Post Mortem

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Enquanto eu limpava as tuas feridas, tivemos as conversas que a saúde nunca nos permitiu. As horas que gastei me ocupando de ti, na verdade – e sem saberes – acabaste cuidando de mim. Decerto que sempre deixavas a porta entreaberta para que eu me sentisse à vontade para entrar e contar o meu dia. Mas eu costumava fingir que não entendia o convite e vivia os meus dias me esforçando para esquecer a tua presença, às vezes incômoda, com tantas perguntas que eu julgava demasiada intrometidas. Infelizmente, apenas quando da tua partida, compreendi que as perguntas eram a única forma que encontravas para que estabelecêssemos um diálogo que fosse além do "oi" e do "chego depois do jantar". Foi preciso te ver acamada para eu me dar conta da tua importância em minha vida. Somente em teu leito descobri quem tu eras, a tua história, o que pensavas sobre a vida, sobre o mundo e sobre mim. Agora que não mais te tenho, tantas perguntas me surgem e não estás mais aqui para respondê-las. Angustiada, tento te encontrar em mim, para assim obter as respostas que perscruto; olho-me no espelho à procura das semelhanças entre nós, no intuito de assim saber que caminho seguir, mas só escuto o silêncio, uma cruel vingança tua. Deito-me, mas antes passo pelo teu quarto e deixo a porta entreaberta para ver se durante o meu sono, sopras os conselhos que eu não quis escutar.

A CASA AMARELA CONTOSOnde as histórias ganham vida. Descobre agora