Parte II

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A campainha tocou e Carlos levantou depressa do sofá, derrubando muita pipoca no chão da sala. Max latiu feito louco e entrou a sua frente, quase o fazendo cair.

- MAX, SENTADO!

Mas é claro que o cão não obedecia, só obedecia outra dona, que não via já há um tempo.

Se livrando das pipocas que ficaram na camisa, abriu a porta, era sua vizinha que resolveu entregar sua correspondência. Ele agradeceu com um sorriso amarelo, já sentindo seu coração se encolher ali dentro. Ele sabia de quem era uma daquelas cartas. Sabia que ela a havia segurado e que agora estava ali. Em suas mãos, em sua casa. Em seu território.

Estava tudo bem então. Não é?

Era apenas uma carta e nada mais.

Por que então ele sentia suas mãos suarem e tremerem?

Se despediu de Maria e fechou a porta. Foi direto para sofá e Max sentou-se a seu lado, não latiu mais. Quase como se soubesse o que aconteceria ali. Que uma vez mais seu dono choraria naquele sofá por alguém que partiu e não voltaria mais.

Carlos pegou o envelope amarelo e o abriu, sem jeito.

Seu coração já disparado, perdeu as estribeiras quando identificou aquela letra, a mesma letra da primeira carta de amor que ele recebeu na vida. A mesma letra que escrevia poesias em guardanapos e guardava pra ele, só pra ele.

E mais uma vez, e não só naquela vez, ele se perguntou o que havia feito. Pediu-lhe um tempo pra pensar e ela foi embora. Disse que não sabia mais se o amor que sentia era de verdade, e então ela partiu. De verdade e para sempre.

Se não era de verdade, porque seus olhos marejavam com aquela carta em suas mãos?

O que Carlos não sabia e tardava a entender é que tudo é de verdade. Todo sentimento é de verdade se o sentimos.

E a verdade daquela história toda é que ele precisava ter feito aquilo, precisava ter dado o estopim que daria fim a tudo.

Mas não a tudo. Há o que seja eterno, e eterno é o que é verdade. O amor era verdade, o que viveram é verdade.

Então, o fim chegara àquela jornada, e era o que precisou acontecer. Carlos precisava estar ali, aprendendo sobre saudade e arrependimento através daquela carta de desamor.

Tudo aquilo já iria acontecer mesmo. Corações partidos não existem. O que existem são caminhos que não pretendemos tomar, e então nos sentimos traídos e perdidos. Mas não existem corações partidos, apenas desejos partidos, paixões partidas. Então a vida continuava, e o coração, também. Inteiro e intacto, cada vez mais vivido e capaz.

Naquele dia Carlos chorou.

Depois guardou a carta no fundo de uma gaveta e ali deixou.

Não foi a última vez que pensou ou chorou por ela.

Não foi a última vez que lembrou dela.

E a esperança que ela deixou pra ele, seja naquele papel amassado, seja na mente já mais madura, era para sempre.

A esperança trazida pelo correio permaneceu. Mas a vida não, a vida foi mudando, e os dois seguiram seus caminhos, como toda boa alma gêmea deste mundo, o que aconteceu depois, ninguém nunca saberá.

Querido Carlos [Concluído]Where stories live. Discover now