– Eu só não percebo porquê a mim? Eu conheci-os vagamente através do filho, e apenas lhes dei um funeral digno – a minha linha de raciocínio perdia-se a cada nova informação.

– Isso já não lhe sabemos explicar. Você passaria a deter um dez a vinte porcento do valor do seguro, a partir de agora, caso os testes de paternidade confirmem, irá deter o cem porcento – engoli em seco.

– E quais foram as provas relevantes que fizeram reabrir o caso? – Francisco questiona, curioso.

– Encontrámos o grupo de assaltantes. Fora tudo encomendado por um inimigo da família, ao que tudo indica, um antigo amigo dos pais do jovem inocente envolvido. E enquanto decorriam as consultas de inquéritos realizados na altura, as cartas apareceram bem explicitas à nossa frente – explica Sara, que mantinha o seu olhar em Joana.

– Soubemos então que foram ocultadas pelo tal grupo pois confessaram logo. Daí não a termos contactado antes –

– E agora? O que posso fazer? – pergunto, perdida.

– Temos a nossa médica disposta a realizar os testes com as amostras de ADN recolhidas do jovem falecido. Apenas comparar e logo deverá ser notificada para se reunir com o advogado da família –

– Mas isso não deveria ser hoje? –

– Iremos cancelar a sua audiência dada a existência deste novo dado, a sua filha e dentro de alguns dias os resultados chegam pelo que nós mesmos a contactaremos para o encontro com os advogados. Era ótimo que pudesse trazer todos os cartões de saúde da menina. – assenti.

– Um resto de Bom dia e voltaremos a ver-nos por melhores razões – despedem-se e eu deixo sair as lágrimas que prendi.

Francisco parecia aliviado, e apesar de eu também o estar, ainda estava a alinhar todos os meus pensamentos acerca disto. O bom de tudo isto é que a minha Joana fica comigo, e ninguém nunca ma poderá retirar.

– Sabias que a família do Bruno era abastada economicamente? – assenti e o loiro olhou-me surpreendido – Ele nunca demonstrou isso. Era tão normal, sociável e não possuía grandes demonstrações disso –

– É, ele sempre foi bastante simples, tal como os seus pais. O que eles faziam principalmente era investir, não propriamente usar o dinheiro para necessidades extraordinárias –

– E agora vais ter acesso a tudo isso. Estás bem? – eu ainda não acreditava.

– Se calhar não deveria ter acesso a tal coisa. Eles não eram a minha família. Eram gentis, generosos, mas isso não explica o facto do meu nome constar na lista dos recebedores do seguro, que neste caso, é o testamento deles dada a sua morte repentina –

– Não penses nisso agora. Pensa na Joana. Ela já estava na tua barriga quando tudo aconteceu, tecnicamente tu és a mãe da neta deles o que te liga imediatamente a eles. – e enquanto regressávamos ao meu carro, a conversa fluía.

– Eu vou precisar da tua ajuda para gerir tudo isto. Ainda tenho medo da quantia avultada que seja. – o meu irmão garantiu-me todo o apoio possível.

A partir daí o silêncio tomou conta de nós. Ele conduziu até à porta da minha casa onde deixara o seu carro e de imediato regressou ao local de trabalho onde apresentara a justificação de motivos familiares e pessoais. Entretanto, eu não conseguiria estar em casa depois de saber tal noticia e a minha mente obrigou o meu corpo a conduzir em direção ao meu café, o qual não visitava fazia muito tempo.

Foi difícil arranjar um estacionamento, pois estava tudo repleto de carros dos que faziam praia neste mês de agosto. Estacionei um pouco mais longe que o habitual e em seguida guiei o carro da bebé Joana em direção ao estabelecimento que também me parecia cheio de pessoas, o que me fez sorrir.

Um Filipe empenhado, com os cabelos despenteados e suor na testa apareceu na minha visão. Pelo que consegui perceber ao longe, ele espremia um limão e em seguida adicionou-o a uma bebida. Passei por entre as pessoas, sem ele reparar na minha presença. Digitei o pequeno código para abrir a porta de acesso ao interior do balcão, e ele continuava atento a servir os clientes.

– Bom dia, trabalhador – ele saltou e colocou a mão sobre o coração, ainda a respirar fundo.

– Que susto, Matilde – direcionou o olhar para mim pela primeira vez. Aquele verde que fazia qualquer um perder-se.

– Viemos fazer uma pequena visita. Já tinha saudades disto aqui – olhei o ambiente à minha volta. Atendi alguns clientes que queriam pagar e ir embora, de forma a ajudar o moreno cansado.

– Isto hoje esteve apinhado de gente. Desde portugueses a emigrantes e Turistas estrangeiros. Presumo que a causa seja mesmo o facto das outras praias também estarem cheias e esta ser a última opção. – ele sentou-se quando não havia mais ninguém, pois todos se dirigiam até ao areal. – Recebi um convite para o casamento do teu irmão – avisou e eu sorri.

– Vais? –

– Sim, claro. Fui é apanhado de surpresa. – conta ao mesmo tempo que volta a colocar-se de pé quando reconhece o carro da Joana. – Olá, Joana – fala e a menina para de se movimentar. – E tu? Tens estado bem? – perguntou, relembrando-me da noite em que ele passou em minha casa dadas as minhas inseguranças.

– Sim, dentro dos possíveis, sempre a ser surpreendida por novas coisas, mas temos de aprender a lidar, não é? – suspirei e a minha mente não mudara de pensamento desde esta manhã. Sempre focada naquele seguro.

– É sim. Somos surpreendidos quando menos esperamos – pego na minha menina e depois de a encher de beijos, entrego-a a Filipe que parecia ter ganhado um carinho especial pela mesma. Os seus olhos brilhavam cada vez que a observava.

– Soube hoje que as investigações do caso da família do Bruno foram reabertas. E também sofreram uma reviravolta rápida com o conhecimento da Joana como sendo sua filha. – desabafo, após alguns minutos de silêncio entre mim e ele.

– Mas está tudo bem? Os familiares não te vão tirar a menina, pois não? – também a ele lhe ocorrera tal coisa.

– Não, e aí está a situação-problema. Eles não tinham familiares, o que faz de mim a parente mais próxima da família e receber o testamento de vida deles. – de alguma forma, falar com ele fazia-me bem.

– Que alívio – sorriu na minha direção. – Não sei o que te dizer, é um caso tão incomum. –

– Eu sei, até eu estou incrédula, tão inusual de se fazer neste caso e país que até parece mentira. Dentro de dias irei reunir-me com os seus advogados para discutir os pormenores – ele entrega-me a menina e os nossos olhares entrem em contacto de novo. – Tenho de vir mais vezes, é tão melhor do que ficar presa em casa – respirei fundo um pouco do ar fresco da brisa marítima.

– Tens sim. Isto aqui cura a alma – e rimos os dois pela sua expressão enquanto a menina no nosso meio parecia querer dormir de novo. – Vês o que te digo, faz bem a qualquer um – acaricia a pequena bochecha da minha filha, o que a faz abrir os seus lábios num sorriso inconsciente enquanto dorme.

Não é apenas este ambiente que faz bem a qualquer um, também ele nos fazia bem.

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hoje, para compensar a minha demora de ultimamente, escrevi dois capítulos!

~ espero sinceramente que estejam a gostar, percebo que agora seja meio aborrecido ler estas partes sem emoção ~ 😳

beijinhos e até breve 💘

(desa)sossegoWhere stories live. Discover now