Capítulo Um

31 3 0
                                    


    Sabe aquele dia que você acorda e parece que é o dia mais perfeito da sua vida? Eu acordei assim hoje. E como não acordar? Passei de ano com notas máximas, tenho uma família maravilhosa, amigos que são praticamente irmãos, saúde, uma namorada mais do que maravilhosa a qual não canso de dizer que amo, e para completar, hoje é o show da mulher que considero a mais perfeita. As vezes me pergunto o que fiz para merecer tudo o que tenho, e morro de medo que algum dia se vá. Tamanha felicidade, que não entendo e nem posso explicar como é essa sensação. Obvio, possuo em minha vida momentos ruins, mas o que são esses pequenos lamentos de uma adolescente, se comparados a toda essa felicidade e amor que me rodeia?

Olho para Julia e não consigo mais desviar meus olhos dela. Como pude me tornar tão trouxa por alguém? Assim eu não vou para Hogwarts nunca. Mas como não olha-la? Seus cabelos loiros longos, seus olhos claros, seu corpo escultural cheio de curvas, e é claro, minha parte favorita, sua bunda que só pode ter sido desenhada. Fui muito cachorra nessa parte? Desculpa! Às vezes tenho sim uma puta vontade de gritar aos quatro ventos de que não somos apenas amigas, que ela é minha e eu sou dela, mas respeito o fato de ela ter medo de se assumir, pois sei que não são todos que possuem uma família como a minha, e o simples fato de poder estar com ela em meus braços, mesmo que escondido, já é maravilhoso.

Julia – Laur? Ta me ouvindo? – Desperto de meus pensamentos ao ouvir sua voz a me chamar. – Serio, odeio quando você começa a divagar deste jeito. - Rolou os olhos enquanto terminava de passar o rimel.

Eu – Desculpa. Tinha falado alguma coisa?

Julia – Perguntei se você já sabe como vai vestida.

Eu – Assim. – Apontei pro meu corpo. Jens preto, camiseta com as relíquias e all star. – Por quê? Ta feio?

Julia – Você não conseguiria ser feia nem se quisesse muito. – Veio até mim e me deu um selinho. – Mas pensei que iria se arrumar mais pro show da sua "diva".

Eu – Depois que você desocupar o espelho eu ajeito minha cara. – Rocei nossos narizes. – Podíamos aproveitar o tempo que temos pra nos divertimos um pouco, não acha? – Enlacei sua cintura na minha.

Julia – Se começarmos com isso, só sairemos daqui quando o show acabar. – Selou nossos lábios novamente. – Agora vai terminar de te arrumar pra vermos o show da Maria não sei das quantas.

Eu – Sem graça. – Bati em sua bunda e fui em direção ao espelho.

(...)

Aos primeiros acordes de Dono Cila, meus olhos já estavam cravados na cantora, os ouvidos atentos a voz que perturba meus sonhos. Se existia uma pessoa que me hipnotizava mais que a Julia, era ela, Maria Gadu. Quando ela começava a cantar, meu corpo inteiro relaxava e tudo a minha volta sumia. Naquele momento, existia somente eu e ela, e todas aquelas pessoas a minha volta sumiam. Ver ela naquele palco, a poucos metros de mim, foi a melhor sensação que já tive, e quando por um instante muito rápido, nossos olhos se cruzaram, eu derreti, mesmo sabendo que não havia nada de mais naquilo. Como algo assim poderia acontecer? Será que é algo comum? Devo me preocupar? – As musicas corriam e o fim de show se aproximava, e ao iniciar Ne Me Quitte Pas involuntariamente entrelacei meus braços na cintura de Julia, que rapidamente se desvencilhou e me olhou braba, e esses dois atos se repetiram até o fim do show, já que meus membros estavam aproveitando a musica e se moviam "quase sem querer". Estava errada em querer curtir um show com a minha namorada e demonstrar esse amor? Já viemos em um show em outra cidade para não correr o risco de algum conhecido nos ver, porque não aproveitar e pelo menos uma noite ser um casal normal? Ver um show, namorar, ir comer um Subway, voltar pra casa e transar a noite inteira. Que mal tem isso?

Quando tudo acabou, ficamos mais um tempo já que Julia não era muito de multidões e estava a fim de ir ao banheiro, e eu como a boa trouxa que sou fiquei esperando. Quando todos já haviam saído da casa de shows, ela sai do banheiro e vamos para o lado de fora para esperarmos o taxi. Como não havia mais ninguém ali achei que finalmente não teríamos problemas se nos abraçássemos. Ledo engano.

Julia – Você esta louca Laura? Que porra te deu hoje? – Retirou meus braços de si enquanto me gritava. – Você perdeu a noção! Só porque viemos nesse show de sapata acha que pode ficar me agarrando assim? Já imaginou se tem algum conhecido por aqui que nos vê?

Eu – Desculpa mor! Achei que não teria problema. Não tem ninguém aqui.

Julia – Não tem ninguém agora. E lá dentro? Porque insistiu em me abraçar?

Eu – Deve ser porque eu queria estar junto da minha namorada. Algum problema?

Julia – Vários. Já pensou se alguém acha que eu sou sapatão? Acabou minha vida Laura. – Continuou a gritar.

Eu – E você é o que Julia? Porque hetero não é. – Comecei a me irritar também. – Porra Julia. Eu te amo, e você é minha namorada! Eu não consigo entender o que eu fiz de tão errado pra você estar deste jeito. Estamos a 40 km de casa, em um show que nenhum dos teus amigos viria. Porque todo esse medo idiota de nos verem juntas?

Julia – E dai? Tu acha que é só dos meus amigos que eu sinto vergonha? Isso que nos temos não é certo, e você sabe disto. É nojento.

Eu – Você esta realmente falando serio? Porque eu não consigo acreditar nas palavras que saem da sua boca. – Nesse momento não conseguia mais controlar minha voz e minhas lagrimas. – É isso que você sente pelo que a gente tem? Nojo? É nojo que você tem do nosso amor?

Julia – Amor? Que amor Laura? Eu nunca te amei, e provavelmente você também não em ama. Temos 16 anos e somos garotas. O que você acha que daria isto? Em um romance? – Ela riu de maneira sarcástica enquanto eu chorava, e em meu pranto não percebi que mais pessoas saíram da casa de shows e observavam nossa discussão. – O que a gente tem é bom, mas nunca vai passar disso. Não espera mais de mim do que posso te dar. – E como se fosse ensaiado, o taxi que esperávamos chega. Ela abre a porta e me pergunta. –Você vem comigo?

Eu – Vai à merda. – Ignorando minhas lagrimas, a empurro para dentro do carro e bato a porta com força e logo em seguida ele da a partida indo embora dali. Sem enxergar direito pelas lagrimas, ando em direção a parede do estabelecimento e me escoro nela escorregando até estar sentada no chão chorando como nunca em minha vida fiz. A sensação de dor que eu sentia era indescritível, e me perguntava como nunca havia visto quem era a pessoa que estava ao meu lado e se tudo que aconteceu foi real, pois eu não queria acreditar.

Não sei por quanto tempo permaneci ali, se foram segundos, minutos ou horas, mas meu pranto não parava, e minha cabeça não se erguia. No momento em que eu menos esperava, braços me envolveram em um abraço e me puxaram contra o peito da pessoa que me acalentava, e naquele cheiro desconhecido, mas reconfortante, deixei-me levar pelas emoções e ali fiquei por muito mais tempo que poderia contar.

Continua...

Quase Sem QuererWo Geschichten leben. Entdecke jetzt