Era uma noite fria, então uma lareira mais ao canto fazia o calor, alimentada por um grande fole de couro.
- Ah, olá senhor! Olá senhor! Senhor?
- Ah, sim. No que posso ajuda-lo? Se é questão de algum projeto... No momento não estou recebendo propostas de invenções... E fale mais alto, sim!
- Ah não. Não é isso. - Aruim gritava, o homem era praticamente surdo.
- Então?
- Bom, nem mesmo eu sei com certeza... Só sei que precisava conhecê-lo.
O senhor soltou os papéis e um filete de algodão que manejava. Fez uma careta de desentender de Janeiro até Aruim.
- Então... fico feliz com sua voracidade de fã. Conseguiu entrar em minha fábrica sem ser notado e isso deve ser considerado. - retirando o restante de algodão e filamentos dos dedos, ele esticou a mão em cumprimento. - Acho que sendo meu fã já deva me conhecer, mas por educação... Me chamo Thomas Alva Edson.
- O que? Thomas...
Aruim entrou em um frenesi que logo foi administrado pelo olhar severo de Janeiro.
- Ah, no que está trabalhando?
- Trabalho em algo que mudará o mundo, e o tornará mais iluminado, é claro.
- A invenção da lâmpada!
- O que disse?
- Nada... Então, está progredindo?
- Isso é segredo. Só digo que há tempos está me tirando o sono. São fracassos sobre fracassos e não sei se tenho tanto gás para continuar. Tudo que tenho a respeito está descrito nessas anotações.
Thomas indicou a pilha de papéis banhados em cálculos e esboços.
- Eu sei que estou falhando, e isso é bom. Muitas das falhas na vida acontecem quando as pessoas não percebem o quão perto estão quando desistem. Mas me sinto cansado demais para continuar pensando a respeito... Talvez engavete o projeto e o retome no futuro.
- Não, não pode!
Thomas exibiu um tímido sorriso.
- Você é engraçado rapaz. Ah, por favor, atice o fogo para nós, ou iremos congelar aqui dentro.
O fole era muito maior do que os comuns, por isso o mau jeito em segurá-lo e o desastre que se seguiu. Sem conseguir levantá-lo o suficiente, Aruim esbarrou na mesa que logo se virou aos pés do inventor, os papéis embaralhados no chão. O pior acontecera quando um jorro inexplicável de vento, empurrou aquele precioso arquivo de anos ao fogo voraz da lareira.
- Não. Não! Não era isso o que eu queria... - Aruim se virava para Janeiro que nada dizia e para Thomas que afofava os cabelos em desespero - Eu não quero que isso aconteça! Estou pedindo, Janeiro!
- Seu desejo não é mais importante neste quadrante. Sua ação se faz muito mais forte que o próprio desejo. Interferiu diretamente no passado e o resultado é este. Já é tarde.
- Como tarde? Você sabia!
Aos poucos as máquinas, combustíveis, criações mirabolantes e cômodos do longo laboratório foram se esvaindo, esquecendo-se de existir. Thomas, sentado sobre as pernas, lamentava a perda de talvez sua maior contribuição para a humanidade.
- Agora você compreende como o tempo é implacável. Thomas não terá mais brio para prosseguir. E como o seu sonho de iluminar o mundo acabou, creio que um dos que ficam para trás sou eu.
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O Emissário do Tempo
FantasyO Emissário do Tempo é uma homenagem a obra prima de Neil Gaiman - Sandman - que cita “rua pavimentada de tempo”, e que assim como a musa Calliope serviu a Richard Madoc, serviu também de inspiração para este conto. [referente a Sandman - Capítulo 1...
A Provação e a Ressurreição
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