Theo

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Duas semanas e meia mais tarde, a ânsia por estabelecer um contato com Artemísia já era uma vontade nublada na mente de Theodoro. Não que aquilo não cruzasse sua mente algumas vezes no dia, mas normalmente ele apenas ignorava o pensamento porque, depois de tantas mensagens, ele achava que estava na hora de perceber que Arte tinha dado um ponto final a tudo que eles tiveram.

Theodoro não teve nem mesmo tempo para velar o seu coração partido. Depois do fim das aulas, os dias correram até as provas do ENEM e, depois de fritar o próprio cérebro com o desespero de passar para uma universidade ou não, já não havia muito de qualquer sentimento nele para sofrer.

Ela o havia cortado de sua vida e ele entendia aquilo, respeitava até. Theodoro tinha sido uma bagunça desde o momento em que foi jogado como responsabilidade de Artemísia, e, no fim da contas, o quanto ele poderia importar para ela? O futuro estava batendo na porta da garota com pressa. Ela com certeza passaria para o curso que quisesse, na faculdade que quisesse. Ela não era a maior fã de festas, mas combinava mais com os cenários de festas de faculdade do que as festas de ensino médio que ele passou três anos frequentando. Theo podia facilmente imaginá-la usando uma blusa de botões, calças jeans e se desculpando por ter derrubado bebida barata nos sapatos de alguém. E as pessoas provavelmente ficariam loucas quando a vissem, os olhos grandes e expressivos, o cabelo curto e a personalidade admirável. Ele definitivamente não combinava com o futuro brilhante dela.

— Theo, não é possível que você esteja mesmo tentando pôr a mesa — Marisa, mãe de Theodoro, olhou para o trabalho mal acabado do filho.

O pai dele estava na cozinha preparando o almoço do primeiro sábado em família em muito tempo deles. Normalmente Vicente era obrigado a cozinhar, já que era chefe de um restaurante, enquanto Theo e Marisa circulavam pela cozinha fazendo tarefas preguiçosamente enquanto fingiam contribuir.

Mas, naquele dia, Theodoro estava se saindo excepcionalmente mal em seu fingimento, porque nem sua função de pôr os pratos na mesa ele estava exercendo bem. Marisa balançou a cabeça enquanto distribuía os pratos em frente aos três lugares.

— Não quero começar uma análise nem nada, mas você me parece cabisbaixo — ela comentou, fingindo dar pouca atenção ao assunto.

Normalmente essa era a tática da mãe de Theo. Ele evitava dar margem para que suas análises fossem longe demais com ele, uma vez que preferia Marisa, sua mãe, que Marisa, a psiquiatra. E ela tentava ser sutil e não tratar Theodoro como um paciente, separar a mãe da profissional, mas não precisava trabalhar com saúde mental para perceber que Theodoro parecia alheio.

Como se o mundo estivesse todo em uma frequência muito acima da dele, e ele estivesse apenas dançando em meio aos outros e coexistindo.

— Estou legal — Theo afirmou, concentrando toda sua mente na arrumação dos talheres.

— É o vestibular? Está ansioso por causa do resultado? Ainda vai demorar um pouco para sair.

— Não, mãe — ou sim, ele mesmo não tinha como saber.

Ela assentiu, pensando em uma abordagem diferente. — Quando vai convidar Artemísia para vir aqui?

Theo soltou o garfo que segurava, o metal fazendo um barulho irritante ao bater no chão. O garoto ajoelhou-se no chão, enfiando parte da cabeça sob a mesa. Não havia necessidade daquilo, mas preferiu ter um momento a sós com o garfo caído enquanto pensava no que dizer em seguida.

Quando tornou a ficar de pé, Theodoro tentou capturar a maior quantidade de ar possível para dentro dos pulmões.

— Eu não te contei que Arte e eu terminamos? — disse num tom casual.

Marisa abriu a boca, chocada, mas a pergunta que proferiu foi ainda mais inesperada por Theo.

— Vocês estavam de fato namorando?

Para falar a verdade, não, e aquilo foi um ponto que pesou muito no término do que quer que eles tivessem. Mas normalmente os pais pulavam para conclusões o mais rápido que podiam, e ele achou que Marisa acreditava que Arte e ele estavam namorando, uma vez que ela tinha se tornado a única garota em sua vida nos últimos três meses.

— Algo do tipo — Theo balançou a cabeça, ainda tentando diminuir a importância do assunto. — Mas não estamos mais.

— Por quê?

— Porque... — ele tentou pensar numa resposta amena. Porque eu escondi algo importante dela, mãe. E porque tudo que a nossa relação trouxe a ela foi drama, e agora ela provavelmente escolheu apagar tudo e seguir em frente para seu futuro. — Bom, não estava funcionando muito bem, mas terminamos numa boa.

— E ainda são amigos?

Theo segurou a risada desgostosa. Não eram amigos. Ele só sabia que ela ainda estava viva porque podia ver os comentários dela nas fotos de Nicolas no Facebook, e as fotos que ela postava no Instagram. Uma selfie na Lagoa, uma foto de um cappuccino artesanal, as costas de Nicolas sujas de areia da praia. Era assim que ele sabia que ela ainda existia no mesmo mundo em que ele, assistindo-a viver do outro lado da tela do celular.

Além disso, se pudesse chamar alguém de amigo, era mais capaz que Nicolas fosse seu amigo que ela. Ele mandava mensagens às vezes, perguntando sobre como foi o ENEM e dizendo que iria assistir o jogo do Interescolar dos Peppers. Mensagens educadas e amigáveis, muito diferentes do tipo de comunicação que ele tinha com Nico meses antes. Tudo muito diferente do que ele tinha meses antes.

— Amigos, sim — Theo sorriu. — A gente se fala de vez em quando, ela vai assistir o Interescolar e tudo mais — mentiu. — Posso convidá-la para vir aqui um dia desses.

— Seria legal — Marisa retribuiu o sorriso.

E Theodoro sentiu-se afundando, pela primeira vez desde que tinha percebido que tudo entre Arte e ele havia acabado. E enfim percebeu que toda aquela situação de se sentir anestesiado com tudo o que estava acontecendo vinha de um sentimento que nunca havia sentido antes.

Theodoro Roriz teve seu coração partido.

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