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Era tarde, Nanda estava na janela da sua casa, aquela toda pintada de azul, relembrando os bons momentos que passara naquela cidadezinha pequena. Foi difícil ter tomado a iniciativa de abandoná-la, mas era um sonho se realizando. Seria a primeira da família à ingressar numa faculdade. A primeira a ter estudado. E por mais que fosse sentir falta dali, e soubesse que nada seria fácil longe da sua família, do seu refúgio, ela estava pronta para conquistar o mundo com seu carisma de menina batalhadora... Porque mesmo que fosse para o mais longe possível, sua casa sempre seria ali.

Adorava como as coisas funcionavam na cidadezinha; de como todos eram simples, acolhedores, — um pouco fofoqueiros, mas de coração bom. Iria sentir falta de pegar a estrada grande a pé com o resto do pessoal — mais ou menos umas trinta pessoas — para irem até a igreja mais perto. Sentiria falta da escola local, das horas que passara ajudando como podia, sendo professora — mesmo que não fosse formada —, ensinando os mais velhos a ler... E principalmente, sentiria falta das festas locais, em especial a festa junina que tanto amava.

Nanda ama festas juninas de todo o seu coração. Não perdia uma sequer e ajudava na organização de todas — principalmente a que aconteceria em dois dias. Sua data do ano preferida. Tudo começava em 12 de junho e ia até o dia 29, em comemoração a São João, São Pedro e Santo Antônio. Era tradição. E não tinha coisa mais divertida para ela do que fazer bandeirolas junto com a criançada da vizinhança, fazer os recadinhos do coração que era a parte mais linda e romântica da festa, se vestir toda espafalhosa para a quadrilha e o casamento caipira, juntar todo mundo para cantar em volta da fogueira, comer muita canjica e claro, ajudar a mãe fazer paçoca, arroz doce e o pé de moleque que todo mundo amava...

Ahh, aquele pé de moleque! Uma maravilha.

Nanda tinha boas lembranças dessas datas com o pé de moleque servindo de protagonista. Como aquele seu namoradinho de distância, que conhecera quando não passava de um garotinho de 10 anos, que juntos faziam suas diabadas para todo canto, nas férias escolares, e amava o doce.

Se ela fechasse os olhos até podia o sentir passando pela sua porta, chegando de São Paulo com a tia, gritando por teu nome lá em 2009. Ele fizera isso muitas vezes, principalmente da última vez que realmente se viram. A última vez do beijo roubado perto da barraca de pé de moleque. Oh menino que adorava um pé de moleque!

Todas às vezes que ele chegava e todo pessoal se reunia para a festa, todo mundo bonito e legal... Lá aparecia Dave todo pintado de barba de mentira, calça rasgada do tio — o Seu Tião da fazenda dos Miguel —, lenço branco e chapéu de palha, correndo pra lá e pra cá segurando a mão de Nanda.

"Vamos Nanda. Pé de moleque. Tem pé de moleque, seu João?", perguntava só por perguntar para seu pai.

E o pai dava a mesma resposta, sempre:

"Tem sim garoto. Mais tem demais uai".

Era coisa de gente de cidade grande. Dizia que não encontrava nada igual por lá. Era até bonitinho. Nanda adorava o sotaque Paulistano, e a curiosidade do menino, que sempre lhe aparecia com uma novidade da cidade grande. Era TV de não sei o que, um tal de Wi-Fi, e um bocado de trem. E ele sempre terminava o dia dizendo que aquela cidadezinha, toda pacata, era o melhor lugar do mundo, e que nunca deixaria de visitá-la. Uma promessa.

Nanda não podia discordar. Mas sempre sonhara em conhecer o mundo, e só de conhecer Dave, o garoto inteligente da cidade grande, ela sentia que já conhecia um pouquinho.

"E têm as melhores pessoas", ele dizia todo atrevido para seu lado, com aquela displicência de capital.

Nanda adorava, adorava.

Amor de MeninaWhere stories live. Discover now