3 - A cidade, o garoto e o velho camponês

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   Um balançar estranho, porém familiar, o incomodou. Sentia-se esquisito. Uma dor forte latejava em sua cabeça e seus músculos pulsavam dolorosamente com seus batimentos cardíacos. Havia desmaiado de novo? Esta era a segunda vez naquele dia completamente irritante. Estava começando a ficar com raiva de tudo isso. Pelo menos desta vez se lembrava do que havia acontecido antes de desmaiar, ao invés de acordar completamente perdido e desnorteado sobre o que havia acontecido. Como não se lembrar? Havia enfrentado e matado aquela criatura monstruosa, cheia de dentes e de braços, dona de um urro amedrontador que estremecia o interior de todos os que ouviam, coisa que atormentaria muitos homens por muitas noites. Começou a ter devaneios. O que era aquela coisa? Onde ele mesmo estava naquele momento? Como conseguira chegar perto do monstro com tanta rapidez? Era um dia esquisito, realmente, e o incomodava com um certo medo, não saber as respostas para tudo aquilo.

O balanço estranho ainda o incomodava enquanto tinha os seus devaneios sobre o que havia acontecido. Abriu os olhos com dificuldade, depois de perceber o tempo que havia ficado perdido em seus pensamentos e lembranças tenebrosas. Tentando focar a imagem embaçada de seus olhos recém-abertos e fracos, percebeu um chão coberto de grama que se mexia constantemente para trás, parecendo uma esteira. Foi pouco tempo depois que percebeu. Era ele, ao invés do chão, que se mexia. Estava repousado com a barriga em algo que andava constantemente, em um intervalo constante de balanços. Sua cabeça estava pendurada para baixo e oscilava de um lado para o outro, seguindo fielmente o movimento que o balançava. Fez força para se mover, mas desistiu imediatamente. Uma dor imensa emanou de seus braços e das suas costas assim que seus músculos se contraíram para fazer o movimento. Voltava a sentir as antigas dores. Sentia-se fraco e incapaz de fazer qualquer tipo de esforço. Sentia como se pudesse ficar ali o tempo todo, mesmo com esse balanço eterno e completamente nauseante que insistia em jogar de um lado para o outro a sua cabeça.

Virou sua cabeça para a direita, olhando para a direção que ele se deslocava, junto com a coisa que o carregava. A sombra negra de um homem contra a luz do luar se projetou gigante na sua frente. As costas dele pareciam ter quilômetros por conta do ângulo, mas logo percebeu que devia-se ao fato de ele estar sentado logo na sua frente. Este homem estava sentado naquilo que o carregava e balançava eternamente. Um cavalo, logo veio em sua mente. Com certeza estava em cima de um cavalo, e o homem sentado estava tomando as rédeas. Por isso aquele balanço lhe era muito familiar.

Quem seria aquela pessoa que direcionava o cavalo? Seria o homem que o ajudara a matar aquela criatura? Com certeza era, mas quem será que era este homem? Seria ele o dono do vulto da caverna? Lenn se desesperou. Se fosse, não estaria em condições de lutar naquele momento. Estava completamente dolorido e incapaz de se mexer, e quaisquer que fossem as possibilidades que Lenn tinha de enfrentar aquele homem da caverna que matava em um piscar de olhos, estavam agora nulas. Porém, uma lembrança veio em sua cabeça. Na caverna, algo misterioso o protegeu do feixe de luz amarela, e, alguma coisa aconteceu que fez com que não sofresse danos quando foi arremessado pelo gigante.

Resolveu arriscar. Fez força nos braços. Sentiu a dor, porém conseguiu aguentá-la. Botou a mão nas costas do homem e empurrou, movendo o próprio corpo para trás e escorregando para fora do apoio que o carregava. Caiu do cavalo que andava numa velocidade mínima e, num baque surdo, acertou suas costelas no chão. Arrependeu-se amargamente do que acabara de fazer. A dor que sentira fora extrema e agonizante, entrando em seus nervos e moendo seus ossos. Ficou no chão se contorcendo e gemendo. Não conseguia focar a visão por conta da imensa dor. Não pensara no que iria sentir se caísse no chão com aquela força e com todo aquele mal jeito. Estava cansado também. Ficou ali por um tempo, deitado enquanto agonizava em sua dor silenciosa, torcendo para aquela sensação se cessar. Era realmente algo insuportável e Intenso demais.

Anjo de Duas CarasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora