Um grito.

E não vinha de dentro da residência.

Sara levou apenas um segundo para reagir perante o susto e Thiago também se levantou de um salto. Não foram os únicos. A casa inteira pareceu despertar como em um passe de mágica.

— O que é que foi isso? — perguntou dona Anália segurando um xale ao redor dos ombros e impedindo as duas crianças de irem muito adiante no corredor.

Márcio, por sua vez, avançou e espiou pela janela.

— Alguém se machucou. Certeza.

— Vamos lá dar uma olhada. — Thiago lançou um olhar para a irmã.

Ela correu na bolsa e pegou uma das armas.

— Vamos, pega isso. — Esticou uma das pistolas para ele, então se virou para o casal. — Por favor, fiquem aqui e se mantenham seguros. Fiquem de olho nas crianças também.

— De jeito nenhum! — Márcio contestou. — Vou junto.

E como se não desse espaço para qualquer tentativa de convencimento por parte dos dois, abriu a porta e lançou um olhar examinador para fora antes de avançar para a varanda.

Como se assistisse a um filme de terror, Sara esperou que alguma mão monstruosa o puxasse para as trevas ou garras surgissem de lugar nenhum para retalhá-lo. Apressou o passo na tentativa de evitar que tal coisa acontecesse, porém apenas o vento a recepcionou. Os sons típicos da noite eram os únicos presentes, como se o que ouviram pouco antes não tivesse acontecido.

Thiago veio por último e fechou a porta, instigando-os a prosseguir. Virou-se para o dono da casa:

— O senhor, que conhece melhor o lugar, acha que pode nos indicar onde foi?

— Talvez pra lá. — O mais velho apontou. — Vamos ver.

O trio seguiu unido e prestando atenção a cada parte em que conseguiam colocar os olhos. A essa altura, a adrenalina de se depararem com um monstro ansioso por sangue e morte deixou Sara completamente desperta. Os olhos pareciam capazes de ver tudo ao mesmo tempo e seu coração batia rápido, ribombando em seus ouvidos.

Ao alcançarem o ponto indicado por Márcio, encontraram-se em uma clareira coberta de grama, troncos caídos e parcialmente iluminada pela luz da lua e das estrelas. O silêncio dominava tudo e trazia uma sensação de tranquilidade.

Talvez por isso a visão do corpo caído em meio ao verde tenha sido tão estranha, mais do que o normal. Thiago correu para verificar a mais nova vítima, que estava bem diferente dos outros casos. Os primeiros corpos pareciam destroçados e, exceto pelos ataques não completados, todos haviam sido mortos.

Sara percebeu, mesmo à distância, que daquela vez o monstro deixara alguém vivo. Provavelmente porque ela gritou e chamou a atenção, o que queria dizer que havia consciência naquela criatura misteriosa.

Teriantropo, provavelmente. Restava saber de que tipo.

— Alô? Sou eu. Por favor, mandem uma equipe médica — pedia Thiago ao telefone. — Temos uma vítima. Pode ser grave. — Pausa. — Certo. Até logo.

E desligou.

Márcio tentava acordar a mulher — que ele disse ser Ana Maria, filha de um dos vizinhos que morava mais abaixo das colinas —, e Sara avançou tentando impedi-lo de piorar o estado de saúde dela. O quadro era delicado e inspirava cuidados.

Quando chegou perto, Sara também reparou que a mulher não tinha maiores ferimentos visíveis, embora a parte da frente de seu vestido estivesse suja de sangue. Por sorte, Thiago andava sempre preparado e tirou do bolso de trás do jeans uma atadura, que usou para tentar diminuir o sangramento.

Sara se acomodou ao lado dele para ajudá-lo na tarefa e, ao fazer isso, ela finalmente percebeu de onde vinha, então descobriu exatamente com o quê estavam lidando. E com quem.

Dois pequenos buracos na lateral do pescoço.

Talvez não tivessem conseguido chegar a tempo no ritual dias antes e a bruxa tivesse conseguido seu intento. Então ela pôs os olhos na faixa em seu braço, suja por uma pequena mancha carmesim, e se deu conta.

Talvez seu sangue tivesse ressuscitado a ameaça.

Ficaram ali, apenas a encarando, por não mais que um segundo ou dois, então desapareceram.

Mas se esqueceram de levar junto com eles o pânico que começava a dominá-la.

Precisava fazer alguma coisa, qualquer coisa, antes que fosse tarde. E o que mais a angustiava não era o fato de não saber o que fazer, antes fosse. Era porque ela sabia exatamente o que devia ser feito.

Apenas não tinha coragem.

Noite Vermelha [COMPLETO]Where stories live. Discover now