26°- CAPÍTULO ✝

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Andei por dois mil e quatrocentos segundos, até que chegasse na minha casa. Contar cada um desses segundos sempre me ajuda a manter toda a minha calma e não deixar que tudo escorre para longe, como era antes. Talvez, eu devesse agradecer a ela por me dar isso agora, nós compartilhamos algo.

Andando calmamente até à porta, mas paro quando ela se abre antes que eu tenha a oportunidade de fazer isso. Eve estava do outro lado, pronta para ir para à escola, julgo eu. O uniforme cobria todo seu corpo, e sua expressão não era de raiva como imaginei que seria, e sim, de cansaço.

Seus olhos sem vida me encaram por alguns segundos, antes que ela saia da casa.

– Por favor, se livra daqueles corpos, o cheiro está insuportável. – Essas sãos suas únicas palavras quando ela passa por mim e caminha em direção à calçada.

Olho o corpo cansado da minha irmã se afastar, e quando não a vejo mais, entro em minha casa. Ando calmamente por todos os cômodos e termino parada na cozinha, onde Mark estava sentado em uma das cadeiras ao redor da mesa de madeira lascada.

– Eve está bem? – Pergunto, atraindo a atenção do garotinho de cabelos loiros.

– Você não deveria pergunta isso para ela? – Ele me olha com sua falta de interesse rotineira.

– Não acho que ela me responderia. – Me escoro contra o batente da entrada da cozinha.

– Acho que ela cansou do que fazemos, isso é bom, não é? Assim ela não atrapalha mais. – Mark pergunta de um jeito tão inocente como se essa pergunta não fosse algo surreal para uma criança de doze anos, considerando o contexto por trás dela.

– Me responde uma coisa, Mark, como era sua relação com a Eve de Setealém?

Isso é algo que me inquieta também, nunca falamos sobre isso e, às vezes, essa outra versão da minha irmã é tratada como se nunca tivesse existido.

– Ela não falava muito e sempre ficava trancada no quarto. Não tenho muitas coisas para dizer. – Mark responde.

– Então, vocês não criaram uma ligação como foi com você e a minha versão? – Pergunto e ele responde com um simples aceno de cabeça. – E por que Angeline só aparece para nós dois? Ela também trouxe Eve para esse mundo.

– Talvez, porque ela não queria aparecer para Eve. – Mark responde, se levantando da cadeira em que estava e caminhando até onde estou, passando do meu lado. – Estou indo pra escola. – E com isso, escuto seus passos se afastarem até que a porta da frente seja aberta e fechada.

Estou sozinha pelo resto do dia.

Depois de pensar um pouco, acabo por ir até o meu quarto, onde o cheiro da morta estava impregnado pelas paredes, acompanhado pelos dois corpos sem vida. Caminho até meu guarda-roupas e retiro de lá alguma coisa que posso usar hoje, as levando comigo até o banheiro, onde pretendo tomar um longo banho. Vou até à banheira e ligo a torneira, esperando com paciência até que ela se encha por completo. E foi preciso, setecentos e vinte minutos até que isso acontecesse. Com a porta do banheiro fechada, retiro toda o uniforme escolar que sou obrigada a usar todos os dias, e o deixo jogado no chão antes de caminhar até à borda da banheira, colocando pé por pé dentro da água quente. Por fim, me sento na banheira e depois me recosto, deixando todo meu corpo ser coberto pelo líquido transparente.

Encaro a água calma sobre meu corpo, lembrando do dia que usei essa banheira para limpar os corpos da Angeline e Jack. Talvez, eu sinta o contato com suas mortes agora transitando por todo esse líquido quente e isso me deixa mais viva do que nunca. Empurro meu corpo para baixo até que a água cubra cada parte do meu corpo, ficando totalmente submersa na banheira. Com os olhos abertos, eu podia enxerga a água dançando sobre minha cabeça, junto da luz que emanava do lado de fora, clareando o teto branco com machas de mofo. A imagem era tremida e acompanhava o balançar da água, assim, como, o barulho calmo que ela cantava nos meus ouvidos.

SETEALÉM || H.SWhere stories live. Discover now