Morder ou não morder?

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- Sempre quis ser veterinário.

Mordo...

- Acho que foi por causa dos documentários de vida selvagem que via com o meu pai.

...ou não mordo?

- A minha mãe queria que eu fosse médico de humanos.

Vou morder.

- Mas o meu pai ficou muito contente por eu ter me formado em medicina veterinária.

Mas mordo onde?

Estava cada vez mais difícil concentrar-me no que Pedro dizia. Ele já estava há horas em minha casa, com muita conversa e pouca ação. Já tinha perdido várias oportunidades de o morder e transformá-lo em vampiro.

Cada vez me parecia mais que tinha feito uma boa escolha. Conseguia imaginar-me casada com o Pedro para toda a eternidade. Ele podia ajudar-me a montar-me de drag, podíamos ir de mão dada para o clube e fazer grandes banquetes de sangue de galinha. Era fácil imaginá-lo nesse papel, mas parecia-me injusto torna-lo vampiro, sem a sua autorização.

- Giovanna... – chamou-me – Giovanna, estás a ouvir o que estou a dizer?

- Claro que sim. O teu pai gostava muito de documentários e a tua mãe de médicos!

- Sim... – disse-me com um sorriso cândido – Foi mais ou menos isso. Por acaso, não tens nada para comer?

Por acaso, não. Vampiros não têm snacks e bolos em casa! Ele não podia aperceber-se de jeito nenhum que não tinha comida em casa e que o meu frigorífico estava cheio de embalagens de sangue.

Naquele momento, para desviar o assunto, resolvi beijá-lo. Ele pareceu surpreso, mas retribuiu. Foi um beijo tímido e contido, mas simplesmente fazia sentido. Não nos estávamos a beijar forçadamente para obter prazer físico. Era muito mais que isso.

Eu não podia mordê-lo à socapa. Não me sentia capaz de o fazer. Ele não o merecia.

Naquele momento, já só tinha 3 opções:

a) Contar já tudo sobre a minha condição e explicar que é possível um vampiro e um humano manterem um relacionamento seguro;

b) Continuar a conhecê-lo melhor e mais tarde decidir o que fazer;

c) Mandá-lo embora de minha casa e nunca mais lhe dizer nada.

- Giovanna, tu és um mistério. – disse-me ele, depois do beijo

- Porquê?

- O teu nome poderia ser Giovanna Imprevisibilidade Rubi. Não esperava este beijo.

- Gosto de esperar pelo momento certo. – disse

- Não é só pelo beijo que digo que és um mistério. Já entendi que tens muito mais a contar sobre ti, para além do que conversámos esta noite.

- Certamente, tu também tens.

- Claro que sim, mas tu és diferente. Consigo sentir isso. Olho para ti, vejo uma pessoa forte, incrivelmente forte, mas frágil ao mesmo tempo. Tenho muita vontade de te conhecer melhor.

- Eu não sou frágil. De jeito nenhum.

Olhei para os seus olhos verdes e percebi que apenas me tinha enganado a mim própria. Eu não queria que ninguém me conhecesse melhor.

Provavelmente, sim, ele era um homem excelente. Poderia até ser o homem perfeito para mim, mas eu nunca poderia ser o par perfeito de alguém. Contar-lhe que era vampira seria uma decisão infantil e precipitada. Adiar e contar-lhe mais tarde, era só adiar o momento em que ele me rejeitaria. A minha decisão era definitiva.

- Pedro, podes sair de minha casa. Foi um erro ter te trazido aqui.


[Português Europeu]

Drag Queen VampiraWhere stories live. Discover now