— De quem é esse quarto? – Pergunto passando a mão por uma estante de livros.
— Da minha irmã – Sua voz saiu fraca, e ele continuou a olhar.
— Han? Você nunca me disse que tinha uma. Porque ela não está na festa? – Questionei virando-me para olhá-lo.
— Ela morreu há dois anos. – Parou de mexer nas roupas e puxou algo para fora e trouxe até mais perto de mim. — Vocês têm um corpo parecido, deve servir em você, se não gostar ou não servir, pode procurar outra lá. – Ele apenas diz isso e saí o mais rápido possível do quarto.
Ao falar dela, parece que a dor ainda era bem intensa sobre sua perda. É compreensível, eu ainda choro quase sempre pela morte da minha mãe. Pela primeira vez percebi algo em comum com o Chuck: a dor da perda.
Olhei bem o vestido que ele me deu, era um verde simples com estampa de flores, ele ia até o joelho e tinha as mangas caídas deixando meus ombros livres. Tirei o colar que não combinava com isso e soltei meu cabelo, ele formou algumas ondas. Tirei um pouco do batom deixando-o mais claro, quase num tom rosa. Como eu não tinha outro calçado, continuei com meus saltos pretos.
Continuei por alguns instantes a olhar pelo quarto. A garota era bonita e radiante em todas as fotos, parecia bem feliz em todas. Pergunto-me qual seria o motivo da sua morte.
— Acabou? – Chuck pergunta atrás da porta.
— S-Sim... – Não esperava que ele estivesse ali.
— Vem logo, eu quero ir embora. – Disse, um tanto agitado.
Saí imediatamente do quarto.
Ele apenas se despediu de algumas pessoas e de sua mãe e enfim levou-me de volta para o campus. Como estava um pouco tarde, tinham poucas pessoas espalhadas pelo gramado. As luzes dos alojamentos estavam desligadas. Dessa vez ele que parecia quieto demais.
— Me desculpe por isso – Murmurou. — A Fernanda é um saco, eu disse.
— Eu já esperava que ela não ia ficar quieta, mas não sabia que era tão imatura. Você não sabe escolher mulher – Faço-o rir um pouco.
— Você está dizendo que você não é boa também? – Ele levantou uma das sobrancelhas pondo seu rosto a minha frente, fazendo-me parar.
— Eu sou uma exceção. – Dou de ombros e ele volta a ficar apenas ao meu lado para continuarmos a caminhar.
— Minha irmã também era. – Ele sorri de leve olhando fixo o chão.
— Ela era bonita... Radiante. Não sei como parecia tão feliz ao seu lado – Dou uma cutucada nele.
— Eu sou mais legal do que você pensa – Ele se defende.
— Vem comigo. Eu sei como vai melhorar – Estendo minha mão, ele hesita um pouco, mas no fim a pega.
O puxo para meu departamento. Apesar de ser mais de meia-noite, eu tinha um truque para entrar escondido.
— Temos uma invasora em potencial aqui – Chegou mais próximo de mim, que estava destrancando a porta com um grampo.
— Shh! – Abro a porta e o deixo passar antes de mim.
— Onde aprendeu isso? – Pergunta.
— Não importa. Tira esse terno aí! – Ele se afasta um pouco, como se eu fosse lhe fazer algo. — Pode deixar que não vou te agarrar por aí, não sou uma louca! – Ele fecha a cara e tira seu terno ficando apenas com a vestimenta branca por baixo.
Chego mais perto dele e retiro sua gravata.
— Você vai me fazer ensaiar a essa hora?
— Não tem nada melhor que extravasar na dança. – Sorrio, me agachando para tirar meu salto. Prendo meu cabelo novamente num coque alto e tiro os brincos colocando-os em cima da mesa junto com minha bolsa.
— Só pode ser brincadeira – Ele ri irônico.
Eu pego meu celular e coloco uma música agitada. Começo a dançar feito louca, sem passos coreografados, apenas libero o estresse ali. Ele não faz nada apenas fica rindo de mim.
— Podemos ao menos acender mais luzes? Só tem essa ali acesa – Ele aponta para a lâmpada do fundo da sala acesa, que estava iluminando pouco. Era a única que sempre estava ligada.
Eu continuo dançando e ignoro seu pedido.
— Anya! – Exclama. Eu pego em sua mão e o puxo para a mesma dança que eu.
Ele começa devagar, mas depois vai acelerando conforme a música tocava, até ficar tão louco quanto eu.
Pela primeira vez estávamos sorrindo juntos, como dois malucos, trancados num departamento com pouca luz, uma música baixa e tentando manter o silêncio. Dançamos até nossos corpos se cansarem e cairmos deitados no chão. Ainda havia uma música tocando no celular, mas não queríamos nem a tirar de lá.
— Você é mais maluca do que imaginei – Diz, ofegante, deitado ao meu lado no chão.
— Você também é mais do que eu imaginei – Deito de lado e ele faz o mesmo.
Nossos olhos se encontram. A manhã estava chegando e seus olhos azuis pareciam verdes agora. Seus cabelos negros pareciam brilhar de forma diferente. Num impulso coloquei minha mão em seus fios para ver se era tão macio quando aparentava e era.
— Gostou do meu cabelo? – Ele riu e eu tirei a mão imediatamente.
— É que... – Pigarreio. — Ele parece falso as vezes. – Dou uma explicação esfarrapada.
— Sei – Ele sorri de canto.
— Temos que sair, daqui a pouco tem gente aqui. – Ponho-me de pé e desligo a música.
Pego as coisas fora da minha bolsa e guardo.
— É... A gente passou mais tempo aqui do que pensei. – Ele chega por trás de mim e pega a gravata e o terno dele e pendura em seu ombro.
Eu senti um nervosismo repentino com sua aproximação então me afastei.
— Podemos dar um tempo hoje? Nada de ensaio, por favor – Pensei em dar mole para ele, mas eu tinha que praticar.
— Nem pensar! – Nego. — Não se atrase dessa vez, se não eu vou fazer você ficar mais tempo aqui. – Ele murmura algo que não consigo ouvir e vai se arrastando até a porta.
— Você é cruel – O empurro pelas costas para fora do departamento e tranco novamente.
— Anda logo! – Exclamo.
Chuck.
Pela primeira vez contei a alguém sobre minha irmã. Claro que todos sabem da morte dela, mas eu nunca cheguei a contar demonstrando estar afetado por isso. Essa garota, tinha algo nela que me colocava o meu eu sensível para fora. Um eu que eu não reconheço e não vejo a muitos anos.
Apesar de ser totalmente desajeitada e sem noção, ela tem alguma aura especial, como se algo nela fosse divino. Como um imã, estou sendo atraído.
Acho que Túlio tinha razão, essa garota é cilada. Mas o que tem de mal cair em uma de vez enquanto? Eu nunca tinha experimentado deixar os sentimentos falarem mais alto, mas ela faz com que eu queria fazer isso.
Continua...
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Castelo de pedra
SpiritualAnya perdeu tudo que tinha muito cedo. Chuck sempre teve tudo e até mais do que merecia. Quando os dois se encontram por causa de uma estupidez a vida de ambos mudam e tomam um rumo diferente onde, sutilmente, segredos do passado virão à tona. "Cas...
Capítulo 11 - Extravasar ❤
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