Capitulo único

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Três batidas na porta.

Há algo no fundo da minha mente que atordoa todos os meus pensamentos enquanto me esforço para abrir os olhos. Sinto minha cabeça doer, e não consigo distinguir se o som gradativo que ecoa pela sala de estar apenas está intensificando a dor, ou se é a fonte dela. Quando finalmente abro os olhos, a claridade irrita minha visão, fazendo-me piscar algumas vezes.

Ergo meu corpo lentamente. Não possuo pressa. Contudo, a pessoa atrás da porta distribui mais algumas batidas pela madeira, declarando sua impaciência. Solto um pequeno suspiro e grito que já estou abrindo, inclinando-me em direção à mesa de centro e pegando me celular, descobrindo que este é o responsável pelo barulho ensurdecedor. Não sei se é ligação ou despertador. Desligo e caminho até a porta.

— Você estava usando estas mesmas roupas na semana passada — Calum declara assim que me vê, o semblante sério e calmo. Como resposta, apenas dou um curto passo para trás, sabendo o que o garoto iria fazer a seguir.

Ele entra, fechando a porta atrás de si enquanto eu devolvo o aparelho ao seu lugar anterior, deitando-me no sofá. Todo o meu corpo dói, e sei que a causa são as noites mal dormidas neste sofá, mesclado ao álcool que ainda flutua vagamente pelo meu corpo.

— Você não pode mais continuar dormindo aqui — o garoto declara, sentando-se na poltrona, posicionando-se estrategicamente para conseguir analisar meu rosto.

— Eu não consigo dormir no quarto, você sabe — digo enquanto passo a mão pelo rosto, não disfarçando a exaustão. Sentia como se já houvesse tido aquela conversa antes. E talvez eu realmente tivesse, provavelmente com Michael. E depois com Ashton. Eu me sentia preso em um enorme ciclo.

— Você... — ele hesita. Assim como todos que vão falar comigo fazem. Eles hesitam. Eles analisam a minha situação. Eles escolhem cuidadosamente as palavras. — Você precisa ao menos tentar, Luke.

— Eu estou tentando — murmuro.

— Como? — questiona o moreno. — Você não toma banho há semanas. Você não troca de roupa e não sobe para o seu quarto. Você não está nem comendo! E a casa... — quando seu tom está praticamente se transformando em gritos, Calum para, suspirando fundo enquanto observa os destroços da minha residência. — Está tudo um caos, Luke.

Sento-me. Qualquer posição no sofá quando estou sóbrio parecer ser desconfortável da mesma maneira. Encaro Calum, esperando que ele diga. Esperando que ele faça os mesmos discursos feitos antes. Espero que ele descreva todas as etapas do luto assim como Michael fez. Espero que ele diga o quanto é difícil, assim como Cassandra. Espero que ele ofereça ajuda para a mudança assim como Ashton. Espero que ele diga que tudo ficará bem assim como todos.

Contudo, um dos meus melhores amigos lança-me um olhar sério e decidido, enquanto prepara e inclina seu corpo para se levantar.

— Amanhã, nós iremos te ajudar a arrumar a casa — declara. — Ashton, Michael e eu. Eu entendo que não é fácil, Luke. É uma perda. E sei que Clifford já te explicou todos os passos de como o luto funciona. Pois bem, é hora de dar mais um passo, está bem? — ele caminha em minha direção, distribui dois tapas fracos em meu braço e sorri brevemente. — Vai ficar tudo bem. Eu prometo.

Quando Calum se aproxima da porta, alegando que na sacola há comida, abre-a e desaparece, meus olhos estão lacrimejando.

Há uma sacola em cima da poltrona, onde o garoto estava sentado. Não havia percebido o momento em que ele havia deixado o pacote ali, mas pego-o e caminho até a cozinha. Assim como todos que me visitam, há congelados para poucos dias. Levando em consideração em minha alimentação, consigo manter os mantimentos por duas semanas, talvez até mais.

Ghost of youWhere stories live. Discover now