1 - Resgate

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Um som estranho penetrou seus ouvidos. Suas pálpebras pesavam como se tivessem sido banhadas em chumbo. Assustado, notou os olhos úmidos. Tentou abri-los, mas eles não obedeceram. Algo não lhe parecia bem. Uma incômoda sensação de que havia andado muito e que, embora dormindo, estivesse acordado. Sons confusos que não pareciam reais tomavam conta do ambiente.

Tudo tão distante... uma espécie de sonho. Um pesadelo, talvez.

Queria entender, mas estava atordoado demais para alguma coisa fazer qualquer sentido. A respiração difícil, custosa, um peso em cima de si.

Tentou acordar, mas nada que experimentasse conseguia tirá-lo daquele estado incômodo de suspensão. Tentou gritar, chorar, andar. Mas parecia dormir, flutuar.

Paralisia do sono? Morte? Buscou racionalizar, inutil. Estava tonto, perdido.

— Preciso acordar...

Uma fraqueza avassaladora tomava seu corpo aos poucos. Ao longe ouviu alguns sons confusos, vozes, sirenes, buzinas distantes. Não conseguiu identificar de onde vinham ou de quem eram as vozes. Ouviu o som alto de uma buzina bem próxima. Um som forte, que aumentava rapidamente. Apavorado com a proximidade daquele barulho ensurdecedor, abriu um pouco os olhos e enxergou um clarão vindo do que pareciam ser dois grandes faróis muito próximos a ele. O medo colocou-o um pouco mais alerta, permitindo-lhe abrir os olhos por completo e enxergar, em meio à confusão, um rosto de mulher. Ela mexia os lábios, conversava, parecia chamar seu nome. Mas ele não ouvia. Seus sentidos estavam suspensos em um torpor incapacitante. Seus olhos arregalados de horror, observavam-na com interesse. A confusão era grande e, o barulho, uma mistura aterradora. O rosto da mulher ainda estava lá, mas uma névoa começava a cobri-lo.

Tentou tocar aquele rosto doce, mas seus braços estavam imóveis. Tentou falar, mas não conseguiu emitir qualquer som. O desespero e o esforço haviam consumido a energia que ainda lhe restava e, fraco, derrotado, desmaiou.

— Droga! — Anne resmungou retornando.

— Como ele está? — Perguntou Qanik.

— Nada bem... Não estou conseguindo tirá-lo do momento. Entrou em um círculo vicioso e fica retornando a ele. Já é a quinta vez.

— Quinta? Não sei como está aguentando... Você sabe que precisamos tirá-lo desse estado ou vamos perdê-lo, não sabe? O escudo natural vai se romper a qualquer momento.

— Eu sei disso, Qanik, mas não consigo. Ele é fraco.

— Fraco ou não, você não está aqui para julgá-lo. O problema existe e desculpas não vão resolvê-lo. — Repreendeu de forma enérgica.

— E o que você sugere? A vontade é dele, não minha!

Qanik olhou-a demoradamente, compondo um semblante descontente. Não estava satisfeito com o comportamento de Anne. Aquele era o primeiro resgate que a deixava tão instável e tão apavorada, retirando-a de seu desempenho normalmente calmo e seguro. Eles tinham pouco tempo e ele precisava agir.

— Eu vou. — Informou decidido.

— Você?!

— Quando um de seus alunos falha, o professor assume o erro. Com a vida não se brinca, Anne. Nem se dá desculpas. Esse rapaz é importante para nós. Eu vou.

— Mas um segundo rosto será muito pior, você sabe disso...

— Não temos escolha! Se você está dizendo que não consegue, eu preciso ir! Não vou entregá-lo de mãos beijadas para eles.

— Você está me julgando como se eu não tivesse sequer tentado. Chamei por ele várias vezes, mas o momento dele foi forte demais e... ele simplesmente não reage! — Reclamou furiosa.

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⏰ Last updated: Aug 22, 2017 ⏰

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As Flechas de Tarian [Degustação]Where stories live. Discover now