Mais um dia

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Segunda feira, 7 horas da matina

Entro na sala vazia e já me posiciono na minha carteira, no meio da fileira encostada na parede. O melhor lugar para conseguir zoar, pegar a matéria e desenhar sem o professor perceber - longe de mim ficar aloprando a aula inteira, mas as vezes não tem problema.
Caderno, lápis e caneta ponta-fina. Praticamente meu melhores amigos. Vou terminar esse desenho hoje nem que seja a última coisa que eu faça.
Gritos no corredor.
Eu acabo hoje, mas não precisa ser agora
Corro para o corredor, em primeiro lugar porque eu me recuso a perder alguma confusão nessa escola entediante, em segundo lugar poque eu acho que sei quem está gritando.

- EU SOU A MULHER CENORA E EU VIM PRA ABALAR
NA SUA CARA
EU VÔ SAMBAR!- uma garota alta no meio do corredor, balançando seu black power e dançando em direção à sala, com um moleque dois palmos menor com um gorro vermelho enorme cobrindo a sua testa seguindo-a numa tentativa falha de copiar seus passos enquanto berra a música.

- Olha só, Boca, que legal. Eu não sabia que a gralha da laranjeira da quadra aberta dava aulas de canto

- Ah, vai te catar, Inferno!- responde o garoto irritado, quase mais vermelho que a própria touca- Tu sabe como é horrível perder uma aposta pra essa OthaiRIA aqui.

- Eu sei que você me ama, Boca- diz a garota de cabelo afro, dando um soquinho amigável no ombro de boca e mostrando a língua para mim

Apenas mais um dia normal com esses dois loucos. De que adianta sanidade com eles por perto?

Essa relação é completamente amigável e parceira, apesar de um pouco agressiva.
Somos só nós três, o grupo conhecido no nono ano como a "dupla de três", nome que surgiu após uma piada numa aula de literatura.

A menina de Black power é Thaísa (uma othairia na minha opinião). Mais alta que qualquer um na nossa sala, teria tudo para sofrer bullying. Cabelo "pixaim", negra, gorda e com vitiligo nos braços não se deixa abater por nada. Se alguém fala do seu cabelo, ela diz que a pessoa tem inveja do "novo mundo" em cima da cabeça dela. Se alguém chama ela de dálmata, ela manda a pessoa tomar naquele lugar aonde não bate sol. Conheci ela no sexto ano e imediatamente me tornei a melhor amiga dessa louca que tem mania de falar as coisas na cara e humilha todo mundo no passinho (sim, ela é uma das melhores dançarinas que eu já vi, e olha que eu já vi vaaaaaarias por aí)

O garoto de gorro é Bruno, popularmente conhecido como Boca. Ganhou esse nome depois de ter engolido uma mosca numa excursão dois anos atrás,ter ido parar no hospital e ser chamado de "boca grande" por um enfermeiro muito engraçadinho. Apesar de tudo, o moleque é simplesmente um gênio, já me salvou em muitas provas de matemática. Conheço ele desde o prézinho, então a intimidade pra mangar da cara dele é quase infinita, e eu sempre tenho várias oportunidades, já que ele tem mania de apostar as coisas com a Thai, mesmo sabendo que ela nunca perde uma aposta...

E tenho eu. Helena, Lê, Inferno( hell, em inglês, adaptado pelo Boca para Hel), deusa nórdica dos mortos inglórios (exagerei um pouco,não foi?). Não sou alguém especial, me imaginem como quiserem. Feminista, ativista, desenhista e lésbica. Me assumi a pouco tempo. Meus pais e amigos levaram isso numa buena, mas tem alguns babacas que continuam enchendo o meu saco por causa disso.

- Qual foi a aposta da vez, Boca Aberta? Deve ter sido boa, se o valor era um mico- A Thai é super metódica quando se tratam de apostas. Para cada nível de dificuldade era um tipo de "valor", e as mais difíceis geralmente envolviam pagar um mico no corredor da escola, sempre super movimentado.

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