Gumusservi

2.3K 144 82
                                    

Gumusservi (n): Ver o luar sobre as águas.

Uma visão do futuro

"Como que faz isso?" a escuto perguntar. Sorrio e vou até ela, agachando-me para ficar do seu tamanho. Agarro seu pequeno bracinho envolvendo-a e apoio a pedra em seus pequenos dedos. Com um pouco de força, faço-a arremessar a pedra, vendo-a observar a pedra quicar na água do lago.

Fica bem aí

Que essa luz cumprida ficou tão bonita em você daí

Ana

Já faziam quase vinte minutos em que eu e Vitória estávamos em silêncio total. As únicas vezes que havíamos falado era sobre como iriamos pagar o uber e tudo aquilo parecia estar a incomodando, pois era nítido em seu olhar e a forma como ela estava conduzindo tudo aquilo.

"É muito longe daqui?" pergunto e ela olha pra mim, negando.

Era a primeira vez desde o dia em que eu conheci Vitória que ela estava totalmente calada.

Logo chegamos no local e a cacheada me parou. Vitória olhou pra mim e para a casa, e se eu já estava perdida, acabei ficando ainda mais.

"O que é aqui?"

"Eu trabalhei aqui logo quando vim pra São Paulo. A cafeteria ainda não existia e eu precisava arranjar dinheiro..." dizia enquanto abria o portão da casa. "Os donos viraram meus amigos e acabaram me dando uma cópia da chave da casa pois eles não utilizam mais."

Ao abrir o portão, me deparei com uma casa enorme, com um grande gramado e uma piscina. Por que Vitória havia-me trago ali?

"Quando eu estou estressada eu venho aqui." Começa, "quando me mudei pra São Paulo as coisas eram muito difíceis. Eu era uma estranha tocantinense em solo paulista nessa selva de pedra e não conhecia ninguém. Eu tinha tudo e ao mesmo tempo, não tinha nada."

Assinto com a cabeça.

"Não ia te trazer aqui. Ia te levar pra tomar um suco e saber como foi o seu dia. Mas eu quero te entender, Ana. Quero saber por que uma hora tu dança comigo, outra dorme comigo e na outra vira o rosto quando vou te beijar. Quero entender o que se passa aí dentro, por que sempre digo que quero saber, quero te conhecer, tu me dá corda e depois corta. Eu não entendo, Ana Clara. Juro que não entendo."

"Vi..."

"Não vem com Vi não, Ana. Tu tá mexendo com meu coração, po." Diz magoada e eu sinto o peso das palavras. "Tu não sabe como eu me importo contigo, Ana Clara. A gente se conheceu agora e eu acho que tu já ta em minha vida a tanto tempo que eu nem sei. Só quero que tu me deixe entender, Ana. Deixa eu conhecer você."

Um grande silêncio se instalou ali. Vitória me observou por longos segundos que mais pareciam horas até começar a tirar sua roupa e entrar na grande piscina. O dia já estava caindo e o reflexo da lua na água tornava todo aquele cenário ainda mais bonito.

Resolvo me permitir também.

"Desculpa." Digo quando começo a tirar minha roupa. "quando acordei e não a vi, encontrei o bilhete, falei contigo e tu não citou a nossa noite, achei que fosse só mais uma noite pra você. Por que pra mim não foi, Vi... Não foi..."

Entro na água e nado até perto de Vitória.

"Por que tu não me disse que era assim que tu se sentia, Ana?" indaga, "eu tô aqui. Eu só quero que tu converse comigo. Se eu faço algo que te incomoda, me diz. E não, Ana, não foi só mais uma noite pra mim. Foi a noite em que você me permitiu te fazer mulher. E não digo que tu me deixou te conhecer intimimamente por que intimidade vai além do sexo. Eu te conheci assim e agora quero te conhecer de outro jeito. Por favor, Ana."

"Eu deixo, Vi..." sem perceber, lágrimas se misturam com á agua da piscina. Sinto os braços de Vitória me rodearem e apoio minha cabeça em seu ombro.

"Não existe Julia, Ana. Não existe fulano, ciclano ou beltrano, se tu me quiser, eu vou estar aqui pra tu."

"Mas tu é tão livre, Vi. Tua liberdade é tão bonita."

"E quem disse que eu não posso ser livre do teu lado? Quem disse que eu não posso ser livre te permitindo ser livre comigo? A vida é tão mais, Ana."

"Eu não quero te prender, Vi."

"Tu não me prende, Ana. Muito pelo contrário! Esse tempo que tu tá comigo me deixou ainda mais de peito aberto pra encarar as coisas com um jeito tão mais bonito e tão seu..."

"Fica aqui?"

"Até ali se tu quiser."

Uma vez eu ouvi dizer que liberdade é essa saga de se jogar todo dia da pedra mais alta, de parapente. Voar por todo o céu, sem deixar de ter o pé no chão. Livre é quem se veste como gosta, usa o cabelo como tá afim, assiste desenho e jornal, ama as músicas que ama, mesmo que o mundo ache cafona ou infantil. Gente que se permite e se impõe.

Mas com a Vi... Com a Vi eu aprendi que liberdade não é isso que a gente tanto banaliza, não é uma inimiga ou concorrente do amor. A pessoa que escolhe, por amor, o mesmo parceiro todos os dias é muito mais livre do que quem se prende nessa jaula de ser sozinho e viver de outrora, porque só assim se é feliz.

Quando olhei para trás, encontrei Vitória brincando com uma borboleta e minha barriga pareceu revirar de tamanha felicidade. Percebi que o que eu procurava a tanto tempo estava bem ali, e se Vitória queria me conhecer, ela iria. Me aproximei dela e quanto a mesma me percebeu, ela sorriu. Passei meus braços em seu pescoço e beijei o canto de sua boca.

"Vi, tu quer me conhecer?"

"Claro."

"Viaja comigo?"

Chegaste ao fim dos capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Oct 15, 2017 ⏰

Adiciona esta história à tua Biblioteca para receberes notificações de novos capítulos!

AntídotoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora