Encontro na linha do metrô - Conto

5 0 0
                                    

Era domingo, fim de tarde, inverno forte, quando Cibele saiu do trabalho. Cansada, mas feliz por finalmente estar montando o apartamento com Carlos. Aquela noite não o encontraria. Ele teria um churrasco com alguns clientes.

Entrou na estação e não tinha quase ninguém na plataforma para pegar o mesmo trem que ela. Talvez pelo frio, o metrô estava bem vazio. Viu mais adiante uma senhora de uns sessenta anos, olhando fixamente para os trilhos. Ela ficou preocupada, pois a mulher estava perto demais da linha.

Ficou prestando atenção para ver se a mulher estava passando mal ou se tinha derrubado alguma coisa. Ela olhava fixamente para os trilhos e o corpo balançava um pouco. Cibele resolveu se aproximar. Percebeu que a mulher chorava. Não falou nada, mas continuou observando. Seu sexto sentido dizia que ela não tinha atendido aquele telefonema no escritório que a fez perder o trem anterior à toa.

E então o próximo se aproximou. Viu a mulher olhando para o trem e se aproximando ainda mais da linha, olhando fixamente para o trilho – desta vez aumentando ainda mais o choro. Certamente ela não tinha percebido sua presença cada vez mais próxima a ela, por estar tão absorta em alguma ideia perigosa.

Quando o trem chegou, ela se movimentou em direção aos trilhos e Cibele ao encontro dela, desviando-a de seu objetivo de se jogar debaixo dele.

– Não faça isso senhora! Não importa o que tenha acontecido, essa não será a solução.

A mulher teve uma crise de choro e abraçou-a. Cibele ficou compadecida. Ela tinha acabado de salvar uma vida e queria entender qual o motivo que levaria aquela mulher a cometer suicídio. Sem pensar duas vezes falou:

– A senhora precisa de ajuda; é evidente. Posso acompanhá-la até sua casa? Onde a senhora mora?

A mulher entre prantos disse o endereço, que era três estações antes da sua. Tentando acalmá-la no percurso, acompanhou a senhora até sua casa. Talvez por sua atenção, a mulher foi se acalmando e quando se deu conta do acontecido, começou a agradecer Cibele aos poucos.

– Obrigada. Você foi um anjo que apareceu em minha vida. Eu teria cometido aquela loucura com certeza.

Chegando à porta de casa ela a convidou a entrar para um chá. Disse que estava sozinha. Cibele sem hesitar, preocupada e também curiosa em saber o que a motivara a tentar o suicídio, aceitou. Foram direto para a cozinha e Amélia, a senhora, começou a contar sua história. O marido a tinha deixado naquele dia, oficialmente. Depois de mais de trinta anos de casamento, dedicação ao marido e aos três filhos, ele tinha arranjado outra mulher.

Amélia tinha sido uma esposa dedicada desde sempre. Ajudou-o trabalhando fora, dando aulas particulares à noite e cuidando dos filhos. O marido tinha investido muito também no trabalho e conseguira vencer na vida. Quando os filhos começaram a crescer e a vida deles a melhorar muito financeiramente, o casamento deles começou a esfriar demais.

O marido começou a fazer academia, usar roupas de marca, viajar constantemente a trabalho e a ficar até tarde em eventos de confraternização com clientes. Fez uma lipoaspiração e uma cirurgia nas pálpebras. Já para Amélia, sempre enrolava quando ela pedia de presente a cirurgia para redução de gordura no abdômen.

Ele começou a maltratá-la, sair cada vez menos com ela e havia mais de um ano que apenas dividiam o mesmo quarto. Ela desconfiava que ele tivesse casos extraconjugais, mas não tinha coragem de confrontá-lo nem investigá-lo para comprovar. Os sinais de que ele iria deixá-la aumentavam a cada dia, mas ainda assim ela não queria acreditar que ele fosse capaz. Não depois de uma vida inteira dedicada a ele e à família.

– Eu tenho 50 anos e olha como pareço 10 anos mais velha! Já ele, depois de tantos procedimentos para rejuvenescimento, aparenta 10 a menos. Ele tem 54. Quer ver a foto dele?

Então foi na sala pegar dois porta-retratos. ― Olha, essa é de nossa viagem a Disney, em 2000 e esta é da viagem dele com nossos filhos em 2013.

Cibele ficou branca e começou a sentir falta de ar. Amélia percebeu e agora os papéis haviam se invertido. Era ela que acudia a moça.

― O que foi meu bem, está se sentindo mal?

Ela respondeu:

― Esse é o Carlos!

― Sim, o Carlos, meu marido, você o conhece?

― Ele é meu noivo!

Ambas chocadas começaram a confrontar as histórias e descobriram que ele enganava as duas. Para Cibele ele não contou que era casado, que tinha filhos, que tinha 54 anos... Ele disse ter 45, dez a mais que ela. Eles haviam se conhecido em um evento no interior e começaram a namorar um ano atrás. Ele arrumou um emprego para ela na cidade havia um mês. Ela estava morando num apartamento alugado e na semana seguinte iria morar com ele, em seu apartamento.

― Ah o apartamento que ele comprou dizendo que era para alugar? ― Perguntou Amélia.

Com ódio, as duas decidiram tramar um plano para se vingarem do homem maldito e falso que tinha enganado duas mulheres tão maravilhosas como elas. Durante aquela semana se encontrariam para combinarem tudo.

Cibele foi andando para casa, para ver se a raiva passava. Não acreditava que tinha salvado a vida da mulher do seu namorado. Combinou com Carlos de tomar café da manhã no dia seguinte e pediu para ele encontrá-la no metrô. Ela queria contar para ele toda a sensação que sentira ao impedir aquela mulher de se jogar nos trilhos.

Quando ele chegou, ela estava olhando fixamente para os trilhos.

― Cibele, cuidado amor, você está muito perto da linha. Ele a abraçou, mas sem retribuir, ela começou a sussurrar no seu ouvido a noite passada.

―... e então eu fui até a casa dela, da Amélia Torres! Nesse momento ele se soltou dela e olhou-a, pálido.

― É, Carlos. Eu salvei sua mulher. Você acha mesmo que devia jogar a vida dela fora por sua causa? Ele começou a balbuciar, sem saber o que dizer.

― Deixa que eu mesma responda. Não, a vida dela não vale a sua, e você, não vale nada.

Depois de uns dias, as manchetes nos jornais eram: Homem de 54 anos morre após assediar mulher, que ao se defender, empurrou-o sem querer nos trilhos do metrô.

Encontro na linha do metrô - ContoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora