A Procissão e a Catedral

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Te Deum laudamus, te Dominum confitemur

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Te Deum laudamus, te Dominum confitemur.

Te aeternum Patrem omnis terra veneratur.

Tibi omnes Angeli; tibi caeli et universae Potestates

Tibi Cherubim et Seraphim incessabili voce proclamant

Era possível esquecer-se de algo tão inerente quanto caminhar? Não era o tipo de acontecimento que Friedrich já havia se questionado, por mais engajado nas questões filosóficas que fosse. Porém, ao desabar no chão em meio a grande York, chegou à conclusão que no seu caso era possível. As palmas de suas mãos ralaram-se até expor a carne, uma parte do tecido da túnica rasgara na manga e seu queixo chegou a tocar o chão úmido de lama. A confusão inicial logo deu lugar para o constrangimento, sentindo o olhar de dezenas de pessoas em sua direção com alguns risos contidos propagados por sua desgraça em meio ao coro devoto da procissão.

Sanctus, Sanctus, Sanctus, Dominus Deus Sabaoth.

Pleni sunt caeli et terra maiestatis gloriae tuae.

Às vezes sentia formigamentos pelo seu corpo, por vezes seus membros moviam-se sem que notasse, sentia o gosto de algo estando com a boca vazia, ou até mesmo escutava algo que não existia. Ele imaginava que fossem sintomas diversos de sua desconhecida doença, pequenas propagações de algo maior que tanto temia ser flagrado. Eram situações estranhas e passageiras que aprendeu a lidar com o tempo, às vezes denunciavam uma crise maior e intensa, mas também apareciam de forma esporádica e sem grandes motivos. Tinha algumas suspeitas que caso ficasse perturbado, nervoso ou passado por grande exaustão as chances de algo ocorrer aumentavam, mas não sabia como ter certeza disso, tratando-se apenas de hipóteses no meio da ignorância do desconhecido.

Naquele momento em específico, pareceu que suas pernas se desconectaram do corpo, parando-as de sentir por um momento curto, mas o bastante para que se desequilibrasse e tombasse de forma humilhante no meio da multidão.

Te gloriosus Apostolorum chorus,

Te Prophetarum laudabilis numerus,

Te Martyrum candidatus laudat exercitus.

Te per orbem terrarum sancta confitetur Ecclesia, Patrem immensae maiestatis

Ao menos recebeu a ajuda para levantar-se de um casal de meia idade, e ao ser questionado se estava bem assentiu positivamente, mas por uma fração de segundos temeu não ser capaz de permanecer em pé novamente. Friedrich os agradeceu enquanto tirava o pó da túnica, olhando para todos os lados com desconfiança, temeroso que alguém tivesse percebido algo a mais em seu desequilíbrio. Conseguiu prosseguir a caminhada normalmente, mas com a incerteza de uma criança aprendendo a andar pela primeira vez.

Venerandum tuum verum et unicum Filium

Sanctum quoque Paraclitum Spiritum

Nas últimas duas noites percorreu a cidade como um rato a se esconder pelos esgotos, andando pelos cantos mais obscuros para não ser notado, vivendo somente do sustento que trouxera, junto ao medo da violência tão comum em locais como aquele. Não conhecia o lugar ou os locais seguros para se alojar, somente evitando permanecer nos locais infestados de peste ou que proibiam sua presença. O ócio e o tédio tomaram conta de si, enfurnado somente com sua cabeça repleta de dúvidas. Provavelmente o oposto do que seria este dia em que reencontraria Loki de uma vez por todas.

Ode aos desafortunadosWhere stories live. Discover now