ao redor do corte já continha indícios que ficaria roxa, e meu lábio sangrando fazia que o sangue misturasse na saliva e era o motivo dos meus dentes estarem vermelhos. Por incrível que pareça eu não estava surpresa, mas a raiva e cansaço como sempre, era a mesma.

Meu tio teve comportamentos agressivos uma semana depois da viagem do meu pai a trabalho, e logo virou algo frequente, fazia praticamente um mês que eu era espancada pelo menos toda semana, e os motivos podiam ser até dos mais bobos possíveis, como usar biquíni e ficar sozinha na praia. Em um dia ele me batia, no outro parecia esquecer isso, agia como se nada tivesse acontecido, as vezes eu acho que ele simplesmente não se lembrava.

Agarro o álcool que já ficava embaixo da minha cama e passo com um lenço limpando meus machucados, ficar com hematomas no corpo com o tempo virou uma rotina, e ficar longe das pessoas para que elas não questionassem ou me perguntassem virou algo que eu estava bem acostumada. Era melhor ficar longe de todo mundo do que ter pessoas sempre perguntando sobre os roxos no meu corpo.

Claro que algumas sabiam, e me olhavam com pena, o dono do The Wreck era um exemplo, o homem ontem me viu correndo do meu tio quando entrei no seu restaurante para despista-lo e ele criou a desculpa que eu ia trabalhar lá para o meu tio ir embora, oque, de fato, teve resultado. Voltei de noite e ele estava apagado, mas no dia seguinte -hoje- quando cheguei na cozinha fui recebida com esses socos. Ao mínimo o Sr. Carrera realmente me ofereceu um emprego, pagaria menos por não estar procurando alguém porém já seria ótimo ficar longe de casa, e no momento eu me vestia justamente para ir nesse novo emprego.

Pelo menos vou trabalhar limpando as coisas, não tenho uma cara muito bonita para ser uma garçonete. Ninguém quer ver roxos e cortes de uma pessoa que está entregando sua comida.

Saio pela janela para não correr risco de receber outro soco, e ajeito o pequeno curativo sobre meu osso zigomático, me mudar para Outer Banks foi a mudança mais drástica na minha vida, e mesmo se não fosse pelo meu tio eu continuaria não gostando daqui. A ilha deveria ser chamada de ilha da desigualdade social, onde chamavam de kooks pessoas do outro lado da ilha, mimados ricos que se acham superiores, e já tive o desprazer de encontrar alguns que acham que sou simplesmente uma boneca que podem levar para a cama. Desse lado da ilha ficam os pogues, negligenciados, pobres que trabalham para os kooks para sobreviver, e encontrar brigas de kooks x pogues era algo normal em eventos ou praias.

– Bom dia Sr Carrera -Digo ao homem que parecia levemente estressado, mas quando ele olhou para mim seus olhos se arregalaram por alguns segundos e ele suspirou, como se estivesse com ódio do meu tio ao ver o meu rosto.

– Sinto muito Jamay -Ele diz com um olhar de receio, e eu estou bem acostumada a receber esses olhares e outros de pena.

– Está tudo bem, nada que já não tenha acontecido antes, como posso ajudar? -Pergunto e o homem mais uma vez suspirou. Acho que ele é um dos únicos kooks legais.

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