Capítulo 01 - É necessário viver aqui, para saber que está aqui

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"... nada disto fazia sentido, amor e ódio, alegria e tristeza tratavam-se apenas de palavras que as pessoas usavam para definir o que sentiam, era isso que ele queria me fazer acreditar, que essas palavras tratavam-se de algo que as ajudava a descrever o que os olhos não podiam ver encarcerado no coração ...".

Diário de Austin

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"Você já viu este homem em sonhos?

Observe no desenho as tatuagens espalhadas pelo corpo, todas são palavras que descrevem sentimentos. Utiliza uma máscara branca sem nenhuma expressão, a mesma usada no teatro grego antigo.

Caso confirme que ele tem aparecido durante seu sono.

CUIDADO!

Você pode estar sendo objeto de seus estudos psicóticos e letais.

Como sei disto?

Ele era meu pai.

Isso mesmo.

Era.

No passado, por que, depois de tudo que me fez, não há como chamar um monstro deste de pai.

Mas ainda irei pegá-lo em seu jogo macabro e levá-lo a justiça.

O contato para relatos é apenas através do e-mail:

Omoldadordementes@gmail.com

Lembre-se, se o ver em seus sonhos, comunique e fique alerta".

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Acabara de publicar num fórum de modo anônimo, um autorretrato que fiz sobre o moldador de mentes.

Os recentes relatos de pessoas que dizem tê-lo visto e misteriosamente desapareceram dias depois, fez com que a polícia local de Riverside começasse a investigar o site, mas, ninguém conseguiria chegar até ele, exceto eu.

Não tenho acesso ao sistema completo de criminosos como os investigadores, nem ao menos sou da área de segurança, porém, fui treinado em sua técnica de invasão de sonhos, e participei de sua obsessiva ambição pela mente humana.

Sua tese de construir personalidades através dos sonhos, como se fosse um Deus brincando de moldar o universo, nunca fora saudável.

Pelo contrário, repugnante e sem o mínimo de remorso pelo que fazia, não passava de um maldito demônio atormentando quem desejasse.

Me espreguicei na cadeira, segurei a xicara de café que ainda estava morna, tomei um gole e olhei para o relógio.

Já passava das 02:00 h da madrugada.

O ritmo de trabalhar a noite no meu próprio bar mudou meus hábitos.

Hoje, segunda-feira, o dia que defini como folga, havia passado pesquisando depoimentos a noite inteira, mas não consegui resultados expressivos, grande parte dos usuários que comentavam sobre o caso, levavam o assunto como uma lenda da internet, um mito virtual como muitos outros.

Mesmo que não fosse seguro, a melhor forma de pegá-lo ainda era dentro de seu próprio mundo, caçando-o de sonho em sonho.

Mas num plano infinito e complexo como este, o que eu poderia fazer para encontrá-lo?

Deveria pensar como ele, ir atrás de suas vítimas, seguir seu padrão, de alguma maneira, ser ele.

Por puro acaso do destino, o vi uma única vez.

Estava praticando a parapsicologia, ou como alguns gostam de chamar, viagem astral, quando o encontrei dentro dos sonhos de Anna.

Lá estava ele, não fazia nada, apenas a observava em seu pesadelo, como se assistisse a um filme.

Estávamos nós três em cima de um imenso prédio, Anna não percebera nossa presença, ou apenas entendera como personagens de sua mente.

Quando o vi, minhas pernas congelaram.

A máscara por mais que não tivesse uma aparência assustadora, apenas um rosto sem definição, me assombrava desde pequeno todas as vezes que era usada durante as viagens que eu e ele fazíamos, invadindo os mais profundos sentimentos das pessoas.

Permaneceu me observando, fixo, sem mover um músculo.

Depois de um tempo.

Nada fez.

Nada disse.

Me descontrolei, o nervosismo e a tensão me fizeram acordar, despertando e nunca mais encontrando-o.

Passei a acompanhar todas as noites, o sono de Anna, para me certificar de que ele não voltaria, mesmo no fundo, tendo medo que retornasse.

Por mais que me desenvolvesse, nunca consegui atingir o seu nível de inserção.

Passei a utilizar um gravador de voz de mão, para conversar comigo mesmo, e identificar quando estava em sonho ou na realidade, esta foi a única maneira que encontrei de manter-se lúcido.

Enquanto ele, nunca precisou de algo para se localizar.

"É necessário viver aqui, para saber que está aqui".

Era isso que dizia quando tentava me ensinar.

Nunca entendi ao certo o que isso significava na prática, fui punido por minha ignorância, não que isso importasse agora.

Tudo que queria, era pôr um fim ao homem que me criou, que destruiu minha infância, que levou minha querida mãe, que fez da mente dos seres humanos seu parque de diversões, o homem doente que pensou ser superior aos outros, meu pai.

O moldador de mentes.

O Moldador de MentesWhere stories live. Discover now