Capítulo 1

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Sinto algo se mover embaixo de mim e uma dor aguda atingir minha perna, coloco a mão esquerda na testa e sinto algo pegajoso por ela. A fumaça não me deixa enxergar muita coisa , outro cutucão na barriga, afasto-me e me deparo com a garotinha coberta de sangue embaixo de meu corpo, seus olhos brilham pelas lagrimas que escorrem sobre a fuligem preta que cobre o rosto rechonchudo. Ela coloca a mão sobre a mascara de oxigênio como se fosse tirar e eu não deixo. Olho ao lado e percebo que ainda estamos sobre os restos do avião, um corpo sem cabeça pende ao que era o poltrona ao lado da minha, uma ânsia me invade e não consigo me segurar, retiro a mascara e vomito ali mesmo.

Tudo ao nosso redor esta manchado se sangue, sem a mascara o cheiro de corpo já se decompondo me atinge em cheio. Não consigo me manter calma ao ver os restos de corpos jogados por todos os lado, tento me levantar bruscamente e grito ao sentir uma dor horrorosa em minha perna direita.

Um pedaço de ferro esta encravado como faca um pouco abaixo do joelho, a garotinha olha para todos os lados horrorizada. Observo o que o avião foi repartido ao meio com a queda e que a porta esta a o que deveria ser sete poltronas de onde estamos. Desfivelo meu cinto e logo em seguida o da garota tento pega-la em meu colo mas a dor que me toma que impede.

-Preciso que me ajude. - Digo segurando em seu rosto. - Estou machucada, então precisamos trabalhar juntas.

-Estou com medo. - Ela chora. - Eu quero minha mãe, MAMÂE!

-Shiii... - Acarecio o pequeno rosto. - Tambem estou com medo, mas precisamos sair daqui, logo acharemos sua mamãe. - Aponto para a porta. - Precisamos chegar ali, tente não pisar em nenhum fio e lembre-se precisamos sair abaixadas, ok?

A garotinha faz sinal afirmativo e eu vou na frente, tirando qualquer coisa cortante ou corpo do caminho. Minha perna queima como fogo e sinto que esta prestes a ceder por conta do meu peso, tento esquecer a dor que me arrebata e faz meu corpo todo convulsionar quando chega e sigo arrastando a perna machucada enquanto seguro a pequena mãozinha da garota.

-Estamos quase lá. - Incentivo-a. - Continue abaixada, cuidado para não bater a cabeça em nada.

O avião esta complemente destroçado, sigo o caminho sem olhar para os disformes rostos segurando as lagrimas que querem me tomar.

Só paro quando estamos de frente com a porta, um corpo esta com o rosto atravessado na janela de vidro coberto por cacos e uma barra de metal atravessada o estomago. Outra onda de vomito quer me atingir, mas não posso me deixar abalar, não quando tenho a vida de uma criança sobre minha responsabilidade. A garota olha para o corpo da mesma forma e que eu, empurro a porta com força e ela não abre, puxo uma alavanca vermelha ao lado e ela cede abrindo uma fresta.

-Não tenho mais forças. - Choro não sentindo mais minha perna. - Eu preciso de ajuda.

Ao lado um corpo sem os braços se meche o rosto do que parecia um momento foi parcialmente estourado deixando o celebro a mostra. Coloco a garota atrás de mim e pego um pego afiado do chão e me preparo. O corpo pende para o lado e embaixo dele um homem se levanta com um corte no rosto que passa do queijo, seguindo pela bochecha ate um pouco abaixo do rosto.

-Precisamos sair daqui.

Ele diz e vai ate a porta chutando-a com força ela cede bruscamente e a luz do sol quase nos cega.

Ao sair e me afastar o mais longe que minha perna permitiu, caio na areia e vomito tentando tirar tudo o que acontecera de meus pensamentos. A garotinha esta na beirada do avião gritando pela mãe, já o rapaz procura algo nos destroços.

Me deito na areia e olho o céu sabendo que aquele ferimento na perna não me deixaria viver. O homem se debruça sobre mim para que eu veja seu rosto e diz algo que não entendo, ele desaparece de minha vista assim que sinto mãos na minha perna, antes que eu possa protestar uma dor agoniante me atinge e ele retira o metal que sai rasgando minha pele, tudo em minha frente gira e meu corpo fraqueja e como se para piorar algo molhado cai em minha perna e não consigo conter o grito com tamanha dor. Rezando para que algo acaba-se com aquela tortura e sofrimento, apago.

"Abro os olhos e vejo o céu negro e estrelado sobre mim, apago.'' Horas depois. '' O sol brilha forte sobre meu rosto, apago. '' Horas depois. "Estou com muito frio, algo gelado foi depositado em minha testa, apago. '' Horas depois. "Acordo e sento-me bruscamente vomitando de lado e logo caio sobre a terra, apago." Horas depois'' Um teto de palha cobre-me do sol, apago. "

-Ela não irá sobreviver. - Alguem sussurra. - O ferimento infeccionou.

-Vamos continuar tentando. - Outra voz.

-Não podemos gastar todo o kit de primeiros socorros com ela. - Pausa. - Não sabemos quanto tempo vamos ficar aqui.

-Tentaremos apenas essa noite.

Silencio...

-Se ela não acordar ainda essa noite a deixaremos com os outros corpos para que morra.

Abro os olhos e um céu escuro é meu teto, olho para o lado e o homem de resto machucado aplica algo em meu ferimento.

-Ainda bem que acordou. - Coloca a mão sobre minha testa. - Eu não teria coragem de entrega-la para a morte.

-Obri... - Minha garganta arde horrores e sinto minha língua seca.

-Deve estar morta de sede. - Ele pega algo parecido com um coco marrom. - Beba tudo e se sentira melhor.

Bebo desesperada por alivio o liquido, que sim é coco, escorre por minha língua e desce pela garganta causando uma sensação de jogar agua em brasas quentes. Uma ânsia me sobe a garganta, mas a engulo, sabendo da importância daquele liquido para minha sobrevivência.

-Se sentirá melhor em breve, mas precisamos cuidar do seu ferimento ou ele te custara a vida.

O homem se levanta e vai embora deixando-me sozinha, logo o sono me toma novamente.

Na manhã seguinte acordo com o sol em meu rosto e a areia pinicando minha pelo, rolo para o lado com dificuldade, ainda sentindo minha perna latejar. Acima da minha cabeça uma floresta se ergue esplendorosa, sento-me com dificuldade e olho para o imenso mar que preenche a imensidão. Do outro lado uma criança corre brincando na beirada da agua.

Embaixo de mim se estende folhas de bananeira como uma pequena cama e em cima um teto de algo parecido com palha. O mesmo homem da noite passada vem andando em minha direção sorrindo.

-Bom dia, como se sente? - Me estende um coco.

-Bom dia. - Sussurros e pego o que me oferece.- Como se tivesse quase morrido.

-Que bom que foi um quase. - Ele sorri. - Ficamos realmente preocupados com você?

-Preocupados? - pergunto.

-Estamos em sete sobreviventes, mas aquela. - Aponta para a garotinha. - A mais especial de todas disse que você se colocou sobre ela para protege-la, uma bela atitude.

-Eu fiz o que devia fazer. - Dou de ombros e levo o coco á os lábios.

-Fez muita mais do que devia. - Ele olha para imensidão. - Eu nem consegui salvar minha mulher gravida.

Os olhos do homem se enchem de lagrimas e ele cobre o rosto com as mãos, seguro minhas lagrimas e acaricio sua costa com a mão livre.

-Voce não teve culpa. - Sussurro.

-Eu sei. - Chora. - Mas me sinto culpado, ela reclamou dizendo que o cinto apertava a barriga e retirou. Dormimos e eu nem sequer me lembrei disso, quando acordei já estávamos caindo e não consegui....

-Shii... Tudo bem, vai ficar tudo bem.   

Locked- Locked Out of HeavenWhere stories live. Discover now