Para ela, o bando é um refúgio contra essas próprias instituições que, teoricamente, deveriam responder às suas aspirações — e isso ela exprime, com intenso desespero, na sua crítica amarga à escola: "O que quer dizer essa de 'proteção do meio ambiente'? Pra começar, é ensinar as pessoas a viverem juntas. É isso aí que a gente devia aprender nesta escola fodida, a se interessarem uns pelos outros, em vez de cada um querer ser mais que o outro, ser mais forte que o cara ao lado e passar o tempo a fazer malandragens para ter uma nota melhor".

No caso de o leitor tentar convencer-se de que as revelações contidas neste livro se referem somente às grandes cidades e que, além disso, trata-se de um fenômeno marginal, nós lhe asseguramos: o vício precoce da heroína, o alcoolismo juvenil e seus efeitos secundários — prostituição infantil, delinqüência ligada à droga — são amplamente disseminados. Mas por que são tão pouco conhecidos? A confissão de Christiane nos fornece algumas explicações: raros, dentre aqueles que sabem — instituições oficiais tais como a polícia, escolas, entidades médicas e sociais, clínicas —, são os que vão até o fundo do problema ou que dão o grito de alerta. As coisas acontecem como se houvesse uma conspiração de silêncio, como se tivesse sido decidido resolver o problema somente com medidas de rotina. Contentam-se em observar, registrar e eventualmente isolar em algum estabelecimento. O sofrimento, o desespero, o universo dessas crianças, nada transpira para o exterior. Tenta-se apresentar o problema da droga unicamente como conseqüência da atividade criminosa de traficantes e revendedores. De certa forma, a luta acaba sendo uma espécie de "operação limpeza".

As instituições responsáveis desenvolveriam certamente mais terapia e prevenção se fossem encorajadas por um maior apoio político, mas este continua a não existir. E a ação política, por sua vez, é pressionada pela opinião pública, que se caracteriza por uma tendência generalizada a recalcar, a não querer pensar. Essa tendência é cuidadosamente estimulada por certas forças políticas que, preocupadas em não deixar nenhuma sombra, por menor que seja, sobre a ordem estabelecida, imputam, sistematicamente, o fracasso ou a inadaptação ao próprio inadaptado ou ao corruptor anônimo.

Não se trata pura e simplesmente de aumentar a informação sobre o problema da droga, mas de uma mudança de atitude da grande maioria dos adultos: nós precisamos ter a coragem de tomar consciência de uma situação deplorável e da nossa responsabilidade em relação a ela. De certa forma, o problema da droga é apenas um sintoma chocante da incapacidade dos adultos — falo de maneira geral — de convencer a geração jovem de que ela tem oportunidade de encontrar, na sociedade da qual nós somos a imagem,um verdadeiro desenvolvimento humano. Na realidade, se as crianças se entregam à droga ou aos braços de seitas duvidosas, não é por puro capricho, surgido do nada; é porque os pais, involuntários e inconscientemente, lhes recusam ajuda, possibilidade de crescer na sua relação com os outros. É isso que eles vão buscar nessas subculturas. Escutar os filhos, ter consciência de seus problemas, eis uma coisa que não se faz mais. Ao contrário, são os pais que transferem para os filhos seus próprios problemas, encarregando-os, muitas vezes, de resolvê-los. O problema de Christiane ilustra perfeitamente este mecanismo psicológico: pode-se analisar a maneira como esta criança assume inconscientemente os ressentimentos e as insatisfações de seus pais. Ela fracassa nessa difícil tarefa. Um fracasso que se expressa de forma diferente do de seus pais.

De qualquer forma, é um erro fundamental pensar que o início do isolamento irremediável dos jovens foi seu mergulho na marginalidade. Esse isolamento era anterior. Não podemos, portanto, atribuí-lo à má vontade ou à recusa das crianças em se comunicarem. O motivo é a privação de uma relação sólida e confiante com aqueles que têm por missão dar a eles amor e apoio. Seria muito simplista acusar este pai ou aquela mãe. Outros fatores interrelacionados exercem uma influência nociva.

Eu, Christiane F. 13 Anos, Drogada e ProstituídaNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ