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— Ah, é você! — ouviu uma voz dizer.

Mariana se virou tão rápido que tropeçou em uma cadeira. O coração acelerado se contraiu ao ver Pedro de pé. Ele estava com uma aparência melhor do que na noite anterior, mas ainda estava muito pálido. Ainda usava as mesmas calças escuras do outro dia, mas estava sem camisa. Mariana tentou não prestar atenção aos gomos do seu abdômen, às tatuagens que cobriam seu torso e braços, ou aos músculos do seu corpo, e se concentrou nas bandagens sobre seu ombro, cobrindo a ferida.

— Você não devia estar de pé. — ela disse, preocupada. Deu um passo em direção a ele, mas hesitou.

— Eu estou bem. — Pedro disse, mas apoiou-se em uma poltrona, parecendo fraco. Quando percebeu que Mariana acompanhava seus movimentos, ele sorriu — Talvez eu devesse sentar. Sentar parece uma ótima ideia.

Ele se sentou, parecendo imediatamente melhor. Levou uma mão ao ombro machucado e apoiou a cabeça no encosto da poltrona, respirando fundo. Ainda hesitante, Mariana se aproximou alguns passos.

— Eu escutei passos e achei que fosse a Eloá. Ela costuma acordar cedo. — ele disse, mantendo os olhos fechados.

— Quem é Eloá? — Mariana franziu os olhos, procurando um lugar para ficar. Ficar de pé parecia estranho, então acabou se sentando numa cadeira próxima, onde não conseguia olhar tão diretamente para ele.

— É a mais nova. Tem só dez anos. — disse, e ela podia ouvi-lo sorrir – É uma gracinha.

— Ela é como vocês? — Mariana perguntou, lentamente. Então, temendo não ter sido muito clara, acrescentou — Ela também é parte anjo?

Pedro demorou tanto para responder que, por um instante, Mariana imaginou que ele não a tivesse ouvido ou que tivesse adormecido. Por fim, após um longo minuto, ele falou.

— Sim. Somos todos nefilim aqui.

— Até o feiticeiro? — ela franziu o cenho. Pedro riu.

— Não, ele não. — disse, com um longo suspiro — Feiticeiros tem sangue de demônio, não de anjo.

— Então ele é como aquela coisa que nos atacou lá em casa? — espantou-se. Lembrar do ataque era lembrar de casa, do desespero da solidão, da falta de notícias. Era lembrar-se de Milena. Seu coração se apertou.

— Não, não. — ele se remexeu na cadeira até encontrar uma posição onde pudesse olhar para ela, parecendo desconfortável — Feiticeiros são filhos de demônios com humanos. São os únicos no Submundo que podem fazer magia. E são imortais.

Mariana ergueu as sobrancelhas, surpresa. A ideia da imortalidade nunca lhe fora muito apelativa — só soava como um sofrimento perpetuado ao infinito — mas a parte da magia parecia muito legal. Mas não conseguia imaginar por que alguém em sã consciência teria um filho com um demônio. Sua mente imediatamente construiu uma cena horrorosa dela nos braços do monstro que a atacara em sua casa, e precisou balançar a cabeça para tirar aquela imagem dali.

— Eveline me disse que vocês são tipo a polícia do Submundo. — falou, então, as palavras parecendo estranhas em sua boca. De canto de olho, viu Pedro sorrir.

— É um jeito bonito de colocar as coisas. — ele disse, calmamente — É quase isso, só que somos treinados desde crianças para isso, assim como as nossas famílias antes da gente. Vivemos pelo trabalho.

— Não parece muito legal. — Mariana comentou, e ele meneou a cabeça em concordância. Observou-o por um instante, e então uma pergunta lhe ocorreu — O que são essas tatuagens? Todos vocês tem. Nunca vi esses símbolos antes.

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