Não Espie

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Dona Joana possuía o título de maior fofoqueira do bairro, coisa com a qual ela própria não concordava, e naquele dia, ela estava lavando roupa quando viu o homem passar pelo portão da casa de Ricardo e Bianca, seus vizinhos recém chegados.

Estava usando um moletom azul e cobria a cabeça com o capuz, e Dona Joana julgou que era esse o motivo dela não reconhecê-lo, já que se orgulhava de conhecer todos em seu bairro. Ou isso, ou era alguém de outro lugar.

Ela se aproximou do muro, pendurando a camisa molhada do marido que estava indo estender no antebraço. O homem se aproximou da entrada da casa do outro lado da rua e deixou alguma coisa na calçada, se virando novamente para sair. Por um momento, os olhos de Dona Joana e do homem se encontraram, e enquanto ele abaixou a cabeça e continuou seu caminho de volta ao portão, ela se virou, disfarçando, e foi pendurar a camisa no varal.

Assim que a fixou a roupa com pregadores na corda, Dona Joana se aproximou novamente do muro pra espiar. O homem já ia longe na rua, com as mãos enfiadas nos bolsos do casaco azul, ainda com o capuz sobre a cabeça. Ela secou as mãos na própria roupa e saiu pelo portão de sua casa.

Sabia que os vizinhos estavam viajando, e pelo que sua outra vizinha, Dona Catarina, tinha lhe contado, só voltariam no início da próxima semana. Claro que estaria fazendo um favor, guardando o que quer que o homem esquisito tenha deixado, então não hesitou em atravessar o portão e buscar a caixa de papelão que encontrou lá.

De volta à sua casa, pôs sobre a mesa da cozinha e observou-a. Já tinha sido aberta antes, e fechada outra vez com fita adesiva, e duas palavras estavam pintadas nela de vermelho: NÃO ABRA.

Bom, Dona Joana pensou, alguém já havia aberto antes. Não faria mal dar só uma olhadinha. Buscou uma tesoura na gaveta, e começou a cortar com cuidado, para que depois pudesse fecha-la mais uma vez.

E cerca de uma hora depois, ela estava lacrada novamente, e Dona Joana andava pela rua com ela entre as mãos. O olhar vazio, os passos sem rumo.

NÃO ABRAOnde as histórias ganham vida. Descobre agora