Capítulo 59

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Mais alguns dias se passaram, estavamos na segunda semana do mês de novembro.
Eu estava melhorando depois de duas semanas após aquela agressão homofóbica. Acho que o que mais mexeu comigo não foram nem as feridas que eu sabia que iriam se curar, o fato era mais sobre o psicólogico, que mesmo eu não querendo, ficou abalado. Andava no meio da rua com medo de ser agredido, ou de algo acontecer com Thomas também, pessoas que me encaravam de uma maneira diferente já eram motivo medo. Mas aos poucos fui me recuperando disso e me prendendo ao carinho que sempre recebia das pessoas a minha volta. Enquanto ainda tiverem pessoas boas no mundo, as más não vão se sobressair...
Meus pais ficaram sabendo de uma parte da história, a que valentões me bateram por causa de um mal entendido, mas não cheguei a contar nada sobre Thomas nem sobre minha sexualidade, que foi pega como razão para essa agressão.
Na verdade eu estava apavorado com a ideia deles saberem, imagina a reação deles de saber que eu fui agredido justamente por ser gay! Se eles já fossem contra, com certeza teriam razões de sobra para não me apoiarem e veriam a minha relação como algo horrível. Não tem como fugir... A imagem que eu sempre passei foi a de um filho perfeito, o que ia sempre bem na escola, o que dava orgulho aos professores com suas notas e postura impecáveis, o que queria e com certeza teria um futuro brilhante, trazendo junto da bagagem uma esposa amável, já que nunca fui de ficar com qualquer garota, e um dia netos correndo pela casa dos meus pais, que adoravam crianças.
Como explicar que nunca seria pai da maneira tradicional?
Como explicar que nunca teria um casamento como o deles?
Como explicar que eu era feliz, mas que corria o perigo de sair na rua e ser agredido por andar de mãos dadas com quem amo?
Meus olhos se umideceram, olhei para cima tentando evitar chorar, já havia chorado por tudo o que aconteceu quando fiquei sozinho, não queria deixar a tristeza me dominar de novo, mas era difícil...
Eu estava no meu quarto ajeitando algumas coisas e guardando na minha pasta os trabalhos da faculdade que havia terminado, enquanto pensava em meus pais e no aperto no coração que eu sentia por guardar um segredo assim deles.
Eliza entrou no meu quarto e me viu ali, então se aproximou devagar. Me observou e repousou sua mão em meu ombro.
Olhei para ela, que retribuiu sorrindo de leve, já sabendo que eu não estava bem.
- Vem cá...- Eliza me chamou, fazendo eu me virar para ela.
- O que?
Ela se aproximou e entrelaçou seus braços em volta de mim, me abraçando com muito carinho. Fiquei surpreso por um momento, mesmo sendo um gesto simples.
- Sou sua melhor amiga, seu chato... Sei quando você está precisando de um abraço.
Sorri e a abracei de volta, naquele abraço apertado e cheio de um sentimento que eu sabia que nunca iria acabar, repousei minha cabeça sobre a sua, sentindo o perfume de rosas suave que seus cabelos negros e sedosos emanavam.
- Quem mandou você ler minha mente?- Perguntei sorrindo com os olhos fechados.
Eliza se afastou um pouco e sorriu dizendo:
- Desde quando nós pedimos permissão?
Dei risada e fiquei olhando para ela sorrindo. Eles sempre sabiam como fazer eu me sentir melhor.
- Eu poderia ler sua mente agora e descobrir o que está te deixando assim, mas prefiro perguntar, sabe?- Ela deu um sorrisinho- O que te preocupa, Ryan?
Respirei fundo.
- Meus pais... Contar a eles tudo o que está acontecendo na minha vida... Deixar de ter segredos.
- Bom, eu não sei como seria a reação dos seus pais, mas eles sempre encararam as coisas tão de boa. Poxa, eles tem o Rychard como filho, o que é ser gay perto de tudo o que ele já aprontou?
Nós dois rimos. Então Eliza continuou:
- Mas eu entendo que deve assustar e que você está com medo por causa da agressão e todos os contras que há em ser homossexual nos dias de hoje... Só não fique se torturando assim! Uma hora você vai poder contar e explicar tudo com calma, são seus pais e te amam como ninguém. Vão perceber que é sobre sua felicidade de que se trata.
Não é que Eliza sempre era a minha voz da razão? Fazia qualquer problema parecer menor. Sorri realmente aliviado ao escutar e pensar em suas palavras. Dei um beijo em sua testa e perguntei:
- O que seria de mim sem você, sua chata?
- Acho que você não poderia nem chamar o que teria de vida!
Nós rimos mais um pouco e ela falou se afastando animada:
- Acabei de ligar para o Arthur! Ele falou que a rave naquela chácara vai rolar mesmo, os organizadores conseguiram programar tudo. Festança a todo vapor!
- Tá andando muito com o Rychard, mocinha! Está muito baladeira.- Falei rindo.
- Nada, é meu namorado que está me levando para o mal caminho, ele é o que me arrasta para a bagunça e eu arrasto ele para os estudos.
- Own, que equilíbrio perfeito!- Falei sorrindo e zoando ela, que mostrou a língua.
Mas a rave iria rolar mesmo e agora até eu fiquei animado para ir depois que Eliza me deu um up, a galera toda ia dos nossos amigos, todos mesmo. Essa seria uma das últimas festas que daria para todos nós irmos juntos antes do final do ano. Então teriamos que aproveitar a oportunidade!
Meu único problema era não saber que uma certa pessoa também não estava querendo perder a oportunidade de arruinar a minha vida...
Mike foi expulso da faculdade e ficou puto da vida por não ter conseguido provar absolutamente nada do que sabia, mas não podia deixar para lá, algo muito errado aconteceu naquele dia, como assim tinha dois Ryans? Isso é impossível, algo eu fiz para sair impune daquela maneira e ele queria saber o que era.
Praticamente perdeu tudo depois que saiu da faculdade, sua popularidade foi para o lixo e não tinha mais seus seguidores fanáticos, já o nome da sua família que era bem conhecida foi parar na boca de fofoqueiros que o difamaram bastante e até aumentaram a história, fazendo seu pai ficar ainda mais irado com ele.
Um pouco antes naquela manhã, ele estava no carro dele olhando furioso para onde eu e o Chris moravamos, até isso ele deu um jeito de descobrir. Steve, aquele outro amigo dele que ajudou a me agredir, estava junto dele no carro.
- Cara... Ainda não entendi direito qual é o seu plano.- Comentou Steve parecendo confuso.
- Simples, esperar.
- Mas esperar o que?
- Não sei ainda... Mas algum jeito eu vou dar de descobrir como o Ryan conseguiu sair ileso e ainda expulsar nós dois.
- Nem me fala, a minha vida está um inferno por causa desse idiota.- Falou o amigo dele encarando o prédio.
- Inferno? A minha é o que então? Eu perdi tudo, cara! Meu apartamento, meu amigos, meu pai não quer nem saber de me dar dinheiro e está quase inventando de me obrigar a fazer uma porcaria de intercâmbio só pra se livrar de mim, dá para acreditar? Se brincar esse carro vai ser a próxima coisa que ele vai arrancar de mim, então tenho que aproveitar agora para saber como vou me vingar.
- Vingança? Você não tinha me falado de vingança, Mike! Sabe muito bem que se chegarmos perto desse cara de novo vamos nos ferrar na prisão, mano!
- E quem falou em fazer alguma coisa com ele? Pretendo fazer algo sem ter que tocar nele de novo.- Falou olhando para frente pensativo.
- Então o que vai fazer?
- Só segue o plano... e espera.- Falou Mike impaciente.
Seu plano era ficar me espionando e achar meu ponto fraco ou qualquer brecha que fosse para continuar me atormentando de uma forma não tão direta, já que se chegasse perto ele teria problemas.
Eles ficaram ali por um tempo, quase desistiram, mas no momento em que iam ligar o carro para dar partida e ir embora, eu e o Chris saímos do apartamento.
Eu saí para a calçada me rachando de rir, Chris estava meio emburrado por estar sendo zoado.
- Aquele grito fino que você soltou... Vai ficar se repetindo na minha mente varias e várias vezes!- Falei quase não tendo mais ar de tanto rir.
- Muito engraçado!- Chris revirou os olhos e ia fechar o portão da entrada do nosso prédio.
- Ei! Está bravinho, mas não fecha a porta na cara das pessoas, né Chrisão?- Falou Ryck correndo antes do Chris fechar a porta sem esperar ele sair.
Mike arregalou os olhos e perguntou:
- Você está vendo o que eu estou vendo?
- Tem dois deles, cara!
- Eu não acredito... Gêmeos!- Afirmou Mike olhando para mim e para o Rychard.
- Esse é o efeito que baratas causam em você?- Perguntou Ryck zoando o Chris também enquanto andavamos.
- Né? Quem vê o Chris com essa voz grossa nem imagina o grito de mulher que ele dá quando vê uma barata!- Falei rindo.
- Verdade, estou até estranhando! Que eu saiba, quem é gay aqui é o Ryan, Chrisão...- Ryck brincou cutucando ele.
- Ah, sai daqui vocês dois! Queria ver também se não iriam se assustar com uma barata subindo na perna de vocês.- Falou ele tentando não rir.
- Talvez um leve susto, mas não a ponto de soltar aqueles gritinhos.
Eu e o Ryck ficamos imitando ele quando viu a barata juntos e caímos na risada de novo.
- Ah, eu não aguento com idiotice em dobro... Vamos logo buscar a Julie e a Eliza para a gente se preparar para a rave.- Falou Chris sorrindo e entregando os pontos.
Nos aproximamos do carro onde Mike e Steve estavam. Os dois se esconderam o mais rápido que puderam. O carro do Chris estava estacionado logo atrás.
- Vou contar para a Julie essa, para ela já saber quem vai ter que matar as baratas quando vocês se casarem!- Falei sorrindo.
- É capaz dos dois subirem juntos em cima da cadeira!- Disse Ryck.
Chris fez uma careta enquanto abria a porta do seu carro.
- Podem me zoar, vamos ver quem vai rir quando eu contar toda a loucura do Ryck estar aqui sem ninguém saber para os pais de vocês como vingança!- Falou Chris dramático.
- Ai, que maldade!- Falei colocando a mão no coração.
- Simplesmente todos iriam se lascar bonito, todo mundo aqui tem profundos segredos!- Disse Ryck rindo.
- Inclusive o senhor, Christian.- Falei o encarando.
- Sei disso, estou zoando! Não sou nem louco de falar alguma coisa para os pais de vocês, eu sairia perdendo e feio!- Falou dando risada.
Olhou para a frente e observou o carro lá parado.
- Esse carro é familiar ou é impressão minha?
- Cara... Tem vezes que eu esqueço até a marca do seu, acha que vou lembrar do carro das outras pessoas? Minha Blue é ciumenta, só deixa eu me lembrar dela.- Falou Ryck entrando pelo outro lado. Chris deu de ombros e entrou também, dando ré e saindo.
Assim que nós desaparecemos virando na esquina, Mike e Steve se ergueram nos bancos e se olharam.
- Você escutou?- Perguntou Steve.
- Claro que escutei... Parece que as coisas podem estar virando a nosso favor, cara.- Falou Mike sorrindo e pensando, enquanto olhava para onde tinhamos ido.
- O que pensa em fazer?
- Não sei ao certo... Mas desmascarar esses idiotas é o plano! E o primeiro passo é descobrir onde os pais deles moram... Todos vão saber os mentirosos que eles são!

Entre Segredos e MentirasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora